sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Medellín em gotas: 19ª - Pastoral familiar



No documento “Família e Demografia”, a II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho de Medellín - depois de apresentar a realidade da família latino-americana e caribenha, refletir sobre o papel da família nessa mesma realidade e tratar da questão demográfica - faz, no final, algumas recomendações para a pastoral familiar.

A Conferência parte de uma constatação: “Por vários fatores históricos, étnicos, sociológicos e até caracterológicos, a instituição familiar sempre teve, na América Latina (e Caribe), uma importância global muito grande. É certo que nas grandes cidades perde parte de sua importância. Nas áreas rurais, que formam ainda a maior parte do continente, apesar de todas as transformações externas, a família continua a desempenhar um papel primordial tanto no campo social, quanto no cultural, no ético ou no religioso”.

Afirmam os bispos: “Por isso e mais ainda pela condição da família de formadora de pessoas, educadora na fé e promotora do desenvolvimento (da vida), mas também a fim de sanar todas as carências de que ela padece e que tem graves repercussões, julgamos necessário dar à pastoral familiar uma prioridade na planificação da pastoral de conjunto”. E ainda: “Sugerimos que esta seja planejada em diálogo com os casais que, por sua experiência humana e pelos carismas próprios do sacramento do matrimonio, podem auxiliar eficazmente em sua elaboração”.

Segundo a Conferência, a pastoral familiar “deve conter, entre outras coisas, as seguintes metas e orientações fundamentais:

1.    Procurar, desde os anos da adolescência, uma sólida educação para o amor que

integre e, ao mesmo tempo, ultrapasse a simples educação sexual, inculcando nos jovens de ambos os sexos a sensibilidade e a consciência dos valores essenciais: amor, respeito, dom de si mesmo etc.

2.    Difundir a ideia e facilitar, na prática, uma preparação para o matrimônio, acessível

a todos os que vão se casar e tão integral quanto possível: física, sociológica, jurídica, moral e espiritual.

3.    Elaborar e difundir uma espiritualidade matrimonial baseada simultaneamente numa clara visão do cristão leigo no mundo e na Igreja, e numa teologia do matrimônio como sacramento.

4.    Inculcar nos jovens em geral e sobretudo nos casais jovens a consciência e a convicção de uma paternidade realmente responsável (...).

5.    Despertar nos esposos a necessidade do diálogo conjugal que os leve à unidade profunda e a um espírito de corresponsabilidade e colaboração.

6.    Facilitar o diálogo entre pais e filhos que ajude a superar, no seio da família, o conflito de gerações e torne o lar ‘um lugar onde se realize o encontro das gerações’ (GS 52).

7.    Fazer com que a família seja verdadeiramente uma ‘igreja doméstica’: comunidade de fé, de oração, de amor, de ação evangelizadora, escola de catequese etc.

8.    Levar todas as famílias a uma generosa abertura para as outras famílias, inclusive de concepções cristãs diferentes; e sobretudo para as famílias marginalizadas ou em processo de desintegração; abertura para a sociedade, para o mundo e para a vida da Igreja”.


Finalmente - declara a Conferência - “queremos estimular os casais que se esforçam por viver a santidade conjugal e realizam o apostolado familiar, bem como os que, ‘de comum acordo, de forma bem ponderada, aceitam com magnanimidade uma prole mais numerosa para educá-la condignamente’ (GS 50)”.

Os bispos concluem dizendo: “Bem planejada e bem executada mediante os movimentos familiares, tão meritórios, ou mediante outras formas, a pastoral familiar contribuirá, certamente, para fazer de nossas famílias uma força viva (e não, como poderia acontecer, um peso morto) a serviço da construção da Igreja, do desenvolvimento (da promoção da vida) e da realização das necessárias transformações em nosso continente”.

Todas as “metas e orientações” do documento “Família e demografia” para a pastoral familiar são de fundamental importância e continuam plenamente atuais.

Destaco duas: Primeira: as famílias precisam ser “comunidades de fé, de oração, de amor e de ação evangelizadora”. Segunda: as famílias precisam ter “uma generosa abertura para as outras famílias, inclusive de concepções cristãs diferentes; e sobretudo (reparem!) para as famílias marginalizadas ou em processo de desintegração; para a sociedade, para o mundo e para a vida da Igreja”.

