domingo, 30 de julho de 2023

CEBs: o jeito “evangélico” de ser Igreja hoje - 15º Intereclesial das CEBs

 


De 18 a 22 deste mês de julho/23, aconteceu em Rondonópolis - MT, o 15o Intereclesial da Comunidades Eclesiais de Base, com o tema “CEBs: Igreja em saída, na busca da vida plena para todos e todas”, e o lema “Vejam, eu vou criar um novo céu e uma nova terra” (Is 55,17ss).

Participaram do Encontro delegações das CEBs de todo o Brasil: mais de 1.500 pessoas, incluindo cerca de 70 padres, 60 bispos e representantes de outros países. O Intereclesial refletiu sobre questões sociais-ambientais e a atuação da Igreja no Brasil.   

O método (caminho) utilizado no encontro foi ver, julgar e agir, ou - em outras palavras - analisar, interpretar e libertar.

A Igreja - lembra-nos o Concílio Vaticano II - é o Povo de Deus e as CEBs são - hoje - o jeito de ser Igreja das primeiras Comunidades Cristãs: o jeito de ser do próprio Jesus de Nazaré.

As CEBs são, pois, o jeito “evangélico” de ser Igreja e o Intereclesial é um encontro de irmãos e irmãs em comunhão. 

Ora, nesse jeito “evangélico” de ser Igreja das CEBs -  não existem classes: Hierarquia, Vida Religiosa e Laicato. No Plano de Deus, todos e todas - na diversidade de dons (carismas) e ministérios (serviços) - somos iguais em dignidade e valor, chamados e chamadas a viver em comunhão, como filhos e filhas do mesmo Pai-Mãe que é Deus, como irmãos e irmãs em Cristo, no Amor (Espírito Santo). A única diferença está na intensidade e profundidade do amor com o qual cumprimos a nossa missão no mundo.

Como dizem os filósofos, o ser humano não é um ser já feito, mas um ser que está se fazendo, um “vir-a-ser”, um ser em construção. Enquanto estamos no mundo, podemos crescer sempre na vivência do amor, que é a perfeição humana, a santidade, a felicidade.

Antes de iniciar o 15º Intereclesial das CEBs (16 de julho) aconteceu a bênção de envio das equipes de serviço na Celebração eucarística, presidida por Dom Gabriel Marchesi (bispo da diocese de Floresta - PE e referencial das CEBs em nível nacional) e concelebrada por Dom Maurício da Silva Jardim (bispo de Rondonópolis-Guiratinga - MT) e os presbíteros presentes.

As Celebrações: de abertura (dia 18 à noite), do Intereclesial e de encerramento (dia 22 à noite) foram verdadeiras Celebrações comunitárias muito bonitas e significativas: tempos fortes de graça de Deus. Era o Povo de Deus das CEBs celebrando sua vida, sua caminhada e sua missão.

O Encontro foi realmente, para as CEBs do Brasil, um novo Pentecostes. Todos e todas voltaram para suas Comunidades animados e animadas, fortalecidos e fortalecidas; desejosos e desejosas de continuar com muito entusiasmo e com muito amor a missão de Jesus hoje: fazer acontecer a Boa Notícia do Reino de Deus, que - se bem entendido - é o projeto de vida mais revolucionário que existe: o projeto de um Mundo Novo, sempre mais Novo.

Para uma visão mais abrangente do 15º Intereclesial das CEBs, leia os sites: http://portaldascebs.org.br/ e https://cebsdobrasil.com.br/. Com muita fé, esperança e amor, a caminhada das CEBs continua!

O documento da CNBB “Missão e Ministério dos Cristãos Leigos e Leigas” - 62 (1999) afirma que - à luz do Concílio Vaticano II e da Conferência de Medellín - precisamos repensar a estrutura social da Igreja e reelaborar a teologia dos ministérios a partir do binômio “comunidade - carismas e ministérios” (e não: “hierarquia - laicato”).

O documento da CNBB posterior “Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade” - 105 (2016), que trata do mesmo assunto, simplesmente desconhece e desconsidera a parte do documento - acima citado - e reafirma o binômio “hierarquia - laicato”. É lamentável!

À luz do documento 62, apresento duas sugestões concretas:

1ª. Que toda a Pastoral da Igreja no Brasil seja planejada a partir do conceito teológico de CEB e de Paróquia dos Documentos de Medellín (que, infelizmente, foram esquecidos). Segundo esses Documentos, a CEB é “o primeiro e fundamental núcleo eclesial” ou “a célula inicial da estrutura eclesial” e a Paróquia é “um conjunto pastoral unificador de Comunidades de Base” (Med XV, 10.13).

2ª. Que o Intereclesial das CEBs (realizado periodicamente), pela sua representatividade nacional, seja reconhecido como o Sínodo do Povo de Deus, onde são discutidas, votadas e tomadas as principais decisões da Igreja no Brasil. Consequentemente, os Intereclesiais regionais e diocesanos seriam também reconhecidos como Sínodos do Povo de Deus regionais e diocesanos.


Que sonho bonito! As CEBs - na grande variedade de suas expressões - se tornariam realmente o jeito “evangélico” - sempre novo e sempre antigo - de toda a Igreja ser!

Estamos caminhando! Um dia chegaremos lá! Esperançar é preciso!








Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 30 de julho de 2023


segunda-feira, 10 de julho de 2023

Voz do Pai (Vox Patris)

 


“A grande expectativa dos Romeiros se volta para a Voz do Pai (Vox Patris), como vem sendo chamado o grande sino que irá ocupar lugar de destaque no Novo Santuário Basílica. Fabricado em Cracóvia, na Polônia, a peça de 55 toneladas, 4m de altura e 4,5m de diâmetro, já está pronta e deve chegar a Trindade entre dezembro próximo e janeiro de 2024” (O Popular, 21 de junho deste ano, p. 11). Será que “a grande expectativa dos Romeiros” é realmente o “grande sino”? Não acredito!

Antes de tudo, lembro que a grandiosa, luxuosa e imponente obra que está sendo construída - há mais de 10 anos - em Trindade é o segundo Novo Santuário Basílica. O primeiro tinha terminado poucos anos antes de iniciar o segundo.

Como cristão que - mesmo com suas limitações humanas - procura viver hoje como Jesus de Nazaré viveu no tempo dele, faço agora - à luz do Evangelho - uma denúncia, que é - ao mesmo tempo - uma crítica construtiva.

A obra faraônica do segundo Novo Santuário Basílica do Divino Pai Eterno em Trindade (GO) - pela sua grandiosidade, luxuosidade e imponência -

1 . Não tem nada a ver com o jeito de ser e viver de Jesus de Nazaré, que:

  • foi morador de rua em Belém antes de nascer, com sua mãe Maria e seu pai José;

  • nasceu como sem-teto na manjedoura de um estábulo;

  • anunciou a boa-noticia do seu nascimento aos pastores, que eram os sem-terra da época;

  • foi migrante no Egito, para fugir da ganância de Herodes;

  • foi carpinteiro com seu pai José;

  • esteve sempre - em sua vida pública -  ao lado e do lado dos pobres, excluídos e descartados, libertando-os de doenças e de outros males; 

  • foi preso com a acusação: “achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo” (Lc 23, 2);

  • morreu na cruz e ressuscitou. “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos” (Jo 15, 13). “Eu estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 20). 

2 . Não tem nada a ver com a Boa Notícia (o Evangelho) do Reino de Deus, que Jesus anunciou ao mundo;

3 . Não tem nada a ver com a Igreja que Jesus “amou e se entregou por ela” (Ef. 5, 25), como a Igreja das primeiras Comunidades Cristãs e, hoje, a Igreja das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que é um “jeito evangélico de ser Igreja”, ou seja, um “jeito sempre novo e, ao mesmo tempo, sempre antigo de ser Igreja”. 

O segundo Novo Santuário Basílica, ainda em construção, reflete um modelo de Igreja imperial, triunfalista, poderosa e luxuosa que é justamente o contrário da Igreja que - diante da profissão de fé de Pedro - Jesus prometeu construir. “Eu te digo que tu é Pedro e sobre esta pedra construirei a minha Igreja e o poder do inferno (do mal) nunca poderá vencê-la” (Mt 16,18).

Se Jesus quisesse uma Igreja imperial, teria nascido no palácio do Imperador de Roma e não na manjedoura de um estábulo.

A “Voz do Pai” (Vox Patri) não é a voz do maior sino do mundo, mas a voz do povo sofrido: os pobres, explorados, excluídos e descartados; os que estão passando fome (33 milhões só no Brasil), em consequência de uma sociedade estruturalmente perversa, cruel e injusta, legitimada muitas vezes em nome de um falso deus e de um falso evangelho.

Por fim, pergunto: se é verdade que somente em duas ou três Celebrações anuais - no dia da festa do Divino Pai Eterno - não cabe o povo no primeiro Novo Santuário Basílica, não teria sido “mais evangélico” construir - numa área aberta - galpões cobertos, simples e bonitos que pudessem abrigar o Povo nas Missas campais e, ao mesmo tempo, nas Romarias (Caminhadas) para que pudessem tomar seus lanches ou refeições num clima de amizade e confraternização? Meditemos!

Termino, deixando claro que o juízo ético - humano e cristão - que fiz nessa denúncia-crítica construtiva, é um juízo de um fato histórico concreto e não da consciência subjetiva das pessoas diretamente envolvidas nesse fato, que só Deus conhece e só Deus pode julgar.


Santuário antigo – Paróquia Divino Pai Eterno



Primeiro Novo Santuário Basílica do Divino Pai Eterno


Segundo Novo Santuário Basílica do Divino Pai Eterno
(em construção)
Trindade - Goiás - Brasil


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 09 de julho de 2023