No ano das Eleições Municipais para
Vereadores ou Vereadoras e Prefeitos ou Prefeitas (como no ano das outras
Eleições), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e dos Regionais, costumam
publicar “Notas oficiais”, dirigidas aos Cristãos Católicos, Cristãs Católicas
e a todo o Povo, sobre a Política Partidária.
Normalmente, essas Notas reafirmam
princípios gerais da chamada Doutrina Social da Igreja, válidos para
qualquer época e qualquer lugar. São Notas a-históricas, que não “escutam
os sinais dos tempos”, fazendo a leitura crítica - análise e interpretação -
dos acontecimentos à luz do Evangelho, como nos pede o Concílio Vaticano II.
“A Igreja para desempenhar sua missão, a todo momento (reparem: a todo momento e, portanto, também no momento das Eleições), tem o dever de escutar (perscrutar) os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho”. “É
necessário, por conseguinte, conhecer e
entender o mundo (repito: conhecer
e entender o mundo) no qual
vivemos, suas esperanças, suas aspirações e sua índole frequentemente
dramática" (A Igreja no mundo de hoje - GS 4).
Infelizmente, a Igreja Católica como
Instituição, no decurso da história, cedeu à tentação do poder e
incorporou em suas estruturas o pior do Imperialismo, o pior
do Feudalismo, o pior do Escravismo e o pior do Capitalismo.
Digo isso com muita dor no coração, por amar a Igreja e lutar para que ela -
mesmo pecadora - seja realmente conforme o Evangelho.
Por exemplo, como pode a Igreja
Instituição - em pleno século 19 - ensinar que a virtude do escravo
era a submissão e a virtude do dono de escravos, a benevolência.
E, pior ainda, como pode conviver com escravos e escravas em seus
próprios quadros? Como conseguia conciliar isso com o Evangelho!?
Hoje, se a Igreja escutasse a todo
momento os sinais dos tempos, interpretando-os à luz do Evangelho, com
certeza denuciaria profeticamente o Sistema Capitalista Neoliberal como
sendo a historicização do “pecado do Mundo”, do “pecado social
ou estrutural” institucionalizado.
Um dado recente da realidade - entre
muitos que poderiam ser citados - é suficiente para confirmar isso. “A riqueza
dos cinco homens mais ricos mais que dobrou, entre 2020 e 2023, saindo de 405
bilhões de dólares para 869 bilhões de dólares. Enquanto 5 bilhões de pessoas
ficaram mais pobres no mesmo período. A desigualdade e a fome aumentam dia após
dia” (Jornal “Grito dos Excluídos e Excluidas”, ano 30 - número 81 -
março/abril - 2024).
A Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB) e dos Regionais - com seus pronunciamentos a-históricos, que
reafirmam valores universais sem escutar os Sinais dos Tempos - não acabam
legitimando, consciente ou inconscientemente (só Deus sabe), situações
conjunturais e estruturas socioambientais, socioeconômicas e sociopolíticas
perversas, desumanas, injustas, antiéticas e sobretudo, anticristãs, que matam
a maioria do nosso Povo? Do ponto de vista histórico, não é uma alienação? A
Igreja Instituição não está usando das benesses do Sistema Capitalista
Neoliberal, como usou das benesses da Escravidão?
“Pergunto-me - diz o nosso Irmão Papa Francisco
- se somos capazes de reconhecer que estas realidades destrutivas correspondem
a um Sistema que se tornou global. Reconhecemos que este Sistema impôs
a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na
destruição da natureza? Se é assim - insisto - digamo-lo sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma
mudança de estruturas. Este Sistema
é insuportável: não o suportam os Camponeses, não o suportam os
Trabalhadores, não o suportam as Comunidades, não o suportam os Povos... E nem
sequer o suporta a Terra, a Irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”. Este
Sistema “exclui, degrada e mata!” (2º Encontro Mundial dos Movimentos
Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15). E ainda: com muito realismo, Francisco afirma que
hoje os Pobres não são excluídos (somente), mas descartados.
Depois do Concílio Vaticano II, e da
Conferência de Medellín (o Concílio para a América Latina e Caribe), vivemos na
Igreja, com muito entusiasmo, um período de profunda renovação, mas
infelizmente - há algum tempo - a Igreja está voltando atrás. As palavras: “Libertação”,
“De Base” e “Popular” tornaram-se praticamente “palavras proibidas”.
Na Igreja - como “Instituição capitalista”
- existe muita hipocrisia, muito farisaismo. Os Documentos de Medellín, por
exemplo, não são citados nem na Lista das Síglas! Hoje, a Igreja fala muito em
Comunidades Eclesiais Missionárias, mas esquece-se de dizer que as
Comunidades Eclesiais - para serem Missionárias - têm que ser De Base, ou seja,
encarnadas na vida do Povo. Até os palácios episcopais estão voltando. Que
vergonha! É uma afronta ao Evangelho.
E agora, uma advertência: os e as
que pensam que “a Igreja das CEBs acabou”, estão enganados. O Espírito Santo
não vai permitir. Mesmo nas catacumbas, elas estão muito vivas e vão voltar com
mais força. É Jesus que quer!
Também atualmente, apesar de tudo, existe
- graças a Deus - o outro lado da moeda e falo isso por experiência
pessoal. Mergulhando na Igreja Povo de Deus, Povo Pobre das Comunidades Eclesiais
de Base (CEBs), percebi que, nessas Comunidades, existe muita sabedoria e
santidade que vem de Deus e que me fez crescer como Ser humano e como Cristão. Sou
profundamente grato às CEBs. Tudo isso é motivo de esperança!
Por fim, pessoalmente - depois de escutar
os Sinais dos Tempos - declaro com toda sinceridade: nenhum Ser humano
consciente e, mais ainda, nenhum Cristão (Ser humano radicalmente consciente) deve
votar em Partidos e Candidatos, que - em sua ideologia - apoiam, defendem e sustentam
o Sistema Capitalista Neoliberal - totalmente irracional, perverso, desumano,
antiético e anticristão (mesmo que, hipocritamente, esses Partidos e
Candidatos ofereçam ao Povo algumas “balinhas” para enganá-lo e mantê-lo
submisso, sem greves e sem revoltas).
Unidos e unidas vencemos e vencermos!
Jesus está e estará sempre do nosso lado! “Somos Mundo Novo, Mundo Novo
queremos”!
Marcos Sassatelli, Frade
dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral
(Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282
Goiânia,
23 de setembro de 2024