segunda-feira, 21 de abril de 2025

Irrestrita solidariedade às Ocupações - Veemente repúdio às ameaças de despejo

 


“Mabel quer ceder áreas públicas para a construção civil” (O Popular, 02/04/25, p. 4 - Manchete). “A Prefeitura tem uma lista preliminar de 125 terrenos que poderiam entrar nas parcerias” (ib.).

Na realidade, o que o prefeito quer mesmo com as parcerias é: colaborar com o crescimento da especulação imobiliária na cidade de Goiânia, tornando os ricos cada vez mais ricos. Em contrapartida, ele quer receber “uma determinada quantia de dinheiro” para legalizar as parcerias e inibir as Ocupações, ameaçando-as de despejo.

De acordo com a SEPLAN, segundo o Sistema de cadastro de áreas da Prefeitura, “há atualmente 875 áreas públicas vagas e 305 ‘invadidas’ no município de Goiânia. O Órgão admite, no entanto, que os dados precisam ser checados” (ib.).

“Mabel diz que a gestão adotará medidas para a retirada de Ocupações irregulares. Na lista prévia de 125 terrenos, há 8 processos judiciais, que tratam de Ocupação”. O prefeito declara: “Vamos buscar estas áreas que estão invadidas (...). Será assim: ou a pessoa paga para que a gente possa pagar outras áreas, ou nós vamos tirar a invasão. O fato é que nós vamos recuperar essas áreas públicas que estão invadidas. São muitas” (ib.).

Antes de tudo, um esclarecimento: senhor prefeito, não se trata de “Invasões irregulares”, mas de Ocupações legítimas de terrenos sem função social por trabalhadores e trabalhadoras que querem e necessitam ter uma moradia digna: um direito fundamental de todo ser humano. Os verdadeiros invasores são os capitalistas, que se apropriam de terrenos - que são de todos e todas - para a especulação imobiliária.

Que vergonha, senhor prefeito! Infelizmente, suas atitudes mostram claramente de que lado o senhor está: do lado dos poderosos. Se o senhor estivesse do lado dos pobres, sua primeira preocupação - depois de eleito - teria sido: criar - com as áreas públicas e com a desapropriação de outras áreas sem função social - as condições necessárias para que todos e todas tivessem seu direito à moradia digna respeitado.

São Tomás de Aquino - em sua época - já dizia que, do ponto de vista ético, nenhum ser humano tem direito ao supérfluo, enquanto o outro (ser humano) não tem o necessário. E dizia ainda que a destinação dos bens para uso de todos os seres humanos é de direito natural primário e a posse (ou propriedade), de direito natural secundário. Quando o direito natural secundário impede o acesso de todos os seres humanos ao direito natural primário, é injusto e antiético (seja do ponto de vista filosófico ou teológico). Trata-se de verdades fundamentais que integram o Pensamento Social Cristão.

Papa Francisco pergunta: “Reconhecemos que este Sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza? Se é assim - insisto - digamo-lo sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este Sistema é insuportável: não o suportam os Camponeses, não o suportam os Trabalhadores, não o suportam as Comunidades, não o suportam os Povos. E nem sequer o suporta a Terra, a Irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”. O Papa diz ainda que este Sistema insuportável exclui, degrada e mata”; e que os “3 T” - terra, teto (moradia) e trabalho - são direitos fundamentais de todo ser humano (2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15).

Do ponto de vista da ética humana e cristã (radicalmente humana), declaro e advirto:

1.    Declaro:

·         Na cidade, os terrenos “largados” para futura especulação imobiliária são de quem precisa deles para morar e trabalhar dignamente. São terrenos que não só podem, mas que devem ser ocupados por essas pessoas.

·         No campo, os latifúndios improdutivos e sem nenhuma função social são de quem precisa deles para morar e trabalhar dignamente na agricultura familiar e comunitária, produzindo alimentos sadios (sem venenos) para a alimentação do povo. São latifúndios que não só podem, mas que devem ser ocupados por essas pessoas.

·    Todo despejo é injusto (como já disse outras vezes). Ora, se o despejo tiver liminar de juiz, é mais injusto ainda, porque se trata de uma injustiça legalizada e institucionalizada. Pessoa humana nunca se despeja.


Observação: só existem três casos nos quais as pessoas podem ser removidas (não despejadas) com dignidade e respeito de uma Ocupação. Primeiro caso: quando a área é de utilidade pública; segundo caso: quando a área é de preservação ambiental. Nestes dois casos, a remoção pode acontecer somente depois que outras moradias estiverem prontas para serem ocupadas. Terceiro caso: quando a área é de risco para a vida dos moradores. Neste terceiro caso, a remoção deve ser imediata e o Poder Público tem a obrigação de pagar o aluguel social até que outras moradias estejam prontas para serem ocupadas.


2.    Advirto:

·         Os que foram eleitos para algum cargo público devem estar sempre a serviço do Povo, a partir dos mais pobres.

·         Lembrem-se que Deus é justo e “seus caminhos são justos e verdadeiros” (Ap 15,3). A justiça de Deus pode tardar, mas não falha.

     Por fim, a denúncia e o pedido de solidariedade do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Diteitos (MTD), do Comitê de Direitos Humanos Dom Tomás Balduino e da Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil são meus também.

300 famílias em Situação de Ocupação no setor Solar Ville (Goiânia), distribuídas em quatro Ocupações diferentes: Paulo Freire, Marielle Franco, Terra Prometida e Manaim, recebem periodicamente novas ameaças de despejo. Nesse contexto, dezenas de crianças, mães, pessoas idosas, com deficiência e doentes - que foram acolhidos e acolhidas nas Comunidades - continuam vivendo em estado de aflição e surpresa. Quanta maldade! (cf. @mtd.goias, @comitedomtomas, @justpazop).



 


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)   
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282

Goiânia, 17 de abril de 2025

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