sábado, 2 de fevereiro de 2019

Brumadinho: uma tragédia-crime humano-ambiental “anunciada”



No dia 25 (sexta-feira) de janeiro último, a barragem 1 do complexo Mina de Feijão, da mineradora Vale, rompeu-se em Brumadinho (MG), a cerca de 60 km de Belo Horizonte, na região metropolitana. Quase treze milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério despencaram da barragem atingindo a área administrativa da Vale, comunidades da região, e o rio Paraopeba, na Bacia do Rio São Francisco. 
A queda da barragem aconteceu pouco mais de três anos depois da do Fundão, em Mariana, até então considerada a maior tragédia-crime humano-ambiental da história do país. 
Na noite do dia 27 (domingo), o Corpo de Bombeiros informou que pelo menos 60 pessoas morreram. Nos dois primeiros dias foram resgatadas 192 pessoas e no terceiro dia de buscas nenhum sobrevivente foi encontrado. O Instituto Médico Legal  já identificou 19 corpos.
O Corpo de Bombeiros informou também que 292 pessoas são consideradas desaparecidas. A queda da barragem em Brumadinho já fez mais vítimas que o desastre de Mariana (19 mortos), em 2015.
A partir do dia 28 (segunda-feira) começaram a ser utilizados equipamentos trazidos por uma missão israelense. Segundo o governo de Minas Gerais, 136 militares israelenses (médicos, engenheiros, bombeiros e técnicos) - que chegaram ao Brasil na noite do dia 27 - já estão auxiliando nos trabalhos de buscas e salvamentos das vítimas da barragem.
A Justiça de Minas Gerais bloqueou R$ 11 bilhões da Vale para compensar os danos provocados pelo rompimento da barragem.
Que compensação é essa? Não é uma tapeação? Não é uma hipocrisia? Será que, bloqueando alguns bilhões de reais, tudo estará resolvido? Os responsáveis pela tragédia-crime da mineradora Vale e do Poder Público não deveriam ser presos, julgados e condenados?
Conforme foi divulgado, somente Minas Gerais conta com 450 barragens e 22 delas não têm garantia de estabilidade. O que está sendo feito pelas autoridades para evitar novos rompimentos de barragens?
No caso de Brumadinho (como no de Mariana e mais ainda), trata-se de uma tragédia-crime humano-ambiental “anunciada”, de uma perversidade e crueldade inimaginável: fruto de “um sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida - DA 385) ou - em outras palavras - de um "sistema nefasto", que considera "o lucro como o motivo essencial do progresso econômico, a concorrência como lei suprema da economia, a propriedade privada dos bens de produção como um direito absoluto, sem limites nem obrigações correspondentes" (São Paulo VI. Desenvolvimento dos Povos - PP 26).
O sistema capitalista neoliberal - uma violência estrutural permanente, institucionalizada e legalizada - coloca o “deus dinheiro” como um valor absoluto, a serviço do qual tudo pode e deve ser sacrificado, inclusive a vida do ser humano e de todo o meio ambiente. “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6, 24).
“Pergunto-me se somos capazes de reconhecer que estas realidades destrutivas correspondem a um sistema que se tornou global. Reconhecemos que este sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza? Se é assim - insisto - digamo-lo sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos... E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”. É um sistema que “exclui, degrada e mata!”. “Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que atinja também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença” (Papa Francisco. 2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15).
Quanto sofrimento, quanta dor e quanta destruição na tragédia-crime de Brumadinho por causa da ganância por dinheiro dos poderosos e do descaso das autoridades!
Outro mundo é possível e necessário! Lutemos por ele! Como cidadãos e cidadãs conscientes, como homens e mulheres de fé não podemos perder a esperança. A vitória é nossa!

Brumadinho noticias

Os militares israelenses vão ajudar nas buscas por vítimas do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, da empresa Vale, em Brumadinho

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 01 de fevereiro de 2019

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