terça-feira, 25 de janeiro de 2011

A aposentadoria de ex-governadores: um descaramento sem limites

 No dia 20/02/11, lendo na primeira página da Folha de S. Paulo a manchete “governador por dez dias recebe pensão para vida toda”, pensei que estava tendo um pesadelo. Não queria e não conseguia acreditar que a notícia fosse verdadeira. Infelizmente tive que cair na realidade. O governador chama-se Humberto Bosaipo (DEM-MT). Trata~se de um descaramento sem limites, de um roubo e de um assalto aos cofres públicos. Como diz Eliane Cantanhede: “haja estômago!” (Folha de S. Paulo, 21/01/11, p. 2).
            Reparem a artimanha e a má-fé do político: “Quando ainda era deputado estadual, Humberto Bosaipo foi o autor da emenda que mais tarde garantiria sua aposentadoria especial como ex-governador de Mato Grosso. Até 2000, só governadores e vices podiam pedir o subsídio vitalício. A emenda de Bosaipo substituiu a menção aos vices por uma definição ampla: 'Aqueles que os tenham substituído e que tenham assinado ato governamental'. Dois anos depois, Bosaipo, como presidente da Assembleia  Legislativa, governou por dez dias” (Ib., p. A10).
            A lei estadual assegurava a pensão vitalícia “até mesmo para quem ocupasse o cargo por apenas um dia, desde que, nesse período, tivesse assinado algum ato governamental” (Ib., 20/01/11, p. A4). Que assinatura cara! Realmente – como diz o Evangelho – os administradores desonestos agem sempre com esperteza! (Cf. Lc 16, 8).
            O gasto anual dos Estados com aposentadorias e pensões para ex-governadores ou suas viúvas é de R$ 30.559.978. O valor daria para pagar uma aposentadoria de um salário mínimo para 4.993 pessoas, ou incluir mais de 37.000 famílias com benefício básico (R$ 68 mensais) no Bolsa Família, ou, ainda, construir 793 casas e comprar 1.030 carros populares. Recebem a aposentadoria vitalícia pelo menos 83 ex-governadores de dez Estados (AM, MA, MG, PA, PB, PR, RO, RS, SE e SC) (Cf. Ib., 21/01/11, p. A10). 
            Só em Santa Catarina, os pagamentos de oito ex-governadores e três viúvas  “consomem quase R$ 237 mil por mês ou R$ 3,1 milhão por ano, contando o 13o (Ib., 24/01/11, p. A7). No mesmo Estado (o governo não informa se é por invalidez), “Hercília Catharina da Luz, 89, filha de Hercílio Luz, que governou Santa Catarina por três mandatos na República Velha (1889-1930), recebe atualmente (desde 1992) R$ 15 mil por mês dos cofres públicos” (Ib.). Que ladroagem! 
            Como se não bastasse, Minas Gerais e outros cinco Estados ( AC, AL, MA, PA e PI) não repassam informações detalhadas sobre os benefícios pagos a ex-governadores. O governo mineiro não só não repassa, mas se recusa a dar estas informações, argumentando que leis de 2004 e lei assinada pelo atual governador Antônio Anastasia no dia 13/01/11 não o permitem.
            E ainda, com a maior cara de pau, o senador eleito Jorge Viana (PT-AC), governador entre 1999 e 2006, defende o benefício como uma “salvaguarda”. Com sofismas, o senador afirma textualmente: “Dependendo do perfil de algumas pessoas, que se expõem nas atividades que desempenham, isso pode ser importante. Eu me expus muito quando ocupei o cargo, e acho que é importante hoje eu ter uma salvaguarda, inclusive para me proteger” (Ib., 22/01/11, p. A6). Quem diria! Até o PT, que se considerava  o paladino da Ética!
            “Desde 2007, o STF (Supremo Tribunal Federal) considera inconstitucional qualquer pagamento de pensão a ex-governadores” (Ib., 20/01/11, p. A4).
            Apesar de todos os malabarismos legais usados, a aposentadoria vitalícia de ex-governadores (ou suas viúvas) é, portanto, inconstitucional e injusta; e a aposentadoria vitalícia de ex-governadores com mandatos “relâmpago” - além de ser inconstitucional e injusta - é também uma aberração que causa profunda indignação e revolta.
            Enquanto estamos denunciando o descaramento sem limites da aposentadoria de ex-governadores, a imprensa nos surpreende com mais uma notícia, que mostra a desfaçatez e o despudor de nossos políticos. “Além do pagamento de aposentadorias a ex-governadores, há Estados que também dão o benefício para ex-deputados estaduais. O Ministério Público questiona a legalidade destas remunerações em dois deles: Mato Grosso e Santa Catarina”.
            No Estado do Mato Grosso, “decisões da Assembleia Legislativa permitiram que 16 deputados e ex-deputados conseguissem a aposentadoria vitalícia desde 1998. Os valores pagos vão subir para R$ 20 mil em fevereiro/11”.
            Chega-se ao cúmulo do absurdo. “Entre os agraciados (com a aposentadoria de ex-deputados) estão o conselheiro do Tribunal de Contas Humberto Bosaipo, que governou o Estado por dez dias em 2002 e que também já obteve aposentadoria como ex-governador” (Ib., 23/01/11, p. A5). Que acinte!
            Toda essa pilantragem institucionalizada – que parece não ter fim - revela a real motivação (não é certamente o bem comum), que leva muitos de nossos políticos a assumir cargos públicos. São políticos aproveitadores, interesseiros e sanguessugas.
            Pedimos a OAB de cada Estado, envolvido nessa falcatrua contra a coisa pública, e a OAB nacional que tomem as providências cabíveis para que o dinheiro roubado seja restituído aos cofres públicos e para que os responsáveis sejam processados, julgados e exemplarmente punidos. É a única maneira de fazer justiça e reparar, de alguma forma, os prejuízos causados ao nosso povo pobre, explorado e excluído.
            Enfim, precisamos tomar consciência dessa realidade iníqua e nunca mais votar em candidatos corruptos. Ao expressar a nossa cidadania, devemos ter presente que: “Não basta  votar. Não basta mesmo escolhermos uma pessoa de 'ficha limpa' por mais importante e fundamental que ela seja. Nossa missão vai além: levar a pessoa 'ficha limpa' a ser eficaz e a se manter ética durante o mandato a serviço do bem comum. Devemos estar atentos para dar continuidade a outros Projetos de Iniciativa Popular, a exemplo do que resultou na Lei 9.840 e na Proposta denominada 'ficha limpa'.
            Algumas experiências de participação popular já se tornaram luz no caminho dos cristãos comprometidos com a política como pedagogia promissora: a) Mandatos coletivos: têm levado a construir estruturas de maior participação dos eleitores e eleitoras durante o caminhar do mandato. O povo organizado pode mais facilmente expressar a sua voz com seus anseios, dificuldades e esperanças diante do Executivo e  do Legislativo; b) Os 'Grupos de Acompanhamento ao Legislativo': se tornaram respeitados e eficientes em várias cidades, grandes ou pequenas. Revestem-se de autoridade moral, sendo a consciência coletiva do povo no Parlamento local. Apresentam as prioridades com metodologia criativa” (CNBB - Pastorais  sociais e outros Organismos. Eleições 2010: O chão e o horizonte, p. 3-4).
            É só com uma efetiva e organizada participação na vida pública que teremos condições de combater as injustiças - como a aposentadoria vitalícia de ex-governadores - e começar a mudar a prática  política.

Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

Goiânia, 25 de janeiro de 2011

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Uma política econômica enganosa

Fala-se muito de propaganda enganosa, que viola os direitos dos cidadãos/ãs, enquanto consumidores. Neste artigo, pretendo fazer algumas reflexões sobre a política econômica enganosa, que - a meu ver - viola os direitos dos cidadãos/ãs, enquanto cidadãos/ãs, e é uma política econômica ambígua, contraditória e hipócrita. Essa política econômica é praticada pela maioria dos nossos governantes e políticos. Graças a Deus, há exceções, que abrem caminhos novos para uma "outra política econômica  possível".
            De um lado, os nossos governantes e políticos - sobretudo nas cerimônias de posse - choram, fazem declarações de amor aos pobres, prometendo que irão acabar com a fome, que irão enfrentar o grave problema social das drogas e da violência, que irão cuidar da saúde, da educação, da segurança etc. Além desse palavrório todo, os nossos governantes e políticos promovem - com as migalhas que sobram da mesa dos ricos - programas chamados de distribuição de renda.  Na realidade, estes programas, embora sirvam para amenizar situações de extrema pobreza (que é o seu aspecto positivo), não distribuem a renda, mas simplesmente restituem ao povo uma pequena e insignificante parcela daquilo que é roubado (roubo legalizado) dos pobres na exploração da mão-de-obra e nos impostos sobre os produtos de primeira necessidade. Trata-se de uma quantia de dinheiro muito maior da investida nos programas, que servem também para enganar os pobres, e para manter a "popularidade" (ou, melhor dizendo, o "populismo") dos governantes e dos políticos.
Nos discursos de posse no Congresso e no Palácio do Planalto, a nova presidenta Dilma se emocionou e chorou diversas vezes. Com palavras bonitas e promessas genéricas, que não assustam e não ofendem o deus-mercado, ela afirmou: "A luta mais obstinada do meu governo será pela erradicação da pobreza extrema e a criação de oportunidade para todos". Disse ainda: "Junto com a erradicação da miséria, será prioridade do meu governo a luta pela qualidade da educação, da saúde e da segurança". Declarou enfim: "Considero uma missão sagrada do Brasil a de mostrar ao mundo que é possível um país crescer aceleradamente, sem destruir o meio ambiente" (Discurso de posse no Congresso, 01/01/11). A presidenta Dilma sabe muito bem que todas essas façanhas não vão acontecer, porque não "cabem" na lógica do sistema capitalista neoliberal e de seus aliados.
Até o Gilberto Carvalho, vendo Lula descer a rampa do Palácio do Planalto, disse: "estou ficando velho e ficando chorão" (Entrevista. Folha de S. Paulo, 03/01/11). Quanta representação teatral e quanta encenação!
De outro lado, os nossos governantes e políticos praticam uma política econômica enganosa, que faz de tudo para preservar, defender e fortalecer os interesses do sistema econômico capitalista neoliberal, que é um “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida – DA, 385) ou – como afirma Paulo VI – um “sistema nefasto”, porque considera “o lucro como o motivo essencial do progresso econômico, a concorrência como lei suprema da economia, a propriedade privada dos bens de produção como um direito absoluto, sem limites nem obrigações correspondentes” (Populorum Progressio - PP, 26).
O sistema econômico capitalista neoliberal aprofunda a desigualdade social, oprime, marginaliza, exclui e assassina os pobres como material descartável. O importante não é a vida do povo, mas o deus-mercado e os interesses dos seus servidores e adoradores.
Em junho de 2003, um grupo de mais de 300 economistas assinou um "Manifesto", "no qual advertia para o agravamento da crise social em face do aprofundamento, pelo governo Lula, da política macroeconômica herdada do Governo anterior", mostrando a necessidade de "uma política econômica voltada para um projeto nacional de desenvolvimento, com prioridade para a geração de empregos e a redução das desigualdades sociais".  Diziam ainda os economistas: "É nossa convicção que, a despeito do aprofundamento da crise social, não há sinais de reversão da atual política econômica. Ao contrário, o governo tem reafirmado que não quer mudar. Portanto, é nosso dever de cidadania insistir na denúncia de que esta política econômica não atende aos interesses da maioria e que aumentará cada vez mais os problemas sociais".
O economista Paulo Passarinho fala dos "impasses do modelo econômico sob Lula" e defende "a necessidade de superarmos o atual modelo econômico, em curso no país desde o início dos anos 90" (Correio da Cidadania, 12/03/10). O mesmo economista afirma também que "sem mudança do modelo econômico, promessa de erradicação da miséria é um engodo" (Ib., 05/11/10).
Numa entrevista, que traz o título "Brasil de Lula: a naturalização da desigualdade", publicada no Correio da Cidadania, o economista Nildo Ouriques à pergunta: "qual o seu balanço dos oito anos do governo Lula?", responde: "Uma refuncionalização do chamado neoliberalismo. Aplicou a consolidação do PT como partido de centro-direita, que detinha a legitimidade para falar sobre os pobres e, portanto, aplicar políticas de sensibilidade social. Mas no sentido de colocar os pobres em políticas caritativas, o que é o Bolsa Família basicamente, apesar de sua importância. Este é o ponto fundamental. Não emancipa amplos setores dos trabalhadores, atende à questão social, diferenciando-se da direita clássica, mas sem emancipar politicamente. Controle eleitoral e alienação política". Nildo Ouriques diz ainda que o Brasil "aceita o papel de potência regional dentro da política externa estadudinense, o que implica maiores graus de autonomia  em relação à diplomacia do FHC, impulsionando uma política sub-imperialista do Brasil, que de fato tenta praticá-la" (22/12/10).
Pelos pronunciamentos da nova equipe do governo Dilma, tudo indica que, na política econômica, não haverá nenhuma mudança essencial, a não ser pequenos ajustes. Como exemplos concretos da insensibilidade (apesar da emoção e do choro no dia da posse) dos nossos governantes e políticos - fiéis servidores e adoradores do deus-mercado  - diante das reais necessidades do povo, basta lembrar alguns fatos:
1.    A maneira, fria e calculista (submissa aos interesses do capital financeiro), como o governo fala da questão do salário mínimo.
2.    A maneira, oportunista e desonesta, como o "PMDB usa o salário mínimo para pressionar por cargos" (e não para atender às necessidades básicas do povo).
3.    A maneira, autossuficiente e arrogante, como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fala do bloqueio de recursos do orçamento, que este ano poderá chegar a R$ 40 bilhões, dizendo (sempre totalmente submisso aos interesses do capital financeiro) que "o freio nas despesas públicas é a aposta do governo para convencer o mercado financeiro da disposição de controlar as contas públicas, depois de um ano pautado por elevação dos gastos" (e eu acrescento: não certamente por amor ao povo sofrido, mas para fins eleitoreiros) (Folha de S. Paulo, 05!01/11, p. A4 e A5).
4.    A farsa do aumento salarial dos parlamentares e dos governantes. Sobre isso, veja o meu artigo: "O aumento salarial dos parlamentares: uma bandalheira que não pode ser esquecida", publicado no Diário da Manhã (29/12/10, p. 18).
5.    Por fim (pasmem!), não podemos deixar de lembrar a última barganha pública dos nossos parlamentares, que revela a total falta de vergonha e dignidade e é um pontapé na cara do povo: o mandato tampão nas férias da Câmara. "45 suplentes ficarão no cargo por um mês ao custo de R$ 5 milhões". Cada um, pelo período de primeiro a 31 de janeiro/11 (em plenas férias legislativas), receberá - entre salário e outros benefícios - o total de R$ 107 mil. Entre os que assumirão o posto, "estão quatro políticos (Edir Pedro de Oliveira - RS, Celcita Pinheiro - MT, Íris Simões - PR e Romeu Queiroz - MG), que são réus na justiça sob a acusação de integrar o escândalo do mensalão ou a máfia dos sanguessugas". Os suplentes "estão sendo convocados devido à renúncia ou afastamento de 45 titulares - a maioria deixou a Câmara em 31 de dezembro para assumir secretarias nos novos governos estaduais" (Folha de S. Paulo, 05/01/11, p. A7). Eles deverão concluir o mandato dos que se afastaram. Que falcatrua bem montada! Graças a Deus, o nosso povo não é bobo! E o freio nas despesas públicas, senhor ministro, Guido Mantega? Será que vale só para as políticas públicas em benefício dos pobres? Realmente não dá para entender como aconteça tudo isso em pleno século XXI!

Precisamos abrir caminhos novos, que façam acontecer as condições objetivas, para que o modelo econômico capitalista neoliberal, injusto e desumano, seja superado. (e não consolidado, como acontece hoje, em nome da chamada governabilidade). Em nossa sociedade já existem muitos sinais de uma "outra política econômica possível". Vale a pena lutar por ela!
              Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 12/01/11, p. 18


Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra


terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Jesus, o "sem-teto" de Belém

Estamos, os cristãos católicos, no tempo litúrgico do Natal, que vai das vésperas do Natal até a festa do Batismo do Senhor, que, neste ano, celebraremos domingo, 9 de janeiro/11.
            Na Missa da noite de Natal proclamamos solenemente: "Ó noite silenciosa! O desejado chegou! A promessa foi cumprida: tempo de espera acabou! Ó noite silenciosa! Chegou-nos o Emanuel (Deus conosco)! O clamor foi atendido, nasceu justiça do céu! (…) Ó noite silenciosa! Deus enviou seu Filho! Nasceu o sol do Oriente, a luz espalha o seu brilho! A vós, ó Pai, nesta noite os servos cantam louvor. Tornados filhos no Filho, no Espírito de Amor" (Proclamação do Natal).
Segundo o relato do Evangelista Lucas, naquela época, o imperador César Augusto mandou fazer o recenseamento em todo o império. Na realidade, o recenseamento era um instrumento de dominação e de cobrança de impostos. "Todos iam registrar-se, cada um na sua cidade natal. José era da família e descendência de Davi. Subiu da cidade de Nazaré, na Galileia, até à cidade de Davi, chamada Belém, na Judeia, para registrar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida. Enquanto estavam em Belém, se completaram os dias para o parto, e Maria deu à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou, e o colocou na manjedoura, pois não havia lugar para eles na hospedaria" (ou, "dentro de casa" - como alguns traduzem) (Lc 2, 3-7).
Os primeiros que receberam a Boa Notícia do nascimento de Jesus foram os pastores. "Eu anuncio a vocês a Boa Notícia, que será uma grande alegria para todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vocês um Salvador, que é o Messias, o Senhor. Isto lhes servirá de sinal: vocês encontrarão um recém-nascido, envolto em faixas e deitado na manjedoura" (Lc 2, 10-12). Os pastores foram às pressas se encontrar com Maria e José, e o recém-nascido.  Voltaram louvando e glorificando a Deus, e tornaram-se os primeiros anunciadores da Boa Notícia do nascimento de Jesus.
Quem eram os pastores? Eram pessoas "odiadas por não respeitar as propriedades alheias, invadindo-as com seus rebanhos e cobrando preços exorbitantes pelos produtos. Um pastor - segundo o Talmud babilônico - não podia ser eleito ao cargo de juiz ou testemunha nos tribunais, por causa da má fama e do desrespeito à propriedade" (Pe. José Bortolini, Roteiros homiléticos. Paulus, 2006, p. 3 - Missa da noite de Natal). Os pastores não eram, portanto, "pessoas de bem".
Jesus, diríamos hoje, nasceu como "sem-teto" e anunciou a Boa-Notícia do seu nascimento aos "sem-terra" (os pastores). Nasceu rejeitado e excluído. "Veio para a sua casa, mas os seus não o receberam" (Jo 1, 11).
O Filho de Deus, o Salvador do mundo, não só se encarnou, assumindo a nossa natureza e a nossa condição humana na história, mas tornou-se solidário - afetiva e efetivamente – com todos aqueles/as que no mundo não têm voz e não têm vez, com todos aqueles/as que não "cabem" nas casas das nossas cidades: os empobrecidos, os oprimidos, os excluídos, os indesejados, os rejeitados e   os descartados da nossa sociedade. Jesus se identificou totalmente com eles/elas, tornando-se um deles/delas.
            Se Jesus, para citar um exemplo, tivesse vindo ao mundo em Goiânia em 2005, teria nascido na Ocupação do Parque Oeste Industrial, porque não haveria lugar para ele (e para seus pais José e Maria) nas casas da cidade. Ele teria sido perseguido (como tantas outras crianças da Ocupação, que estão traumatizadas até hoje), seus pais José e Maria teriam resistido, juntamente com os companheiros/as, mas enfim - por causa da ganância dos poderosos e da conivência das autoridades (os Herodes de hoje), teria sido barbaramente despejado, juntamente com seus pais e os outros moradores/as. Talvez, quem sabe, teria sido morto à queima-roupa, como Pedro e Vagner.
            Jesus, em princípio, podia ter nascido no palácio do imperador de Roma ou em outros palácios, mas não o fez. Por quê? O que Ele quer nos dizer com isso? Qual é o sentido do Natal para nós? O que significa celebrar e reviver o Natal, hoje?
            Muitas vezes, com nossos presépios bonitos e até luxuosos, em ambientes e Igrejas com ar condicionado e todo tipo de conforto, conferimos ao Natal uma aura romântica, que não tem nada a ver com o estábulo e a manjedoura, na qual Jesus nasceu.
É verdade que Jesus veio para todos/as, mas o caminho que Ele escolheu, para anunciar ao mundo a Boa-Notícia do Reino de Deus, não foi o caminho dos poderosos (dos Herodes de ontem ou de hoje), mas o caminho dos pobres, que é um caminho alternativo.
E nós, seus seguidores/as, será que escolhemos o caminho de Jesus? Será que, em nossas Igrejas e em nossas Comunidades, não estamos, muitas vezes, demasiadamente preocupados com comportamentos que visam o poder, o luxo, a riqueza, a ostentação e o triunfalismo? Será que não procuramos legitimar tais comportamentos proferindo as palavras, hoje muito comuns, "para Deus o melhor"? O que é o melhor? Será que o melhor está no ter (e não no ser)?
Será que, em determinadas situações, não nos “prostituímos” com nossos conchavos, com nossas atitudes bajuladoras e com nossas alianças ambíguas?
Na noite de Natal cantamos com alegria: "Noite feliz! Mas, do ponto de vista meramente racional, não foi uma noite feliz. Qual é a mulher grávida que gostaria de dar à luz seu filho numa manjedoura? Nenhuma, com certeza. Seria um caso de desrespeito à dignidade humana, de marginalização e de injustiça. Mas por que, mesmo assim, cantamos: Noite feliz!? Porque temos a certeza, à luz da fé, que estamos diante do grande mistério do amor infinito de Deus para conosco. Deus nos ama "até o fim" (Jo 13, 1), até não poder mais. Como é insondável o mistério do amor de Deus para conosco! Que prova de amor Deus no deu!
Jesus passou quase toda a sua vida no anonimato, vivendo - certamente com simplicidade e naturalidade - a vida de trabalhador, a vida de carpinteiro, juntamente com José, seu pai.
Nos poucos anos de vida pública - contam os Atos dos Apóstolos – Jesus, ungido com o Espírito Santo, "andou por toda parte fazendo o bem", sempre ao lado dos mais pobres e necessitados. “E nós (os Apóstolos) somos testemunhas de tudo o que Jesus fez na terra dos judeus e em Jerusalém” (At 10, 38-39).
Mesmo, porém, “andando por toda parte fazendo o bem”, Jesus foi preso e acusado de subverter o povo (cf. Lc 23, 2), foi torturado e morto na cruz, que era a morte mais humilhante e mais vergonhosa possível. A solidariedade e a identificação com todos os rejeitados/as da nossa sociedade não podia ser maior. Ele, o Santo e o Justo, se fez bandido, se fez criminoso. Mas "Deus o ressuscitou e nós – dizem novamente os Apóstolos -  somos testemunhas disso" (At 2, 32). E é justamente por causa da Ressurreição de Jesus que, no tempo litúrgico da Páscoa, cantamos alegres: "Vitória tu reinarás, ó cruz, tu nos salvaras"!
Na última Ceia, Jesus, depois de lavar os pés dos discípulos, perguntou: "vocês compreenderam o que acabei de fazer? (…) Eu lhes dei o exemplo e vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz" (Jo 13, 12-15). Em outra ocasião, conversando com os discípulos, Jesus disse: “Quem de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês, e quem de vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se o servo de todos" (Mc 10, 43-44).
Podemos dizer que Jesus revolucionou todos os critérios da convivência humana. E nós? Será que queremos realmente seguir Jesus, procurando “discernir os 'sinais dos tempos' à luz do Espírito Santo” e nos colocar a serviço do Reino de Deus? (Documento de Aparecida – DA, 33).
Um dia, "enquanto ia andando, alguém no caminho disse a Jesus: 'Eu te seguirei para onde quer que fores', mas Jesus lhe respondeu: 'As raposas têm tocas e os pássaros têm ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça' (Lc 9, 57-58). E, num outro encontro com os discípulos, Jesus acrescentou: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16, 24).
            Enfim, lembremos que: “O seguimento de Jesus é fruto de uma fascinação que responde ao desejo de realização humana, ao desejo de vida plena. O discípulo é alguém apaixonado por Cristo, a quem reconhece como o mestre que o conduz e o acompanha” (DA, 277).
            “Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância” (Jo 10-10).


Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
Goiânia, 04 de janeiro de 2011



quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

O aumento salarial dos parlamentares: uma bandalheira que não pode ser esquecida

   No dia 15 de novembro/10, numa votação relâmpago, a toque de caixa e no apagar das luzes, "os parlamentares se deram um aumento salarial real que nenhum brasileiro teve" (Revista "Veja", 22 de dezembro de 2010, capa). São os crimes de "colarinho branco", são os crimes das "pessoas de bem", das pessoas que - com sorriso cínico, mas sem perder a fineza e a elegância - debocham do povo.
            O aumento salarial dos parlamentares foi uma bandalheira, uma farra, um escândalo, um verdadeiro festival de irresponsabilidades. Que vergonha!
            Embora a celeridade não seja uma das virtudes do Parlamento brasileiro, no caso em questão, foram necessários apenas vinte minutos na Câmara e menos de cinco minutos no Senado para que os deputados e senadores aprovassem um aumento de 61,83% nos próprios salários, de 136,93% no salário do presidente da República e de 148,63% no salário do vice-presidente e dos ministros de Estado. Que eficiência, quando se trata dos próprios interesses!  O novo salário entrará em vigor em primeiro de fevereiro de 2011 e todos receberão 26.723,13 reais por mês, que corresponde ao teto salarial do funcionalismo público.
            Para a votação do aumento salarial, 279 deputados federais aprovaram o regime de urgência, abrindo caminho para que o decreto legislativo fosse aprovado, primeiro, pelos deputados federais e, depois, pelos senadores. Apenas 35 deputados federais se posicionaram contra o regime de urgência. Pergunto: não são 513 os deputados federais? Em pleno dia de trabalho, 199 não se encontravam na Câmara e não votaram. Será que estavam de licença-prêmio?
            No Senado só três senadores se manifestaram contra o aumento salarial. Marina Silva (PV-AC), dizendo que seria mais correto um ajuste equivalente à inflação, como defende o PSOL, José Nery (PSOL-PA), apresentando o voto contrário do partido e Álvaro Dias (PSDB-PR), afirmando que o aumento só seria plausível se viesse com um corte das verbas de gabinete.
            Devido a aprovação do regime de urgência, "nas duas Casas, a votação foi simbólica, ou seja do tipo em que o congressista não declara seu voto. Na simbólica, quem preside a sessão anuncia: 'Aqueles que aprovam, permaneçam como estão'. Para, em seguida, emendar: 'Aprovado'" (www.congressoemlfoco.uol.com.br). Por se tratar de decreto legislativo, o texto não precisa ser enviado à sanção presidencial, expediente que permite eventuais vetos. Diga-se de passagem, o presidente-operário Lula se manifestou a favor do aumento. Será que esqueceu o sofrimento dos seus ex-companheiros?
            No site citado acima, podemos encontrar a lista completa, por Estado, dos deputados federais que apoiaram e dos que não apoiaram a votação do aumento salarial. No site www.noticias.uol.com.br, podemos encontrar essa mesma lista, por Partido. Só lembro os nomes dos deputados federais de Goiás que votaram a favor do aumento salarial: Carlos Alberto Leréia (PSDB), Luiz Bittencourt (PMDB), Marcelo Melo  (PMDB), Pedro Wilson (PT), Raquel Teixeira (PSDB) e Roberto Balestra (PP).
Não podemos esquecer tamanho oportunismo político. Vamos divulgar, alto e bom som, o nome dos que praticaram, na calada da noite e sem nenhum escrúpulo, essa falcatrua, para que todos/as tomem conhecimento. Precisamos banir da vida pública os corruptos e os aproveitadores, que - no lugar de servir ao povo - se servem do povo para seus próprios interesses. Todos os que têm senso de justiça, devem estar profundamente indignados com tudo o que aconteceu e dispostos, como nunca, a lutar na defesa dos Direitos Humanos e da Ética.
            Tem mais: Com o aumento do salário do Legislativo e os benefícios indiretos (verbas de gabinete, verbas indenizatórias para custear despesas políticas, auxílio-moradia, cotas de passagens aéreas, cotas de telefone, celulares, correios), "cada um dos 594 congressistas representa custo médio de R$ 128 mil por mês aos cofres públicos" (Folha de S. Paulo, 17 de dezembro/10, p. A7). Nem falamos aqui do custo dos deputados estaduais e dos vereadores municipais, em consequência do efeito cascata, provocado pelo aumento do salário dos deputados federais. Trata-se realmente de um verdadeiro assalto, de um verdadeiro roubo legalizado e institucionalizado.
            Quem sabe, um dia, uma Constituinte Popular estabeleça que os Políticos (que já  têm sua profissão) devem ser voluntários e que os Parlamentares não podem legislar em causa própria? O sonho pode se tornar realidade. Não podemos perder a esperança de "uma outra política possível".
            No entanto, precisamos urgentemente avaliar o que pode ser feito agora, do ponto de vista legal e constitucional, para reverter essa situação de iniquidade. Com a palavra os nossos advogados “populares”, para que nos orientem sobre o que fazer e como fazer.
            Pergunto: Se todos/as os cidadãos/ãs são iguais perante a lei - como afirma a Constituição - por que o salário mínimo tem um aumento de 6%, enquanto o salário dos políticos tem um aumento de até 148,63%? Não é inconstitucional? Por que os parlamentares não cumprem o Decreto-Lei 2.162 de 1940, que criou o salário mínimo com a finalidade de suprir as necessidades básicas do trabalhador e de sua família? Conforme estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócioeconômicos (Dieese), o salário mínimo deveria ser atualmente de R$ 2.047,58. Se os vencimentos dos políticos devem corresponder ao teto salarial do funcionalismo público, por que o salário mínimo não deve, pelo menos, corresponder à finalidade do Decreto-Lei que o criou? É só uma questão de opção política.
            Esse aumento do salário dos políticos "soa como um desatino e mostra o tamanho do abismo que separa a atual legislatura da sociedade, agindo, inclusive de costas para ela, a ponto de se premiar quando deveria expiar em público os próprios pecados" (Revista "Veja", 22 de dezembro de 2010, p. 76). O cientista político David Fleischer afirma: "Os parlamentares têm preocupação zero com a opinião pública. Tentaram fazer um negócio bem disfarçado, contemplando também o Poder Executivo" (Ib., p. 77).
            Segunda feira, dia 27 de dezembro/10, cerca de 100 estudantes universitários e secundaristas, indignados, ocuparam a rampa do Palácio do Planalto, protestando contra o aumento do salário dos parlamentares e reclamando da “ditadura parlamentar”. Diziam em coro: “Ô Dilma, que papelão, tem dinheiro para ministro, mas não tem para a educação” (cf. Diário da Manhã, 28/12/10. p. 13). Parabéns jovens! O Brasil  precisa muito de vocês.
            Termino com as palavras de Dom Manuel Edmilson, bispo emérito da Diocese de Limoeiro do Norte - CE, que num gesto profético - em discurso firme e coerente, proferido no Senado Federal – teve a coragem cívica de recusar a Comenda de Direitos Humanos dom Helder Câmara, conferida no dia 21 de dezembro/10. Dom Edmilson diz: "A condecoração é um atentado, uma afronta ao povo brasileiro, ao cidadão, à cidadã contribuintes para o bem de todos com o suor de seu rosto e a dignidade de seu trabalho. É seu direito exigir justiça e equidade em se tratando de honorários e de salários. Se é seu direito e eu aceitar, estou procedendo contra os Direitos Humanos. Perderia todo o sentido este momento histórico. O aumento a ser ajustado deveria guardar sempre a mesma proporção que o aumento do salário mínimo e da aposentadoria. Isto não acontece. O que acontece, repito, é um atentado contra os Direitos Humanos do nosso povo" (Discurso durante sessão no Senado, 21 de dezembro/10).
                          Diário da Manhã , Opinião Pública, Goiânia, 29/12/10, p. 18



Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Dom Fernando: pastor-profeta

Por ter tido a felicidade de ser amigo e colaborador direto de Dom Fernando Gomes dos Santos como Coordenador da Pastoral e Vigário Geral da Arquidiocese de Goiânia, não posso deixar passar o ano do seu centenário de nascimento sem dar publicamente o meu testemunho.
Por ocasião de sua morte, ou, melhor dizendo, do dia em que, há 25 anos, "completou sua Páscoa", falei que Dom Fernando foi "um Pastor-Profeta dos nossos tempos", "fiel à Palavra de Deus e fiel aos apelos da realidade" (cf. Revista da Arquidiocese. Goiânia, ano 28, n. 6/7, junho/julho 1985, p. 393 e 426-427).
Dom Fernando tinha uma personalidade forte, mas um coração muito grande. Era uma figura de extraordinária profundidade humana; sabia compreender, com amor de pai e ternura de mãe, as fraquezas do ser humano; ele foi sempre um irmão solidário de todos/as, especialmente dos mais pobres.
No depoimento, que ele deu à Revista Eclesiástica Brasileira (REB), poucos meses antes de sua Páscoa definitiva, depois de falar da ação pastoral do Secretariado da Pastoral Arquidiocesana (SPAR), diz que ela "se complementa naturalmente no gabinete do arcebispo, sempre aberto a ouvir a todos, a qualquer hora. Nesses encontros - em sua maior parte com pessoas pobres, marginalizadas e oprimidas - tem acontecido que, além das palavras de estímulo, recebam, alguma vez, o sacramento da Penitência, sem que ninguém saiba ou perceba. Transforma-se, assim, em lugar privilegiado de reconciliação e de perdão" (REB, março de 1985).
Quando, por causa de sua tomada de posição clara, destemida e firme em defesa do povo, o acusavam de ser contra o governo, dom Fernando  dizia: “eu sou a favor do povo; quando o governo estiver a favor do  povo, eu estarei com ele, quando estiver contra o povo, eu estarei contra ele". 
Dom Fernando nunca foi um homem bajulador e oportunista, como é bastante comum  acontecer, mesmo em ambientes de igreja. Por ser sempre um homem reto, coerente e franco, ele não conseguia entender e não tolerava, de forma alguma, a traição, que na realidade é um comportamento covarde e mesquinho. Percebendo que uma pessoa, em quem ele tinha confiado, o traia, sofria calado, mas perdia completamente a confiança. Quando, porém, confiava em alguém, sua confiança era total e irrestrita
Como tive a graça de conviver com Dom Fernando e ser, pela afinidade que tínhamos, pessoa da sua confiança, quando alguém o procurava para tratar de um assunto que podia ser resolvido no Secretariado da Pastoral Arquidiocesana (Spar), o ouvi diversas vezes dizer: "isso é com Frei Marcos". Dom Fernando - sobretudo depois do Concílio Vaticano II - era um homem que acreditava na "Igreja dos Pobres" e vivia a comunhão e participação, numa Igreja toda ela ministerial. Por isso, partilhava com os Padres, as Religiosas e os Agentes pastorais leigos/as a responsabilidade do pastoreio.
Embora tenha consciência que não é mérito meu, mas dom de Deus, honra-me muito o reconhecimento de Dom Fernando a respeito do  SPAR, no depoimento já citado: "O Spar tem sido o grande centro de convergência e de irradiação de tudo o que se passa na Arquidiocese no campo pastoral. Dotado de sede própria, que integra o conjunto Catedral-Cúria Metropolitana-Spar, no centro da cidade, constitui o ponto mais dinâmico da Arquidiocese. Hoje o Spar conta com o coordenador da Pastoral, Frei Marcos Sassatelli, que é também vigário geral, e com uma extraordinária equipe de sacerdotes, religiosas e leigos competentes, de rara dedicação e eficiência. No Spar, funcionam oito Comissões que dinamizam as atividades fundamentais, referentes às prioridades do Plano Pastoral, elaborado em Assembleia Arquidiocesana e constantemente estudado nas reuniões e encontros. O Spar produz, também, grande número de boletins e impressos, que são divulgados nas paróquias da Arquidiocese, principalmente nas comunidades da periferia, e que são encomendados por outras Igrejas particulares do Brasil afora. Grande é também o número de cursos ministrados nas comunidades da capital e do interior" (REB, ib.).
Como todo ser humano, Dom Fernando tinha também suas limitações e seus defeitos, mas era um homem de uma só palavra, um homem íntegro, um homem "sem violência e sem medo". Com inabalável fidelidade, amava muito a Mãe Igreja, mesmo, às vezes, sofrendo profunda e silenciosamente por causa das incompreensões de irmãos da própria Igreja.
No seu Testamento, dom Fernando confessa: "Não obstante as minhas deficiências, fraquezas, e falhas, sempre me consagrei com tudo o que sou e com tudo o de que dispus, à Santa Igreja e ao sagrado ministério" (O Testamento de Dom Fernando. Revista da Arquidiocese. Goiânia, ano 28, n. 6/7, junho/julho 1985, p. 356).
Dom Fernando, como "pastor-profeta dos nossos tempos" e como "defensor e advogado do Povo" (capa da REB de março de 1985), era também implacável na denúncia e na luta contra as injustiças sociais. Era respeitado e temido pelos poderosos, sobretudo nos tempos difíceis da ditadura militar.
Dom Fernando, como homem "fiel à Palavra de Deus e fiel aos apelos da realidade", viveu intensamente os ensinamentos do Concílio Vaticano II.
"Como Cristo, por sua Encarnação ligou-se às condições sociais e culturais dos seres humanos com quem conviveu; assim também deve a Igreja inserir-se nas sociedades, para que a todas possa oferecer o mistério da salvação e a vida trazida por Deus” (Concílio Vaticano II. A atividade missionária da Igreja - AG, 10).
            "Para desempenhar sua missão, a Igreja, a todo momento, tem o dever de perscrutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho, de tal modo que possa responder, de maneira adaptada a cada geração, às interrogações eternas sobre os significados da vida presente e futura e de suas relações mútuas. É necessário, por conseguinte, conhecer e entender o mundo no qual vivemos, suas esperanças, suas aspirações e sua índole frequentemente dramática" (Concílio Vaticano II, A Igreja no mundo de hoje - GS, 4).

            Que a memória do legado do primeiro arcebispo da Arquidiocese de Goiânia, Dom Fernando Gomes dos Santos, no centenário do seu nascimento e nos 25 anos de sua Páscoa definitiva, sirva-nos de estímulo para que sejamos, sempre mais, uma Igreja evangélica, uma Igreja pobre e uma Igreja comprometida com a Boa-Notícia do Reino de Deus no mundo de hoje.
                            Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 23/12/10, p. 17



Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Crimes do Poder Público contra a vida do povo

Considerar a política econômica como algo que não pertence à área dos direitos humanos, é um crime do Poder Público contra a vida do povo.
"Enquanto Lula tenta escapulir de rótulos ideológicos, a presidenta Dilma assume claramente uma opção pela esquerda. Essa opção tende a se revelar não na política econômica, mas na área de direitos humanos" (Eliane Cantanhêde. Presidenta eleita assume opção clara de esquerda na área de direitos humanos. Folha de S. Paulo, 06/12/10, p. A4). Como se pode separar a política econômica da área de direitos humanos ou, em outras palavras, da ética?
Se o presidente Lula "tenta escapulir de rótulos ideológicos", quer dizer que apoia e defende a ideologia dominante. Aliás, a vitória eleitoral do governo de "esquerda" do Lula no Brasil (e tudo indica que o governo Dilma dará continuidade ao governo Lula), antes de significar "a ascensão do povo" ao poder do Estado, perpetua "sua subordinação" ao "jugo neoliberal".
Na verdade, como aconteceu também em outros países da América Latina, o partido dos "trabalhadores" ascendeu ao poder "para concluir o trabalho que a direita não teria condições (por falta de legitimidade) de acabar" (Cf. Alexander Maximilian Hilsenbech Filho. Governos de "esquerda" e movimentos sociais na América Latina: entre a cooptação e a construção de uma democracia autônoma. Revista Espaço Acadêmico, N. 62, julho 2006). Segundo alguns cientistas sociais, o governo Lula "consolidou" o capitalismo no Brasil.  
Por ser o ser humano um ser histórico, situado e datado, a ideologia é uma mediação necessária. Faz parte da nossa condição humana; não há como não ter ideologia. O importante é que a ideologia seja uma ferramenta a favor da vida ou uma ferramenta libertadora e humanizadora, e não uma ferramenta a favor da morte ou uma ferramenta opressora e desumanizadora.
A área dos direitos humanos integra a política econômica, que é a base material necessária para uma vida digna para todos/as. A defesa e a promoção dos direitos humanos deve acontecer não só nas relações pessoais ou interpessoais, mas também e sobretudo nas relações estruturais (sócioeconômico-político-ecológico-culturais). A política econômica do sistema capitalista neoliberal, que a nova presidenta quer manter e fortalecer, é uma violação estrutural, silenciosa e permanente, dos direitos humanos.
A situação da educação é um outro crime do Poder Público contra a vida do povo. "Sinceramente, não entendo por que mais pessoas não se sentem revoltadas diante das condições da educação pública neste país. Somos uma nação em que cerca de 50% das crianças brasileiras da 5a série são semianalfabetas. Dos 3,5 milhões de alunos que ingressam no ensino médio (antigo colegial), apenas 1,8 milhão se formam. (…) Estas estatísticas refletem décadas - ou melhor, centenas de anos - de descaso com a educação" (Jair Ribeiro. Revolução na educação. Folha de S. Paulo, 05/12/10, p. A3).
A avaliação internacional, chamada Pisa e coordenada pela OCDM (Organização de Nações Desenvolvidas), analisou a educação em 65 países e constatou: "Os estudantes brasileiros com 15 anos melhoraram em leitura, ciências e matemática nos últimos 9 anos. Seguem, porém, entre os mais atrasados do mundo. (…) No ranking, o Brasil está na 53a posição, com nota semelhante a Colômbia e Trinidad e Tabago" (Folha de S. Paulo, 08/12/10, p. C1).
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) sobre a Evolução do Analfabetismo e do Analfabetismo funcional (quem tem menos de quatro anos de estudo) no Brasil - Período 2004-2009, realizada anualmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), constatou: "No Brasil, a taxa de analfabetismo entre pessoas com mais de 15 anos recuou 1,8% no período e hoje é de 9,7% - ou cerca 14 milhões de habitantes que não sabem ler nem escrever" (O Popular, 10/12/10, p. 8).
Segundo os dados, divulgados no dia nove de dezembro/10 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e que se referem a pessoas com mais de 15 anos de idade, "mesmo com uma queda de 2,1 pontos porcentuais nos índices de analfabetismo em cinco anos, Goiás ainda tinha 384 mil pessoas analfabetas e outras quase 500 mil analfabetas funcionais em 2009" (Ib.).
O aumento (que está na ordem do dia) de 133,96% do salário do presidente da República, de 148,63% do salário do vice-presidente da República e dos ministros de Estado, e de 61,83% do salário dos deputados federais e senadores que, por efeito cascata, provoca automaticamente o aumento do salário dos deputados estaduais, é também um crime do Poder Público contra a vida do povo. O projeto federal de aumento salarial foi aprovado na quarta feira, dia 15 de dezembro/10.
Com isso, o salário do presidente e vice-presidente da República, dos ministros de Estado, e dos deputados federais e senadores passa a ser de R$ 26.723,13. O salário dos parlamentares goianos, que antes era de R$ 12.384,06, passa a ser de R$ 20.042,25. Além do salário, os deputados goianos têm o direito legal (mas não o direito ético) a R$ 21 mil mensais de verba indenizatória para gastos com viagens, telefonia, escritório, combustíveis, etc. Que vergonha! É realmente um pontapé na cara do povo, que ganha um salário de fome.
Poderíamos enumerar uma lista enorme de crimes do Poder Público contra a vida do povo, como, por exemplo, o caos na saúde pública e muitos outros, que o espaço limitado de um artigo não permite.
Os três casos citados são suficientes para mostrar que os crimes do Poder Público contra a vida do povo são uma consequência lógica de um “sistema econômico iníquo” (DA - Documento de Aparecida, 385) ou de um “sistema nefasto”, porque considera “o lucro como o motivo essencial do progresso econômico, a concorrência como lei suprema da economia, a propriedade privada dos bens de produção como um direito absoluto, sem limites nem obrigações correspondentes” (PP - Populorum Progressio, 26).
Em outras palavras, os crimes do Poder Público contra a vida do povo são uma consequência lógica de "estruturas de morte" (DA 112) e de "estruturas de pecado" (DA 92, 532) ou "situações de pecado" (DA 95).
Diante desse sistema de competição, de dominação e de exploração, diante de tanta injustiça e iniquidade, o que fazer? Os Movimentos sociais populares e todos aqueles/as que acreditam que é possível mudar esta realidade precisam se unir, não se deixar cooptar pelo sistema vigente e lutar rumo à vitória de maneira organizada, para que um "mundo novo" aconteça, um mundo de cooperação, de igualdade, de solidariedade e de fraternidade. 
Para os cristãos católicos, o Advento é um tempo forte de alegria e de esperança ativa, que - unidos a todas as forças sociais que buscam a transformação e a mudança - os leva a ser sujeitos de uma história diferente, de "uma outra história possível".

"O senhor é fiel para sempre, faz justiça aos que são oprimidos; ele dá alimento aos famintos, é o Senhor quem liberta os cativos" (Salmo 146).   

                Diário da Manhã , Opinião Pública, Goiânia, 16/12/10, p. 17 




Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção -  SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra


quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Torneiras fechadas e torneiras abertas


O ministro da Fazenda Guido Mantega afirmou que o novo governo terá "torneiras fechadas" e repetiu várias vezes que é necessário "frear gastos públicos". Acrescentou que "todos os ministérios terão de dar a sua contribuição". Declarou também que negociar um salário mínimo superior aos R$ 540 previstos no projeto de Orçamento-2011, é "uma ameaça à consolidação fiscal". Disse ainda "ser fundamental que não sejam aprovados projetos em tramitação no Congresso, como a PEC 300, que eleva salários na área de segurança". Além de "cortar despesas de custeio e aumentar a poupança pública", o ministro "se comprometeu a economizar o suficiente para reduzir a dívida pública de 41% para 30% do PIB em 2014" (Folha de S. Paulo, 25/11/10, p. A6).
Como se pode perceber pela fala do ministro, está claro que - embora mudando algumas pessoas - a política econômica continua a mesma. Ela está voltada para os interesses do grande capital. "Mudança, mas sem virada de mesa. Executivos do mercado de capitais viram na indicação da equipe econômica da presidenta eleita, Dilma Rousseff, um esforço de renovação, porém, conservando o status quo longamente testado e aprovado" (Ib., p. A8).
O povo empobrecido, oprimido e excluído continuará recebendo do poder público "esmolinhas" para que não se revolte e para que continue alimentando o "populismo" dos nossos governantes, tão necessário para fins político eleitoreiros.
As torneiras, senhor ministro, deveriam estar fechadas para o desvio de verbas, para o superfaturamento nas licitações públicas, para os mensalões, para a barganha política na distribuição de cargos, para a prática da corrupção e para todos os gastos desnecessários, como, por exemplo, a compra do Aerodilma.
Quem leu a notícia "governo negocia a compra de novo avião presidencial" e tem um mínimo de senso de justiça deve ter ficado profundamente indignado. É um acinte que subestima a inteligência do nosso povo. Não dá para entender como um governo que pretende ser "dos trabalhadores" (mas que, de fato, traiu "os trabalhadores") se preocupe tanto com posturas ostensivas e luxuosas. Parece que os nossos governantes estão se lambuzando com o poder às custas do povo sofrido. Lembrem-se que não é o cargo que dá valor e dignidade a pessoa humana, mas é a pessoa humana que dá valor e dignidade ao cargo.
O Aerodilma "custa até cinco vezes os US$ 56,7 milhões (…) pagos em 2005 pelo Aerolula, um Eirbus-A319 em versão executiva". Que vergonha! As próprias autoridades estão escondendo a cara. "Justificar tal despesa seria complicado, como foi em 2005, e seria fonte certa de desgaste para Dilma (…) Assim, juntou-se a fome com a vontade de comer, e a nova compra está sendo camuflada por uma necessidade real" (Folha de S. Paulo, 29/11/10, p. A12). Vejam só a preocupação do nosso governo. É realmente ridículo. É realmente assustador ver tanta irresponsabilidade.  
As torneiras, senhor ministro, deveriam estar abertas para implementar políticas públicas que criem condições permanentes de vida digna para o nosso povo (isso não se faz com "esmolinhas"); que defendam e promovam os direitos humanos; que implantem um sistema de educação pública de qualidade, um sistema de saúde com atendimento respeitoso e competente, um verdadeiro sistema de segurança (sem violência policial), um  transporte coletivo eficiente; enfim, políticas públicas voltadas para a geração de empregos com salário justo para todos, principalmente para os jovens, tirando-os do mundo da violência e das drogas (não com salário mínimo de R$ 540, que é uma afronta aos trabalhadores/as). Isso sim, significa "virar a mesa" e pôr em prática uma política econômica diferente, uma política econômica humana e a serviço do bem comum.
Infelizmente, no sistema capitalista neoliberal, as relações econômicas, internacionais e nacionais, são estruturalmente criminosas e assassinas. Matam os pobres paulatinamente. Basta lembrar que, em 2009, o governo gastou 36% do orçamento da União (380 bilhões de reais) para pagar os juros da dívida pública, enquanto gastou 4,8% para a saúde e 2,8% para a educação. Trata-se de uma verdadeira sangria, que torna os ricos sempre mais ricos à custa dos pobres sempre mais pobres.
Por que o governo, dito "popular" e "dos trabalhadores" (não "dos capitalistas") não promove uma auditoria a respeito da dívida pública, interna e externa, como seus membros sempre defenderam antes de chegar ao poder? A própria Constituição Federal de 1988, a respeito da dívida externa, diz que o governo devia fazer a auditoria, no prazo de um ano, a partir da data de sua promulgação. Não o fez. Por que?
 Se o governo promovesse a auditoria da dívida pública, descobriria quem fez a dívida, como o dinheiro foi usado, quem se beneficiou (não foi certamente o povo)  e, talvez, descobriria que, na realidade, a dívida já foi paga muitas vezes e que o credor é o próprio povo. Isso poderia justificar, legal e moralmente, o cancelamento e o não pagamento da dívida pública e o PIB poderia ser usado integralmente para implementar políticas públicas em benefício do povo.
Mas, mesmo admitindo a hipótese que, depois da auditoria, sobrasse algumas dívidas (o que é muito improvável), o governo teria a obrigação moral de pagar a dívida só depois de resolver os problemas sociais básicos do nosso povo e depois que todos tivessem uma vida humana digna. Isso justificaria a moratória.
Graças a Deus, ainda tem muita gente que acredita num "outro mundo possível" e num "outro Brasil possível". E é por isso que continua lutando para que o "sonho" se torne realidade. "Vem, Senhor, não tardes mais, és o anseio das nações! Vem curar os nossos 'ais' e expulsar as opressões! (Canto litúrgico do Advento). 






      
                                    Diário da Manhã , Opinião Pública, Goiânia, 02/12/10, p. 10


 
Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos