quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O julgamento do "mensalão" no STF

O chamado “mensalão” é o esquema de compra de votos (de apoio político) de parlamentares com dinheiro público e de lavagem de dinheiro, que é considerado o maior escândalo do governo Lula, em 2005/2006. Na acusação dos réus do mensalão no STF, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que o esquema funcionava "entre quatro paredes" do palácio presidencial e pediu a prisão imediata de eventuais condenados. "Quando falo de quatro paredes, falo das paredes da Casa Civil, de algo que transcorria dentro do palácio da Presidência da República". O chefe do Ministério Público Federal disse ter sofrido intimidações e "ataques grosseiros" após entregar suas alegações finais. "Houve tentativa de constrangimento e intimidação do procurador-geral da República, o que jamais havia ocorrido, o que mostra que nós temos uma quadrilha extremamente arrogante." Gurgel pediu aos ministros do STF que a corte estabeleça um "paradigma histórico". "(Peço) desde já a expedição dos mandatos de prisão cabíveis imediatamente após a realização do julgamento". Gurgel considerou "risível" o discurso de que o mensalão não passou de um "delírio". "Jamais um delírio foi tão solidamente (...) documentado e provado". E repetiu que trata-se do mais "atrevido" e "escandaloso" esquema de corrupção do Brasil. O procurador-geral apontou o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu como o mentor da quadrilha. Dedicou 25 minutos das quase 5 horas de discurso a Dirceu, e disse que "a prova é contundente contra o ex-ministro. Procurou também justificar a ausência de provas documentais da ação de Dirceu, alegada pela defesa. "O autor intelectual, quase sempre, não fala ao telefone, não envia mensagens eletrônicas, não assina documentos, não movimenta dinheiro por suas contas, agindo por intermédio de `laranjas'. A prova da autoria do crime não é extraída de documentos ou de perícias, mas essencialmente da prova testemunhal". Gurgel deu uma ênfase especial aos repasses de dinheiro a deputados em épocas de votações importantes no Congresso, como as reformas tributária e previdenciária, ocorridas entre setembro e dezembro de 2003. Dos 38 réus, o procurador-geral pediu a absolvição por falta de provas do ex-ministro Luiz Gushiken e do assessor partidário Antônio Lamas (Cf. Felipe Seligman, Flávio Ferreira, Márcio Falcão e Rubens Valente. Mensalão - o julgamento. Folha de S. Paulo, 04/08/12, p. A4). E ainda: o ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza, responsável pela denúncia do mensalão no STF, afirma que, tanto na denúncia quanto nas alegações finais do Ministério Público, existem evidências "certas e determinadas" da compra de apoio político. "Não há dúvida nenhuma quanto a isso". O Ministério Público Federal considera o mensalão o mais "atrevido" escândalo de corrupção do país e apresenta as provas sobre a existência de uma "sofisticada quadrilha". Souza rejeita a tese de que houve caixa dois. "A convicção do Ministério Público é que não foi caixa dois". "Toda aquela movimentação financeira, pagamentos na calada da noite, às escondidas, em dinheiro vivo, à margem do sistema bancário, revela algo ilícito que não poderia ser à luz do dia". Souza afirma que o Ministério Público foi justo na acusação e cauteloso em todo o processo (Cf. Márcio Falcão. Mensalão - o julgamento. Folha de S. Paulo, 10/08/12, p. A4). Os advogados de defesa dos réus tentam desqualificar o mensalão. Alguns, como Márcio Thomaz Bastos (que foi chamado o “deus” dos criminalistas) e outros, são crimininalistas famosos e de muita experiência. Recebem honorários astronômicos e não se importam se o dinheiro tem origem em práticas de corrupção ou não. Com oportunismo descarado, sem nenhuma preocupação com a verdade e com a ética, usam todos os artifícios jurídicos possíveis para conseguir absolver seus clientes, mesmo sabendo que são culpados. Por razões venais jogam, sem nenhum escrúpolo, sua dignidade humana no lixo. Trata-se realmente de uma prática repugnante. É verdade que todo ser humano, mesmo o maior criminoso, tem direito à defesa, mas sempre dentro de critérios baseados na justiça. "Não podemos ser justos se não formos humanos" (Vauvenarques, Luc de Clapiers). No dia 18 de maio do corrente ano, escrevi um artigo com o título: O caso do mensalão: até quando ficará impune? (Veja nos sites: http://www.dmdigital.com.br/novo/#!/view?e=20120518&p=23; http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=67048 e outros) Para manter a impunidade usam-se diversas artimanhas. Cito só algumas, amplamente divulgadas na imprensa: - A artimanha de gerar incertezas e dúvidas sobre a existência do mensalão, dizendo que se trata de um “delírio” e que o mensalão não existiu; - A artimanha de retardar a ação judicial com recursos processuais, para que o julgamento não acabe antes das eleições municipais de 7 de outubro, evitando, assim, o desgaste e o dano que eventuais condenações poderiam causar nos partidos políticos envolvidos; - A artimanha de caracterizar a distribuição de dinheiro do mensalão como mera caixa dois, uma infração menor do ponto de vista legal; - A artimanha de usar todos os meios para não perder os clientes endinheirados; - A artimanha de querer salvar a qualquer custo a imagem dos partidos políticos envolvidos no mensalão, decorrente do julgamento (“quem não deve, não teme”); - A artimanha de acompanhar o julgamento de forma discreta, visando “fechar o capítulo”; - A artimanha de pedir aos partidos políticos, envolvidos no mensalão, para manter a aparência de calma; - A artimanha de fazer o possível para que a pauta dos telejornais não seja concentrada no julgamento do mensalão; - A artimanha de desqualificar as provas sobre a existência de uma “sofisticada quadrilha”; - A artimanha de dizer que a acusação é desprovida de provas; - A artimanha de elogiar os advogados de defesa dos réus do mensalão. Infelizmente o STF é - parece - muito dividido: alguns ministros pró-condenação e outros pró-absolvição. “O julgamento assemelha-se a uma competição eleitoral, com dois partidos disputando uma vaga: a de fazer justiça” (Joaquim Falcão. Quem tem razão, Barbosa ou Lewandowski? Folha de S. Paulo, 19/08/12, p. A4). A sociedade espera que o STF julgue os réus do mensalão com isenção e com justiça, tendo como único critério de julgamento a verdade dos fatos. Inclusive, os culpados devem ser punidos e obrigados a devolver aos cofres públicos o dinheiro subtraído ilicitamente. Caso isso não aconteça, o STF ficará totalmente desmoralizado frente à opinião pública. "Três coisas devem ser feitas por um juiz: ouvir atentamente, considerar sobriamente e decidir imparcialmente" (Sócrates). "Não procure tornar-se juiz se não tiver força para eliminar a injustiça. Do contrário, você se acovardaria diante de um poderoso e mancharia a sua própria integridade" (Eclo 7,6). Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 03/09/12, p. 02 http://www.dmdigital.com.br/novo/#!/view?e=20120903&p=21 http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&langref=PT&cod=70042 Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano

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