Em seu Discurso - depois de saudar e
agradecer carinhosamente os participantes do 3º Encontro Mundial dos
Movimentos Populares (3º EMMP) - o Papa Francisco faz a recordação
do 2º Encontro. Nesta recordação destaco o primeiro ponto marcante
do Discurso: uma mudança de estruturas para que a vida seja digna.
“No nosso último Encontro na Bolívia -
diz Francisco - com a maioria de latino-americanos, pudemos falar da
necessidade de uma mudança para que a vida seja digna, uma
transformação de estruturas; além disso, do modo como vocês,
Movimentos Populares, são semeadores de mudança, promotores de
um processo para
o qual convergem milhões de pequenas e grandes ações interligadas
de modo criativo, como numa poesia; foi por isso que quis chamar
vocês de
‘poetas sociais’; e
também pudemos enumerar algumas tarefas imprescindíveis para
caminhar rumo a uma alternativa humana diante da globalização da
indiferença: 1. pôr a economia ao serviço dos povos; 2. construir
a paz e a justiça; 3. defender a Mãe Terra”.
De coração aberto, o Papa lembra:
“Naquele dia, com a voz de
uma ‘cartonera’ e
de um camponês, na conclusão foram lidos os dez pontos de Santa
Cruz de la Sierra, onde a palavra ‘mudança’ estava
carregada de um grande conteúdo, ligada às coisas fundamentais que
vocês reivindicam: trabalho digno para todas as pessoas excluídas
do mercado de trabalho; terra para os camponeses e as populações
indígenas; habitações para as famílias desabrigadas; integração
urbana para os bairros populares; eliminação da discriminação, da
violência contra as mulheres e das novas formas de escravidão; fim
de todas as guerras, do crime organizado e da repressão; liberdade
de expressão e de comunicação democrática; ciência e tecnologia
ao serviço dos povos”.
Francisco diz ainda: “Ouvimos também
como vocês se comprometeram a abraçar um projeto de vida que
rejeite o consumismo e recupere a solidariedade, o amor entre nós e
o respeito pela natureza como valores essenciais. É a felicidade de
‘viver bem’ aquilo que vocês reclamam, a ‘vida boa’, e não
aquele ideal egoísta que enganosamente inverte as palavras e propõe
a ‘boa vida’”.
Reparem como o Papa se coloca no meio dos
Movimentos Populares: como um irmão que confia neles e conta com
eles!
Francisco
reconhece e respeita a diversidade e as diferenças como um grande
valor. “Nós
que hoje estamos aqui, de diferentes origens, credos e ideias, talvez
não estejamos de acordo acerca de tudo, certamente pensamos de modo
diverso sobre muitas coisas, mas sem dúvida estamos de acordo sobre
estes pontos”.
Mostrando que acompanha e é ‘próximo’
da caminhada e da luta dos Movimentos Populares, o Papa declara: “Sei
também que foram realizados Encontros e laboratórios em vários
países, onde se multiplicaram os debates à luz da realidade de cada
Comunidade. Isto é muito importante porque as soluções reais para
as problemáticas atuais não sairão de uma, três ou mil
conferências: elas devem ser fruto de um discernimento coletivo que
amadurece nos territórios juntamente com os irmãos, um
discernimento que se torna ação transformadora ‘em conformidade
com os lugares, os tempos e as pessoas’, como dizia Santo Inácio.
Caso contrário, corremos o risco das abstrações, de certos
‘nominalismos declaracionistas (slogans),
que são frases bonitas, mas que não conseguem sustentar a vida das
nossas Comunidades’ (Carta ao Presidente da Pontifícia Comissão
para a América Latina, 19 de março de 2016). São slogans! O
colonialismo ideológico globalizador procura impor receitas
supraculturais que não respeitam a identidade dos povos”. Reparem,
mais uma vez, como o Papa é objetivo e claro em suas palavras!
Francisco elogia e aprecia a capacidade de
discernimento dos Movimentos Populares: “Vocês caminham por outra
vereda que é local e, ao mesmo tempo, universal. Um caminho que me
recorda como Jesus pediu para dispor a multidão em grupos de
cinquenta, para lhes distribuir o pão (cf. Homilia
na Solenidade do Corpus Christi,
Buenos Aires, 12 de junho de 2004)”.
Com toda ternura e fraternidade, o Papa faz
elogios à luta, à persistência e à coragem dos Movimentos
Populares. Tem por eles muita admiração e palavras de incentivo que
brotam do mais profundo de suas entranhas.
“Há pouco assistimos ao vídeo que vocês
apresentaram como conclusão deste 3º Encontro. Vimos os rostos de
vocês nos debates sobre o modo de enfrentar ‘a desigualdade que
gera violência’. Tantas propostas, muita criatividade e grande
esperança na voz de vocês, que talvez tivesse mais motivos para se
queixar, permanecer emudecida nos conflitos, cair na tentação do
negativo. E,
no entanto, vocês olham para a frente, pensam, debatem, propõem e
agem. Congratulo-me com vocês, acompanho vocês e peço-lhes que
continuem a abrir caminhos e a lutar. Isto me dá força, dá-nos
força. Penso
que este nosso diálogo, que
se acrescenta aos esforços de muitos milhões de pessoas que
trabalham diariamente pela justiça no mundo inteiro, começa a
ganhar raízes”.
Quanta sinceridade e quanta empatia para
com os Movimentos Populares Francisco revela em suas palavras!
Realmente, ele é uma pessoa de uma sensibilidade humana e cristã
muito profunda. Vive a radicalidade do seguimento de Jesus de Nazaré
e - como um verdadeiro pastor e profeta - enfrenta com coragem os
desafios do mundo de hoje! E nós! Meditemos!
Fr.
Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor
em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor
aposentado de Filosofia da UFG
E-mail:
mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia,
11 de janeiro de 2017
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