A pastoral familiar deve colaborar na formação de famílias cristãs profundamente humanas, sensíveis aos desafios do mundo de hoje, que saibam escutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho e, por fim, que sejam verdadeiras “Igrejas domésticas em saída”, em missão. 

A pastoral familiar não pode criar clubinhos de amigos e amigas, fechados sobre si mesmos, com mentalidade elitista e preocupados somente com seus próprios interesses (mesmo que sejam espirituais) ou, no máximo, com os interesses de sua Paróquia. Se fizer isso, estará incentivando o “egoísmo familiar” ou “paroquial”.
           E a nossa pastoral familiar? Como está sendo? Quais são seus principais objetivos? Meditemos!


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Descrição: Descrição: Resultado de imagem para Fotos da II Conferência Episcopal da América Latina e Caribe em Medellín, 1968

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 28 de novembro de 2018

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Medellín em gotas: 18ª - Questão demográfica



No documento “Família e Demografia” - que é o terceiro - a II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho de Medellín - depois de apresentar a realidade da família latino-americana e caribenha e refletir sobre o papel da família nessa mesma realidade - trata da questão demográfica.
Afirma: “A questão demográfica em nosso continente reveste-se de uma complexidade e delicadeza peculiares”. De um lado, é certo “que existe um rápido crescimento da população” (índice de nascimento, índice de mortalidade infantil baixo mas não satisfatório, índice de longevidade crescente); de outro lado, é certo também “que a maioria de nossos países sofre de subpopulação e precisa de um aumento demográfico como fator de desenvolvimento”; e ainda “que as condições sócio-econômico-culturais, excessivamente baixas, se mostram adversas a um crescimento demográfico pronunciado”.
Os bispos, conscientes de sua responsabilidade, declaram: “Como pastores, sensíveis aos problemas de nossa gente, fazendo nossas suas dores e angústias, julgamos
necessário enunciar os seguintes pontos sobre esta matéria”:
  1. Todo enfoque unilateral e toda solução simplista a respeito desses problemas são incompletos e equívocos. “Aparece como particularmente daninha a adoção de uma política demográfica antinatalista que tende a suplantar, substituir ou relegar ao esquecimento uma política de desenvolvimento (promoção da vida) mais exigente, mas a única aceitável. ‘Trata-se, com efeito, não de suprimir os comensais e sim de multiplicar o pão’ (Paulo VI)”.
  2. A Encíclica Vida Humana (Humanae Vitae - HV), pelo seu caráter social, tem - ao lado da Desenvolvimento dos Povos (Populorum Progressio - PP) - uma importância especial para o nosso continente. Ante nossos problemas e aspirações, a HV:
  1. “Acentua a necessidade imperiosa de sair ao encontro do desafio dos problemas demográficos com uma resposta integral e orientada para o desenvolvimento (promoção da vida).
  2. Denuncia toda política fundada num controle indiscriminado da natalidade, isto é, a qualquer preço e de qualquer maneira, sobretudo quando se torna condição de ajuda econômica.
  3. Ergue-se como defensora dos valores inalienáveis como: o respeito à pessoa humana, especialmente dos pobres e dos marginalizados, o valor da vida, o amor conjugal.
  4. Contém um apelo e um estímulo à formação integral das pessoas mediante uma autoeducação dos casais, cujos elementos principais são: o autodomínio, a rejeição de soluções fáceis, mas perigosas por serem alienantes e deformadoras, a necessidade da graça de Deus para o cumprimento da lei, a fé como estimuladora da existência e um humanismo novo, livre do erotismo da civilização burguesa etc.”.
  1. O próprio Papa Paulo VI - diz a Conferência - reconhece que a aplicação da Encíclica na parte a que se refere à ética conjugal, ”aparecerá facilmente aos olhos de muitos como difícil e até impossível na prática” (HV 20).
Os bispos, conhecedores dessas dificuldades e empenhados em oferecer seu apoio a todos/as que procuram viver o ideal que a HV propõe, indicam os seguintes pontos:  
  1. “O ensinamento do magistério na Encíclica é claro e inequívoco a respeito da exclusão dos meios artificiais para tornar voluntariamente infecundo o ato conjugal (HV).
