Lendo a
matéria “Além de terceirizar escolas, Marconi quer ampliar colégios militares”
(O Popular, 24/06/15, p. 2), fiquei abismado. Pergunto: qual é a visão que o
governador tem de educação pública? Realmente, não dá para entender?
“O
governador Marconi Perillo (PSDB) - diz o Jornal - confirma que pretende
iniciar a terceirização da gestão das escolas públicas estaduais a partir de
agosto, assim que o Estado definir qual é o modelo a ser implantado, se
Parceria Público-Privada (PPP) ou Organização Social (OS)”.
Com total
despudor, ele afirma: “não vou abrir mão do foco de promover mudanças e
melhorias na educação pública. Devemos publicar em agosto o primeiro chamamento
público para o setor privado participar da gestão, inicialmente pelas escolas
de Águas Lindas”.
Segundo o
Popular, a respeito da terceirização, há uma divergência entre a fala do
governador Marconi Perillo e a da secretária da Educação Raquel Teixeira. Enquanto
o primeiro diz que irá iniciar a terceirização das escolas estaduais, assim que
o Estado definir o modelo a ser implantado (PPP ou OS), a segunda (que - por
ser professora universitária - parecia entender algo de educação, mas que na
realidade está decepcionando a todos/as) afirma que o modelo de terceirização
das escolas estaduais será via Parceria Publico-Privada (PPP). Embora - para
quem defende uma educação pública de qualidade - isso seja secundário,
pergunto: o modelo que o governo pretende implantar ainda vai ser definido ou
já está definido?
O Jornal
acrescenta: “entretanto, o governo já estuda alternativa para regiões ou cidades
onde houver dificuldades para a terceirização: ampliar os colégios militares”.
Educadores
e educadoras, pasmem! Marconi Perillo afirma: que aumentar o número de colégios
militares “é uma demanda da maioria da população goiana. Várias cidades nos
pedem mais colégios militares que, é bom frisar, tiveram as melhores notas no
último IDEB, por conta da disciplina e da hierarquia, além da qualidade de
ensino”.
Uma das
duas: ou o governador não entende nada de educação pública, ou usa de má fé. Que
disciplina e hierarquia é essa que o governador defende? Tem-se a impressão que
ele estudou numa escola da época da ditadura ou da época do fascismo, nas quais
predominava o pensamento único e quem ousasse pensar de maneira diferente era
preso como subversivo.
Reparem!
Sempre segundo o Popular, “existem 19 colégios militares em Goiás e a
Assembleia aprovou neste ano projetos para a criação de mais 24 unidades”. Que
absurdo! Para Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filosofia Política da
USP e atual ministro da Educação, a militarização das escolas públicas indica a
falência do sistema de ensino brasileiro. “Em um período fundamental de
formação, ao invés de educar, você adestra e disciplina. O que o governo de
Goiás está fazendo é renunciar à formação dos sujeitos”.
Segundo
Rafael Custódio, advogado e coordenador do Programa de Justiça da ONG Conectas
Direitos Humanos, “escolas militarizadas podem deixar pouquíssimos espaços de
discussão, de divergência e até de tolerância para que seus alunos possam se
manifestar como bem entenderem. Acho que devemos nos perguntar se queremos
escolas que criem cidadãos de fato, não apenas cumpridores de ordens” (http://portal.aprendiz.uol.com.br/arquivo/2014/02/26/educacao-sitiada-escolas-a-servico-da-militarizacao-das-cidades/).
Para onde a
educação pública está andando? Por que será que o governador Marconi Perillo quer
militarizar as escolas? Será que ele pretende militarizar também a sociedade como
um todo e transformá-la num grande batalhão de militares?
Diante
dessa visão de educação pública (que é muito preocupante) e da situação em que
ela se encontra atualmente, torna-se necessário fazer alguns questionamentos
críticos.
1. A educação
pública - segundo a Constituição Federal - é direito de todos/as e dever do
Estado. Por que o Governo não assume com responsabilidade a sua obrigação e não
contrata, por concurso público, educadores/as preparados, capacitados e
competentes para a cogestão (ou seja, a gestão democrática, com a participação
de todos/as) das escolas públicas? Por que o Governo lava as mãos, se omite e
quer terceirizar a educação pública? Terceirizar não é uma forma disfarçada e
camuflada de privatizar? Não é usar o dinheiro público para enriquecer empresas
privadas (que se escondem atrás de nomes bonitos como OS ou PPP) e tirar
benefícios adquiridos dos trabalhadores/as em educação? Terceirizar a educação não
é pois, a confirmação da incapacidade do governo de gerir os serviços públicos
essenciais?
2. A função
dos militares (é com respeito que falo isso) não é cuidar da escola pública. Multiplicar
os colégios militares, ou seja, militarizar as escolas não é um grave desvirtuamento
da função dos militares e da própria educação pública? De que disciplina e
hierarquia o governador fala? Será que ele está auspiciando a volta da ditadura
civil e militar? Ter as melhores notas “por conta da disciplina e da hierarquia”
não é sempre sinal de educação de qualidade. Que sociedade queremos? Uma
sociedade militarizada, autoritária e ditatorial?
3. Ao
contrário, educar é suscitar (ou despertar) no educando/a todas suas
possibilidades de realização humana. É um processo de dentro para fora e não de
fora para dentro. O educador/a tem o papel de desencadear esse processo e ser o
orientador-mediador entre o conhecimento e o educando/a. Em todo o processo, porém,
o educando/a é sempre sujeito de sua própria educação e não objeto. De alguma
forma, todos/as somos, ao mesmo tempo, educadores/as e educandos/as. Ninguém
educa ninguém, ninguém se educa sozinho. Os seres humanos se educam entre si
(em comunhão). Portanto, senhor governador, educar não é domesticar, adestrar, subjugar,
dominar e enquadrar o educando/a (educação domesticadora). Educar não é
depositar conhecimentos na cabeça do educando/a, como se fosse um caixa de
banco (educação bancária).
4. Quem sabe, um
pouco de estudo da pedagogia do grande filósofo da educação brasileiro, Paulo
Freire, não ajudaria o governador Marconi Perillo e outros governantes a ter
uma outra visão de educação pública e a mudar de atitude? Por que será que esse
grande pensador - que defende uma educação libertadora - é muito valorizado em outros
países e quase totalmente desconhecido no Brasil? Não é esse um sinal evidente
de uma sociedade autoritária e opressora?
5. Enfim, faço
um apelo: educadores e educadoras, lutem - de modo organizado e com firmeza - contra
essa iniciativa do governador Marconi Perillo de terceirizar ou militarizar a
educação pública. Ela é uma iniciativa que se apresenta como moderna, mas que na
realidade é retrógrada, conservadora, reacionária e pretende acabar com a educação
publica!
Diga não à
”terceirização” ou à “militarização” da educação pública!
Diga sim à
educação pública de qualidade para todos e para todas, sem enganação!
Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP)
e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de
Filosofia da UFG
Goiânia, 08 de julho de 2015
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