terça-feira, 27 de agosto de 2013

Uma prática política oportunista

“Pelo menos 61 servidores lotados em órgãos da administração direta e indireta da Prefeitura de Goiânia, como a Comurg (Companhia de Urbanização de Goiânia), receberam salários que, em alguns casos, superaram R$ 80 mil, bem acima dos R$ 19,2 mil pagos a Paulo Garcia (prefeito), que foi definido por decreto como teto no Município.” (O Popular, 15/08/13, p. 13)



Trata-se de um verdadeiro assalto aos cofres públicos.



Uma denúncia como essa deveria levar a Câmara Municipal a tomar providências imediatas, para averiguar sua veracidade ou não. “A verdade vos libertará” (Jo 8, 32).



Infelizmente, não foi isso o que aconteceu nestes dias. Entre os vereadores prevaleceu uma prática política demagógica, oportunista, calculista e interesseira, que é repugnante e totalmente antiética.



Reparem: “Após manobra da base do prefeito Paulo Garcia (PT), a Câmara de Goiânia arquivou ontem (dia 14) requerimento apresentado pelo vereador Elias Vaz (sem partido) para instalação da Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar casos de salários acima do teto na Prefeitura de Goiânia. A pedido da líder do prefeito, Célia Valadão (PMDB), a sessão plenária foi interrompida para reunião a portas fechadas e quando retornaram ao plenário, 8 dos 17 vereadores que tinham assinado o requerimento retiraram suas assinaturas” (Ib.).



Vejam os nomes dos vereadores que, por covardia ou interesse pessoal (que não é certamente o amor à verdade) retiraram suas assinaturas do requerimento: Zander Fábio (PSL), Antônio Uchôa (PSL), Paulo da Farmácia (PSDC), Divino Rodrigues (PSDC), Bernardo do Cais (PSC), Tatiana Lemos (PC do B), Paulo Magalhães (PV), Rogério Cruz (PRB). Eleitores e eleitoras, será que esses vereadores merecem o voto de vocês?



Por que tanta falcatrua? Não deveria ser interesse de todo mundo saber se a denúncia dos supersalários é verdadeira ou não? E, se a denúncia for verdadeira, os vereadores – como representantes e servidores do povo – não deveriam ser os primeiros a exigir que os responsáveis sejam processados, julgados, condenados e obrigados a devolver aos cofres públicos o dinheiro roubado?



O fato que o prefeito “assinou decreto solicitando a adequação dos salários” (Ib.) não justifica o comportamento irresponsável dos vereadores. Investigar a denúncia e tomar as medidas legais cabíveis é uma questão de justiça. Tamanha imoralidade não pode ser empurrada debaixo do tapete.



Ora, se a investigação vai ser feita por meio de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) ou por uma Comissão Permanente, é secundário. O importante é que a investigação seja realizada em caráter de urgência, que o povo não seja enganado ou feito de palhaço e que seja dada uma satisfação pública à sociedade. Chega de enrolação! Não dá mais para aguentar! 



Aliás, é necessário que a investigação da denúncia dos supersalários se estenda a todos os níveis do Poder Público: do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Trata-se de uma verdadeira formação de quadrilha e de uma farra escandalosa, que clama por justiça. 



Ah! Se os vereadores de Goiânia e todos os políticos lembrassem as palavras do nosso irmão Francisco, bispo da Igreja de Roma!



“O futuro exige hoje a tarefa de reabilitar a política, que é uma das formas mais sublime da caridade. O futuro exige de nós também uma visão humanista da economia e uma política que obtenha cada vez mais e melhor a participação das pessoas, evite o elitismo e erradique a pobreza. Que a ninguém falte o necessário e que se garanta a todos dignidade, fraternidade e solidariedade: este é o caminho proposto” (Teatro Municipal do Rio de Janeiro, 27/07/13). 



Vale destacar que a líder do prefeito, acima citada, escreveu um lindo testemunho de sua presença, como cristã e política, na JMJ. Dá para entender? Quanta incoerência! 



Irmão Francisco, se Deus quiser, chegaremos lá!

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A pena de morte para os moradores de rua

Fabíola ou Neguinha, de aproximadamente 30 anos, foi assassinada com dois tiros (tórax e abdômen) numa calçada da Avenida Bruxelas, no Jardim Novo Mundo, em Goiânia, na madrugada do dia 3 deste mês. Ela é a 33ª vítima da violência contra os moradores de rua na Capital desde agosto do ano passado e foi encontrada sem vida ao lado de um cachimbo de crack e uma garrafa de bebida alcoólica.



Fabíola “foi a segunda moradora de rua assassinada só na semana passada. Ela era acostumada a passar o dia com um grupo de andarilhos que perambulavam na região leste da Capital, entre a Praça da Bíblia, no setor leste Vila Nova e a linha de trem, no Jardim Novo Mundo”. O assassinato de Fabíola “está dentro de um contexto em que moradores de rua na Capital têm sofrido ataques constantemente, a tiros, a pedradas e a pauladas”. Tem-se a impressão que, na prática, foi decretada a pena de morte para os moradores de rua. Uma verdadeira barbárie!



José Eduardo da Silva, assistente social e assessor de direitos humanos do município de Goiânia e da Coordenação do Comitê Intersetorial de Políticas Municipais para a População de Rua, anunciou que “em meio a mais uma onda de assassinatos na Grande Goiânia, a Prefeitura vai lançar, em 90 dias, um sistema de proteção à pessoas em situação de rua”. Reparem: em 90 dias. O município não percebe que se trata de urgência urgentíssima? Por que tanta demora? Será, mais uma vez, uma conversa fiada?



Maria Madalena Patrício de Almeida, da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia, afirma que “o número de vítimas pode ser bem maior, já que ela perdeu o contato com muitos moradores de rua, após o início das execuções em série”. Ela “cobra ações pontuais para a elucidação dos crimes”. Tudo indica que se trata realmente de um grupo de extermínio.



Diante da omissão do Poder Público (municipal e estadual) e de sua incapacidade (ou, falta de vontade política) de resolver o problema, a Pastoral dos Povos de Rua – como afirma Maria Madalena – defende que “a investigação desses crimes deve ser federalizada.”



A respeito disso, apareceu uma luz no final do túnel. “Uma proposta de federalização das investigações de aproximadamente 40 homicídios cometidos no Estado está em análise pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). O pedido é de autoria da Procuradoria-Geral da República” (O Popular, 04/08/13, p. 03). A esperança sempre se renova e nunca morre!



Domingo (11), deste mês, fiquei tomado de indignação, lendo a seguinte notícia: “Será realizado na manhã do dia 10 de setembro o primeiro júri popular do acusado de matar um morador de rua em Goiânia, que está na lista dos 33 executados desde agosto do ano passado. O também morador de rua Alessandro Marques Teresa vai responder pela morte de Jorge Coelho dos Santos, assassinado, a facadas, em 8 de dezembro do ano passado, em um depósito de reciclagens, na Vila Boa Sorte.”



Não quero defender ninguém que mata outra pessoa. Nesse caso, porém, algumas perguntas, se fazem necessárias. Faço-as não só em nome pessoal, mas também da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia.



Será que deve ser justamente um morador de rua (Alessandro) – acusado de matar outro morador de rua (Jorge) – o primeiro a ir a júri popular? Será que com isso a Justiça não quer desviar a atenção da sociedade do verdadeiro problema e fazer crer que quem mata os moradores de rua são outros moradores de rua? Será que o morador de rua que matou outro morador de rua – se é que é verdade – não foi “comprado” por alguém para fazer o serviço? Será que não existe um grupo de extermínio que, a mando dos poderosos (considerados pessoas de bem), quer “limpar” a cidade? Enfim, será que a Justiça acha que a população é idiota?



A notícia continua dizendo: “Outros 11 foram executados antes de Jorge, mas ainda não foram julgados. O PM Rogério Moreira da Silva, o Zinca, é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população, mas também não há previsão para o julgamento dele” (Ib., 11/08/13, p. 08).



Pergunto: “Por que esses 11 homicídios, que foram cometidos “antes”, não foram julgados e os assassinos não foram a júri popular?”



O próprio PM Rogério – sempre segundo a mesma notícia – é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população. Por que ele não foi ainda julgado e não foi a júri popular? Queremos justiça e não maracutaia!




