quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Democracia popular

 

Antes de votarmos nas eleições do segundo turno, lembremos a “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”:


  • lançada oficialmente no dia 11 do mês de agosto deste ano na Faculdade de Direito da USP em São Paulo, com atos realizados no mesmo dia em quase todas as capitais do país e outras cidades, e
  • assinada por mais de um milhão de pessoas , incluindo representantes de Organizações sociais (e o autor destas linhas).

Ela nos convida a lutar urgentemente em defesa da democracia, contra toda ameaça de volta a um regime de governo ditatorial e fascista e - nesse momento tão grave que estamos vivendo - não podemos nos omitir.


         A Carta denuncia:


  • Vivemos em um país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude”. E ainda:
  • “Estamos passando por momento de imenso perigo (repito: imenso perigo) para a normalidade democrática, risco às Instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições. Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira”. 

Por fim, com firmeza, declara:

  • “No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições. Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona: Estado Democrático de Direito Sempre!".

A mensagem da Carta é uma denúncia e, ao mesmo tempo, um alerta que nos faz refletir a todos e a todas.

Além disso, precisamos continuar lutando para que a democracia (que - permitam-me um neologismo - no Capitalismo neoliberal é, na realidade, uma “elitocracia”) se torne cada vez mais “democracia popular”. Isso será plenamente possível somente com a superação do Projeto Capitalista e a implantação do Projeto Popular (fraterno, comunitário e socialista), onde todas as pessoas sejam reconhecidas como iguais em dignidade e valor e tenham os mesmos direitos; e onde também os direitos da Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum sejam respeitados.

No 2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares (Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 07-09/07/15), em seu discurso, o papa Francisco pergunta: “Reconhecemos que este sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza?”. E responde: “Se é assim - insisto - digamo-lo sem medo: queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos.... E nem sequer o suporta a Terra, a Irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco” (o grifo é meu).

O papa continua insistindo: “Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que atinja também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença”. Meditemos!

Termino com as palavras da jovem Manuela de Morais Ramos, presidenta do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP: “É preciso ousar sonhar e caminhar no sentido da luta por uma democracia ainda inexistente no país. Não queremos a democracia da fome, a democracia das chacinas e tampouco a democracia dos ricos. Queremos a antítese da democracia que temos hoje, em outros termos, a democracia da diversidade, a democracia dos trabalhadores, uma democracia real. Queremos a democracia dos povos!” (Ato em defesa da Democracia, 11 de agosto de 2022).

(Cf. https://www.brasildefato.com.br/2022/08/10/lancamento-da-carta-aos-brasileiros-reune-inumeras-personalidades).

Lembrando as palavras do papa Francisco, da Manuela e, sobretudo, conscientes da nossa responsabilidade, no segundo turno das eleições para presidente votemos pela “democracia popular”, votemos 13!

                                                                                               Brasil de Fato, 10/08/22

                                                                                                Brasil de Fato, 10/08/22


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 19 de outubro de 2022



·  

·    

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

O Ser humano

 

“A Ética da Libertação é assumida como uma perspectiva e uma alternativa; ambas - perspectiva e alternativa - partem de uma situação concreta, de uma realidade histórica”, lida - analisada e interpretada - desde os Pobres. Essa situação concreta é, para nós, a América Latina e o Caribe (mas vale também para a situação concreta da África, da Ásia e da Europa). Delas - perspectiva e alternativa - “a Ética da Libertação recebe seus elementos essenciais e assume, a partir desta situação, os problemas universais do Ser humano e da sociedade" (Caldera, A. S. Filosofia e Crise. Pela Filosofia latino-americana. Vozes, Petrópolis, 1984, p. 25). 

Na realidade, a Ética da Libertação (toda Ética é da Libertação:  liberta de tudo aquilo que impede a Vida) faz parte da Antropologia filosófica e/ou teológica da Libertação.

Na primeira série de artigos sobre a Ética da Libertação, as reflexões teológico-pastorais são vividas e tematizadas em torno do eixo: O Ser humano.

Neste - o primeiro da série - apresento um quadro geral, que é, ao mesmo tempo, um roteiro, dos temas que serão desenvolvidos posteriormente:

  • O Ser humano “no-mundo” (“no-espaço” e “no-tempo”): a “mundanidade” (“espacialidade” e “temporalidade”) do Ser humano e de todos os seres.
  • O Ser humano “com-o-mundo” (“com-o-espaço” e “com-o-tempo”): a "mundanidade" ("espacialidade" e "temporalidade") consciente, própria do Ser humano, ser pluri-dimensional e pluri-relacional (ser de relações).

              º “Com-o-mundo material e vivente” e “com-os-outros” (semelhantes).

              º “Com-o-Outro absoluto” (Deus).

  • O Ser humano histórico: a “historicidade” do Ser humano. 

              º O Ser humano social: a "socialidade" do Ser humano histórico.

              º O Ser humano individual: a “individualidade” do Ser humano histórico. 

                    . O Ser humano corpóreo: a "corporeidade” do Ser humano individual.

                    . O Ser humano bio-psíquico: a “bio-psiquicidade” do Ser humano individual.

                O Ser humano espiritual ou pessoal: a “espiritualidade” ou “pessoalidade” do Ser humano individual.

  • O Ser humano meta-histórico: a “meta-historicidade” ("meta-socialidade" e "meta-individualidade") do Ser humano. 
              º O Ser humano meta-histórico “já e ainda não” no mundo (no espaço e no tempo):  a meta-historicidade relativa.

         º O Ser humano meta-histórico “além da morte” na eternidade: a meta-historicidade absoluta (plena).

Termino com uma oração: “Assim como aqui (em assembleia) nos reunistes, ó Pai, à mesa do vosso Filho em união com a Virgem Maria, Mãe de Deus (e nossa), e com todos os santos e santas, reuni no Mundo Novo, onde brilha a vossa paz, os homens e as mulheres de todas as classes e nações, de todas as raças e línguas, para a ceia da comunhão eterna, por Jesus Cristo, nosso Senhor” (Oração Eucarística VIII).

Na sociedade e - mais ainda - na Igreja precisamos acabar com as classes. Todos e todas (incluindo a comunidade LGBTQIA+) - mesmo sendo pessoas humanas únicas e diferentes (of. a Teoria da Evolução de Darwin) - somos iguais em dignidade e valor.

Todos e todas somos filhos e filhas do mesmo Pai-Mãe que é Deus. Todas e todos somos irmãos e irmãs em Cristo.

É este o projeto de vida - de sociedade e de mundo - de Jesus de Nazaré: a Boa Notícia do Reino de Deus. É este o Projeto de Vida Popular (verdadeiramente fraterno, comunitário, socialista). Por fim, é este o Projeto de Vida humano, ético e cristão.


 

                                         www.fatosdesconhecidos.com.br/características-que-te-fazem-um-ser-humano-único


                                         https://br.freepik.com/vetores-premium/igualdade-em-direitos-humanos


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 10 de outubro de 2022



O artigo foi publicado originalmente em:
https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano/















quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Jesus subversivo

 

entre o nosso povo(Lc 23,2) 



Companheiros e companheiras, irmãos e irmãs de caminhada – depois de ouvir o vídeo: https://www.youtube.com › watch (toda a Igreja convocada por bispos e padres) – em consciência sinto a necessidade de fazer, com toda firmeza, uma denúncia: o vídeo citado é baseado na mentira e na hipocrisia do começo até o fim; trata-se de um vídeo repugnante.

Dizem os autores do vídeo: “somos mais de 8.000 padres conservadores”. Que pena!

O vídeo “pede voto para o presidente Jair Bolsonaro (PL) e prega contra ‘o candidato que defende o comunismo ateu’, em suposta alusão ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que não é nem comunista e nem ateu”.

Irmãos e irmãs, lembremos a acusação que os fariseus e mestres da Lei fizeram contra Jesus quando foi preso e condenado à morte na cruz: Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo (Lc. 23,2).

Os “fariseus e mestre da Lei“ de hoje - disfarçados até de “padres e bispos” - fazem a mesma acusação que fizeram a Jesus contra todos aqueles e aquelas que - mesmo com seus limites humanos e com seus erros - se colocam de corpo e alma: 

  • ao lado e do lado dos “pequeninos” do Evangelho: os pobres, marginalizados, oprimidos, excluídos e descartados do nosso “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida, 385), perverso, desumano, antiético e anticristão;
  • contra os poderosos e opressores do povo, que são os esteios desse modelo econômico e dessa nossa sociedade baseada na violação institucionalizada dos Direitos Humanos, na injustiça estrutural e na desigualdade gritante, que mata milhões de pobres pela fome e a falta de condições mínimas para uma vida humana digna;
  • e contra os “fariseus e mestres da Lei” de hoje, que - mentindo descaradamente - falam o nome de Deus em vão, deturpam o Evangelho (a Boa Notícia de Jesus de Nazaré) e o usam para naturalizar e legitimar a iniquidade e perversidade de nossa sociedade capitalista neoliberal.  

Meditemos: Hoje, no mundo temos 828 milhões de pessoas passando fome; destas, mais de 33 milhões somente no Brasil. As 8 pessoas mais ricas do mundo possuem tantos bens quanto a metade da população mais pobre (3,6 bilhões de pessoas). As 5 pessoas mais ricas do Brasil têm um patrimônio igual à renda da metade da população mais pobre (106,3 milhões de pessoas). Somente na grande Goiânia - GO, o número de pessoas em situação de pobreza extrema é atualmente de mais de 500 mil pessoas. É esse o pecado social (estrutural) institucionalizado e legalizado que os padres conservadores do vídeo defendem e querem hipocritamente legitimar em nome do Evangelho!

Ouçamos as palavras do papa Francisco aos Movimentos Populares e à Igreja, que continuam plenamente atuais.

Dirigindo-se aos Movimentos Populares, Papa Francisco afirma: “Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas mãos de vocês, na capacidade de vocês se organizarem e promoverem alternativas criativas na busca diária dos ‘3 T’ (trabalho, teto, terra), e também na participação de vocês como protagonistas nos grandes processos de mudança, regionais, nacionais e mundiais”.

Dirigindo-se, pois, à Igreja, Papa Francisco constata: “Soube que são muitos na Igreja aqueles e aquelas que se sentem mais próximos dos Movimentos Populares. Muito me alegro por isso! Ver a Igreja com as portas abertas a todos vocês, que se envolve, acompanha e consegue sistematizar em cada Diocese, em cada Comissão ‘Justiça e Paz’, uma colaboração real, permanente e comprometida com os Movimentos Populares”.

E convida: “Convido-vos a todos, bispos, sacerdotes e leigos (cristãos e cristãs em geral), juntamente com as organizações sociais das periferias urbanas e rurais, a aprofundar este encontro” (2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15).

Será que a Igreja está atendendo ao convite do papa? Em sua grande maioria, infelizmente não!

Por fim, podemos afirmar com certeza que a proposta de vida de Jesus de Nazaré é a mais revolucionária que existe (muito mais que todas as propostas de vida socialistas e comunistas que tivemos até agora). Na proposta de Jesus, todos e todas somos chamados e chamadas a viver como irmãos e irmãs, partilhando tudo o que somos e temos: é o “comunismo” ou “comunitarismo” radical.  

Sejamos seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré!

No segundo turno, votemos 13, o candidato que - hoje - mais se aproxima do Projeto de Vida de Jesus!


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 05 de outubro de 2022

A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos