“Ai daqueles que fazem leis injustas e
daqueles que escrevem sentenças de opressão, para negar a justiça ao fraco e
fraudar o direito dos pobres do meu povo”
(Is 10,1-2)
O Tribunal absolveu o
tenente-coronel José Divino Cabral, o sargento Rorion Alves Martins, o tenente
Weldel de Jesus Costa, os capitães Alessandri da Rocha Almeida e Wilmar Rubens
Alves Rodrigues e o tenente Eduardo Bruno Alves. “Os cinco primeiros foram
denunciados por omissão, homicídio qualificado (com uso de recurso que
impossibilitou a defesa da vítima) e tentativa de homicídio, enquando o último
foi acusado de tortura”. A razão para a absolvição é: “a materialidade dos
crimes foi comprovada pelos exames de laudos cadavéricos, mas não houve
comprovação da autoria” (O Popular, 25/06/14, p. 2).
Reparem:
foram necessários 9 anos para absolver os policiais militares e não mandá-los a
júri popular. Por que tanto tempo? Será que não foi para esfriar os ânimos e
deixar que os fatos caíssem no esquecimento? Será que não foi proposital e de
má-fé? Dá para desconfiar!
Como
diz José Rafael de Menezes, “o julgar é ato subjetivo, pois a própria palavra
‘sentença’ provém de ‘sentir’, como sentimento do magistrado. A sentença é então
aquilo que o juiz sente” (A
personalidade intelectual do magistrado. Nossa Livraria, Recife, 1996,
p. 16). Só que há aí um “porém”. Em princípio, o “sentir” do juiz deveria
brotar sempre de sua coerência ética e de seu compromisso com a defesa da
justiça e dos direitos humanos. Muitas vezes, porém, não é isso que acontece e
o “sentir” do juiz brota da sua conivência e comprometimento com os interesses
dos governantes e poderosos, em detrimento dos pobres e oprimidos. O caso do
Parque Oeste Industrial é um dos símbolos mais gritantes da impunidade
legalizada.
Fazendo
a memória dos principais fatos do despejo da Ocupação “Sonho Real” (no Parque
Oeste Industrial), em fevereiro de 2014 escrevi: “apesar de o governador
Marconi Perillo ter prometido publicamente que não iria mandar retirar as
famílias da Ocupação, de 6 a 15 de fevereiro de 2005, de 0 às 6h, a Polícia
Militar do Estado de Goiás começou a ação de reintegração de posse, realizando
a chamada ‘Operação Inquietação’, que foram dez dias de tortura física e
psicológica coletiva. Cercou a área com viaturas, impediu a entrada e a saída
de pessoas e cortou o fornecimento de energia elétrica. Com as sirenes ligadas,
com o barulho de disparos de armas de fogo, com a explosão de bombas de efeito
moral, gás de pimenta e lacrimogêneo, a Polícia Militar promoveu o terror entre
os Moradores da Ocupação e provocou traumas psicológicos nas crianças. Que
maldade! Nenhuma lei permite uma Operação noturna criminosa como essa.
No
dia 16 de fevereiro de 2005, a Polícia Militar do Estado de Goiás realizou uma
verdadeira Operação de Guerra, cinicamente chamada ‘Operação Triunfo’.
Participaram da Operação 1,8 mil policiais. Em uma hora e quarenta e cinco
minutos, cerca de 14 mil pessoas foram despejadas de suas moradias de maneira
violenta, truculenta e sem nenhum respeito pela dignidade da pessoa humana. A
Operação Militar produziu duas vítimas fatais (Pedro e Vagner), 16 feridos à
bala, tornando-se um desses paraplégico (Marcelo Henrique) e 800 pessoas
detidas (suspeita-se com razão que o número dos mortos e feridos seja bem
maior). Esses crimes - apesar de muitas promessas - continuam até hoje impunes.
Nessa
Operação Militar criminosa, ilegal e imoral, todos os Direitos Humanos
fundamentais foram gravemente violados: o Direito à Vida, o Direito à Moradia,
o Direito ao Trabalho, o Direito à Saúde, o Direito à Alimentação e à Água, os
Direitos da Criança e do Adolescente, os Direitos da Mulher, os Direitos dos
Idosos e os Direitos das Pessoas com Necessidades Especiais” (Leia a íntegra do
artigo: 16 de fevereiro de 2005: uma data
que não pode ser esquecida, em: http://www.dm.com.br/jornal/#!/view?e=20140216&p=20
ou
Enfim,
podemos dizer que, no caso do Parque Oeste Industrial, uma coisa é certa.
Independentemente das provas que incriminam cada um dos militares acima citados,
a Operação “Inquietação” e a Operação “Triunfo”, pela maneira como foram
planejadas e executadas, são duas Operações criminosas (ilegais, inconstitucionais
e imorais) enquanto tais, em sua
totalidade. Até um débil mental sabe disso! Os responsáveis por essas Operações
criminosas foram, e ainda são, o então Governador do Estado de Goiás, Marconi
Perillo e seus auxiliares imediatos, o Secretário de Segurança Pública e
Justiça do Estado de Goiás, Jônathas Silva e o Comandante Geral da Polícia
Militar do mesmo Estado, Cel. Marciano Basílio de Queiroz. São eles que, em
primeiro lugar, devem ser processados, julgados e condenados. Lembrem-se os
responsáveis: a justiça dos homens pode falhar, mas a justiça de Deus não falha!
A
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República tem a obrigação
constitucional e, sobretudo, ética de “federalizar” - com urgência e sem
enrolação - essas Operações criminosas do Parque Oeste Industrial, em Goiânia -
GO. A absolvição dos militares pelo TJ-GO, que - conforme me contaram - saíram do
Tribunal com um sorriso sarcástico, é mais um motivo para que isso seja feito o
quanto antes. Se a Secretaria não o fizer, passará à história como conivente
com o crime. Chega de omissão! Justiça, já!
Assine
(se ainda não o fez) o Abaixo-assinado “Federalização
já” em: http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=P2012N21783.
Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 09 de julho de 2014