Termino, lembrando que para começar a buscar uma solução à situação desumana em que vivem os moradores de rua, nossos irmãos e irmãs, é preciso implementar – com respeito e amor – uma política baseada na pedagogia libertadora, que leve esses mesmos moradores de rua a serem sujeitos (protagonistas) de sua própria história e não meros objetos da ação assistencial e/ou caritativa do Poder Público, das igrejas e das chamadas “pessoas de bem” de nossa sociedade excludente e hipócrita. A responsabilidade para que isso aconteça é de todos e todas nós.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O irmão Francisco e a JMJ

“Não deixemos entrar no nosso coração a cultura do descartável,
porque nós somos irmãos. Ninguém é descartável!”
 (Visita à Comunidade de Varginha - Manguinhos, 25/07/13)

Do dia 23 a 28 de julho deste ano, aconteceu no Rio de Janeiro, a 28ª Jornada Mundial da Juventude (JMJ). O lema da Jornada foi “Ide e fazei discípulos entre todas as nações!” (Mt 28, 19). Compareceram aos diversos atos da JMJ cerca de 3,7 milhões de pessoas, a grande maioria jovens.
Francisco, com toda simplicidade, humildade e ternura, apresentou-se como um irmão no meio dos irmãos e irmãs. Seu testemunho nos edificou e sua palavra nos questionou.
No dia 24, na Homilia no Santuário de Aparecida, Francisco afirmou: "Hoje, mais ou menos todas as pessoas, e também os nossos jovens, experimentam o fascínio de tantos ídolos que se colocam no lugar de Deus e parecem dar esperança: o dinheiro, o poder, o sucesso, o prazer". "Frequentemente uma sensação de solidão e de vazio entra no coração de muitos e conduz à busca de compensações, destes ídolos passageiros".
Pedindo que os cristãos/ãs sejam "luzeiros da esperança", continuou dizendo: "tenhamos uma posição positiva sobre a realidade". "Encorajemos a generosidade que caracteriza os jovens, acompanhando-lhes no processo de se tornarem protagonistas da construção de um mundo melhor". E ainda: "os jovens não precisam apenas de coisas, precisam sobretudo que lhes seja proposto aqueles valores imateriais que são o coração espiritual de um povo, a memória de um povo".
No dia 25, na Visita à Comunidade de Varginha, Francisco declarou: “Queria lançar um apelo a todos os que possuem mais recursos, às autoridades públicas e a todas as pessoas de boa vontade comprometidas com a justiça social: não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo e mais solidário! Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que ainda existem no mundo! Cada um, na medida das próprias possibilidades e responsabilidades, saiba dar a sua contribuição para acabar com tantas injustiças sociais! Não é a cultura do egoísmo, do individualismo, que frequentemente regula a nossa sociedade, aquela que constrói e conduz a um mundo mais habitável, mas sim a cultura da solidariedade; ver no outro não um concorrente ou um número, mas um irmão”.
Lembrou, ainda, que a Igreja é “advogada da justiça e defensora dos pobres diante das intoleráveis desigualdades sociais e econômicas, que clamam ao céu” (Documento de Aparecida, 395),
 E, dirigindo-se aos jovens, afirmou: “Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar. Procurem ser vocês os primeiros a praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas a vencê-lo. A Igreja está ao lado de vocês, trazendo-lhes o bem precioso da fé, de Jesus Cristo, que veio ‘para que todos tenham vida, e vida em abundância’ (Jo 10,10)”.
No mesmo dia 25, em sua Saudação na Acolhida aos Jovens, Francisco afirmou: “queridos jovens: se queremos que a Cruz tenha realmente sentido e plenitude, como vocês mesmos desejam e merecem, digo a cada um e a cada uma de vocês: ‘bote fé’ e a vida terá um sabor novo, terá uma bússola que indica a direção; ‘bote esperança’ e todos os seus dias serão iluminados e o seu horizonte já não será escuro, mas luminoso; ‘bote amor’ e a sua existência será como uma casa construída sobre a rocha, o seu caminho será alegre, porque encontrará muitos amigos que caminham com você. ‘Bote fé’, ‘bote esperança’, ‘bote amor!’”.
Já, no domingo dia 28, durante a Missa de Envio, falando de coração aberto, convidou os jovens a serem discípulos em missão e afirmou: "Não tenham medo de ser generosos com Cristo, de testemunhar o seu Evangelho, a sua fé". “Ide, sem medo, para servir”. "Sabem qual é o melhor instrumento para evangelizar os jovens? Outro jovem! Este é o caminho a ser percorrido por vocês!". "O Senhor procura a todos, quer que todos sintam o calor da sua misericórdia e do seu amor". "Não tenham medo! Quando vamos anunciar Cristo, Ele mesmo vai à nossa frente e nos guia. Ao enviar os seus discípulos em missão, Jesus prometeu: ‘Eu estou com vocês todos os dias’". “Jesus não nos trata como escravos, mas como homens livres, amigos, como irmãos; e não somente nos envia, mas nos acompanha, está sempre junto de nós nesta missão de amor”.
