“Feliz de quem caminha na justiça,
diz a verdade e não engana o
semelhante!”
(Laudes,
3ª Semana, 4º feira, Antífona)
É realmente estarrecedor e repugnante tomar conhecimento
que o ato da mesa diretora da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, que -
desde outubro do ano passado - voltou a conceder o auxílio-moradia aos
deputados, foi transformado em lei.
Em Goiás, o auxílio-moradia aos
deputados começou a ser pago em 1999, no mesmo ano em que o benefício (melhor
seria dizer, o “malefício”) foi instituído na Câmara Federal.
Alegando
necessidade de economia, a Assembleia Legislativa de Goiás suspendeu o
pagamento do auxílio-moradia em fevereiro do ano passado, mas diversos
deputados, com base política no interior, reclamaram da medida, afirmando que
precisavam da verba para manter residência em Goiânia. Coitados dos deputados!
Dá até dó!
Em
outubro do mesmo ano, a Assembleia, por ato da mesa diretora, voltou a conceder
- como foi dito acima - o auxílio-moradia, que, reajustado, passou a ser de R$
2.859. Agora, o ato da mesa diretora daquela Casa virou lei, publicada no Diário Oficial do Estado (DOE),
no dia 27 deste mês de janeiro.
Henrique
Tibúrcio, presidente da OAB-GO, classificou a medida como imoral e afirmou: “a
decisão de cortar o benefício, no início de 2013, foi uma atitude de
responsabilidade com o dinheiro público, um dever cívico daqueles que são
eleitos para nos representar na Assembleia. É lamentável que a Casa tenha
voltado atrás na decisão”.
Que vergonha, senhores deputados! O
auxílio-moradia tornou-se uma imoralidade pública legalizada, uma grande
injustiça e uma verdadeira afronta aos trabalhadores e trabalhadoras.
Segundo
o deputado Helder Valin, presidente da Assembleia Legislativa, a transformação
em lei da medida tomada pela mesa diretora foi para “dar segurança à ação. Por
aqui - diz ele - sempre oficializamos esses benefícios por atos da mesa ou
resoluções. Pedi que a procuradoria da Casa fizesse um levantamento e
identificamos que na Câmara Federal transformaram essa questão em lei. Optamos
por fazer o mesmo aqui, para não pairar nenhuma dúvida quanto à legalidade”.
Que descaramento!
A
Assembleia entende que não há inconstitucionalidade na concessão do
auxílio-moradia. O deputado Helder Valin afirma: “tudo o que é pago aos
deputados estaduais tem por base o que é concedido na Câmara dos Deputados. Os
deputados aqui têm direito a 75% de todos os benefícios pagos por lá”.
A
OAB-GO entende que há inconstitucionalidade no pagamento do auxílio-moradia.
“Se não houver alteração textual - afirma Sérgio Leão, conselheiro da entidade
e advogado constitucionalista - não faz diferença o ato da mesa ou a lei. A
questão é que, como é pago, sem necessidade de comprovação do uso da verba para
o fim a que se destina, o valor é caracterizado como salário. E a Constituição
é clara quando diz que os membros do Legislativo receberão salário em única
parcela. Se não há regras, quer dizer que estão recebendo dois salários, o que
fere a Constituição”.
Alguns
deputados, querendo justificar a não necessidade de comprovação dos gastos,
despudoradamente afirmam que precisam do dinheiro para fazer campanha (leia:
para comprar votos) ou para “ajudar eleitores do interior, que sempre pedem
ajuda para formaturas ou festas religiosas”. Que hipocrisia!
Outro
argumento usado pelos deputados para justificar, com artifícios legais, a
falcatrua do auxílio-moradia é que os juízes e desembargadores do Tribunal de
Justiça de Goiás (TJ-GO) recebem também a verba, que é de 10% de seu vencimento
mensal, sem ter a necessidade de comprovar sua utilização.
Será que os senhores deputados não
sabem que uma imoralidade não justifica a outra (algo, aliás, muito elementar)!
Será que eles não precisam de algumas aulas de ética!
Diante da transformação do ato da mesa
diretora em lei, a OAB pediu novo estudo sobre o conteúdo da mesma e,
comprovando a inconstitucionalidade da concessão do auxílio-moradia, entrará
com ação civil pública para a suspensão do pagamento. Parabenizo a OAB-GO pela medida.
Em todo caso, quero afirmar que para
as pessoas que têm um mínimo de senso ético, a questão da legalidade/constitucionalidade
ou não do auxílio-moradia, é secundária. Nem tudo o que é legal, é ético. O que
é mais do que claro é que o auxílio-moradia - seja dos deputados estaduais e
federais, seja dos juízes e desembargadores - é uma imoralidade pública
acintosa e repugnante.
Por
fim, faço um pedido aos meios de comunicação de Goiás (os outros Estados
poderão fazer o mesmo) para que divulguem amplamente e em letras garrafais o
nome de todos os deputados estaduais e federais, e de todos os juízes e
desembargadores, que recebem o auxílio-moradia. Precisamos organizar -
sobretudo os jovens - uma grande campanha contra esses aproveitadores do povo, para
que sejam definitivamente banidos da vida pública.
“A
política, tão desacreditada, é uma sublime vocação, é uma das formas mais
preciosas da caridade (amor), porque busca o bem comum. (...) Rezo ao Senhor
para que nos conceda mais políticos, que tenham verdadeiramente a peito a
sociedade, o povo, a vida dos pobres” (Francisco. A Alegria do Evangelho - EG,
nº. 205). Ah! Como seria diferente a política se os nossos deputados tivessem
“verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres”! Uma outra política
é possível e necessária!. Lutemos por ela.
(O artigo foi elaborado utilizando
dados da reportagem: “Auxílio-moradia. Ato que cria benefício é transformado em
lei”, em O Popular, 28/01/14, p. 12).
Leia também os artigos:
- A volta do auxílio-moradia: uma
sem-vergonhice parlamentar,
em:
-
Uma Justiça “injusta”, em: