(Continua o tema dos artigos anterioriores
sobre o Ser humano)
Na
vida do Ser humano histórico - “já e ainda não” meta-histórico
- a liberdade é uma exigência e, ao mesmo tempo, uma
consequência da racionalidade. Ela "é um risco e um mistério que
envolvem a absoluta frustração no ódio (morte plena) ou a radical realização no
amor (vida plena)” (BOFF,
L., Vida para além da Morte. Vozes, Petrópolis, 1973, p. 94). Esse risco e
esse mistério devem ser assumidos e vividos permanentemente.
A
realidade que chamamos de "morte" - como todos e todas sabemos
por experiência - é constitutiva da condição existencial do Ser humano
histórico. Sabemos que temos de morrer e - vendo a morte dos outros e das
outras ou antecipando a nossa pela imaginação - podemos adquirir a experiência
vital e a convicção real de nossa própria morte.
"Vejo
claramente diante de mim minha morte. No constante incremento da eficácia
vivida do meu passado, que ata cada vez mais fortemente cada um dos meus
passos, sob cuja determinação nos sentimos cada vez mais claramente, e que atua
como um todo sobre a vida; no progressivo estreitamento da esfera do futuro que
me está dada na expectação imediata; na pressão, cada vez mais forte, do âmbito
do presente, inserido entre o passado e o futuro; em todas as vivências, me
está dado o acercamento da morte, que se aproxima por segundos; independente do
lugar em que me encontre, dentro do ritmo vital de minha espécie humana, esteja
enfermo ou são, observe-o ou não o observe, chegue ou não a formulá-lo
claramente num juízo. Porque esta experiência está jacente na vida, na essência
da vida, não no acaso de minha organização humana e no especial ritmo de sua
existência: infância, juventude, velhice e duração da vida" (SCHELER, M. Murte y Supervivencia.
Revista de Occidente, Madrid, s.d., p. 75-76. Citado por: DEL VALLE, A. Basave.
Filosofia do homem - Fundamentos de Antropologia metafísica. Convívio, São
Paulo, 1975, p. 247).
Neste
sentido, o Ser humano, desde os primeiros momentos de sua vida, caminha para a "morte".
Ele é
um "ser-para-a-morte", ou seja, um "ser-para-a-passagem”
- última e definitiva - do "modo de ser histórico" (em processo
permanente de meta-historicização: meta-histórico “já e ainda não”) para
o "modo de ser meta-histórico" (em estado pleno: meta-histórico
“além da morte”). Como, porém, o Ser humano histórico é
"ontologicamente" voltado para a vida e a vida plena, ele é,
sobretudo, um "ser-para-a-vida”.
Em
síntese, podemos dizer que o Ser humano histórico como "corpo"
biopsíquico e espiritual ou pessoal, "morre" (a ênfase é
colocada no corpo); o Ser humano histórico como "espírito" (ou
"pessoa") biopsíquico e corpóreo, "ressuscita" ou
"vive para além da morte" (a ênfase é colocada no espírito ou
pessoa). O sujeito, porém, da Morte e Ressurreição é sempre o Ser
humano histórico todo.
Na "morte"
(cisão total do tempo para a eternidade) o Ser humano "acaba de
nascer totalmente" (BOFF,
L., o.c., p. 55) para a vida plena ou morte plena.
O Ser
humano meta-histórico é, antes de tudo, Ser humano meta-social
(meta-sociedade), mas a “meta-socialidade” não é
a totalidade do Ser humano meta-histórico. A "meta-socialidade"
é - podemos dizer - "meta-socialidade individual", porque
a sociedade influencia e condiciona dialeticamente o indivíduo.
O Ser
humano social, ou seja, o Ser humano histórico em suas relações sociais
ou estruturais, é "ontologicamente" voltado para o meta-social;
é, "já e ainda não",
meta-social. A dimensão da meta-socialidade é constitutiva
da meta-historicidade do Ser humano.
O Ser
humano histórico meta-socializa-se dialética e permanentemente como “Vida
social” ou “Morte social”, até à meta-socialização plena
(total, absoluta) como “Vida social plena” ou “Morte social plena”.
A meta-socialização
plena (total, absoluta) como “Vida social plena” é a afirmação da dimensão social do Ser humano em sua
plenitude, ou seja, da humanização plena (da Vida eterna, da Páscoa definitiva,
da Plenitude da Ressurreição, da Plenitude do Reino de Deus, da Salvação
eterna, do Céu, do Paraíso).
A meta-socialização
plena (total, absoluta) como “Morte social plena” é a negação de
tudo o que foi dito no parágrafo anterior.
Contrariamente
a uma interpretação "individualista", afirmar a meta-socialidade
do Ser humano meta-histórico, significa "afirmar uma Comunidade
humana 'além da morte’ (temporal), no sentido que a Comunidade humana -
tendo já uma dimensão meta-histórica - náo é destruida por esta mesma
morte" (GEVAERT,
J., o.c., p. 268).
Para o
Ser humano meta-social, “estrutural e constitutivamente” ligado aos
outros (semelhantes), o processo dialético permanente (o caminho) da
meta-socialização - até à meta-socialização plena (total, absoluta) como Vida
meta-social plena ou Morte meta-social plena - passa pelo reconhecimento ou não
dos outros como outros e pela experiência do amor meta-social (meta-estrutural)
ou não (desamor meta-social, egoísmo meta-social), em todas as suas
manifestações.
Essa
experiência é ainda a condição necessária para encontrar (conhecer e vivenciar)
o significado fundamental - último e definitivo - da existência humana
meta-social.
A
experiência do amor meta-social se dá (acontece) na e pela Práxis meta-sócial
(voltaremos sobre o assunto, falando da
Práxis meta-social).
(Continua nos próximos artigos sobre o Ser
humano)
O artigo foi publicado originalmente em:
https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano-meta-historico-social/
(27/03/25)
Marcos
Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em
Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor
aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282
https://freimarcos.blogspot.com/ - Goiânia, 28 de abril de 2025