Como
professor de Filosofia aposentado da Universidade Federal de Goiás (UFG)
- com muita honra - uno-me aos estudantes, funcionários e funcionárias, professores
e professoras, pesquisadores e pesquisadoras da UFG nas homenagens prestadas à
Universidade pelos seus 63 anos de existência.
Não
pude estar fisicamente presente na sessão solene da Assembleia Legislativa de
Goiás (ALEGO), proposta pela deputada Bia de Lima (06/12/23) e da Câmara
Municipal de Goiânia (14/12/23: dia do aniversário à noite), mas estou
unido a todos e todas vocês. A UFG merece!
Na
sessão solene da Câmara Municipal de Goiânia, a reitora Angelita Pereira de
Lima, em seu discurso, lembra-nos que a Instituição “mesmo sendo uma
Universidade jovem, figura entre as mil melhores do mundo em todos os rankings”.
E conclui: “Temos muito que comemorar e celebrar e, principalmente, muito a
agradecer à Comunidade externa” (O Popular, 15/12/23, p. 20). No artigo “A UFG
nasceu para ser de Goiás”, a reitora escreve: “Em 2023, a UFG posicionou-se nos
principais rankings internacionais entre as 5% maiores e melhores do mundo” e
“está entre as 20 melhores do país” (Ib., 20/12/23, p. 3).
Como
eterno aprendiz de filósofo - em homenagem à UFG pelos seus 63 anos de
existência - coloco para nossa reflexão (no breve espaço de um artigo) uma
questão que considero de fundamental importância, sobretudo hoje, na vida das
Universidades: a questão da “não-neutralidade” ou da “não
possibilidade da indiferença política” da ciência.
Embora
essa questão refira-se a todos os momentos do processo do Conhecimento -
comum (a maioria dos nossos conhecimentos, mesmo dos cientistas, são do
Conhecimento comum), científico, filosófico e teológico - devido ao
extraordinário desenvolvimento das Ciências - ela é particularmente sentida e
debatida quando se trata do Conhecimento científico.
Em sentido amplo, Conhecimento científico
é todo Conhecimento metódico e sistemático; em sentido estrito, é o Conhecimento
metódico e sistemático que se fundamenta na observação rigorosa e
na verificação experimental dos fatos ou fenômenos. O objeto do
Conhecimento científico pode ser a realidade natural (o mundo material e vivente)
e/ou a realidade humana (o mundo especificamente humano). O sujeito do
Conhecimento científico é sempre o Ser humano.
Portanto, do ponto de vista do objeto do
Conhecimento, podemos distinguir as Ciências em "Ciências naturais" e
"Ciências humanas"; do ponto de vista do sujeito do Conhecimento,
todas as Ciências são "Ciências humanas".
À postura da chamada “neutralidade
científica” podemos fazer uma "crítica
externalista" e uma "crítica
internalista".
A "crítica externalista" procura revelar os mecanismos que
condicionam externamente a prática científica. "Esse tipo de crítica,
que investiu contra a concepção ingênua, segundo a qual a ciência seria um
produto do espírito desligado das situações socialmente determinadas, tem
mostrado que as ideias científicas partem necessariamente de um contexto
social, são favorecidas ou entravadas por ele, mas, de qualquer forma, dependem
dele como contexto de gênese, como o solo do qual brotam. Com mais ênfase, esse
tipo de crítica tem mostrado que a atividade científica não se esgota em puro
Conhecimento, pura ideia, mas retorna ao meio social na forma concreta de
utilização prática de seus resultados. Dessa maneira, a crítica à neutralidade
científica situa a atividade científica no contexto social mais amplo mostrando
que ele é, ao mesmo tempo, o contexto de gênese e de utilização do Conhecimento
científico" (MENDONÇA, W. Sobre a Neutralidade Científica, em
"Encontros com a Civilização Brasileira", 12 (1979) 226. Cf. também:
JAPIASSU, H. O mito da neutralidade científica. Imago, Rio de Janeiro, 1975).).
A "crítica externalista" à “neutralidade
científica” é "muito sensível aos aspectos institucionais da prática
científica, frequentemente deixados de lado pelo discurso da Filosofia da Ciência".
Ela contribui "para orientar uma ação política a respeito da ciência"
e representa "um verdadeiro progresso para a compreensão das implicações
sociais do Conhecimento científico" (Ib.). Não consegue, porém, vincular definitivamente Conhecimento científico e
sociedade, negando, assim, a possibilidade da neutralidade científica.
A "crítica
internalista" à neutralidade científica - mesmo reconhecendo a
importância da crítica ideológica ao contexto social de gênese e de utilização
do Conhecimento científico - estende
esta mesma crítica ao contexto específico da prática científica, isto é, ao
espaço interno da ciência.
Ela mostra que "antes de qualquer
aplicação específica do Conhecimento, há uma ligação profunda entre o projeto
científico e o projeto social. Uma tentativa neste sentido exige que
o universo do discurso científico, por um lado, e o universo da palavra e da
ação correntes, por outro lado, sejam postos em correspondência como regidos
pela mesma lógica. Segundo este modo de ver as coisas, as regras que definem
as práticas sociais operam também nas abstrações do Conhecimento científico,
isto é, operam internamente no discurso da Ciência. Somente assim resulta
eliminada a separação entre conhecer e valorar, ou entre saber e agir; numa
palavra, somente assim mostra-se que o Conhecimento científico é fato
político" (Ib., p.
229).
Falamos
aqui do Conhecimento científico como atividade humana e não dos produtos
materiais obtidos através dele (exemplo: o computador). Estes, enquanto
formulações acabadas das teorias científicas, são os resultados finais da
pesquisa científica, ou seja, de todo o processo do Conhecimento científico e
não têm conotação político-ideológica (Cf. Ib., p. 227-228).
Por
fim, podemos dizer que - na Filosofia da Ciência - todas as ciências ganham um
sentido mais profundo e mais humano.
Feliz
Natal e um Ano Novo de muitas lutas e vitórias a todos/as da UFG e aos prezados/as
leitores/as.
Sugestão: leiam ou releiam -
nesses dias - os artigos “No Natal, Jesus tem lado” (2021) e “Natal
2022: que o lado de Jesus seja nosso lado” (2022): no IHU, no BLOG do Frei
Marcos ou em outros sites)
Marcos Sassatelli, Frade
dominicanoDoutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral
(Assunção - SP)Professor aposentado de Filosofia da UFGE-mail: mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 20 de dezembro de
2023
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