Depois das reflexões feitas (na 1ª parte do artigo) à luz do Concílio Vaticano II e da Conferência de Medellín, apresento aqui algumas propostas concretas: caminhos que a Igreja Cristã Católica precisa percorrer para voltar a ser uma Igreja verdadeiramente evangélica.
1ª. A Igreja Cristã Católica deve reconhecer - não só na teoria, mas também na prática - que todos os Seres humanos - Cristãos e Cristãs incluídos - são iguais em dignidade e valor.
“Deus disse: ‘Façamos o Ser humano à nossa Imagem e semelhança’. (...) E Deus criou o Ser humano à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou, macho e fêmea os criou” (Gn 1,26-27).
"Deve-se
reconhecer cada vez mais a igualdade fundamental entre todos os Seres humanos"
(A Igreja no mundo de hoje - GS 29). "A razão principal da dignidade
humana consiste na vocação do Ser humano para a comunhão com Deus" (GS
19). Na Igreja “reina (deveria reinar...) verdadeira igualdade quanto à
dignidade e ação comum a todos os cristãos e cristãs na edificação do Corpo de
Cristo" (A Igreja - LG 32).
“Na Igreja, Povo de
Deus, é comum a dignidade dos filhos e filhas de Deus batizados e batizadas, no
seguimento de Jesus, na comunhão recíproca e no mandamento missionário”
(Exortação Apostólica Pós-sinodal “Ecclesia in America” - EA 44). “Na Igreja,
todos e todas são chamados à santidade (perfeição humana, felicidade) e
receberam a mesma fé pela justiça de Deus” (LG 32).
"O mistério do Ser
humano só se torna claro verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado. (…)
Cristo manifesta plenamente o Ser humano ao próprio Ser humano e lhe descobre a
sua altíssima vocação" (GS 22). “Todo aquele que segue Cristo, o Ser
humano perfeito, torna-se ele também mais Ser humano” (GS 41).
2ª. A Igreja Cristã Católica deve ser toda ministeral, na diversidade dos dons (carismas) e dos serviços (ministérios).
Na Igreja: “existem
dons diferentes, mas o Espírito é o mesmo; diferentes serviços, mas o Senhor é
o mesmo; diferentes modos de agir, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos.
Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para a utilidade de todos. A um,
o Espírito dá a palavra de sabedoria; a outro, a palavra de ciência segundo o
mesmo Espírito; a outro, o mesmo Espírito dá a fé; a outro ainda, o único e
mesmo Espírito concede o dom das curas; a outro, o poder de fazer milagres; a
outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, o dom de
falar em línguas; a outro ainda, o dom de as interpretar. Mas é o único e mesmo
Espírito quem realiza tudo isso, distribuindo os seus dons a cada um, conforme
ele quer” (1Cor 12,4-11).
3ª. A Igreja Cristã Católica deve ser uma Comunidade de Irmãos e Irmãs (um círculo) e não uma Hierarquia de classes - Clero e Laicato - com a classe intermediária chamada Vida Religiosa (uma pirâmide).
“Desenvolvendo perspectivas já
presentes no Concílio, mas ainda não explicitadas, vários teólogos - a começar
por Congar - têm proposto pensar a estrutura social da Igreja dentro do binômio
'comunidade - carismas e ministérios'. O primeiro termo, 'comunidade' (ou o
teologicamente mais denso, 'comunhão'), inclui tudo o que há de comum a todos
os membros da Igreja; e a dupla 'carisma e ministérios' inclui tudo o que
positivamente os distingue. É esta, aliás, a perspectiva do Novo Testamento,
onde nunca aparece o termo 'leigo' ou ‘leiga’ (e - podemos acrescentar - nem o
termo ‘clero’), mas sublinham-se os elementos comuns a todos os cristãos/ãs e,
ao mesmo tempo, valorizam-se as diferenças carismáticas, ministeriais e de
serviço. Neste sentido, os termos que designam os membros do Povo de Deus
acentuam a condição comum a todos os renascidos pela água e pelo Espírito: santos/as, eleitos/as, discípulos/as,
irmãos/ãs” (CNBB. Missão e Ministérios
dos Cristãos Leigos e Leigas - 62, 1999, número 104-106. Veja a íntegra do
Documento. Infelizmente, depois de 17 anos, no Documento “Cristãos Leigos e
Leigas na Igreja e na Sociedade - 105 - 2016, a CNBB esqueceu o Documento
anterior e voltou a reafirmar o binômio Hierarquia e Laicato)
Na
Igreja, todas as eleições - nas Pastorais e nos Conselhos Pastorais (os novos
Sínodos) - devem ser comunitárias e ter valor deliberativo, em comunhão com as outras
Igrejas e com a Igreja de Roma, cujo bispo (papa deriva de pai) é sinal de
unidade de todas as Igrejas numa só Igreja.
4ª. A
Igreja Cristá Católica precisa se despojar de todas as formas de luxo, poder e
triunfalismo
Para
fazer isso, a Igreja deve seguir o caminho que Jesus (Caminho, Verdade e Vida) fez,
desde a manjedoura de um estábulo, onde nasceu como sem-teto, até na Cruz, onde
morreu como criminoso, acusado de “subverter” o povo. Ora, para seguir o
caminho de Jesus, a Igreja precisa:
- Acabar
com todos os títulos honoríficos (eminência,
excelência, monsenhor e muitos outros). Ficar somente com os títulos
acadêmicos, que dizem qual é a área na qual o irmão ou a irmã está mais preparado
ou preparada para servir e os títulos profissionais que indicam qual o serviço
que o irmão ou a irmã presta.
- Acabar
com o cardinalato e sua sagrada púrpura (que de
sagrado não tem nada).
- Acabar
com os palácios episcopais (que estão voltando), com outros palácios e com todo tipo de luxo na
construção das Igrejas, nos vasos e vestimentas litúrgicas, mas preservando tudo o que é patrimônio histórico-cultural
- positivo ou negativo - cuja memória nos ensina hoje (um exemplo: a Igreja de
S. Francisco de Assis, em Salvador - BA, com o interior revestido em ouro
(“Igreja de ouro”). Pergunto: Logo São Francisco? Que contradição!).
- Acabar
com todas as manifestações e celebrações triunfalistas. A Igreja deve ser sal da terra, fermento na massa
e luz do mundo.
- Acabar
com todas as formas de poder. Na Igreja -
além dos serviços (ministérios) das diferentes pastorais - só deve existir o
serviço (ministério) da coordenação com sua secretaria.
- Acabar,
por fim, com a Igreja - Estado: o maior
equívoco histórico, que não tem nada a ver com o Evangelho. Como? De duas
maneiras:
º Devolvendo
o Estado do Vaticano ao Estado italiano, com a responsabilidade de preservar
seu patrimônio histórico-cultural, seja positivo que negativo, ou:
º Criando
um pequeno Estado autônomo com a mesma responsabilidade e totalmente
independente da Igreja, como - por exemplo - a República de S. Marino na Itália
e outros.
Quem
sabe, um dia tudo isso se tornará realidade e teremos uma Igreja Cristã
Católica verdadeiramente evangélica. Invoquemos o Espírito Santo. (Vejam na imagem
abaixo: o Papa Francisco é um irmão igual aos outros do grupo)