Fala-se muito de propaganda enganosa, que viola os
direitos dos cidadãos/ãs, enquanto consumidores. Neste artigo, pretendo fazer
algumas reflexões sobre a política econômica enganosa, que - a meu ver - viola
os direitos dos cidadãos/ãs, enquanto cidadãos/ãs, e é uma política econômica
ambígua, contraditória e hipócrita. Essa política econômica é praticada pela
maioria dos nossos governantes e políticos. Graças a Deus, há exceções, que
abrem caminhos novos para uma "outra política econômica possível".
De
um lado, os nossos governantes e políticos - sobretudo nas cerimônias de posse
- choram, fazem declarações de amor aos pobres, prometendo que irão acabar com
a fome, que irão enfrentar o grave problema social das drogas e da violência,
que irão cuidar da saúde, da educação, da segurança etc. Além desse palavrório
todo, os nossos governantes e políticos promovem - com as migalhas que sobram
da mesa dos ricos - programas chamados de distribuição de renda. Na realidade, estes programas, embora sirvam
para amenizar situações de extrema pobreza (que é o seu aspecto positivo), não
distribuem a renda, mas simplesmente restituem ao povo uma pequena e
insignificante parcela daquilo que é roubado (roubo legalizado) dos pobres na
exploração da mão-de-obra e nos impostos sobre os produtos de primeira
necessidade. Trata-se de uma quantia de dinheiro muito maior da investida nos
programas, que servem também para enganar os pobres, e para manter a
"popularidade" (ou, melhor dizendo, o "populismo") dos
governantes e dos políticos.
Nos
discursos de posse no Congresso e no Palácio do Planalto, a nova presidenta
Dilma se emocionou e chorou diversas vezes. Com palavras bonitas e promessas
genéricas, que não assustam e não ofendem o deus-mercado, ela afirmou: "A
luta mais obstinada do meu governo será pela erradicação da pobreza extrema e a
criação de oportunidade para todos". Disse ainda: "Junto com a
erradicação da miséria, será prioridade do meu governo a luta pela qualidade da
educação, da saúde e da segurança". Declarou enfim: "Considero uma
missão sagrada do Brasil a de mostrar ao mundo que é possível um país crescer
aceleradamente, sem destruir o meio ambiente" (Discurso de posse no
Congresso, 01/01/11). A presidenta Dilma sabe muito bem que todas essas
façanhas não vão acontecer, porque não "cabem" na lógica do sistema
capitalista neoliberal e de seus aliados.
Até o
Gilberto Carvalho, vendo Lula descer a rampa do Palácio do Planalto, disse:
"estou ficando velho e ficando chorão" (Entrevista. Folha de S.
Paulo, 03/01/11). Quanta representação teatral e quanta encenação!
De outro
lado, os nossos governantes e políticos praticam uma política econômica
enganosa, que faz de tudo para preservar, defender e fortalecer os interesses
do sistema econômico capitalista neoliberal, que é um
“sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida – DA, 385) ou – como afirma
Paulo VI – um “sistema nefasto”, porque considera “o lucro como o motivo
essencial do progresso econômico, a concorrência como lei suprema da economia,
a propriedade privada dos bens de produção como um direito absoluto, sem
limites nem obrigações correspondentes” (Populorum Progressio - PP, 26).
O sistema
econômico capitalista neoliberal aprofunda a desigualdade social, oprime,
marginaliza, exclui e assassina os pobres como material descartável. O
importante não é a vida do povo, mas o deus-mercado e os interesses dos seus
servidores e adoradores.
Em junho
de 2003, um grupo de mais de 300 economistas assinou um "Manifesto",
"no qual advertia para o agravamento da crise social em face do
aprofundamento, pelo governo Lula, da política macroeconômica herdada do
Governo anterior", mostrando a necessidade de "uma política econômica
voltada para um projeto nacional de desenvolvimento, com prioridade para a
geração de empregos e a redução das desigualdades sociais". Diziam ainda os economistas: "É nossa
convicção que, a despeito do aprofundamento da crise social, não há sinais de
reversão da atual política econômica. Ao contrário, o governo tem reafirmado
que não quer mudar. Portanto, é nosso dever de cidadania insistir na denúncia
de que esta política econômica não atende aos interesses da maioria e que
aumentará cada vez mais os problemas sociais".
O
economista Paulo Passarinho fala dos "impasses do modelo econômico sob
Lula" e defende "a necessidade de superarmos o atual modelo
econômico, em curso no país desde o início dos anos 90" (Correio da
Cidadania, 12/03/10). O mesmo economista afirma também que "sem mudança do
modelo econômico, promessa de erradicação da miséria é um engodo" (Ib.,
05/11/10).
Numa
entrevista, que traz o título "Brasil de Lula: a naturalização da
desigualdade", publicada no Correio da Cidadania, o economista Nildo
Ouriques à pergunta: "qual o seu balanço dos oito anos do governo
Lula?", responde: "Uma refuncionalização do chamado neoliberalismo.
Aplicou a consolidação do PT como partido de centro-direita, que detinha a
legitimidade para falar sobre os pobres e, portanto, aplicar políticas de
sensibilidade social. Mas no sentido de colocar os pobres em políticas
caritativas, o que é o Bolsa Família basicamente, apesar de sua importância.
Este é o ponto fundamental. Não emancipa amplos setores dos trabalhadores,
atende à questão social, diferenciando-se da direita clássica, mas sem
emancipar politicamente. Controle eleitoral e alienação política". Nildo
Ouriques diz ainda que o Brasil "aceita o papel de potência regional
dentro da política externa estadudinense, o que implica maiores graus de
autonomia em relação à diplomacia do FHC,
impulsionando uma política sub-imperialista do Brasil, que de fato tenta
praticá-la" (22/12/10).
Pelos
pronunciamentos da nova equipe do governo Dilma, tudo indica que, na política
econômica, não haverá nenhuma mudança essencial, a não ser pequenos ajustes.
Como exemplos concretos da insensibilidade (apesar da emoção e do choro no dia
da posse) dos nossos governantes e políticos - fiéis servidores e adoradores do
deus-mercado - diante das reais
necessidades do povo, basta lembrar alguns fatos:
1.
A maneira, fria e calculista (submissa aos
interesses do capital financeiro), como o governo fala da questão do salário
mínimo.
2.
A maneira, oportunista e desonesta, como o
"PMDB usa o salário mínimo para pressionar por cargos" (e não para
atender às necessidades básicas do povo).
3.
A maneira, autossuficiente e arrogante, como o
ministro da Fazenda, Guido Mantega, fala do bloqueio de recursos do orçamento,
que este ano poderá chegar a R$ 40 bilhões, dizendo (sempre totalmente submisso
aos interesses do capital financeiro) que "o freio nas despesas públicas é
a aposta do governo para convencer o mercado financeiro da disposição de
controlar as contas públicas, depois de um ano pautado por elevação dos
gastos" (e eu acrescento: não certamente por amor ao povo sofrido, mas
para fins eleitoreiros) (Folha de S. Paulo, 05!01/11, p. A4 e A5).
4.
A farsa do aumento salarial dos parlamentares e
dos governantes. Sobre isso, veja o meu artigo: "O aumento salarial dos
parlamentares: uma bandalheira que não pode ser esquecida", publicado no
Diário da Manhã (29/12/10, p. 18).
5.
Por fim (pasmem!), não podemos deixar de lembrar a
última barganha pública dos nossos parlamentares, que revela a total falta de
vergonha e dignidade e é um pontapé na cara do povo: o mandato tampão nas
férias da Câmara. "45 suplentes ficarão no cargo por um mês ao custo de R$
5 milhões". Cada um, pelo período de primeiro a 31 de janeiro/11 (em
plenas férias legislativas), receberá - entre salário e outros benefícios - o
total de R$ 107 mil. Entre os que assumirão o posto, "estão quatro
políticos (Edir Pedro de Oliveira - RS, Celcita Pinheiro - MT, Íris Simões - PR
e Romeu Queiroz - MG), que são réus na justiça sob a acusação de integrar o
escândalo do mensalão ou a máfia dos sanguessugas". Os suplentes
"estão sendo convocados devido à renúncia ou afastamento de 45 titulares -
a maioria deixou a Câmara em 31 de dezembro para assumir secretarias nos novos
governos estaduais" (Folha de S. Paulo, 05/01/11, p. A7). Eles deverão
concluir o mandato dos que se afastaram. Que falcatrua bem montada! Graças a
Deus, o nosso povo não é bobo! E o freio nas despesas públicas, senhor
ministro, Guido Mantega? Será que vale só para as políticas públicas em
benefício dos pobres? Realmente não dá para entender como aconteça tudo isso em
pleno século XXI!
Precisamos
abrir caminhos novos, que façam acontecer as condições objetivas, para que o
modelo econômico capitalista neoliberal, injusto e desumano, seja superado. (e
não consolidado, como acontece hoje, em nome da chamada governabilidade). Em
nossa sociedade já existem muitos sinais de uma "outra política econômica
possível". Vale a pena lutar por ela!
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia,
12/01/11, p. 18
Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia
Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na
Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão
Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
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