segunda-feira, 25 de agosto de 2025

“Penduricalhos”: uma artimanha para “legalizar” os supersalários

 


Segundo o DIEESE e o IBGE, no Brasil cerca de 34 milhões de trabalhadores/as recebem até um salário-mínimo, atualmente R$ 1.518,00. Isso representa cerca de 35,63% da população ocupada, ou seja, mais de 34,766 milhões de pessoas. Outra pesquisa do IBGE indica que 60% dos brasileiros/as vivem com até um salário-mínimo por mês.

Essa é a realidade de nossa sociedade capitalista neoliberal ou ultraneoliberal: uma sociedade estruturalmente irracional, injusta, desumana, antiética e anticristã, de uma iniquidade diabólica “institucionalizada”.

É repugnante deparar-se, volta e meia, com reportagens na imprensa e notícias nas redes sociais a respeito da criação desavergonhada de “penduricalhos” para socorrer as “necessidades fictícias” dos desembargadores, juizes, promotores, procuradores e parlamentares (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores).

Entre os muitos que poderiam ser relatados, cito - como exemplos - dois casos do Estado de Goiás:

Primeiro caso: Juízes do Tribunal de Justiça de Goiás chegam a ter a seguinte remuneração:

13 acima de R$ 100 mil; 11 entre R$ 90 mil e R$ 100 mil; 28 entre R$ 80 mil e R$ 90 mil; 19 entre R$ 70 mil e R$ 80 mil; 66 entre R$ 60 mil e R$ 70 mil; 229 entre R$ 50 mil e R$ 60 mil; 101 entre R$ 39,1 mil e 50 mil.

Todos (ou, quase todos) são vencimentos acima do teto constitucional: R$ 39,2 mil. Que vergonha! Uma imoralidade pública legalizada, institucionaliada e, às vezes, legitimada em nome de uma visão religiosa deturpada e hipócrita. Como podemos acreditar na “justiça” desses juízes!?

(Veja mais em: https://opopular.com.br/politica/juizes-do-tribunal-de-justica-de-goias-tem-remuneracão-superior-a-r-100-mil-1.1750259).

Segundo caso: “O Ministério Público de Goiás (MP - GO) pagou R$ 95 milhões em benefícios no primeiro semestre” (O Popular, 18 de agosto de 2025”. Manchete de primeira página).

“As indenizações de membros ativos do Ministério Público de Goiás (MP - GO) custaram R$ 95 milhões entre janeiro e julho de 2025. Neste período, a despesa bruta com esta categoria foi de R$ 267 milhões. Os dados foram consultados no Portal da Transparência do Órgão de controle.

As principais verbas indenizatórias, às quais os promotores e procuradores têm acesso, são auxílios alimentação, creche, saúde e transporte, além de licença-prêmio e abono pecuniário.

Estes benefícios se acumularam ao longo dos anos e foram apelidados de ‘penduricalhos’. Por terem natureza indenizatória, essas verbas não estão sujeitas ao corte do teto constitucional, contribuindo para o pagamento de supersalários” (ib. p. 4).

Resumindo, o Ministério Público de Goiás, de janeiro a julho de 2025, gastou com a Folha total: R$ 267.555.207,01; com a Verba indenizatória: R$ 95.086.248,81 (cf. ib.).

Essa realidade hipócrita - de uma iniquidade diabólica, que clama por justiça diante de Deus - é um insulto aos pobres.

Por fim, fica uma pergunta:

Por que os juízes e desembargadores, os promotores e procuradores de Goiás e do Brasil não criam uma verba indenizatória para os 60% dos brasileiros/as que vivem com até um salário-mínimo por mês (R$ 1.518,00)?

Enquanto não conseguirmos implantar o Projeto Social Popular (PSP) - comunitário e socialista no verdadeiro sentido da palavra - superando o Projeto Social Capitalista (PSC), seria o único “penduricalho” justo e ético.

A esperança nunca morre! A luta continua! Unidos/as e organizados/as, um dia chegaremos lá!

(Obs.: por “social” - no singular ou no plural - entendo: socioeconômico, sociopolítico, socioecológico ou socioambiental, sociocultural e sociorreligioso)

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)   
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282  

Goiânia, 24 de agosto de 2025



MST realiza plantio coletivo nos territórios de Reforma Agrária
em homenagem ao legado de Papa Francisco,
que nos deixou o apoio e a esperança de um futuro com justiça social.
28 de abril de 2025
https://mst.org.br/conteudo/galerias-de-imagens/



O Ser humano meta-histórico “além da morte” (2)

 


(Continua o mesmo tema do último artigo sobre o Ser Humano - parte 2)

Vimos que na existência histórica do Ser humano, o par psicológio angústia-esperança não pode ser separado e corresponde ao par ontológico: desamparo metafísico-plenitude subsistencial. A coexistência destes momentos na vida humana é orgânica e forma uma unidade substancial.

No Ser humano, "a angústia é o sentimento de nosso desamparo ontológico e a esperança é o pré-sentimento de nossa plenitude subsistencial. Há ocasiões em que é a angústia que tem voz cantora e mal-e-mal conseguimos então escutar, simultaneamente, as apagadas vozes da esperança. Outras vezes, apodera-se de nós um bem-estar inefável e ascensional que quase nos faz esquecer que no fundo de nosso ser ainda cisma - embora levemente - a angústia" (DEL VALLE, A. Basave. Filosofia do homem. Fundamentos de Antropologia metafísica. Convívio, São Paulo, 1975, p. 95).

Todo Ser humano pode dizer: "meu afã de plenitude subsistencial existe somente em função de superar meu desamparo ontológico. E meu desamparo ontológico se faz tão-só patente porque tenho um afã de plenitude subsistencial. A plenitude alcançada é sempre relativa e está ameaçada pelo desamparo. Mas, por sua vez, o desamparo se vê corrigido, amparado em parte, pelo afã de plenitude subsistencial que se projeta com toda a sua intenção significativa. Este afã de plenitude subsistencial, mesmo que se dê no tempo, não está submetido ao tempo. Trata-se de um testemunho irrecusável da egrégia vocação humana, de uma humilde submissão do Ser humano integral à sua interioridade aberta para o ser e para a Deidade. Meu afã de plenitude subsistencial, com toda sua significação 'meta-histórica', participa na plenitude absoluta, primeira e transcendente”.

Em outras palavras, “meu afã de plenitude subsistencial, que se me apresenta coexistindo orgânica e dialeticamente com meu desamparo ontológico, com minha insuficiência radical, em forma parecida ao contraponto musical, implica a Plenitude Subsistente e Infinita da qual provém, precisamente, meu concreto afã de plenitude que se dá no tempo. Se existe nosso afã de plenitude subsistencial - o que é um fato evidente - então existiu desde sempre uma Plenitude Subsistente, porque se não tivesse existido, não se dariam todos os nossos concretos afãs de vida e de mais vida. 

Nessa situação humana concreta - e a partir dela - é compreensível que “o primeiro ato do meu afã subsistencial seja o de dirigir um chamamento à Plenitude Infinita que suscita todos os afãs de plenitude. Sem um fundamento em Deus, inicial e final, meu concreto afã de plenitude subsistencial não encontra solução. (...) A razão de ser última de nosso afã de plenitude subsistencial não se encontra numa idéia, mas sim unicamente num Ser Plenário, existente em si e por si" (Ib. p. 263-264. Ver também o pensamento de M. BLONDEL sobre a exigência de Infinito do Ser humano).

O caminho, pois, que parte do "real humano" tenta responder à pergunta: por que o Ser humano histórico "descobre existencialmente" o Absoluto? Chega-se à descoberta da dimensão meta-histórica do Ser humano “além da morte” e da existência do Absoluto pela intuição existencial. O Ser humano histórico, intelectualmente aberto e disposto a viver a vida em profundidade, descobre o Absoluto (Deus) nas coordenadas (na dinâmica, no redemoinho) da própria existência e no encontro interpessoal, pois o Absoluto - de uma forma ou de outra - está sempre presente na vida do Ser humano histórico.

É no encontro interpessoal que Deus se manifesta ao Ser humano histórico e ele adere - livre e concretamente - ao Absoluto. O "existir-perante-Deus" é a possibilidade última e suprema do "existir humano". O Absoluto confere ao "existir humano" a autenticidade definitiva, suscitanto no Ser humano histórico a paz, a alegria e a unidade interior.

As "situações existenciais", particularmente as "situações-limites" (como o fracasso, o sofrimento, o mal, a morte) e a exigência de moralidade (justiça) nos levam a Deus, fundamento do Ser nos seres existentes. Na adesão ao Absoluto - como resposta a um apelo do ser - o Ser humano histórico experimenta sua existência, simultaneamente, como liberdade e como dádiva (dom) de Deus. Quanto mais o Ser humano histórico é livre, tanto mais ele é seguro que não existe (não é) por si mesmo, mas que existe (é) pelo Absoluto e que o Absoluto existe (é) por si mesmo (Ver, a respeito da descoberta existencial de Deus, o pensamento de S. KIERKEGAARD, de K. JASPERS e de G. MARCEL. Cf. também HERRERO, X. O problema de Deus, em "Síntese Nova Fase" 11 (1977) 29-43). 

(No próximo artigo sobre o Ser Humano, continua o mesmo tema: parte 3)

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)   
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282  

https://freimarcos.blogspot.com/ - Goiânia, 16 de julho de 2025

                                                                                                      




O artigo foi publicado originalmente em: 

https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano-meta-historico-alem-da-morte-2/ (19/08/25)

 

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Mais um despejo diabólico em S. Antônio do Descoberto

 


No dia 4 deste mês de agosto começou o perverso e diabólico despejo de mais de 1,6 mil pessoas - trabalhadores e trabalhadoras - de cerca 400 famílias de Antinha de Baixo, no município de Santo Antônio do Descoberto - GO

No primeiro dia do despejo, moradores e moradoras tiveram suas casas demolidas durante uma megaoperação - de uma crueldade e iniquidade inimagináveis - que mobilizou diversos órgãos governamentais. Na região moram famílias de pequenos agricultores. Algumas dessas famílias possuem documentação que comprava mais de um século no local e outras que chegaram na última década.

O Tribunal de (In)Justiça do Estado de Goiás - num ato legal e institucional totalmente desumano e antiético - autorizou o despejo forçado, por ordem do desembargador Breno Caiado, primo do governador Ronaldo Caiado e nomeado por ele.

O processo que autoriza o despejo corre há décadas e já contou com a atuação de diversos familiares do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que alegam ser herdeiros das terras.

Ronaldo Caiado - com a pretensão de ser presidente (que Deus nos livre!) - e os familiares responsáveis pelo despejo - se comportaram como verdadeiros demônios.

Reafirmo mais uma vez: todo despejo é injusto, desumano, antiético e anticristão. Pessoa humana não se despeja.

Deixo a Ronaldo Caiado e aos seus familiares, responsáveis pelo despejo diabólico de Antinha de Baixo, a advertência de Jesus no Evangelho de domingo passado (3 deste mês de agosto).

“Do meio da multidão, alguém disse a Jesus: ‘Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo’. Jesus respondeu: ‘Homem, quem foi que me encarregou de julgar ou dividir os bens entre vocês?’ Depois Jesus falou a todos e a todas: ‘Atenção! Tenham cuidado com qualquer tipo de ganância. Porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a sua vida não depende de seus bens’.

E contou-lhes uma parábola: ‘A terra de um homem rico deu uma grande colheita. E o homem pensou: ‘O que vou fazer? Não tenho onde guardar minha colheita’. Então resolveu: ‘Já sei o que fazer! Vou derrubar meus celeiros e construir outros maiores; e neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: ‘meu caro, você possui um bom estoque, uma reserva para muitos anos; descanse, coma e beba, alegre-se’! Mas Deus lhe disse: ‘Louco! Nesta mesma noite você vai ter que devolver a sua vida. As coisas que você acumulou, para quem vão ficar?’”

(Lc 12,13-20).

Uma advertência: Senhor Ronaldo Caiado e familiares, responsáveis pelo despejo de S. Antônio do Descoberto, não se esqueçam: Deus é justo. “Nesta mesma noite você vai ter que devolver a sua vida”. “Esta mesma noite”, pode ser hoje, amanhã ou depois. Só Deus sabe. Mas com certeza a justiça será feita. E a justiça de Deus é verdadeira! Não é a “justiça” dos “grileiros de terras”. Aguardem!

Por fim, parabenizo o Vereador Fabrício Rosa, o deputado estadual Mauro Rubem, outros políticos e outras políticas que são totalmente solidários e solidárias para com os trabalhadores e as trabalhadoras diabolicamente despejados.  Estamos juntos e juntas. A luta continua!

Um Brasil Novo queremos! Um Mundo Novo queremos!

Vejamos o Vídeo abaixo e meditemos!

         
 
Do vereador Fabricio Rosa


Do Deputado Estadual Mauro Rubens





Foto: Gabriel / Ascom Dep. Mauro Rubem)



Marcos Sassatelli, Frade dominicano
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https://freimarcos.blogspot.com/ - Goiânia, 06 de agosto de 2025

 



terça-feira, 5 de agosto de 2025

Projeto Social Popular x Projeto Social Capitalista

 


(Por “social”, entendo: sociopolítico, socioeconômico, socioecológico ou socioambiental, sociocultural e sociorreligioso).

Muitos Políticos dos Partidos Populares (chamados de esquerda: PT e companhia), que em teoria defendem o Projeto Social Popular (PSP), na prática procuram quase sempre fazer aliança com Políticos dos Partidos Capitalistas, que defendem o Projeto Social Capitalista (PSC) neoliberal.

Ora, o Projeto Social Popular (PSP) e o Projeto Social Capitalista (PSC) são Projetos opostos e a aliança (que significa “comunhão”) entre Políticos dos dois Projetos é impossível.

O que pode haver, entre esses Políticos, são somente acordos pontuais em situações concretas que não podem esperar e que precisam ser resolvidas o mais rápido possível.

Mesmo nessas situações, os Políticos dos Partidos Populares devem ter consciência da ambiguidade desses acordos pontuais: por um lado, eles resolvem, ao menos provisoriamente, situações sociais graves e urgentes; por outro lado, reforçam o Projeto Social Capitalista (PSC).

Sugiro que, no início do mandato, o Governo Federal de Políticos dos Partidos Populares crie ou (se já existe) renove e faça funcionar regularmente o Conselho Nacional Popular (CNP), formado pelos membros do Governo (Presidente e Ministros/as) e por representantes - representativos - das Organizações Sociais Populares (Movimentos Populares, Partidos Populares, Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras, Movimentos de Estudantes, Associações de Mulheres e outros/as).

Esse Conselho - ao menos por enquanto - não pode ser oficial, porque não é contemplado na Constituição Federal, mas pode e deve ser público, como são públicas as atividades das Organizações Sociais Populares. Todos e todas devem conhecer e poder dar sugestões.

Na atual situação social, o Conselho Nacional Popular (CNP) deve ser a expressão concreta das Organizações Sociais Populares no Poder. Chega de Governos que - mesmo sem querer - são “reformistas” e fortalecem o Capitalismo, total e estruturalmente irracional, desumano e antiético.

O Conselho Nacional Popular (CNP) precisa se reunir periódica e publicamente (não oficialmente) para fazer uma análise crítica da conjuntura, na ótica das Organizações Populares - a ótica dos Pobres - que leve o Governo Federal a abrir caminhos novos e a tomar consciência dos passos que podem e devem ser dados para fazer acontecer o Projeto Social Popular (PSP).

Três questões fundamentais deveriam e ainda devem ser analisadas pelo Conselho Nacional Popular (PSP). Primeira: Por que, depois de quase quatro Governos Federais do PT e Partidos aliados, chegamos ao Governo Bolsonaro? Quais as causas? Segunda: O que o atual Governo Federal pode e deve fazer para não chegar a outro Governo Federal parecido ou pior que o de Bolsonaro? Terceira: Quais os passos que o Governo Federal pode e deve dar hoje para que o Projeto Social Popular (PSP) comece a acontecer em nossa realidade?  

De 21 a 25 de julho - Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, Dia Internacional da Agricultura Familiar e Dia do Trabalhador e da Trabalhadora Rural - o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) promoveu a Semana Camponesa com o lema “Para o Brasil alimentar, Reforma Agrária Popular”: uma Jornada Nacional de Lutas, com mobilização em 22 capitais do Brasil e a participação de cerca 17 mil militantes Sem Terra. O objetivo foi: pressionar o Governo por medidas concretas para a Reforma Agrária Popular.

Nessa Semana Camponesa foi divulgada a “Carta do MST à Sociedade Brasileira” (21/07/25). A Carta - depois de reconhecer que “estamos em luta para ecoar nossa voz coletiva em todo o país, que se conecta ao sentimento da sociedade brasileira e do Presidente Lula na defesa incondicional da soberania nacional, ameaçada pelo imperialismo e pelas ações de Donald Trump” - afirma:

“No entanto, a ameaça à nossa soberania popular e nacional também tem vindo de dentro do próprio país, com a subordinação da nossa agricultura às empresas transnacionais e com as ações do Poder Legislativo, representante dos interesses do agronegócio e da mineração”.

E ainda: “A Reforma Agrária Popular é um instrumento de defesa das terras do país, em contraposição ao agronegócio entreguista, golpista, saqueador e antipatriótico. Soberania nacional só é possível com soberania alimentar. E a soberania alimentar se constrói com a agricultura familiar camponesa e com a Reforma Agrária Popular” (os grifos são meus).

O MST reconhece que: “após quase três anos de Governo Lula, a Reforma Agrária Popular continua paralisada”. Ora, “as famílias acampadas e assentadas se perguntam: Lula, cadê a Reforma Agrária Popular?”  E continuam dizendo: “Somos milhares de Sem Terra! São mais de 122 mil famílias, organizadas em 1.250 acampamentos em todo o país, que precisam de terra para trabalhar e viver. Cerca de 400 mil famílias assentadas seguem à espera de políticas públicas que existem, mas não chegam à base, para melhorar a produção de alimentos e o desenvolvimento dos assentamentos”.

Recordo, agora, alguns passos que podiam e ainda podem ser dados:

Apoiar e fortalecer a agricultura familiar camponesa, que já é responsável por 70% dos produtos consumidos no Brasil. Taxar os super-ricos e reduzir a jornada de trabalho sem redução salarial. Assentar em moradias dignas todos os Trabalhadores e Trabalhadoras das Ocupações rurais e urbanas. Além da Reforma Agrária Popular, precisamos da Reforma Urbana Popular.

E (um dia, quem sabe?) reapropriar-se do supérfluo dos ricos - que é o necessário dos pobres “roubado legalmente” - e devolvê-lo aos seus legítimos proprietários (os próprios pobres).

S. Tomás de Aquino ensina: “ninguém tem direito ao supérfluo, quando o outro ou a outra não tem o necessário”. Como estamos longe ainda da verdadeira justiça!

A luta pelo Projeto Social Popular (PSP) continua! Esperançar é preciso! Desistir nunca!

(Confira a Carta do MST na íntegra: https://mst.org.br/2025/07/21/mst-divulga-carta-a-sociedade-brasileira-em-defesa-da-reforma-agraria-popular-e-da-soberania-nacional/


                                    
                  Foto: Francisco Proner                                                                                                           Foto: Luisa Medeiros 





Marcos Sassatelli, Frade dominicano,
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP) 
e Professor aposentado de Filosofia da UFG.
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br - Cel. e WA: (62) 9 9979 2282 -

https://freimarcos.blogspot.com/ - Goiânia, 31 de julho de 2025






segunda-feira, 14 de julho de 2025

O Ser humano meta-histórico “além da morte” (1)

 


Nos três últimos artigos refletimos sobre o Ser humano meta-histórico (meta-social e meta-individual) “já e ainda não”.

Neste, vamos começar a refletir sobre o Ser humano meta-histórico (meta-social e meta-individual) “além da morte”.

Na existência histórica do Ser humano, encontramos, fundamentalmente, dois "caminhos" ("vias") que nos levam: o primeiro, a descobrir a necessidade da existência de Deus (o Outro absoluto), Fonte (Fundamento) do ser nos seres ou (em linguagem teológica) de Deus Criador; o segundo, a descobrir, diretamente, a dimensão da meta-historicidade humana “além da morte” e, indiretamente, a existência de Deus.

O primeiro "caminho" parte do "real" como tal (portanto, também do "real humano"). Antes de tudo, tenta responder à pergunta: por que existe o "real"? Esta pergunta é racional e perfeitamente legítima. Não basta explicar o real e mostrar como funciona (que é o papel das ciências); é preciso também questionar a própria existência do real. "Se se consegue não só 'falar' esta questão, mas também 'pensá-la' realmente, percebe-se que a existência do real, considerado no seu todo, faz surgir uma outra questão: ele não explica a sua própria existência (...). O real 'existe', é um ponto, eis tudo" (PODEUR, L. Imagem moderna do mundo e fé cristã. Paulinas, São Paulo, 1977, p. 131).

É esta a "contingência" do real. Se pararmos por aqui, o "real" torna-se um "absurdo". Continuemos o movimento da razão que interroga, inscrevendo o próprio real num contexto emglobante. "Neste caso, a existência do real (...) torna-se exigência de um fundamento (...). Somos levados então a propor a hipótese de uma fonte, da qual nada sabemos a não ser que seria 'completamente diferente' do mundo, porque seria o fundamento do mundo e ela mesma não teria que ter um fundamento" (ib., p. 132).

Chegamos, assim, ao tema da "presença ontólogica" de Deus - em linguagem filosófica - ou "presença criadora” de Deus (criação) - em linguagem teológica.

A hipótese da existência de um Deus - fundamento do ser nos seres existentes - não é irracional e irreal. "Mesmo que a ciência pudesse explicar cabalmente as existências que aparecem e desaparecem do universo, ela não poderia dizer nada a respeito da existência como tal da realidade: ela simplesmente a pressupõe e funciona tomando-a por base" (ib.).

Em seguida, o "caminho", que parte do "real" como tal, tenta responder à pergunta: qual é o "sentido" do real? É próprio do Ser humano histórico procurar um "sentido" (um "significado") não só para a sua existência, mas também para o "real" (a "realidade") considerado em si mesmo (e não neste ou naquele indivíduo).

O conhecimento "científico" dos mecanismos do real (material e vivente) - mesmo supondo a ciência totalmente acabada (o que é impossível na condição existencial do Ser humano) - não oferece nenhum dado concernente à existência e à natureza do sentido (significado) último das coisas (cf. ib., p. 133-134). Portanto, "a afirmação de um Deus-fundamento pode inserir-se em nossa concepção do real sem opor-se ao projeto científico e sem obrigar, por nada deste mundo, a repor em questão os nossos conhecimentos do universo" (ib., p. 134).

O segundo "caminho" - que nos leva a descobrir, diretamente, a meta-historicidade do Ser humano “além da morte” e, indiretamente, a existência de Deus - parte do "real humano" (da realidade humana). Antes de tudo, tenta responder à pergunta: por que o Ser humano "necessita estruturalmente" de Infinito? A "necessidade estrutural" (a "exigência estrutural") de Infinito mostra que o Ser humano histórico - embora limitado em suas possibilidades - é infinito em seus anseios e aspirações (tensões, projeções); ele vive em estado de busca permanente e nunca se satisfaz; ele anseia uma plenificação, ou seja, uma vida plena (completa), uma realização plena (total), que possa trazer-lhe uma felicidade plena (verdadeira).

Será que tais anseios (aspirações) são infundados e levam o Ser humano histórico à frustração (e/ou ao desespero), ou será que são fundados e levam este mesmo Ser humano histórico à esperança? Sua vida desenvolve-se numa contínua disputa entre a angústia (ou a inquietude constante) - que pode levar, às vezes, à frustração e/ou ao desespero - e a esperança - que leva ao Absoluto, ao Infinito (Veja o pensamento de S. Agostinho a respeito da inquietude constante do Ser humano).

Na existência histórica do Ser humano, "o par angústia-esperança não se pode cindir. Este par psicológico corresponde a este outro par ontológico: desamparo metafísico-plenitude subsistencial. A coexistência destes momentos na vida humana é orgânica e forma uma unidade substancial. Os vaivéns da vida devem-se ao predomínio do sentimento de nosso desamparo ontológico ou ao predomínio do pré-sentimento de nossa plenitude subsistencial. No 'ser contingente' ('ens contingens') que é o Ser humano, há um desfiladeiro para o nada e uma escada para o Absoluto. Somos, os humanos, um misterioso amálgama de nada e de eternidade" (DEL VALLE, A. Basave. Filosofia do homem. Fundamentos de Antropologia metafísica. Convívio, São Paulo, 1975, p. 95).

(No próximo artigo sobre o Ser humano continua o mesmo tema: parte 2)

 

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)   
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https://freimarcos.blogspot.com/ - Goiânia, 15 de maio de 2025









O Artigo foi publicado originalmente em

https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano-meta-historico-alem-da-morte-1/   (10/07/25)

segunda-feira, 7 de julho de 2025

Uma imoralidade pública - covarde, cruel, perversa e diabólica

 


No dia 2 deste mês de julho - na derrubada das casas na Comunidade da Ocupação do Setor Estrela Dalva, Região Noroeste de Goiânia - o prefeito Sandro Mabel foi de uma covardia, crueldade e perversidade diabólicas. Os moradores construíram - e ainda estavam construindo - suas casinhas com material, comprado quase sempre à prestação e com dinheiro tirado da própria alimentação.

Que desumanidade! O senhor, prefeito Sandro Mabel e seus apoiadores, foram uma prova concreta de que o demônio existe. Não dá para entender como um ser humano possa ser tão mau!

Faço agora uma advertência. Prefeito Sandro Mabel, se o senhor não pedir perdão publicamente da gravíssima imoralidade que praticou para com nossos irmãos e irmãs pobres da Ocupação do Setor Estrela Dalva e não reparar o prejuízo que causou aos seus moradores, reconstruindo suas casas, brutalmente demolidas e quitando, se necessário, suas prestações do material de construção com o seu próprio dinheiro (e não o dinheiro da Prefeitura), lembre-se:

- pagará muito mais caro diante de Deus;

- a justiça de Deus pode tardar, mas não falha.

Aguarde! “Os caminhos de Deus são justos e verdadeiros” (Ap 15,3). “Deus ama o seu Povo e exalta os pobres com a vitória” (Sl 14,4).

“Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas! Vocês são como sepulcros caiados: por fora parecem bonitos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e podridão! Assim também vocês: por fora, parecem justos diante dos outros, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e injustiça. Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas!” (Mt 23,27-29).

Jesus, no caso do prefeito Sandro Mabel e companhia limitada, diria: “Ai de vocês fariseus hipócritas, que derrubam as moradias dos pobres e adoram o deus dinheiro!”.

Por fim, afirmo mais uma vez (nunca é demais): do ponto de vista humano, ético e cristão (radicalmente humano) “todo despejo é injusto” e, se tiver liminar da “Justiça”, é mais injusto ainda, porque se torna uma injustiça legalizada e institucionalizada. Pessoa humana não se despeja como se fosse “lixo degradável”.

E ainda: só existem três casos, nos quais os moradores e moradoras de uma Ocupação podem ser removidos e removidas com dignidade.

Primeiro: se for uma área com risco de vida para seus moradores. Nesse caso, a remoção deve ser realizada o mais rápido possível e o Poder Público tem a obrigação de pagar o aluguel social até que outras casas dignas estejam prontas para serem ocupadas.

Segundo: se for uma área de utilidade pública. Nesse caso, a remoção só pode ser realizada depois que outras casas estiverem prontas para serem ocupadas.

Terceiro:  se for uma área de preservação ambiental. A remoção só pode ser feita como no caso anterior.

Todo terreno abandonado para especulação imobiliária (dos adoradores do deus dinheiro) não só pode, mas deve ser ocupado pelas pessoas que não têm moradia digna: direito humano fundamental de todos e de todas.

Como cristão, eu também sou Igreja (Comunidade dos seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré) e não posso ficar calado. O silêncio é um grave pecado de omissão. O meu lado é o lado de Jesus de Nazaré: o lado dos pobres, dos marginalizados, dos explorados, dos excluídos e dos descartados: os e as que - nessa sociedade capitalista, estruturalmente irracional, desumana, antiética e anticristã - não têm voz e não têm vez.

Reafirmo: senhor prefeito, Sandro Mabel, aguarde a justiça de Deus!

A luta continua e a esperança nunca morre...



02/07/25


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
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A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos