Em outubro de 2021, o Papa
Francisco deu início a um novo Sínodo (sýnodos: caminhar juntos) com o tema:
"Por uma Igreja Sinodal: comunhão,
participação e missão". Trata-se de um caminho sinodal de três anos, articulado em três fases: diocesana, continental, universal.
- Fase diocesana: outubro de 2021 a abril de 2022;
- Fase continental: setembro de 2022 a março de 2023;
- Fase universal: outubro de 2023.
Terminada
a fase continental, a Secretaria Geral do Sínodo - recolhendo tudo o que foi
refletido nas bases - enviará um segundo Documento de Trabalho aos
participantes da Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que será
realizado em Roma, segundo os procedimentos da Constituição Apostólica
“Episcopalis Communio” (terceira e última fase).
O itinerário
do caminho sinodal - afirma o papa Francisco - “foi concebido como um dinamismo de escuta recíproca (gostaria
de frisar: um dinamismo de escuta recíproca), conduzido em todos os níveis da
Igreja e que diz respeito a todo o Povo de Deus”. Os bispos, os padres, os
religiosos, as religiosas e todos os cristãos e cristãs “devem ouvir-se” e,
depois, “ouvir-se uns aos outros”. “Quem tiver ouvidos, ouça o que o Espírito
diz às Igrejas” (Ap. 2,7).
“O
Sínodo é até o limite. Inclui a todos e todas: os pobres, os mendigos, os
jovens toxicodependentes, todos esses que a sociedade descarta, fazem parte do
Sínodo”. “O cristianismo deve ser sempre humano, humanizante, reconciliar
diferenças e distâncias, transformando-as em familiaridade, em proximidade”.
“Em tempo de pandemia, o Senhor impulsiona a missão de uma Igreja que seja sacramento
de cuidado”. “Um dos males da Igreja, aliás uma perversão, é esse
clericalismo que separa o padre, o bispo das pessoas”.
“O tema da sinodalidade não é o
capítulo de um tratado sobre eclesiologia, e muito menos uma moda, um slogan ou
um novo termo a ser usado ou instrumentalizado nos nossos encontros. Não! A sinodalidade
expressa a natureza da Igreja, a sua forma, o seu estilo, a sua missão”.
Assim falamos de Igreja
sinodal, “seguindo o que podemos considerar o primeiro e mais
importante ‘manual’ de eclesiologia, que é o livro dos Atos dos Apóstolos”.
No
caminho sinodal, “a fase diocesana é muito importante, porque realiza a escuta
de todos os batizados e batizadas”. Precisamos “superar a imagem de uma Igreja dividida
entre líderes e subordinados, entre os que ensinam e os que têm de aprender,
esquecendo que Deus gosta de inverter as posições: ‘derrubou os poderosos dos seus
tronos e elevou os humildes’ (Lc
1, 52)”.
Caminhar
juntos “evidencia mais a horizontalidade do que a verticalidade”.
Nós pastores “caminhamos com o povo, às vezes à frente, outras no meio e
outras atrás. O bom pastor deve caminhar na frente para guiar, no meio para
encorajar e não esquecer o cheiro do rebanho, atrás porque também o povo
tem ‘faro’. Tem olfato para encontrar novas vias para o caminho, ou para
encontrar novamente a vereda perdida”.
Como
cristãos e cristãs, “o senso da fé (sensus fidei) nos qualifica na missão profética de Jesus
Cristo, para que possamos discernir quais são os caminhos do Evangelho hoje” (cf. Concílio
E. Vaticano II. A Igreja - LG, 34-35).
Fala-se
que o Sínodo é “o maior processo de consulta democrática da história da
Igreja Católica” (acrescento: a partir da Igreja imperial). Nas Comunidades da
Igreja primitiva, todos e todas viviam como irmãos e irmãs. Tudo era comum e decidido
em comum.
É
realmente louvável e merece total apoio o esforço do nosso irmão o papa
Francisco para que toda a Igreja viva a sinodalidade, o caminhar juntos.
Ora, na vivência da sinodalidade temos - penso eu - quatro
momentos. Neste Sínodo estamos vivendo os primeiros dois momentos:
- 1º
momento: a vivência da sinodalidade nas
reflexões dos Encontros diocesanos e continentais;
- 2º
momento: a vivência da sinodalidade nas
propostas que surgem nesses Encontros (apresentação e aprovação).
Falta ainda a vivência do terceiro e do quarto
momentos da sinodalidade - abaixo relacionados - para que a Igreja volte a ser,
em nossa realidade de hoje, uma Igreja realmente evangélica, como as primeiras
Comunidades cristãs.
- 3º
momento: a vivência da sinodalidade na
Assembleia Geral Ordinária do Sínodo do Povo de Deus (terceira e última
fase do caminho sinodal), substituindo o Sínodo dos Bispos. Afinal, a Igreja
não é o Povo de Deus?
- 4º
momento: a vivência da sinodalidade na
aprovação das decisões tomadas na Assembleia e publicadas no Documento
final.
A vivência do 3º e 4º momentos da sinodalidade só
será possível quando a nossa Igreja Católica tomar realmente consciência que
todos os seres humanos têm a mesma dignidade e que, por isso, devem
viver a igualdade e praticar a democracia de maneira plena, sem
restrições.
A vivência da sinodalidade é,
portanto, a prática da democracia radical na Igreja das pessoas de fé.
Um
exemplo a ser seguido: por 50 anos a Prelazia de S. Felix do
Araguaia, com seu bispo Dom Pedro Casaldáliga, viveu plenamente a sinodalidade (em seus quatro momentos).
“Havia uma verdadeira horizontalidade
- bispo, padres, religiosos, religiosas e demais cristãos e cristãs - todos e
todas eram protagonistas. Todos e todas tinham direito a falar nas reuniões e a votar
em assuntos que exigiam decisões
conjuntas. Todos e todas eram irmãos
e irmãs pelo mesmo batismo que receberam. Este jeito de ser Igreja vivido
na Prelazia mostra que outra Igreja é
possível!” (Prelazia de São Félix do Araguaia. Alvorada, julho-setembro,
2021).
Um dia chegaremos lá! Esperançar é preciso! (Veja no
http://freimarcos.blogspot.com/ os artigos sobre as questões da dignidade,
da igualdade e da democracia na Igreja).
Ave Maria
Dom
Pedro Casaldáliga - Brasil de Fato RS
Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor
em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor
aposentado de Filosofia da UFG
E-mail:
mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 14 de fevereiro de 2022
O Artigo foi publicado originalmente em:
https://portaldascebs.org.br/a-questao-da-sinodalidade-na-igreja/
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