Francisco diz ainda que, para servir, é necessário cantar ao Senhor Deus um canto novo. “Qual é este canto novo? Não são palavras, nem uma melodia, mas é o canto da nossa vida, é deixar que a nossa vida se identifique com a vida de Jesus, é ter os seus sentimentos, os seus pensamentos, as suas ações. E a vida de Jesus é uma vida para os demais. É uma vida de serviço”.
No Encontro com os Voluntários da JMJ, no mesmo dia 28, o nosso irmão Francisco lembrou aos jovens: “Na cultura do provisório, do relativo, muitos pregam que o importante é ‘curtir’ o momento, que não vale a pena comprometer-se por toda a vida, fazer escolhas definitivas, ‘para sempre’, uma vez que não se sabe o que reserva o amanhã. Em vista disso eu peço que vocês sejam revolucionários, eu peço que vocês vão contra a corrente; sim, nisto peço que se rebelem: que se rebelem contra esta cultura do provisório que, no fundo, crê que vocês não são capazes de assumir responsabilidades, crê que vocês não são capazes de amar de verdade. Eu tenho confiança em vocês, jovens, e rezo por vocês. Tenham a coragem de ‘ir contra a corrente’. E tenham também a coragem de ser felizes!”.
Na diversidade das culturas, que a todos e a todas nos enriquecem, a JMJ (mesmo com suas limitações e ambiguidades) foi uma manifestação pública de fé e de comunhão universal. Mas sabemos que isso não basta. Ser discípulos/as missionários/as de Jesus de Nazaré é um jeito de viver 24 horas, dia e noite. Portanto, jovens, mãos à obra. Vão para as ruas.
No Encontro com os Jovens argentinos na Catedral, o irmão Francisco declarou: “espero uma confusão na Jornada Mundial da Juventude. Mas quero confusão e agito nas dioceses, que vocês saiam às ruas. Quero que a Igreja vá para as ruas. Quero que nos defendamos de tudo que seja acomodação e ficar fechado em torno de nós mesmos. As paróquias devem sair às ruas. Se não, acabam se transformando numa ONG. E a Igreja não pode ser uma ONG”.
Falando dos jovens, na Entrevista exclusiva da GloboNews, exibida no O Fantástico dia 28, Francisco afirmou:  “um jovem que não protesta não me agrada. Porque o jovem tem a ilusão da utopia e a utopia não é sempre ruim. A utopia é respirar e olhar adiante. O jovem é mais espontâneo, não tem tanta experiência de vida, é verdade. Mas às vezes a experiência nos freia. E ele tem mais energia para defender suas ideias. O jovem é essencialmente um inconformista. E isso é muito lindo! É preciso ouvir os jovens, dar-lhes lugares para se expressar, e cuidar para que não sejam manipulados”.
Irmão Francisco, sua palavra e, sobretudo, seu testemunho é um sinal de muita esperança para os jovens e para todos/as nós, discípulos/as missionários/as de Jesus de Nazaré. Obrigado por ter, com toda simplicidade, assinado “Francisco” na sua primeira Encíclica “Lumen Fidei” (A Luz da Fé), sem títulos honoríficos e pomposos. É um gesto muito revelador.
Embora, Francisco, sua pessoa nos edifique a todos e a todas, muitos/as de nós, motivados pelo Evangelho, temos um sonho: desejamos ardentemente que as estruturas centrais da Igreja mudem, para que o bispo da Igreja de Roma - que, como o irmão sempre fala, preside na caridade (não, na lei) todas as Igrejas - não seja mais chefe de Estado (rei ou monarca absoluto), mas somente pastor. Jesus não fundou nenhum Estado e quando o povo queria proclamá-lo rei, ele dava um jeito de se esconder. O Vaticano podia deixar de ser Estado e ser entregue à UNESCO, para que cuide do seu patrimônio cultural.
Para que o nosso irmão Francisco e seus sucessores - que esperamos sejam eleitos um dia com uma maior representatividade da Igreja de Roma e de todas as Igrejas - possam cumprir sua missão, precisam ter, como qualquer bispo, a liberdade de viajar quando quiserem e para onde quiserem, de acordo com a necessidade pastoral, sem o aparato externo reservado aos chefes de Estado. Para que sejamos uma Igreja realmente evangélica, precisamos de mudanças profundas e radicais. Que o Espírito Santo nos ilumine!
“Um sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade” (Raul Seixas).

Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 08 de agosto de 2013

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O “auxílio viagem” em aviões da FAB

 
O descaramento na vida pública é tanto que - além do “auxílio-moradia”, “auxílio-alimentação”, “auxílio-paletó”, “auxílio-doença”, auxílio-não sei mais o quê, para os juízes e políticos - temos também um outro auxílio, o “auxílio-viagem” em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), para a cúpula do Congresso Nacional e para os ministros. Que vergonha!
  A cúpula do Congresso Nacional fez 91 viagens nos primeiros seis meses deste ano com aviões da FAB, uma média de um voo a cada dois dias.
  O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), solicitou 27 voos desde que assumiu, em fevereiro, até junho. Além de Alagoas, seu reduto político, foi ao Rio, São Paulo, Ceará e Bahia. O antecessor de Renan, José Sarney (PMDB-AP), voou 18 vezes no mesmo período de 2012.
  A Presidência da Câmara solicitou 61 vôos até junho - 47 pedidos pelo presidente, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que teve Natal como um dos principais destinos. Nove pedidos partiram do deputado André Vargas (PT-PR), que substituiu Alves em ao menos três ocasiões. As outras cinco viagens foram feitas em janeiro pelo então presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), que voou 67 vezes de fevereiro a junho do ano passado” (cf. Folha de S. Paulo, 15/07/13, p. A5)
  O ministro da Previdência, Garibaldi Alves Filho usou um avião da FAB para voar de Fortaleza ao Rio, onde assistiu à final da Copa das Confederações (cf. Ib., 12/07/13, p. A8).
  O ministro do Esporte, Aldo Rebelo usou um avião da FAB para ir a Cuba no Carnaval com a mulher, o filho e assessores. Esteve em Havana em missão oficial e justificou a carona à mulher e ao filho, dizendo que ambos também foram convidados pelo governo cubano (cf. Ib., 24/07/13, p. A10).
  Alguns, dos que usaram os aviões da FAB, por causa da divulgação de suas viagens na mídia e das manifestações de protesto do povo nas ruas, devolveram aos cofres públicos ao menos parte do dinheiro gasto. Infelizmente, para muitos de nossos políticos e governantes o que importa não é ser éticos, mas parecer éticos e não perder a popularidade.
  Pela lei em vigor (decreto presidencial 4244/02), as autoridades podem requisitar aviões da FAB - que eu chamo de “auxílio-viagem” - por “motivo de segurança e emergência médica, em viagem a serviço e deslocamento para o local de residência permanente”.
  Essa lei é totalmente injusta. Precisa ser mudada. Trata-se de uma mordomia inconcebível e desnecessária, que é uma afronta aos trabalhadores. Eticamente falando (e não só legalmente falando) a requisição de aviões da FAB só se justifica em situações muito especiais, como, por exemplo, em caso de calamidade pública, onde é exigida, em caráter de urgência, a presença de uma determinada autoridade federal e não há, em tempo hábil, um meio de transporte ordinário. Em outros casos, as viagens podem até ser legais, mas são certamente antiéticas...
  Pior ainda é quando o presidente do Senado, o presidente da Câmara Federal e os ministros desrespeitam de forma acintosa a própria lei, abusando de sua autoridade. Esquecem-se que devem estar a serviço do povo e não de sua autopromoção e de seus interesses pessoais ou familiares, usando o dinheiro público. É uma verdadeira falcatrua, que denota uma grande irresponsabilidade política.
  Por que será que as autoridades federais, habitualmente e em situações de normalidade, não podem pagar suas viagens com o próprio salário, como fazem todos os trabalhadores? A questão da segurança é uma desculpa. Quem cuida da segurança dos trabalhadores? Não dizem que temos um governo dos trabalhadores? Que mentira!
  Paulo VI, em 1971, dizia: “a política é a forma mais sublime de praticar a caridade” (o amor) e “uma maneira exigente de viver o compromisso cristão, ao serviço dos outros” (Encíclica Octogesima Adveniens).   Nestes dias, Francisco retomou o mesmo ensinamento, afirmando: “a política é uma das formas mais elevadas da caridade (do amor), visto que procura o bem comum”. Como estamos longe desse ideal!
  “Virá um dia em que todos, ao levantar a vista, veremos nesta terra reinar a liberdade”
  “Louvemos nosso Pai, Deus da libertação, que acaba com a injustiça, miséria e opressão. Louvemos os irmãos que lutam com valia, fermentando a história, virá o grande dia” (Canto). Essa é a nossa esperança!

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

A morte de Darlan clama por justiça

Acompanhem a peregrinação e a morte no SUS de Darlan Teixeira Santos, 30 anos, servente de pedreiro. É uma verdadeira tragédia! É uma história de arrepiar!
No dia 3 deste mês de julho, Darlan foi vítima de acidente de moto no Setor Madre Germana. É encaminhado ao Hospital de Urgência de Goiânia (HUGO), onde é constatado traumatismo craniano clínico, que não precisaria de cirurgia.
No dia 8, Darlan é transferido do HUGO para o Hospital S. Domingos, onde é acompanhado por dois neurologistas.
No dia 11, recebe alta e volta para casa, em Goiânia, reclamando de dores de cabeça.
No dia 13, procura o CAIS da Chácara do Governador e de lá é encaminhado ao HUGO. Depois é transferido para o Hospital Cidade Jardim e, no dia 15, recebe alta, voltando para casa.
No dia 17, volta a sentir dores de cabeça e, mais uma vez, vai ao CAIS da Chácara do Governador, onde precisou de reanimação. É novamente levado para o HUGO e volta para o CAIS.
No dia 18, de madrugada, Darlan morre, após sofrer oito paradas cardíacas (cf. O Popular, 19/07/13, p. 4).
Reparem! Não dá para acreditar! Em sua maratona por atendimento, Darlan percorreu 10 Unidades de Saúde. Quanto descaso! Quanta judiação! Quanta irresponsabilidade! Como escrevi em outro artigo, é realmente “um SUS que mata os pobres”!
Pergunto: se Darlan fosse filho do governador, do prefeito ou de algum outro político, será que estaria morto? Certamente não. A morte de Darlan é um crime do Poder Público, que clama por justiça. Quem vai responder judicialmente por ele?
Diante da gravidade do acontecido, faço um apelo para que algum advogado de Goiânia - sensibilizado pelo caso de Darlan - se disponha, voluntária e gratuitamente, a processar a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Provavelmente, se isso acontecer, ninguém será condenado. Infelizmente, as nossas leis não estão do lado dos pobres, mas dos poderosos. Em todo caso, processar a SMS servirá para manifestar publicamente a indignação e o protesto da sociedade organizada, e, quem sabe, para conseguir, ao menos, uma indenização para a família de Darlan.
A morte dele - como afirma a irmã Gersilene - foi provocada per negligência das Unidades de Saúde, por falta de assistência adequada e vaga na UTI. Não adianta os responsáveis pela SMS e pelas Unidades de Saúde inventarem desculpas. Ninguém é bobo.
O caso de Darlan, que nos abalou a todos e a todas, tornou-se emblemático, mas existem muitos outros casos parecidos com esse. Apesar das manifestações do povo na rua, a situação da Saúde Pública continua uma calamidade. Em Goiânia, estes últimos dias foram uma sucessão de graves problemas no atendimento à população. Que desrespeito! Até quando, meu Deus!

Sem nunca perder a esperança que uma outra sociedade é possível, lutemos para que o Poder Público - Municipal, Estadual e Federal - tome consciência que a saúde, por ser um direito fundamental de toda pessoa humana, deve ser tratada como prioridade absoluta. A vida em primeiro lugar!