“O Povo é sujeito. E a
Igreja é o Povo de Deus a caminho na história, com alegrias e dores. Sentir
com a Igreja é para mim, pois, estar neste Povo.
E o conjunto dos fiéis
é infalível no crer, e manifesta esta sua infaibilidade crendo (...)”
(Francisco. Entrevista exclusiva às Revistas
dos Jesuítas,19 de agosto de 2013)
No dia 29 do mês de setembro,
aconteceu em Trindade - GO, a 3ª Romaria Arquidiocesana das Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs) ao Santuário Basílica do Divino Pai Eterno. Foi uma
manifestação de fé encarnada na realidade e uma verdadeira experiência de
Igreja, comprometida com o anúncio e a construção do Reino de Deus, que é a Boa
Notícia de Jesus de Nazaré.
Éramos cerca de 1.500 pessoas vindas
de Comunidades e Paróquias da Arquidiocese de Goiânia e algumas também de
outras dioceses. Entre os participantes estavam muitos jovens, diversas religiosas,
inseridas na vida de nossas Comunidades e quatro padres.
Concentra-mo-nos no trevo de Trindade,
cantando cantos da caminhada, num clima de muita alegria. Partilhamos
comunitariamente o lanche - por sinal muito gostoso - que todos e todas
trouxeram de casa.
Depois desta calorosa acolhida de
irmãos e irmãs, iniciamos a nossa Romaria, toda celebrativa. O tema foi Justiça e Profecia a Serviço da Vida, em
preparação ao 13º Intereclesial de CEBs, que acontecerá em Juazeiro do Norte -
CE, de 07 a 11 de janeiro de 2014. O lema foi Juventude a Serviço da Vida. “Eu vim para que todos tenham vida e a
tenham em abundância” (Jo 10,10).
Depois da entrega da Cruz da
Juventude, caminhamos rumo ao Santuário e, nas paradas, meditamos as estações
da Via Sacra, na vida do nosso povo, sobretudo dos jovens.
Vivenciamos Jesus sendo preso,
torturado e crucifucado hoje: no extermínio da Juventude; no assassinato de
Moradores de Rua; na discriminação racial; no desemprego estrutural, fruto do
sistema capitalista; na dependência química; na dor de tantas mães e seus
filhos; no tráfico de pessoas, trabalho escravo e prostituição; na luta de
religiosas e religiosos, que não se calam diante das injustiças e dão sua vida
pelas vidas; na vivência, muitas vezes difícil, da afetividade e vida familiar;
na violência contra a mulher; na vida sofrida das pessoas com necessidades
especiais; no consumismo, sobretudo dos jovens, devido à influência dos meios
de comunicação; na vida subumana dos presos nas cadeias, que são depósitos de
lixo humano; na precariedade da saúde pública; na deficiência da educação
pública; e, enfim, na vida doada dos Mártires do campo e da cidade.
Chegamos ao Santuário, cantando um
canto de Ressurreição. Entramos com bendeirinhas brancas, com a Cruz da
Juventude, com o banner das CEBs e a Bíblia. Proclamamos o Evangelho de Lucas
(4,16-21), no qual Jesus retoma as palavras do profeta Isaías e faz delas o seu
programa de vida. “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagou
com a unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a
libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os
oprimidos, e para proclamar um ano de graça do Senhor”. Celebramos, pois, a
Eucaristia, sinal da comunhão com Deus e entre nós, no Amor.
No final, os jovens, os delegados que
irão ao 13º Intereclesial das CEBs e todos/as nós recebemos o envio para a
Missão. “O Senhor te chama, te ama, te consagra e te envia”! Terminamos com um
canto de Paz e abraçando-nos mutuamente como irmãos e irmãs.
Apesar da indiferença e falta de interesse
de setores da Igreja - que lamentamos profundamente - a 3ª Romaria das CEBs da
Arquidiocese de Goiânia foi sinal de uma nova primavera. Ninguém, autoridade ou
não, consegue deter a força do Espírito de Deus. “Descerá sobre vocês o
Espírito Santo. Dele receberão força para serem as minhas testemunhas até os
confins do mundo” (At 1,8).
Sentimo-nos fortalecidos pelo
testemunho de simplicidade e despojamento do nosso irmão Francisco, bispo da
Igreja de Roma, que preside na caridade todas as Igrejas.
Parafraseando Francisco e João XXIII,
nós que participamos da Romaria - de coração aberto e com esperança, que já é
certeza - podemos dizer: “como gostaríamos de uma Igreja Pobre, para os Pobres,
com os Pobres e dos Pobres”. É esta a Igreja que Jesus de Nazaré quer; é esta a
Igreja Povo de Deus e é esta a Igreja que as CEBs sonham e desejam ser no
mundo, sobretudo, na América Latina e no Brasil.
Pessoalmente, não tenho nenhuma dúvida
de afirmar que as CEBs são uma das expressões mais evangélicas (ou, a mais
evangélica) de ser Igreja hoje.
Por conseguinte, uma Igreja
trunfalista e clerical; que quer se impor pela ostentação, pela pompa e pelo
poder não é com certeza a Igreja de Jesus de Nazaré.
Em maio de 2010, os bispos do Brasil -
retomando os ensinamentos do documento 25 da CNBB, de 1982, sobre Comunidades Eclesiais de Base na Igreja do
Brasil, reafirmam: “as CEBs continuam sendo um ‘sinal da vitalidade da
Igreja’ (A Missão de Cristo Redentor - RM 51). Os discípulos e as discípulas de
Cristo nelas se reúnem para uma atenta escuta da Palavra de Deus, para a busca
de relações mais fraternas, para celebrar os mistérios cristãos em sua vida e
para assumir o compromisso de transformação da sociedade”.
Por isso - continuam os bispos – “como
pastores, atentos à vida da Igreja em nossa sociedade, queremos olhá-las com
carinho, estar à sua escuta e tentar descobrir através de sua vida, tão
intimamente ligada à história do povo no qual elas estão inseridas, o caminho
que se abre diante delas para o futuro” (CNBB, doc. 92. Mensagem ao Povo de Deus sobre as CEBs, maio de 2010).
Quando será que todos e todas nós -
sobretudo os padres - olharemos as CEBs “com carinho”, estaremos “à sua escuta”
e tentaremos descobrir “o caminho que se abre diante delas”?
Segundo os Documentos de Medellín (que representam o “ato de fundação”
da Igreja latino americana como latino americana), as CEBs não são uma das
tantas expressões da vida comunitária, mas “o primeiro e fundamental núcleo
eclesial”, “célula inicial da estrutura eclesial”, “foco de evangelização” e
“fator primordial da promoção humana”. A paróquia é definida como “um conjunto
pastoral vivificador e unificador das Comunidades de Base” (Medellín 15, III).
Como estamos longe, ainda, dessa realidade e da vivência desses
ensinamentos? Peçamos ao Espírito Santo a conversão do coração.
Fr. Marcos
Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em
Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor
aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 02 de outubro de 2013
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