quinta-feira, 10 de maio de 2018

Laura Cibelly: vítima da “pena de morte” na Saúde


Companheiros e companheiras de caminhada, que participam ativamente do Conselho Municipal de Saúde e dos Conselhos Locais de Saúde de Goiânia afirmam que a atual Secretária Municipal de Saúde, Fátima Mrué, está empenhada num trabalho sério que visa melhorar o SUS de Goiânia, defendendo a autonomia da Secretaria e não aceitando interferências políticas interesseiras. Pela confiabilidade das pessoas que dão o testemunho, acredito que seja verdade e - nesse trabalho - a Secretária, com sua equipe, merece todo nosso apoio.
É, porém, absolutamente necessário fazer - sem mais demora - a distinção entre a busca de melhoramento do SUS (que deve ser permanente) como sistema de atendimento diário à saúde da população - e os casos de emergência e urgência. Nesses casos, todas as discussões devem ser deixadas para depois e - tendo em mãos o parecer médico, dizendo que se trata de um caso de urgência urgentíssima - a única coisa que o Poder Público precisa fazer é atender imediatamente, mesmo que seja em hospitais privados e a pagamento.
A Secretaria Municipal de Saúde deve ter - em seu orçamento - uma verba reservada para esses casos. As obras podem esperar, mas a vida não espera. A salvação de uma vida em situação de emergência e urgência deve estar sempre em primeiro lugar. Não dá mais para tolerar - sem profunda indignação - a frieza com que se aceita a morte de tantas vítimas inocentes, inclusive crianças, come se fosse uma coisa normal.
Nos casos de emergência e urgência, a falta de atendimento ou a demora no atendimento é crime de omissão de socorro que, na prática (mesmo que não seja na teoria), legaliza e institucionaliza a “pena de morte”. O Poder Público - do ponto de vista não somente ético, mas também jurídico - é responsável por essa omissão e deve ser processado, julgado, condenado e obrigado a pagar uma indenização à família das vítimas.
Todos sabemos que as vítimas inocentes da “pena de morte” na Saúde, legalizada e institucionalizada, são sempre pessoas pobres, sobretudo crianças e idosos/as, Para os ricos nunca faltam vagas na UTI dos hospitais. Nunca se ouviu falar que um rico morreu por falta de vaga em UTI.
Um dos últimos casos, amplamente noticiado, é o de Laura Cibelly, que nasceu em 23 de abril último, na Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, no Setor Vila Nova.
“Bebê morre após luta por UTI”. “A menina Laura Cibelly sofria de uma cardiopatia e precisava com urgência de um leito especializado. Vaga foi disponibilizada após ação da Defensoria Pública, mas ela não resistiu” (O Popular, 30/04/18, p. 15 - Manchete: título e subtítulo).
Laura peregrinou por vários hospitais de Goiânia e - mesmo diante do parecer dos médicos que “apontavam para a necessidade urgente de que ela fosse levada para uma UTI cardíaca, pois seu estado era gravíssimo” - só no dia 28 (em resposta a uma requisição feita no dia anterior), a família conseguiu uma liminar na Defensoria Pública “para que os bens da Prefeitura fossem bloqueados a fim de garantir que a cirurgia fosse realizada na rede privada, já que não havia profissionais aptos na rede pública”. No dia 29, “Laura conseguiu um leito no Instituto Goiano de Pediatria (Igope), no Parque Amazônia, onde faleceu” (Ib.). Infelizmente, era tarde demais!
Com muita dor no coração, pergunto: Precisava de tudo isso!? Não é cruel demais!? Não é uma injustiça que clama diante de Deus!? Não é uma vergonha para Goiânia!? Todos e todas sabemos que, se Laura fosse filha de ricos, estaria viva.
Manifesto a minha total solidariedade aos pais e familiares de Laura. Que Deus dê muita força para vocês, que sintam sempre a presença de Laura na vida de vocês e que ela - feliz na casa do Pai - interceda por vocês e por todos/as nós.
Termino fazendo um apelo aos advogados da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap) de Goiás e do Brasil: de maneira organizada e como trabalho de voluntariado, coloquem-se à disposição dos parentes de Laura (e de outras pessoas que também perderam a vida pelo mesmo motivo) para processar o Poder Público pelo crime de omissão de socorro, exigindo uma indenização para a família das vítimas. Não vai trazer a Laura (e as outras pessoas) de volta, mas é o mínimo que pode ser feito. Quem sabe, com isso, o Poder Público tome consciência de suas responsabilidades!
Lutemos por um outro mundo possível e por um Projeto Social (sócio-econômico-político-ecológico-cultural) Popular, no qual todos os direitos e os direitos de todos/as sejam respeitados.

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 O Poder Público deve ser processado, julgado e condenado


Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 09 de maio de 2018


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