sábado, 5 de novembro de 2011

Um descaso inadmissível e injustificável

Parece pesadelo! Vejam só que situação deprimente! “Falta até água e luvas no Hugo (manchete). No maior hospital de urgências do Centro-Oeste, os médicos sofrem com falta de luvas cirúrgicas, fios para sutura e até água para lavar as mãos. E a lista de problema do Hugo é maior, conforme admite o governo, que culpa a burocracia. Pior para os pacientes”.
            Nas fotos da reportagem - imagens captadas por celular de médico - aparecem: corredor lotado com pacientes, 4 elevadores quebrados, aparelho de ar condicionado queimado usado como ninho por uma coruja, sala de internação lotada, pia com só uma torneira funcionando, sujeira e falta de material de limpeza. Médico afirma “que problemas podem comprometer resultado das cirurgias” (O Popular, 28/10/11, 1ª página).
            Toda essa situação de descalabro foi denunciada várias vezes. “Denúncias por parte de médicos do Hospital de Urgência de Goiânia (Hugo) são frequentes e se repetem há quase duas décadas. Há 14 anos, o neurocirurgião Paulo Roberto Taveira chegou a abandonar um plantão para se dirigir à polícia, onde deu queixa contra a instituição hospitalar por omissão de socorro. Ele tinha o intuito de se resguardar, uma vez que os pacientes vinham morrendo pela falta de condições de atendimento”. Entra governo, sai governo e a situação continua a mesma ou pior.
Realmente, não dá para acreditar! Trata-se de um descaso do Poder Público inadmissível e injustificável! Quem vai responder judicialmente por essa situação criminosa e pelas mortes acontecidas ou que poderão acontecer em consequência dessa mesma situação?
Se os nossos governantes fossem obrigados a levar seus filhos e familiares doentes para serem atendidos e tratados no Hugo, tenho certeza que encontrariam imediatamente uma saída legal para resolver a situação. Infelizmente, os pobres - em nosso sistema capitalista neoliberal - não têm valor nenhum. São material descartável.
            É inadmissível que em pleno século XXI sejamos obrigados a assistir a um espetáculo tão degradante, tão cruel e tão desumano, que grita por justiça diante de Deus. A situação do Hugo - além de ser inadmissível - é também injustificável. Não adianta inventar desculpas, como o entrave da burocracia. O povo não é bobo! Quantas vezes o governo dispensou a licitação pública, em casos considerados (mesmo que às vezes não fossem) de urgência e emergência. Será que existe algo mais urgente e mais emergencial que a saúde pública e a vida dos pobres? 
            O entrave da burocracia não está sendo usado como argumento para, de forma sutil, justificar a terceirização (leia-se: privatização) da Saúde Pública?  “Na avaliação da Secretaria Estadual de Saúde (SES), a burocracia é o grande entrave para a boa administração de Unidades Públicas como o Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo). De acordo com a superintendente de Gerenciamento das Unidades Assistenciais de Saúde da SES, Lázara Maria Mundim, há processos - para manutenção e aquisição de material - que chegam a demorar até 530 dias para serem concluídos”. Que absurdo! Que irresponsabilidade! Mais uma vez, não dá para acreditar!
Segundo o secretário estadual da saúde, Antônio Faleiros “a solução para a série de problemas enfrentados pelas Unidades Públicas de Saúde (Hospital Geral de Goiânia - HGG, Materno Infantil, Hospital de Doenças Tropicais - HDT, Hospital de Urgências de Goiânia - Hugo e Hospital de Urgências de Aparecida de Goiânia - Huapa) está no repasse da administração às Organizações Sociais (OS)”. Diz ele: “Não há dúvidas de que, com a administração por meio de OS, a solução e a resposta serão imediatas” (Ib., p. 5). Senhor secretário, será que é realmente esta a solução? Não seria melhor que o Poder Público cumprisse a Constituição Federal, que reza: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (Art. 196).
            É só uma questão de vontade política e de priorizar aquilo que realmente é prioritário: a vida, sobretudo, dos empobrecidos, oprimidos e excluídos do nosso “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida - DA, 385). Precisamos urgentemente de uma Saúde Pública de qualidade para todos/as e não de “terceirizar” ou “privatizar” a Saúde Pública, enriquecendo, com o dinheiro do povo, empresas particulares, que dizem ser Organizações Sociais (OS) e nem sempre (ou quase nunca) são aquilo que dizem ser. Está na hora de o Poder Público assumir sua responsabilidade em relação à Saúde e não de “lavar as mãos”   
                     Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 04/11/11, p. 7

Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
                                                                                                                                                                    E-mail: mpsassatelli@uol.com.br        

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