  2. Mas o próprio Santo Padre reafirmou, ao inaugurar a Conferência: ‘Esta norma não constitui uma cega corrida para a superpopulação nem diminui a responsabilidade, nem a liberdade dos cônjuges, a quem não se proíbe uma honesta e razoável limitação da natalidade, nem impede os meios terapêuticos legítimos, nem o progresso das investigações científicas’ (Discurso ao inaugurar a II Conferência Episcopal Latino-americana).
  3. A vida sacramental, sobretudo como caminho para uma progressiva maturidade humana e cristã do matrimônio, é um direito e, mais ainda, um dever, e corresponde a nós, pastores, facilitar esse caminho aos casais cristãos.
  4. A ajuda mútua que os casais se proporcionam ao reunirem-se, apoiados por peritos em ciências humanas e sacerdotes imbuídos do espírito pastoral, pode ser inestimável aos que, apesar de suas dificuldades, procuram alcançar o ideal visado.
  5. Formulamos o propósito, e procuraremos cumpri-lo, não só de prestar ‘nosso serviço às pessoas que lutam com essas dificuldades, com o coração de bom pastor’ (HV, e Discurso de abertura da II Conferência), mas também, e de modo especial, de hipotecar nossa solidariedade aos casais que sofrem, por meio do exemplo de nossa própria abnegação pessoal e coletiva, na pobreza real, no celibato assumido com sinceridade e vivido com seriedade e alegria, na paciência e dedicação aos seres humanos, na obediência à palavra de Deus e, sobretudo, na caridade elevada até ao heroísmo”.
A Conferência, inspirada na HV, apresenta o ideal humano e cristão (radicalmente humano) do matrimônio (vida matrimonial) e da família (vida familiar) para nossa realidade latino-americana e caribenha.
Refletindo, porém, sobre esse ideal, podemos levantar alguns questionamentos:
  • O que entendemos por “meios artificiais” e “meios naturais”? Tem sentido fazer essa distinção? Os “meios naturais” são somente os “meios biológicos” (ou seja, os meios que seguem os ritmos biológicos do corpo humano)? Numa visão existencial integral da natureza humana, os meios que - à luz da razão iluminada pela fé - um casal cristão escolhe para fazer - com responsabilidade e amor à vida - o seu planejamento familiar, não são “meios naturais”?
  • Temos a capacidade de reconhecer, entender, respeitar e valorizar as etapas da caminhada de crescimento de cada casal e de cada família - em sua situação histórica concreta - rumo ao ideal apresentado?
  • Sabemos aceitar (sem julgar e sem condenar) - reconhecendo seus valores - situações familiares diferentes, como as uniões homoafetivas (LGBTs)?               
Jesus foi sempre muito humano e respeitoso para com as pessoas. Era a partir de sua realidade que Jesus suscitava nas pessoas a capacidade de abrir novos horizontes e encontrar novos caminhos de vida. Lembremos, por exemplo, o seu encontro com a samaritana (cf. Jo 4,5-42) e com a mulher pecadora (cf. Lc 7,36-50).
Jesus só não tolerava a hipocrisia e a falsidade: “Raça de cobras venenosas! Se vocês são maus como podem falar coisas boas? Pois a boca fala aquilo de que o coração está cheio” (Mt 12, 34). Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas! Vocês são como sepulcros caiados: por fora, parecem justos diante dos outros, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e injustiça” (Mt 23,27-28). Pensemos!



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Descrição: Descrição: Resultado de imagem para Fotos da II Conferência Episcopal da América Latina e Caribe em Medellín, 1968


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 21 de novembro de 2018

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Medellín em gotas: 17ª - Papel da família



No documento “Família e Demografia” - que é o terceiro - a II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho de Medellín - depois de apresentar a realidade da família latino-americana e caribenha - reflete sobre o seu papel nessa mesma realidade.

Começa retomando as palavras do Concílio Vaticano II: “A força e o vigor da instituição matrimonial e familiar se evidenciam igualmente: as profundas mudanças sociais contemporâneas, não obstante as dificuldades a que dão origem, manifestam muitas vezes, de várias maneiras, a verdadeira índole dessa instituição” (A Igreja no mundo de hoje - GS 47)

Continua dizendo: “É portanto necessário ter em conta os valores fundamentais que a doutrina da Igreja atribui à família cristã para que a ação pastoral leve as famílias latino-americanas a conservar ou a adquirir esses valores que as capacitem a cumprir sua missão”.

Entre esses valores, a Conferência - em suas linhas de reflexão - assinala três especificamente: “a família formadora de pessoas, educadora na fé e promotora do desenvolvimento” (da vida). 

1.    Formadora de pessoas

Os bispos retomam novamente o ensinamento do Concílio Vaticano II: “A família recebeu diretamente de Deus a missão de ser célula primeira e vital da sociedade” (Apostolado dos Cristãos Leigos - AA 11,3).

“É, pois, dever dos pais, criar um ambiente de família animado pelo amor, pela piedade para com Deus e para com os seres humanos que promova a educação íntegra, pessoal e social dos filhos”. E ainda: “Cada ser humano continua a ter o dever de salvar a integridade da pessoa humana, na qual sobressaem os valores da inteligência, da vontade, da consciência e da fraternidade... Como mãe e alimentadora desta educação acha-se em primeiro lugar a família” (GS 61).

A Conferência afirma: “Essa doutrina do Concílio Vaticano II nos faz ver a urgência de a família cumprir sua tarefa de formar personalidades integrais, e para tanto conta com muitos elementos”.

“Realmente a presença e influência dos modelos distintos e complementares do pai e da mãe (masculino e feminino), o vínculo do afeto mútuo, o clima de confiança, intimidade, respeito e liberdade, o quadro de vida social com uma hierarquia (ou melhor, uma comunhão) natural mas matizada pelo clima de afeto, tudo converge para que a família se torne capaz de plasmar personalidades fortes e equilibradas para a sociedade”.

2.    Educadora na fé

Os bispos retomam mais uma vez o ensinamento do Concílio Vaticano II: “Os esposos cristãos são para si mesmos, para seus filhos e demais familiares, cooperadores da graça e testemunhas da fé. São para seus filhos os primeiros pregadores e educadores na fé” (AA 11) e devem “inculcar a doutrina cristã e as virtudes evangélicas aos filhos amorosamente recebidos de Deus” (A Igreja - LG 41,5), e realizar esta missão “mediante a palavra e o exemplo” (LG 11), de tal maneira que “graças aos pais, que precederão com o exemplo e a oração na família, os filhos e ainda os demais que vivem no círculo familiar, encontrarão mais facilmente o caminho do sentido humano, da salvação e da santidade” (GS 48).

A Conferência reconhece: “Sabemos que muitas famílias da América Latina foram incapazes de se tornarem educadoras na fé, ou por não estarem bem constituídas, ou por estarem desintegradas e outras, ainda, porque vêm dando esta educação em termos de mero tradicionalismo, às vezes até com aspectos míticos e supersticiosos. Daí a necessidade de se dotar a família atual de elementos que lhe restituam a capacidade evangelizadora, de acordo com a doutrina da Igreja”.

3.    Promotora do desenvolvimento (da vida)

Os bispos retomam outra vez as palavras do Concílio Vaticano II: “A família é a primeira escola das virtudes sociais necessárias às demais sociedades... É aí que os filhos fazem a primeira experiência de uma sã sociedade humana... É através dela que os filhos vão sendo introduzidos gradativamente na sociedade civil e na Igreja” (Educação Cristã - GE 3). Além disso, “a família é a escola do mais rico humanismo”, e “o humanismo completo é o desenvolvimento Integral”.

Considerando, pois, que “na família convivem diversas gerações que se ajudam mutuamente para adquirir uma sabedoria mais completa e estabelecer os direitos das pessoas com as demais exigências da vida social, sabemos que ela constitui o fundamento da sociedade” (GS 52).

“Nela, os filhos, num clima de amor, aprendem mais facilmente a reta ordem das coisas (valores), enquanto que formas culturais comprovadas vão penetrando como que naturalmente no espírito dos adolescentes, à medida que estes vão crescendo” (GS 61).

“Aos pais cabe preparar, no seio da família, os filhos para conhecerem o amor de Deus para com todos os seres humanos; ensinar-lhes, gradativamente, sobretudo pelo exemplo, a solicitude pelas necessidades materiais e espirituais do próximo” (AA 30), e assim a família cumprirá sua missão e “promoverá a justiça e demais boas obras a serviço de todos os irmãos que padecem necessidade” (AA 11).

Por ser a família um fator importantíssimo no desenvolvimento, “o bem-estar da pessoa e da sociedade humana está ligado estreitamente a uma situação favorável da comunidade conjugal e familiar” (GS 47). Conclui fazendo um pedido: “Por isso todos os que têm influência nas comunidades e grupos sociais devem trabalhar eficazmente para a promoção do matrimônio e da família” (GS 52).

O ensinamento de Medellín sobre o papel da família continua atual e é uma luz para a pastoral familiar. Dizer que a família é “promotora de desenvolvimento” e que “o humanismo completo é o desenvolvimento integral”, significa dizer que a família é promotora da vida do ser humano no mundo, com o mundo, com os outros/as (semelhantes) e com o Outro absoluto (Deus).

Por isso, retomando e aprofundando perspectivas já presentes no Concílio Vaticano II, Medellín torna-se a fonte de inspiração da Teologia da Libertação: uma reflexão à luz da fé a partir da práxis (unidade dialética de prática e teoria) de libertação dos pobres e oprimidos (e seus aliados/as) da América Latina e Caribe e do mundo inteiro. Os teólogos entenderam que sem a libertação de tudo que impede a vida não há “humanismo completo” ou “desenvolvimento integral”.

“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4,18-19). “Eu vim para que todos/as tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).

A família - reconhecendo e respeitando as situações familiares diferentes da que foi apresentada, como as uniões homoafetivas (LGBTs) - deve ser promotora da libertação e da vida, e a Teologia - se for verdadeira - deve ser da Libertação e da Vida.





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Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 14 de novembro de 2018

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Felizes os que promovem a Paz Infelizes os que vão à guerra



     No Brasil - como em muitos outros países - vivemos numa democracia formal, que - na realidade - é uma “elitecracia”. A elite capitalista neoliberal, com seus meios de comunicação, manipula a seu bel-prazer a consciência do povo. Os detentores do poder econômico - que são os opressores do povo - com sua esperteza demoníaca, conseguem a façanha de serem “hospedados agradavelmente” na consciência dos oprimidos. É a ditadura do “deus dinheiro” e de seus adoradores, na qual o cidadão - dominado ideologicamente - torna-se um joguete de seus meios de comunicação.
    “Os donos da ‘elitecracia’ querem sempre garantir a sua impunidade. Daí a existência do foro privilegiado (por prerrogativa de função) para mais de 20 mil autoridades no Brasil. Isso é resquício dos tempos aristocráticos, que previam privilégios para os monarcas e para os ‘nobres’ (ou seja, para as castas)”. (https://professorlfg.jusbrasil.com.br/noticias/402371523/poderosos-estao-sendo-investigados-ha-mais-de-10-anos-no-stf-fim-do-foro-privilegiado-por-que-nao-pensar-num-brasil-diferente).   “Os filhos deste mundo são mais expertos que os filhos da luz” (Lc 16,8). Um Brasil diferente é possível! Por que não pensar nisso?!
O presidente eleito, Jair Bolsonaro - que é fruto da façanha da “elitecracia” brasileira - apresenta-se como um homem “honesto”, que “foi eleito por Deus”, que “tem Deus no coração”; que coloca o “Brasil acima de tudo” e “Deus acima de todos”; que chama o seu superministro  Sérgio Moro de “soldado que está indo à guerra, sem medo de morrer”.
     O importante não é falar o nome de Deus a todo momento para agradar a sensibilidade religiosa do povo e, ao mesmo tempo, enganá-lo. O importante é saber qual é a representação que Jair Bolsonaro tem de Deus. Com certeza, o Deus dele não é o Deus de Jesus de Nazaré, que é Amor e que não pede a ninguém de “ir à guerra”. Jesus - que é o Emanuel, o Deus conosco, que caminha conosco - diz “Felizes os que promovem a Paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). Pela lei dos opostos, podemos dizer: “Infelizes os que vão à guerra, porque serão chamados filhos do demônio”.
     Bolsonaro afirma que a luta por um Brasil novo e a busca de parcerias nas relações internacionais devem acontecer sem “viés ideológico”. Essa afirmação já é com viés ideológico. O ser humano é um ser histórico, situado (num lugar) e datado (num tempo). Portanto, tudo o que o ser humano pensa, diz e faz é com viés ideológico (é ideológico). No comportamento humano não existe neutralidade. Ora, o problema não é pensar e agir com viés ideológico (sendo ideológico), mas é saber se a nossa ideologia promove a libertação e a vida ou produz a opressão e a morte.
Para sermos humanos, éticos e, sobretudo, cristãos (radicalmente humanos) - devemos combater e lutar contra toda corrupção. Precisamos lembrar, porém, que existem dois tipos de corrupção: a pessoal e a estrutural. A primeira é o comportamento corrupto de pessoas (governantes, políticos e outras); a segunda, que é muito mais grave e cria as condições favoráveis à prática da corrupção pessoal, é a corrupção sistêmica, institucionalizada e legalizada, que é considerada natural e normal (até em nome de Deus).
    Combater somente o comportamento corrupto das pessoas, sem combater a corrupção estrutural, ou seja, sem lutar para mudar as estruturas injustas, é uma atitude hipócrita, que serve para legitimar e fortalecer o “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida, 385) dominante.
     Um exemplo dessa corrupção estrutural é a desigualdade gritante que existe no Brasil. “Quase 30% da renda do Brasil está nas mãos de apenas 1% dos habitantes do país, a maior concentração do tipo no mundo. É o que indica a Pesquisa Desigualdade Mundial 2018, coordenada, entre outros, pelo economista francês Thomas Piketty. O grupo, composto por centenas de estudiosos, disponibilizou banco de dados que permite comparar a evolução da desigualdade de renda no mundo nos últimos anos” (https://www.pragmatismopolitico.com.br/2018/06/brasil-pais-mais-desigual-do-mundo.html).
     Jesus adverte: “Ai de vocês, os ricos, porque já têm a sua consolação! Ai de vocês, que agora têm fartura, porque vão passar fome! Ai de vocês, que agora riem, porque vão ficar aflitos e irão chorar! Ai de vocês, se todos os elogiam, porque era assim que os antepassados deles tratavam os falsos profetas!” (Lc 6,24-26).
    No 2ª Encontro Mundial dos Movimentos Populares, o Papa Francisco - com toda clareza - afirma: “Os seres humanos e a natureza não devem estar a serviço do dinheiro. Digamos não a uma economia de exclusão e desigualdade, na qual o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata. Esta economia exclui. Esta economia destrói a Mãe Terra”.  
        Continua Francisco: “A casa comum de todos nós está sendo saqueada, devastada, arrasada impunemente. A covardia em defendê-la é um pecado grave. Vemos com crescente decepção sucederem-se uma após outras Conferências Internacionais, sem qualquer resultado importante. Peço-vos em nome de Deus que defendais a Mãe Terra”. Conclui dizendo: “Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos.... E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”.
Por fim, o Papa confia plenamente nos Movimentos Populares (que na “elitecracia” do Brasil muitas vezes são criminalizados) para mudar o sistema: “Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas mãos de vocês, na capacidade de vocês se organizarem e promoverem alternativas criativas na busca diária dos ‘3 T’ (trabalho, teto, terra), e também na participação de vocês como protagonistas nos grandes processos de mudança nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!”. (Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15).
É essa corrupção estrutural, que - juntamente com a corrupção pessoal - precisamos combater. É esse “sistema econômico iníquo” que precisamos mudar. Tudo indica, porém, que o novo Governo irá combater somente o comportamento corrupto de alguns políticos da oposição, sobretudo dos Governos anteriores, para “parecer” (não “ser”) honesto, mas estará total e covardemente a serviço (como mero fantoche) do sistema capitalista neoliberal - estruturalmente corrupto - para fortalece-lo, usando para isso - todas as vezes que for necessário e com a conivência hipócrita de líderes religiosos - o nome de Deus: uma verdadeira blasfêmia.
    Acorda povo! “De olho aberto para não virar escravo”! (CPT). “Justiça e Paz se abraçarão” (Sl 85). Unidos e organizados, vamos à luta! “A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos”! (Mt 9,37).


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Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 07 de novembro de 2018

A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos