A corrupção pública é, antes de tudo, estrutural. É
o próprio sistema capitalista neoliberal, que é corrupto. As práticas de
corrupção pública são um reflexo desse “sistema econômico iníquo” (Documento de
Aparecida - DA, 385). Elas servem para fortalecê-lo e para defender interesses
individuais e de grupos. A preocupação com o bem comum, que é o bem de todos e
de todas, a partir dos empobrecidos, oprimidos e excluídos, nem passa pela
cabeça de muitos de nossos agentes públicos.
No Brasil, “oitocentos bilhões de reais são
roubados, desviados com obras superfaturadas, cartões corporativos entre golpes
de toda a espécie com dinheiro público todos os anos” (http://www.achetudoeregiao.com.br/atr/corrupcao.htm).
Infelizmente, a corrupção pública é uma constante em nossa sociedade e
é considerada como algo normal e natural. Bobo é quem, podendo, não aproveita.
Surpreendentemente, o povo está acordando. A tônica
de todas as manifestações do povo nas ruas, principalmente dos jovens, é de
indignação e de combate à corrupção pública.
Por causa da pressão popular, o Senado
Federal, no dia 26 de junho deste ano, aprovou projeto de lei que altera o
Código Penal e torna a corrupção crime hediondo. É mais uma vitória do povo.
“O texto aprovado determina que a corrupção
ativa (quando é oferecida a um funcionário público vantagem indevida para a
prática de determinado ato de ofício) passa ter pena de 4 a 12 anos de
reclusão, além de multa - atualmente, a reclusão é de 2 a 12 anos. A mesma
punição passa a valer para a corrupção passiva (quando funcionário público
solicita ou recebe vantagem indevida em razão da função que ocupa). A proposta
também inclui entre crimes hediondos a prática de concussão (ato de exigir
benefício em função do cargo ocupado)” (http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/06/senado-aprova-texto-base-de-projeto-que-torna-corrupcao-crime-hediondo.html).
Esperamos que o projeto de lei do
Senado seja aprovado na Câmara e sancionado pela presidenta da República.
Refiro-me, agora, a uma prática de corrupção
pública, legalizada e institucionalizada, da qual pouco se fala e que - a meu
ver - pode ser considerada uma prática de concussão. Trata-se dos gastos
exorbitantes e inescrupulosos de dinheiro público com todo tipo de mordomias
por parte de políticos e outros agentes públicos. É uma vergonha e uma afronta
ao nosso povo, sobretudo aos trabalhadores que ganham salário mínimo. É um
comportamento repugnante e que, de alguma forma, se torna até ridículo.
Alguns exemplos são paradigmáticos e, ao
mesmo tempo, ilustrativos. Em nível de Brasil, cito dois. O primeiro: entre
2011 e abril de 2013, nas 46 viagens da comitiva presidencial, foram gastos US$
4, 5 milhões; em 2011 e 2012, no pagamento de diárias para ministros, equipe de
apoio e funcionários nas missões no estrangeiro, foram gastos US$ 3, 1 milhões;
numa diária da suíte presidencial, foram gastos US$ 19 mil.
Nas viagens presidenciais, a lista de
exigências do Itamaraty às Embaixadas é sempre grande: cerca de 17 veículos, incluindo
um blindado para a presidenta, furgão sem banco para equipamentos e
caminhão-baú para a bagagem; uma média de 55 quartos em hotéis; material de
escritório, além de telefone e internet para as cerca de 80 pessoas da comitiva
oficial (cf. Folha de S. Paulo, 17 de junho de 2013, p. A10).
O segundo exemplo: o presidente da Câmara dos
Deputados usou, com dinheiro público e com a maior cara-de-pau, um avião da
Força Aérea Brasileira para levar a noiva, parentes dela, enteados e um filho
ao jogo da seleção no Maracanã, no domingo passado, dia 30 de junho. Reparem!
Um jato C-99 da FAB foi buscar a turma em Natal, terra do deputado. Decolou às
19h30 de sexta-feira rumo ao Rio de Janeiro e retornou no domingo, às 23h, após
o jogo (cf. Ib. 03 de julho de 2013, p. A7).
Em nível de Estado de Goiás, cito um exemplo.
Os gastos da Assembleia Legislativa com viagens de deputados estaduais e
servidores entre fevereiro e 7 de junho (deste ano), data de atualização do
último Diário Oficial da Casa, somam R$ 280,9 mil (cf. O Popular, 24 de junho
de 2013, p. 2).
Outros exemplos de práticas de corrupção
pública (malversação do dinheiro público) são os chamados auxílio-alimentação e
auxílio-moradia para juízes. Trata-se realmente de práticas antiéticas
inadmissíveis, que ofendem a sensibilidade de todos e de todas. É o cúmulo do
absurdo!
Precisamos lutar para que a praga da
corrupção, que envenena a vida pública, seja extirpada de nossa sociedade Uma
outra prática pública é possível e necessária! Já temos sinais positivos, que
abrem caminhos novos e começam a criar as condições objetivas para que isso
aconteça. A esperança nunca morre!
Fr. Marcos Sassatelli, Frade
dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em
Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de
Filosofia da UFG
Goiânia, 03 de julho de 2013