"Eu anuncio a
vocês a Boa Notícia,
que será uma grande
alegria para todo o povo” (Lc 2, 10)
O Evangelho de Lucas
diz que, estando José e Maria em Belém, chegou a hora de Maria dar à luz. Como
“não havia lugar para eles dentro de casa” (Lc 2, 7), Jesus nasceu num estábulo,
“rejeitado” e “excluído” pela sociedade da época. Maria o enfaixou e o colocou
numa manjedoura. “Veio para a sua casa, mas os seus não o receberam" (Jo
1, 11). Jesus - diríamos hoje - nasceu como “sem-teto”.
Antes de encontrar
abrigo num estábulo, José e Maria, grávida de Jesus, perambularam nas ruas e
praças de Belém, bateram em muitas portas, que - por serem pobres - sempre se
fechavam na frente deles. Dormiram - penso eu - debaixo das marquises nessas
mesmas ruas e praças. Hoje diríamos que Jesus, ainda no seio de Maria, foi
“morador de rua”.
Os pastores foram os
primeiros que receberam a Boa Notícia do Natal de Jesus. "Eu anuncio a
vocês a Boa Notícia, que será uma grande alegria para todo o povo: hoje, na
cidade de Davi, nasceu para vocês um Salvador, que é o Messias, o Senhor. Isto
lhes servirá de sinal: vocês encontrarão um recém-nascido, envolto em faixas e
deitado na manjedoura" (Lc 2, 10-12).
Os pastores foram às
pressas se encontrar com José e Maria, e o recém-nascido. Voltaram louvando e
glorificando a Deus, e tornaram-se os primeiros anunciadores da Boa Notícia do
Natal de Jesus.
Quem eram os
pastores? Eram pessoas "odiadas por não respeitar as propriedades alheias,
ocupando-as com seus rebanhos e cobrando preços exorbitantes pelos produtos. Um
pastor - segundo o Talmud babilônico - não podia ser eleito ao cargo de juiz ou
testemunha nos tribunais, por causa da má fama e do desrespeito à
propriedade" (Pe. José Bortolini, Roteiros homiléticos. Paulus, 2006, p. 3
- Missa da noite de Natal). Os pastores não eram, portanto, considerados
"pessoas de bem". Eram - diríamos hoje - os “sem-terra” da época de
Jesus.
E o Natal de Jesus,
hoje? Quem são os pastores, hoje? A partir da nossa realidade e à luz da
mensagem do Evangelho, podemos afirmar que os pastores são, hoje:
- os “moradores de
rua”, que a sociedade hipócrita, injusta e excludente considera “lixo humano” e
que são barbarmante assassinados, com a anuência silenciosa das chamadas
“pessoas de bem”;
- os “sem-teto”, que,
como verdadeiros heróis e verdadeiras heroínas, lutam incansavelmente pelo
direito à moradia digna;
- os “sem-terra”,
que, unidos e organizados em movimentos, combatem o latifúndio, reivindicam uma
verdadeira reforma agrária e defendem o direito à terra de trabalho;
- os “presos”, que,
considerados a escória da sociedade, vivem nas cadéias (verdadeiros depósitos
de “lixo humano”) em condições degradantes e subumanas;
- os “desempregados”,
que, como massa sobrante,
descartável e excluída do direito à cidadania, não encontram trabalho para
poder sustentar com dignidade a si e a suas famílias;
- os “subempregados”
que são explorados por empresas gananciosas, que visam somente o lucro;
- os “trabalhadores”,
que - mesmo empregados, na rede pública ou privada - trabalham o dia inteiro e
ganham um salário de fome;
- os “doentes”, que,
por omissão de socorro, morrem à mingua, devido a uma saúde pública, que é uma
verdadeira calamidade;
- os “jovens”, que -
envolvidos no mundo das drogas, por falta de políticas públicas de qualidade -
são cruelmente exterminados;
- enfim, “todos
aqueles e aquelas” que - solidários com os empobrecidos, oprimidos e excluídos
da sociedade - denunciam profeticamente as injustiças e lutam, com muito amor e
esperança, por um mundo novo, que, à luz da Fé, é o Reino de Deus, acontecendo
na história humana e cósmica.
Hoje, são estes os
pastores, os primeiros que recebem, com alegria, a Boa Notícia do Natal de Jesus
em seu meio. Hoje, são estes os pastores, que, louvando e glorificando a Deus,
se tornam os primeiros anunciadores dessa Boa Notícia para todos nós.
Há poucos dias,
recebi da Pastoral do Povo da Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
- que acompanho de perto - o convite (o mais honroso da minha vida) para ajudar
a servir o almoço a cerca de 100 Moradores de Rua e para almoçar junto com
eles. Conversando com os Moradores de Rua, fiquei profundamente impressionado
com a sensibilidade humana desses nossos irmãos e irmãs, sofridos e
“descartados” pela sociedade.
Fiquei também muito
sensibilizado e edificado pelo testemunho de ternura com que a Neusa, a
Madalena e a equipe de voluntários trataram os Moradores de Rua. Todos
receberam uma cesta de Natal, preparada com carinho e amor de irmãos e irmãs.
Para mim e para todos
e todas que estávamos lá, foram eles e elas os primeiros e as primeiras que -
numa situação de muito sofrimento - receberam, com grande alergria e esperança,
a Boa Notícia do Natal de Jesus. Foram eles e elas os primeiros e as primeiras
que anunciaram essa Boa Notícia para todos e todas nós.
No juízo final, “os
justos perguntarão: Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de
comer? Ou com sede e te demos de beber? E quando te vimos como estrangeiro e te
acolhemos? Ou nu e te vestimos? E quando te vimos enfermo ou preso e fomos te
visitar? O Rei responderá: em verdade vos digo: todas as vezes que fizestes
isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,
37-40)
Atenção, meus irmãos
e minhãs irmãs! Não nos iludamos, procurando a Boa Notícia do Natal de Jesus onde
ela não se encontra. Procuremo-la onde ela realmente se faz ouvir e onde ecoa
com toda força profética. Feliz Natal!.
Leia também os
artigos:
Jesus,
o “sem-teto” de Belém,
em:
Jesus,
“morador de rua” em Belém, em:
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