“O Vaticano II faz-nos
passar:
- de uma Igreja-instituição ou de uma Igreja-sociedade perfeita para uma Igreja-comunidade, inserida no mundo, a serviço do Reino de Deus;
- de uma Igreja-poder para uma Igreja pobre, despojada, peregrina;
- de uma Igreja-autoridade para uma Igreja serva, servidora, ministerial;
- de uma Igreja piramidal para uma Igreja-povo;
- de uma Igreja pura e sem mancha para uma Igreja santa e pecadora, sempre necessitada de conversão, de reforma;
- de uma Igreja-cristandade para uma Igreja-missão, uma Igreja toda ela missionária”.
(Dom Aloísio Lorscheider.
Fotografia da Igreja que o Concílio Vaticano II sonhou” - Os destaques em
negrito são meus).
O Concílio Vaticano II colocou as bases para
que a Igreja Cristã Católica viva um processo de libertação permanente dos
pecados pessoais de todos os que somos cristãos e cristãs dessa Igreja e,
sobretudo, do seu pecado estrutural como Instituição. É só
fazendo isso que a Igreja Cristã Católica voltará a ser - no mundo de
hoje - uma Igreja realmente evangélica como eram, no seu tempo, as
primeiras Comunidades Cristãs
A Conferência de Medellín - em teoria, mas ainda muito
pouco na prática - encarnou esses ensinamentos do Concílio Vaticano
II na realidade da América Latina e do Caribe.
Costuma-se dizer que a Igreja é santa e que os
pecadores são os cristãos e cristãs. Essa afirmação é verdadeira somente em
parte. Explico-me:
Todos e todas nós, cristãos e cristãs - enquanto seres
humanos situados (no espaço) e datados (no tempo) - somos pecadores e pecadoras,
mas também santos e santas. Enquanto estamos nesse mundo, sempre precisamos nos
libertar dos nossos pecados pessoais e crescer na santidade - que, no Plano de
Deus, é a perfeição humana - vivendo cada dia mais profundamente o mandamento
do Amor a Deus e aos Irmãos e Irmãs.
Jesus carinhosamente diz aos seus discípulos/as: “Filhinhos/as:
vou ficar com vocês só mais um pouco. Vocês vão me procurar, e eu digo agora a
vocês o que eu já disse aos judeus: para onde eu vou, vocês não podem ir. Eu
dou a vocês um mandamento novo: amem-se uns aos outros. Assim como eu
amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros. Se vocês tiverem amor uns
para com os outros, todos/as reconhecerão que vocês são meus discípulos/as” (Jo
13, 33-35).
O projeto de vida dos que somos cristãos e cristãs deve
ser um projeto de vida humana radical.
Pessoalmente - por viver há mais de 50 anos a experiência
de vida cristã das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) - posso testemunhar
que, no meio dos nossos irmãos e irmãs, trabalhadores e trabalhadoras pobres dessas
Comunidades, encontrei - além de pecados - muita santidade.
Foi na convivência com os irmãos e as irmãs
dessas Comunidades que aprendi a ser cristão (frade dominicano, padre, professor
de filosofia na UFG e teologia em outras Instituições) e aprendo até hoje.
Nessa caminhada, entre os muitos fatos que me
marcaram profundamente, cito um: numa Comunidade da periferia de Goiânia visitava
periodicamente um senhor baiano, idoso e doente. As visitas eram sempre muito
fraternas e - depois de uma longa e carinhosa conversa de irmãos, sentados num
banquinho, um ao lado do outro, na porta do barraco onde ele morava - quando ia
embora, sempre me dizia: “Deus conte seus passos!”. Após algum tempo, a filha
voltou com ele para a Bahia. Na hora de sua morte (plenitude da Páscoa), disse
à filha com toda simplicidade: “Quando você for a Goiânia, avisa Frei Marcos
que eu morri!”. Quanta sabedoria de vida e quanta fé! Acho que Deus está contando meus passos até
hoje!
Continuando as nossas reflexões - além dos pecados
pessoais dos que somos cristãos e cristãs - o que há de mais grave na Igreja
Cristã Católica é seu pecado estrutural (institucionalizado), do
qual ela precisa se libertar para voltar a ser hoje uma Igreja realmente evangélica.
No decurso de sua história - ao contrário de Jesus
que venceu as tentações - a Igreja Instituição cedeu a três grandes tentações:
do poder, do luxo e do triunfalismo. Ela incorporou estruturas do
imperialismo, do feudalismo e do capitalismo, que não têm nada a ver com o Evangelho
de Jesus de Nazaré e tornou-se uma Igreja poderosa, luxuosa e triunfalista.
Entre muitos, cito somente um fato: na Procissão da
Solenidade do Corpo de Cristo, pessoalmente sinto-me sempre muito mal vendo a
Eucaristia transportada nas ruas centrais de Goiânia num ostensório de ouro e por
Ministros com vestimentas litúrgicas luxuosas, enquanto Jesus, na pessoa dos
Moradores em Situação de Rua, dorme deitado na calçada das ruas, onde a
procissão eucarística passa. Que contradição! Que Igreja é essa!
Agradeço a Deus a vida do nosso irmão Papa Francisco pelo
seu testemunho e por tudo aquilo que ele - dentro do possível - conseguiu fazer
por uma Igreja mais evangélica e que o nosso Irmão, o Papa Leão XIV pretende continuar. Mesmo com tudo
isso, ainda há muito a ser feito!
(Esclarecendo: no texto
uso a palavra “evangélica” como expressão do seguimento radical de
Jesus)
(Depois dessas reflexões de
caráter mais geral, na 2ª parte do Artigo - com muito amor à Igreja Cristã
Católica da qual sou membro - apresentarei algumas propostas concretas para
que essa Igreja volte a ser - cada dia mais - uma Igreja realmente evangélica).
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