A chamada “Casa da Acolhida Cidadã” - situada
à Rua Minas Gerais, esquina com Senador Jaime, Nº 839, Setor Campinas, Goiânia (GO)
- não merece ser chamada “da acolhida” e,
menos ainda, de “cidadã”.
Uma história - que vivi pessoalmente
e que deixa qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade humana indignada -
ilustra muito bem a minha afirmação.
Na noite do dia 4 de janeiro deste
ano, Maria (nome fictício), uma moça de aproximamente 25 anos, estava esperando
a minha chegada, na Rua 242, Nº 100 (Praça S. Judas Tadeu - Setor Coimbra) para
pedir socorro.
Contou sua história
de vida: veio de Belém do Pará para trabalhar. Chegando na Rodoviária de
Goiânia, a pessoa que ficou de pegá-la não apareceu. Sem saber para onde ir,
perambulou pela cidade e foi recebida na Casa da Acolhida Cidadã.
Depois de algum tempo
que estava na Casa, um policial - afirmou ela - a pegou pelo braço e, de
maneira grosseira, a tirou à força de uma escada onde não podia ficar.
Maria não gostou da
maneira como foi tratada e, seguindo o primeiro impulso, pegou suas coisas e
saiu. Ponderei com ela que, mesmo tendo o direito de exigir respeito, não podia
ter feito aquilo.
Telefonei
imediatamente à Casa da Acolhida e a assistente social de turno disse-me que na
Casa tem uma norma, segundo a qual, uma pessoa que sai voluntariamente, só pode
voltar depois de três meses. Disse-me também
que - mesmo com essa norma - no dia seguinte, de manhã, poderia ir lá e
conversar com os responsáveis da Casa.
Consegui, pois, um
lugar para que Maria pudesse passar a noite com segurança.
No dia seguinte, de
manhã - como não podia ir pessoalmente - pedi a dois Irmãos da minha Comunidade
que levassem Maria à Casa da Acolhida e conversassem com os responsáveis. E foi
isso que eles fizeram.
Qual não foi a minha
surpresa? Poucas horas depois, Maria estava novamente na Praça S. Judas Tadeu.
À pessoa que a viu e que já a conhecia da noite anterior, ela disse que a Casa
da Acolhida esperou os Religiosos sairem para mandá-la embora. Telefonei
novamente à Casa da Acolhida e a pessoa que atendeu disse-me secamente que a
Casa tem normas rígidas e que quem desobedece vai para rua mesmo. Que pedagogia
é essa?! Que psicologia é essa?! Que serviço social é esse?!
Diante de tanta insensibilidade
e arrogância, só não chamei a imprensa na hora para documentar os fatos, devido
a outros compromissos.
Maria passou a noite
na casa de uma pessoa amiga, que a acolheu com muita atenção e humanidade. Na
manhã seguinte, atendendo a um desejo dela, consegui o dinheiro para comprar a
passagem até Belém do Pará e a pessoa que a hospedou, a levou na Rodoviária.
Termina aqui a história de Maria em Goiânia. Que Deus a acompanhe e proteja!
Pessoalmente, não tenho
motivos para duvidar da história de Maria, que é uma história muito sofrida.
Mas - mesmo admitindo a hipótese que a história não seja verdadeira - eu pergunto:
1.
A
vida não está acima das normas?
2.
Como
um ser humano - homem ou mulher - pode ter a coragem de jogar na rua uma moça, que
não sabe para onde ir, só porque desobedeceu a uma norma?
3.
Se
ela desobedeceu, não quer dizer que precisa de atenção e de ajuda mais do que
os outros?
4.
Que
educadores sociais, psicólogos e assistentes sociais são esses que trabalham nas
Instituições públicas com tanta frieza e desumanidade?
5.
Que
tipo de formação e orientação receberam?
6.
Será
que essas pessoas não têm consciência?
7.
E
se têm, será que a consciência não dói?
A sociedade, na qual vivemos, é legalista, injusta e hipócrita. Trata os pobres e excluídos como “lixo humano” e “material descartável”.
“O
ser humano - diz nosso irmão, o papa Francisco - é considerado, em si mesmo,
como um bem de consumo que se pode usar e depois lançar fora. Assim teve início
a cultura do ‘descartável’, que aliás chega a ser promovida. Já não se trata
simplesmente do fenômeno de exploração e opressão, mas duma realidade nova: com
a exclusão, fere-se, na própria raiz, a pertença à sociedade onde se vive, pois
quem vive nas favelas, na periferia ou sem poder já não está nela, mas fora. Os
excluídos não são ‘explorados’, mas resíduos, ‘sobras’” (A Alegria do Evangelho
- EG, Nº 53).
A
história de Maria é uma história paradigmática. Existem muitas outras histórias
parecidas com essa.
Apesar
de tudo isso, canto: “Eu creio num mundo novo, pois
Cristo ressuscitou! Eu vejo sua luz no povo, por isso alegre estou!”.
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