sábado, 25 de junho de 2011

Iluminação precária e falta de sinalização nos bairros da periferia de Goiânia

Quem anda, a pé, de ônibus ou de carro, nos bairros da periferia de Goiânia pode constatar a falta de sinalização no transito e, de noite, também a precariedade da iluminação pública. As intervenções, as benfeitorias e/ou as melhorias realizadas pelo Poder Público Municipal são insuficientes e não acompanham o crescimento da cidade.
            Foram realizadas - é verdade - algumas obras, que merecem o nosso reconhecimento, como, por exemplo, as obras de revitalização da Avenida do Povo, da Praça 16 de Outubro e de construção da Praça das Palmeiras Vereador Gari Negro Jobs, na Vila Mutirão.
“A Praça 16 de Outubro ganhou academia de ginástica, parque infantil, bancos de madeira, lixeiras e pergolado. A Praça das Palmeiras Vereador Gari Negro Jobs, que antes era utilizada como depósito de lixo e entulho, agora conta com ornamentação e paisagismo, grama esmeralda, nove espécies de palmeira, parque infantil, pergolado, academia de ginástica e floreiras. Trafegar pela região também ficou mais fácil com o alargamento da Avenida do Povo. O novo projeto da via, que abrange a Vila Mutirão e o Jardim Liberdade, incluiu o estreitamento do canteiro central e o alargamento das pistas. Além disso, foi feito o plantio de árvores e grama esmeralda e as passarelas ganharam vasos e iluminação especial” (www.prefeituragoiania.stiloweb.com.br – 18/04/11).
Essas benfeitorias, que eram esperadas há muito tempo pela comunidade, foram inauguradas no dia 15 de abril/11 pelo prefeito de Goiânia Paulo Garcia. Estiveram presentes o presidente da Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), Luciano Henrique de Castro, o presidente da Agência Municipal de Obras (Amob), Iram Saraiva Júnior, secretários municipais e vereadores.
Com as obras de reurbanização de canteiros e a construção de novos espaços, “têm surgidos - destaca o prefeito - nichos de aconchego em lugares nunca antes imaginados” (Ib.). A humanização desses espaços públicos - afirma ainda o prefeito - tem por objetivo “promover a melhoria da qualidade de vida e favorecer o lazer e a convivência dos moradores dos bairros onde estão sendo realizadas as obras” (Ib.).
Segundo as autoridades do município, com as obras da Vila Mutirão, a Prefeitura de Goiânia “democratiza o acesso a projetos (...), que até agora só haviam sido executados em setores nobres e centrais, como as Alamedas Eugênio Jardim e Coronel Joaquim Bastos, no Marista” (Ib.).
Tudo isso é positivo, mas precisamos fazer alguns questionamentos. Por que os setores, do ponto de vista econômico, mais ricos e, portanto, de maior poder aquisitivo, são chamados de “setores nobres”? Por que aceitamos, como sendo natural, uma ideologia que valoriza as pessoas, os locais e os ambientes na base do ter e não do ser? Por que achamos normal que seja o econômico a determinar a “nobreza” de um setor? Isso não demonstra um atraso cultural muito grande? Por que, por exemplo, a Vila Mutirão, não pode ser considerada um “setor nobre” tanto quanto o Setor Marista ou, quem sabe, até mais?
E ainda: Por que, quando é inaugurada uma obra pública nos bairros da periferia, costuma-se usar, nos discursos, uma linguagem que denota bajulação e  submissão às autoridades? Por que costuma-se agradecer as autoridades como se a obra inaugurada fosse um favor que elas fazem ao povo? Será que o povo esqueceu que o dinheiro usado nas obras é dele?
O próprio estilo das reportagens jornalísticas dá a impressão que, nos bairros ricos, as benfeitorias são consideradas um direito dos moradores e sua realização, uma obrigação do Poder Público. Nos bairros pobres, ao contrário, as benfeitorias - quando realizadas - não são consideradas um direito dos moradores, mas uma benevolência do Poder Público.
Isso acontece porque, no sistema capitalista neoliberal, os governantes não governam para os pobres, mas para os ricos. Um exemplo claro disso é a história dos moradores da Ocupação “Sonho Real”, no Parque Oeste Industrial. Para os pobres só restam as migalhas que sobram da mesa dos ricos. Essas migalhas servem para manter os pobres submissos, como massa de manobra para fins eleitoreiros.
Enfim, reconhecemos que as obras e benfeitorias realizadas na Vila Mutirão - como outras obras e benfeitorias - são uma contribuição para a melhoria da qualidade de vida dos moradores e são motivo de esperança. Portanto, parabenizamos (não agradecemos) o prefeito e as demais autoridades municipais que, ao menos nesses casos, cumpriram o seu dever. Constatamos também com satisfação que o povo está cada vez mais consciente a respeito da necessidade de respeitar os bens públicos, que são de todos, sem praticar vandalismos.
Mas, apesar das obras e benfeitorias realizadas pela Prefeitura, somos obrigados a admitir que a situação das ruas e outros espaços públicos dos bairros da periferia de Goiânia continua, em geral, precária e, em muitos casos, calamitosa.
            Como seria bom se todas as ruas e praças dos nossos bairros da periferia de Goiânia fossem revitalizadas como a Avenida do Povo e a Praça 16 de Outubro! Infelizmente, a maioria dessas ruas e praças estão cheias de buracos (talvez por causa do asfalto mal feito), sem meio-fios, sem faixas demarcando as ruas, sem faixas de pedestres, sem sinalização horizontal ou vertical nos quebra-molas e sem iluminação pública adequada.
             Tudo isso favorece os acidentes de carro e a prática de crimes, como roubos e assaltos. Quem sabe (é uma sugestão) chegou a hora de criar em Goiânia as Sub-Prefeituras para um trabalho descentralizado e mais eficiente, não só na área da infra-estrutura, mas também e sobretudo, em outras áreas (como as áreas da educação, da saúde, da moradia, do trabalho, da segurança e do transporte) que têm por finalidade implantar políticas públicas em benefício do povo.
            A descentralização do trabalho na vida pública exige, porém, políticos e governantes honestos e éticos, que estejam a serviço do bem comum e cumpram suas tarefas com amor. Em caso contrário, a descentralização oferece, aos políticos e governantes, a possibilidade de práticas de abuso de poder, de desvio de verbas públicas e de corrupção, para seus interesses pessoais.

            Esperamos que o Poder Público Municipal olhe, com vontade política de buscar soluções, para as necessidades de infra-estrutura e outras necessidades dos bairros da periferia de Goiânia e tome com urgência as devidas providências, para uma melhor qualidade de vida do povo.
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 24/06/11, p. 5


            Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
                                                                                                                                                                      E-mail: mpsassatelli@uol.com.br

sábado, 18 de junho de 2011

Palocci caiu, o caso não encerrou

Há poucos dias escrevi um artigo com o título  “O caso Palocci: o ‘toma lá, dá cá’ de uma política sem ética” (Diário da Manhã, Opinião Pública, 03/06/11, p. 3). Depois dos novos desdobramentos do caso em questão, volto a falar sobre o assunto.
Como todos sabemos pela ampla cobertura que a imprensa deu ao fato, antes de assumir o cargo de ministro-chefe da Casa Civil do governo Dilma Rousseff, Antônio Palocci adquiriu, na cidade de São Paulo, um escritório por R$ 882 mil e um apartamento de luxo por R$ 6,6 milhões. Segundo o  ministro, os dois imóveis foram comprados pela empresa Projeto Administração de Imóveis, da qual ele possui 99,9% do capital.
Em base ao patrimônio de R$ 375 mil, declarado à Justiça Eleitoral em 2006, com a compra desses imóveis, Palocci multiplicou por 20 seu patrimônio nos quatro anos em que esteve na Câmara (Cf. Folha de S Paulo, 15/05/11, p.A4).
Por causa da crise que a denúncia causou no governo Dilma Rousseff, depois de muitos conchavos políticos, Palocci caiu, mas o “caso Palocci” não encerrou. A sociedade exige que seja investigado e que - se comprovados (como tudo indica) os crimes de enriquecimento por abuso de poder e de trafico de influência - o ex-ministro seja processado, julgado e condenado. Infelizmente, os crimes de colarinho branco quase sempre são silenciados, esquecidos e empurrados debaixo do tapete. Não podemos permitir que a impunidade continue. É uma questão de justiça, é uma questão de ética.
Infelizmente, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, decidiu arquivar as representações, que pediam a abertura de inquérito contra o ministro-chefe da casa Civil, Antônio Palocci, por não existir - segundo ele - indícios concretos de prática de crime e nem justa causa para investigar o caso.
"O Ministério Público - diz Romeu Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado - analisou toda a documentação minuciosamente e apontou que não há irregularidade. Se não há irregularidade, não tem por que se querer fazer CPI ou convocar o ministro Palocci aqui no Senado. É um assunto de página virada." (www.terra.com.br - 07/06/11). O senador pretende tampar o sol com a peneira e mente descaradamente, sabendo que aquilo que ele diz não é verdade. As denúncias são muito graves, e a sociedade espera que todas elas sejam investigadas e esclarecidas, com a maior transparência possível. Chega de impunidade!
O deputado federal Moreira Mendes (PPS-RO) - expressando, a respeito do caso Palocci, os sentimentos da grande maioria dos cidadãos/ãs brasileiros - reagiu à decisão do procurador-geral da República, dizendo: “É absolutamente lamentável essa decisão do procurador-geral. Com essa  postura, o Ministério Público Federal passou a ser um apêndice, uma assessoria especializada do Palácio do Planalto”. E ainda: “A instituição deixou de lado a responsabilidade constitucional de fiscalizar os atos do Poder Público. Ao engavetar os pedidos de investigação, o procurador-geral faz com que o Ministério Público perca  credibilidade”.
O deputado disse também ser o “fim” o MP desprezar os “fortes” indícios que pesam contra o ministro e indagou: “Ao que parece, nem isso sensibilizou o procurador. E se aparecer mais denúncias, vai ficar assim mesmo? E a satisfação que  o Ministério Público terá de dar à sociedade?”.
Como se isso não bastasse, o governo Dilma Rousseff submete - segundo Moreira Mendes - o Congresso Nacional a uma situação “constrangedora”, a fim de evitar que Antônio Palocci seja convocado pelo mesmo Congresso para explicar a “fórmula” pela qual conseguiu crescer seu patrimônio 20 vezes em quatro anos (www.pps.org.br - 07/06/11).
Por que tantas artimanhas para esconder a verdade dos fatos? Tudo isso suscita - e com razão - muitas suspeitas. Se nas investigações houvesse honestidade, o primeiro interessado no esclarecimento dos fatos deveria ser o próprio Antônio Palocci.
O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, afirmou que recebeu com frustração e decepção a notícia da decisão do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de arquivar as representações contra o então ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci,
 "Ninguém - comentou ele - vinha atribuindo culpa a quem quer que seja. O que a sociedade esperava era a investigação da situação que envolvia o ministro Palocci por parte do Estado brasileiro, aí representado por quem pode fazê-lo, que é o Ministério Público Federal". Segundo o presidente nacional da OAB, com a decisão, a leitura que se transmite à sociedade é, lamentavelmente, "a de que se conferiu uma senha para a impunidade neste país".
O sentimento maior - continua Ophir Cavalcante - é o de frustração e decepção, porque se negou o direito da sociedade brasileira, de ver realizada a investigação acerca dos bens de um dos homens públicos mais influentes da República (www.oab.org.br - 07/06/11).
Mesmo após o arquivamento pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, das representações contra Antônio Palocci, por iniciativa da oposição e da imprensa, as investigações continuam acontecendo no Ministério Público Federal do Distrito Federal, no Ministério Público Federal de São Paulo e na própria Procuradoria Geral da República (PGR).
“O País merece saber como o ministro-chefe da Casa Civil conseguiu tanto dinheiro em tão pouco tempo. Se é que teve mesmo clientela tão vasta enquanto era deputado federal, a que título seus clientes o pagaram? As deduções de impostos de tais pagamentos foram feitas corretamente ou houve irregularidade por incompatibilidade dos serviços realmente prestados com as exigências da Receita? Isso sem contar a necessidade de verificação sobre possíveis vínculos entre a atividade de consultor e a influência de Palocci no governo” (www.estadao.com.br - 08/06/11).
Outras duas denúncias surgiram contra Antônio Palocci. A primeira é a denúncia de que ele vive há quatro anos num apartamento alugado de 640 metros quadrados, cujo dono - segundo reportagem da Revista Veja (04/06/11) - é uma empresa fantasma, ou seja, de fachada, que está em nome de um laranja de 23 anos, que mora num casebre de fundos na periferia de Mauá, no ABC Paulista, e recebe R$ 700 por mês.
A segunda é a denúncia de que Antônio Palocci teria incorrido em crime fiscal, quando - numa entrevista concedida à TV Globo (04/06/11) - admitiu ter recebido, no final de 2010, R$ 10 milhões, relativos a contratos praticados entre 2006 e 2010 pela empresa de consultoria Projeto.
Os que lutamos pela justiça e exigimos que as denúncias contra Palocci (como contra qualquer pessoa) sejam investigadas, muitas vezes, somos acusados de desestabilizar o governo e favorecer o retorno da direita.
Podemos perguntar: “Nesse contexto, o que cabe à esquerda? Calar-se para não se misturar com essa escumalha reacionária? Nem de perto. Cabe denunciar os dois como produtos inerentes do caráter essencialmente predatório dessa ordem econômica que oprime maiorias para enriquecer privilegiados. Dessa ordem capitalista. É isso que temos que deixar claro permanentemente. Embora estejamos taticamente coincidentes, até juntos, não estamos misturados. Estamos contra os dois: os que se venderam, como Palocci e seus aliados - dos maganos do PT aos cardeais desprezíveis do PMDB -, e os que sempre estiveram cúmplices dos que corrompem e degradam as instituições, ditas, republicanas - PSDB, PFL e seus sucedâneos. E é por aí que fazemos a diferença. É por aí que nos fazemos imprescindíveis” (Milton Temer, Contra Palocci e contra a direita farsante,    www.correiocidadania.com.br - 08/06/11).
Além do mais, qual é, na prática, a diferença que existe entre Palocci e os políticos da chamada direita demotucana e sua mídia, se “Palocci sempre foi o homem de confiança do deus-mercado e dos barões da mídia”, e se Palocci sempre foi “um político pragmático, centralizador e adepto da ortodoxia neoliberal”? (Altamiro Borges, Palocci caiu! E agora, Dilma?  www.adital.com.br - 09/06/11).
E que dizer, então, do seguinte questionamento: “Em reunião de representantes do PT, PSB, PC do B e PDT, alguém discursou: precisamos estar atentos, pois a direita se prepara para voltar ao poder. Nessa seleta reunião, outro sujeito bradou com toda força: direita? Mas direita somos nós. Basta lembrarmos que ser direita é preservar a manutenção do sistema capitalista e é isso o que nós fazermos diuturnamente. Talvez os senhores estejam se referindo à extrema-direita. Mas o Maluf, o Sarney, o Jader Barbalho, o Renan Calheiros, o Romero Jucá e todo o PMDB fisiológico já não estão do nosso lado? Por que pregar esse espantalho de uma direita que não passa de nós mesmos?” (Gilvan Rocha, Que direita? - www.correiocidadania.com.br - 20/05/11). Pensemos nisso.

Enfim, os que lutamos por “um outro mundo possível” somos terminantemente contra toda prática política oportunista e interesseira, toda prática política de conchavos, e toda prática política do “toma lá, dá cá”, venha de onde vier. Queremos, sim, uma prática política que seja realmente humana e ética.
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 17/06/11, p. 3 



 Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra


domingo, 12 de junho de 2011

Uma saúde pública criminosa

Na madrugada do dia 31 de maio/11 o aposentado José Fernandes, de 65 anos, morreu “aguardando vaga de UTI em um Cais, onde ficou internado durante cinco dias. O drama de José Fernandes e de sua família foi mostrado pela TV Anhanguera” (O Popular, 03/06/11, p. 5). Perguntamos: Quem vai responder pela morte de José Fernandes? O que o Ministério Público está fazendo para que os responsáveis por esse crime sejam processados, julgados e punidos? A sociedade aguarda uma resposta.
Mesmo depois de anunciada - há quase um mês - a parceria entre as Secretarias Estadual (SES) e Municipal de Saúde (SMS), “os pacientes que precisam de atendimento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) continuam enfrentando horas e até dias de espera por uma vaga” (Ib.).
            Entre muitos casos, cito o de Reinaldo Alves Pereira, de 85 anos, já divulgado na imprensa. Reinaldo está com Acidente Vascular Cerebral (AVC) isquêmico e com pneumonia. Foi internado às 11 horas do dia 30 de maio/11 no Cais Novo Mundo. A família precisou recorrer ao Ministério Público e ingressar com mandado de segurança para conseguir uma vaga na UTI por volta das 19 horas do mesmo dia.
            A pedagoga Elma Teresinha Pereira Carvalho, filha única de Reinaldo, contou: “Tenho convicção de que só conseguimos a vaga graças à intervenção de um vizinho, que é vereador”. Meu pai - continua ela - quase morreu esperando pela UTI”. Que descaso! Que falta de respeito!
            Infelizmente, não são somente os doentes graves que estão insatisfeitos com a saúde pública. A reclamação é geral, por causa das estruturas físicas precárias dos centros de atendimento, da constante falta de médicos, da demora para conseguir consulta e para ser atendido, e do mau atendimento recebido nos consultórios. Só para citar um exemplo, no dia dois de junho/11, como é comum acontecer, havia no Cais de Campinas - segundo os próprios pacientes - apenas um médico atendendo.
Numa pesquisa, realizada anonimamente em diversas unidades de saúde do município de Goiânia no início de fevereiro/11, observou-se como era prestada a assistência aos pacientes e constatou-se que, de 20 consultas cronometradas, a mais longa durou 5min e 40seg, e a mais curta - a de Vanusa Cunha, de 35 anos, que virou capa do jornal - durou 33seg. O recomendado pelo Conselho de Medicina é o atendimento de 20min (Cf. O Popular 06/02/11, capa e p. 4-5 - reportagem). Que irresponsabilidade! Que situação criminosa! Apesar das medidas anunciadas para melhorar a qualidade do atendimento, a saúde pública continua uma verdadeira calamidade.
            Vanusa Souza Cunha, procurada depois de três meses da consulta relâmpago de 33seg, era o retrato da desesperança. Indignada pelo tratamento recebido antes e, sem acreditar que a situação possa mudar, afirma: “Prefiro sentir dor em casa que esperar pelo Sistema Único de Saúde (SUS)”. E continua dizendo: “Nunca mais voltei ao Centro de Assistência Integral à Saúde (Cais) do Jardim Curitiba, na Região Noroeste de Goiânia. Dá até descrença de ir lá” (Ib. 05/08/11, p. 3).
Há poucos dias, porém, Vanusa sentiu na pele, mais uma vez, o que é depender da saúde pública. “A mãe dela, idosa, precisa se submeter a um exame de endoscopia, cuja autorização parte da SMS. Para conseguir o ‘chequinho’ que permitirá à mãe fazer o exame, Vanusa passou 11 horas numa fila, das 5 às 16 horas, ‘sem almoço, sem lanche e em pé’” (Ib.). A história de Vanusa é o retrato fiel de uma legião enorme de trabalhadores/as, que são obrigados a depender do SUS.
            Há também reclamações frequentes de falta de medicamentos nas farmácias das unidades de saúde. Basta citar um fato concreto, que é revelador de toda uma situação de descaso do Poder Público em relação à saúde. Há poucos dias um trabalhador com neuropatia em estado muito avançado (que, segundo ele, é consequência do espancamento do qual foi vítima durante a chamada “Operação Triunfo”, no bárbaro despejo dos moradores da ocupação “Sonho Real” do Parque Oeste Industrial, em 2005) e sem condições de trabalhar, me procurou desesperado pedindo ajuda. Mostrou-me um Protocolo - que deixa qualquer ser humano indignado - com os dizeres: “Certifico, para os devidos fins, que nesta presente data 18/05/11, recebemos a receita do paciente José (nome fictício) na farmácia da Secretaria Municipal da Saúde de Goiânia. Data provável da entrega dos medicamentos 18/06/11”. Que descaramento! Que falta de humanidade!
Reparem: José, que devido à doença não tem as mínimas condições de trabalhar, precisa urgentemente de dois remédios de uso contínuo, relativamente caros. A farmácia da Secretaria Municipal de Saúde recebe a receita das mãos do paciente e marca, para depois de 30 dias, a data provável da entrega dos medicamentos. Que cinismo! Que humilhação! O próprio teor do Protocolo soa como uma condenação à morte de José e, indiretamente, é uma confissão de culpa do Poder Público Municipal.
O povo não tem nada a ver com a desculpa da falta de verbas, com o atraso no repasse das mesmas por parte da União e do Estado. As relações entre as diversas instâncias de poder e as obrigações de cada instância são um problema político dos governantes. O povo, havendo necessidade e sobretudo urgência, tem o direito de ser atendido imediatamente e não depois de um mês  “com data provável”.

            No lugar de buscar - como parece esteja acontecendo - a privatização da saúde pública (uma área vital e historicamente escanteada) de maneira sutil e velada (para não ser impopular), como no caso das chamadas Organizações Sociais (OSs) (entidades que atuam em áreas de interesse público), o Poder Público - Federal, Estadual e Municipal - deveria se preocupar em cumprir a Constituição Federal, que reza: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (Art. 196). È só uma questão de prioridade política. A vida em primeiro lugar!
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 11/06/11, p. 3 


Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

sábado, 4 de junho de 2011

O caso Palocci: o “toma lá, dá cá” de uma política sem ética

“Semanas antes de assumir o cargo mais importante do governo Dilma Rousseff, o ministro Antônio Palocci (Casa Civil) comprou um apartamento de luxo em São Paulo por R$ 6,6 milhões. Um ano antes, Palocci adquiriu um escritório na cidade por R$ 882 mil”. Segundo o ministro, os dois imóveis foram comprados pela empresa Projeto Administração de Imóveis, da qual ele possui 99,9% do capital.
Em base ao patrimônio de R$ 375 mil, declarado à Justiça Eleitoral em 2006, com as compras dos dois imóveis “Palocci multiplicou por 20 seu patrimônio nos quatro anos em que esteve na Câmara - período imediatamente posterior à sua passagem pelo Ministério da Fazenda, no governo Lula” (Folha de S Paulo, 15/05/11, p.A4).
Observe-se que “o período no qual a empresa de consultoria Projeto ganhou mais dinheiro, cerca de R$ 10 milhões, foi quando o ministro Antônio Palocci (Casa Civil) tinha poder para acessar dados reservados e planos de investimentos do governo federal”. A empresa Projeto “faturou R$ 20 milhões em 2010. Metade desse valor foi contabilizado entre novembro e dezembro, meses em que Palocci acumulou a atividade empresarial com a função de coordenador da equipe de transição da presidenta Dilma Rousseff” (Ib., 29/05/11, p. A4).
O caso Palocci já foi abordado pelos meios de comunicação a partir de diferentes enfoques e com as mais variadas preocupações. O enfoque que interessa a muitos de nós brasileiros/as e a preocupação que muitos de nós temos é de caráter ético. Está claro que o ministro Palocci se aproveitou dos cargos públicos que ocupou para tráfico de influências, buscando, com o maior descaramento, seus próprios interesses pessoais. Não importa tanto saber se Palocci - devido a sua esperteza e as suas artimanhas políticas - conseguiu fazer o que fez de forma legal ou não; o que importa é saber que o comportamento político do ministro foi o de um aproveitador inescrupoloso e antiético.
As reações da maioria dos políticos diante do caso Palocci deixam muitos cidadãos/ãs boquiabertos e totalmente indignados com o jogo sujo do “toma lá, dá cá”. Trata-se de uma prática política desavergonhada, despudorada e antiética. È realmente assustador! Até onde nós vamos? A crise política que o governo federal vive, por causa do caso Palocci, é enfrentada sem nenhuma preocupação com a ética.
Alguns fatos ilustram muito bem esta realidade. “O governo se ampara na posição expressada pela Comissão de Ética Pública da Presidência, que se reuniu pela manhã (dia 16/05) e concluiu que não caberia ao grupo investigar a evolução patrimonial de Palocci, a não ser que alguma irregularidade específica fosse apontada”. “Para nós - diz  Gilberto Carvalho em nome do governo - o assunto está encerrado e nós estamos muito satisfeitos com esse resultado. Vamos para frente” (Ib., 17/05/11, p. A6). Que cinismo! Que hipocrisia! Será que o governo acha que o povo é idiota?
Vejam também o oportunismo das bancadas ruralista e evangélica (evangélica?). A preservação de Palocci foi utilizada pelas bancadas ruralista e evangélica como ‘moeda de troca’ para atingir os seus objetivos. Palocci, um dos principais articuladores do Planalto nocauteado pelas denúncias, tornou-se presa fácil nas mãos dessas bancadas. As notícias da imprensa e dos movimentos sociais que acompanham a crise dão conta de que o governo aceitou votar e fazer concessões no Código Florestal para evitar a convocação de Palocci no Congresso” (Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores - CEPAT / Instituto Humanitas Unisinos - IHU, Elementos para uma análise da Conjuntura da Semana, 30/05/11). Que pratica política é essa! É realmente uma prática política antiética e repugnante, que dá nojo.
Vejam ainda o argumento interesseiro dos detentores do poder econômico. “O possível enfraquecimento do ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, causa desconforto em boa parte do mercado. Ainda que longe do comando da economia, ele é visto por muitos analistas como o interlocutor mais confiável do sistema financeiro, disposto a lutar contra mudanças bruscas na condução da política econômica. Um Palocci fraco ou fora do governo tende a aumentar o grau de incerteza dos investidores em relação aos rumos da administração Dilma Rousseff na economia, embora isso não deva se traduzir em grande turbulência nos mercados ou em declarações mais enfáticas em defesa do ministro”.
O economista de uma instituição financeira (com passagem pelo governo Fernando Henrique Cardoso) afirma: “Para o mercado, Palocci é o integrante do governo de bom senso, com uma cabeça organizada, que pode evitar maluquices na economia”. Sempre segundo o economista, a saída de Palocci seria mal recebida por “tirar uma âncora de uma certa racionalidade dentro do governo” (Jorge Nogueira, O caso Palocci e a ética do mercado, 23/05/11 – www.midiaindependente.org). 
Que “certa racionalidade” é essa? Não é, sem dúvida, uma racionalidade que abre caminhos novos e faz acontecer um projeto alternativo de sociedade, que chamamos também de projeto popular, mas é a racionalidade do sistema financeiro mundial ou do sistema capitalista neoliberal vigente, que é um “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida - DA, 385); que é um “sistema nefasto”, porque considera “o lucro como o motivo essencial do progresso econômico, a concorrência como lei suprema da economia, a propriedade privada dos bens de produção como um direito absoluto, sem limites nem obrigações correspondentes” (Populorum Progressio - PP, 26); que é, enfim, "o mal maior, o pecado acumulado, a raiz estragada, a árvore que produz esses frutos que nós conhecemos: a pobreza, a fome, a doença, a morte da grande maioria" (Bispos do Centro-Oeste. Marginalização de um Povo, 1973).
O ministro Palocci é um homem público, que ocupa um cargo de muita responsabilidade no governo federal. E justamente por ser um homem público, diante das denúncias da imprensa a respeito do seu comportamento como político e como ministro, ele deveria ser o primeiro interessado no esclarecimento dos fatos. Quem não deve, não teme.
Não dá para entender a atitude do ministro Palocci. Usando o argumento de que os contratos têm cláusula de confidencialidade, ele não quer dar nenhuma explicação e se recusa a informar quem eram seus clientes.
Não dá para entender também a preocupação do governo federal de querer “blindar” o ministro com barganhas políticas - ameaças, concessões e acordos espúrios - para que a vida dele não seja investigada. Esse comportamento gera mais dúvidas, mais suspeitas e mais interrogações. Doa a quem doer, custe o que custar, a verdade deve ser dita, É uma exigência ética. “A verdade vos libertará” (Jo 8,32).
Finalmente, diante desse descalabro político, aparece uma luz, que é motivo de esperança. “Procuradoria abre investigação sobre os bens de Palocci”. “Ministério Público Federal quer saber como o ministro conseguiu multiplicar patrimônio por 20 em quatro anos”. “Cópias das declarações de Imposto de Renda de Palocci foram pedidas à Receita; petista terá que dar nomes de clientes”. “O Ministério Público Federal abriu investigação para apurar se o ministro Antônio Palocci (Casa Civil) enriqueceu ilicitamente” (Folha de S. Paulo, 27/05/11, p. A4). Esperamos que o resultado da investigação seja divulgado, para o conhecimento de todos, o mais rápido possível. A sociedade precisa de uma satisfação. Não dá mais para aguentar tanta falcatrua e tanta irresponsabilidade com a coisa pública.

Todos os que lutamos por “um outro mundo possível” e por “uma outra política possível” precisamos lembrar: “A cultura atual tende a propor estilos de ser e viver contrários à natureza e a dignidade do ser humano. O impacto dominante dos ídolos do poder, da riqueza e do prazer efêmero se transformaram, acima do valor da pessoa, em norma máxima de funcionamento e em critério decisivo na organização social. Diante dessa realidade, anunciamos, uma vez mais, o valor supremo de cada homem e de cada mulher. Na verdade, o Criador, ao colocar a serviço do ser humano tudo o que foi criado, manifesta a dignidade da pessoa humana e convida a respeita-la (cf. Gn 1,26-30)” (DA, 387).
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 03/06/11, p. 3 

Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
                                                                                                                                                      E-mail: mpsassatelli@uol.com.br

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Um transporte coletivo caótico e desumano

Os usuários do transporte coletivo estão indignados com o aumento da passagem de ônibus, sem as melhorias prometidas na operação do sistema em 2008. No dia 21/05/11, em toda a região metropolitana de Goiânia, a passagem passou de R$ 2,25 para R$ 2,50 e a do Eixo Anhanguera passou de R$ 1,15 para R$ 1,25. “O reajuste foi definido em reunião da Câmara Deliberativa do Transporte Coletivo (CDTC), na noite da última quarta feira (18), com base numa planilha de custo apresentada pela Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC)” (Diário da Manhã, 21/05/11, p. 2). No dia 20 de maio, um dia antes do aumento da tarifa e por causa do próprio aumento, os usuários do transporte coletivo tiveram muita dificuldade para adquirir bilhetes de sit pass.
O reajuste do valor das passagens de ônibus (o contrato prevê que seja anual) é calculado com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), aumento do salário dos motoristas e elevação do óleo diesel. Segundo o Sindicato das empresas de Transporte Urbano Coletivo (Setransp), as empresas não calculam tarifas, mas simplesmente repassam os custos do sistema à CMTC, numa planilha técnica, para que ela faça o cálculo.
O aumento só não ocorreu no ano passado (o último foi em 2009) porque “nem as empresas nem o Poder Público cumpriram todos os investimentos prometidos para o setor em março de 2008, quando foram renovados os contratos de concessão para a exploração do serviço. Novos abrigos, nova frota, reforma e ampliação de terminais e garagens, e o Centro de Controle Operacional (CCO) deveriam ser realizados em cinco anos, e até agora foram feitos parcialmente” (O Popular, 19/05/11, p. 3). Em janeiro/11, numa reunião extraordinária da CDTC, os prazos para o cumprimento das metas foram estendidos em mais um ano.
Segundo um engenheiro, ex-integrante da CDTC, que pediu sigilo da identidade, “existe a prática, por parte dos operadores (do sistema do transporte coletivo), de esperar que ônibus fiquem lotados para cumprir rotas e reduzir custos para as empresas”. Segundo ele, “a fiscalização da CMTC é ‘fantasiosa’ quanto ao cumprimento de planilhas e que a CDTC sempre delibera sobre renovação de concessões e aumento de tarifas, mas jamais sobre as operações”. Afirma textualmente: “Os fiscais não atuam, não há multas por atrasos. Há redução da frota com o argumento de reduzir custos e baixar as tarifas. Mas isso só reduz custos para eles mesmos. Porque, para o usuário, isso significa atrasos constantes e superlotação”. O engenheiro diz ainda que as planilhas não são cumpridas. “Terminais onde havia nove ônibus que atendiam três bairros passaram a operar com seis veículos. Para ajustar as planilhas, os operadores atrasam saídas, quando justamente há mais usuários à espera, o que gera superlotação. A prática e conhecida como ‘planilhão’”. E conclui com as palavras: “Deveriam colocar mais ônibus para reduzir intervalos de espera” (Ib.).
Quantas artimanhas que, por baixo dos panos, as empresas inventam em sua ganância e em sua sede de lucro, às custas do sofrimento do povo! È realmente uma grande injustiça social!
Vejam que situação trágica! “Noite de caos. Terminal destruído, ônibus apedrejados, bombas de efeito moral, correria, usuários passando mal e outros sendo presos fizeram parte do cenário de guerra na noite de 20/05, no Terminal Padre Pelágio em Goiânia” (Diário da Manhã, 21/05/11, 1ª e 2ª páginas, Manchetes).
A causa imediata do caos parece ter sido um acidente entre dois caminhões e a queda de energia na subestação do setor Campinas, que – segundo a imprensa noticiou – deixaram o trânsito congestionado e impediram a chegada dos ônibus no terminal. Na realidade, porém, esse fato só foi o estopim final. A verdadeira causa é que a paciência do povo, que precisa todo dia do transporte coletivo para ir ao trabalho, para voltar para casa e para outras necessidades, chegou no seu limite, ou seja, esgotou.
Não dá mais para aguentar tanto descaso, tanta falta de responsabilidade do Poder Público a respeito do transporte coletivo, que é um dos serviços básicos imprescindíveis. Entra governo, sai governo, e a situação caótica e desumana continua a mesma. Ônibus superlotados, sujos, muitos deles em condições precárias, e com constantes atrasos. Parecem mais ônibus de carga do que ônibus de transporte de pessoas humanas. É a total falta de consideração e de respeito pela dignidade do povo trabalhador. É uma desumanidade e uma imoralidade pública estrutural e, podemos dizer, legalizada.
As opiniões dos usuários do transporte coletivo sobre o aumento da passagem são muito significativas e reveladoras. Citemos algumas: “Pagaria até mais na passagem se houvesse serviço de qualidade. Do jeito que está, de graça é caro” (Hélio Junior). “Cadê a qualidade do serviço prestado que justifica esse aumento?” (Marcelo de Sá). “Gostaria de ver a planilha de cálculos, cronograma de investimentos e a fundamentação disso tudo” (Alex De Martini). “Isso é resultado do abuso de poder da rede privada, que não melhora o transporte público e ainda aumenta a tarifa” (Jordana Borges). “Lamentável, pois a qualidade é muito ruim!” (Wesley Rosa Pinheiro). “Desrespeito, não obrigam as empresas a reformar os terminais e aumentam o preço de um péssimo serviço!” (Paulo Winicius) (O Popular, 19/05/11, p. 3 – Opinião do leitor). São opiniões que falam por si mesmas.
Faltam realmente, na área do transporte coletivo (como, aliás, na área da saúde, da educação, do trabalho, da segurança e em outras áreas), políticas públicas que coloquem como prioridade absoluta a qualidade de vida do povo e não o enriquecimento das empresas. Precisamos urgentemente de um transporte coletivo digno. Andar de ônibus deveria ser prazeroso e repousante, e não cansativo e estressante. Talvez seja um sonho, mas o sonho pode se tornar realidade. Os recursos materiais existem. É só uma questão de

vontade política. A pessoa humana, sobretudo dos pobres e excluídos, deve estar sempre em primeiro lugar.

              
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 27/05/11, p. 3 

Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

domingo, 22 de maio de 2011

O novo Conselho de Ética do Senado: um deboche público

O Conselho de Ética (?) do Senado foi criado em 1993 com o objetivo de zelar pela conduta dos 81 senadores e ganhou, muitas vezes, as páginas do noticiário por causa dos casos de processos que, levados até ele, foram simplesmente arquivados. Só contra o presidente do Senado José Sarney foram arquivadas 11 acusações. Em 2009, a oposição, insatisfeita com as absolvições de Sarney, deixou o órgão como protesto. Depois de dois anos, o Conselho de Ética do Senado - formado por 15 titulares e 15 suplentes – reiniciou, no dia 27 de abril/11, suas atividades (cf. www.r7.com - 16/05/11).
“Novo Conselho de Ética tem Renan e aliados de Sarney” (Folha de S. Paulo, 27/04/11, p. A4, manchete), que são 13 senadores, incluindo o presidente do colegiado João Alberto Souza (PMDB-MA).
Vejam até onde chega o descaramento, ou, em outras palavras, a pouca vergonha deslavada da maioria dos nossos senadores. Reparem a composição do novo Conselho de Ética. Renan Calheiros foi eleito membro titular do órgão, “depois de responder a cinco processos por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética do Senado”. Juntamente com Renan, “foram escolhidos para compor o colegiado outros 14 senadores - grande parte com processos na Justiça”. Para presidir o Conselho, foi eleito no dia 27/04, com 14 votos dos 15 senadores presentes, o senador João Alberto Souza (PMDB-MA), que é amigo de Renan e do presidente do Senado José Sarney. “Fiel aliado dos Sarney, governou o Estado em1990 quando uma lei estadual doou um prédio histórico à família do presidente do Senado”. Apesar disso, com a maior cara de pau, promete independência (imaginem que independência!). “O conselho é cortar na própria carne”, diz ele. “Já estou preparado, exerci o cargo duas vezes”.
Continua o elenco dos senadores “éticos”. A vice-presidência do Conselho é ocupada por Gim Argello (PTB-DF), “investigado em inquérito que está no STF (Supremo Tribunal Federal) por ter alugado computadores com valor superfaturado quando era deputado distrital em Brasília”. São também membros do novo Conselho de Ética do Senado Valdir Raupp (PMDB-RO) e Romero Jucá (PMDB-RR). Valdir Raupp “foi acusado de desvio de recursos quando era governador de Rondônia, entre 1995 e 1998. Responde a processo na Justiça”. Romero Jucá, “em 2005, renunciou ao cargo de ministro da Previdência após suspeitas de que usou fazendas inexistentes como garantia para empréstimos” (Folha de São Paulo, ib.).
Resumindo: “Dos 15 titulares do Conselho, oito respondem a inquéritos ou a processos no Supremo Tribunal Federal. Destes, o campeão é Renan Calheiros (PMDB-AL), cinco vezes processado por quebra de decoro parlamentar. Lembram-se de quando ele foi forçado a renunciar à presidência do Senado justamente para escapar de ser cassado por quebra de decoro parlamentar. Para agravar a situação de absurdo, alguns desses senadores também já foram objeto de mais de um processo no próprio Conselho de Ética. E novamente Renan Calheiros, líder do PMDB no Senado, é o campeão, com cinco representações” (www.atarde.com.br – 16/05/11).
Mas que Conselho de Ética (?) o Senado tem! Trata-se de uma verdadeira afronta aos eleitores! Será que os nossos senadores acham que o povo é bobo? É realmente o cúmulo do absurdo! Como estamos longe de uma prática política ética!
“Vemos com preocupação o acelerado avanço de diversas formas de regressão autoritária por via democrática que, em certas ocasiões, resultam em regimes de corte neopopulista. Isso indica que não basta uma democracia puramente formal (...), mas é necessária uma democracia participativa e baseada na promoção e respeito dos direitos humanos. Uma democracia sem valores (...) torna-se facilmente ditadura e termina traindo o povo” (Documento de Aparecida - DA, 74).

Por isso, precisamos “apoiar a participação da sociedade civil para a reorientação e consequente reabilitação ética da política” (DA, 406a), como, por exemplo, a criação de instrumentos de controle externo. “Pensemos em quão necessária é a integridade moral nos políticos” (DA, 507) Uma outra prática política é possível e necessária. Lutemos por ela.
                   Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 21/05/11, p. 3 



Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Lula, o palestrante de luxo dos banqueiros e das multinacionais

No discurso da primeira convenção nacional do PT, em 1981, Lula afirmava que o partido então criado, era “uma inovação histórica” e vinha para livrar a classe trabalhadora da condição de “massa de manobra dos políticos da burguesia”. Dizia que o sindicato é a ferramenta adequada para melhorar as relações entre o capital e o trabalho, mas que o partido existe para ir além: “Queremos que os trabalhadores sejam os donos dos meios de produção e dos frutos de seu trabalho”. Afirmava que “o mundo caminha para o socialismo” e que o PT, com sua mística radical, não tinha como objetivo “buscar paliativos para as desigualdades do capitalismo” (Cf. Leo Lince. Lula, a metamorfose que ambula, 14/04/11 – www.correiocidadania.com.br). Lula, quem te viu e quem te vê!
Em fevereiro/11 escrevi um artigo com o título “Lula, um ex-operário deslumbrado pelo poder” (Cf. Diário da Manhã, Opinião Pública, 07/02/11, p. 18).  Hoje acrescento que Lula é também um ex-presidente - ex-sindicalista e ex-operário - obcecado pela fama. Como o ex-presidente Lula pode ser tão oportunista e renegar sua própria história; como pode ser tão ambicioso e tão ganancioso, até o ponto de - como palestrante de luxo a serviço dos interesses dos banqueiros e das multinacionais - vender sua própria dignidade humana, traindo seus ex-companheiros. É realmente um comportamento repugnante e totalmente antiético.
Vejam só que absurdo! Lula, o novo empresário e o novo rico, tornou-se o palestrante mais caro do Brasil. Segundo noticiou a imprensa, o ex-presidente cobra por uma palestra um cachê que vai de R$ 200 mil a cerca de R$ 790 mil (por enquanto!). Em março/11, a multinacional LG foi a primeira a contratar o Lula para uma palestra no Brasil, com cachê de R$ 200 mil. A multinacional Telefônica convidou o Lula para uma palestra em Londres, com cachê de cerca US$ 300 mil. Lula foi também a Washington, a convite da Microsoft, e a Acapulco, a convite da Associação dos Bancos do México. No dia 4 de maio/11, o Lula fez palestra em São Paulo, a convite do Bank of América Merril Lynch. Reparem: quando Lula vai ao exterior, viaja quase sempre em jatinho particular. Como custa caro o ex-operário, ex-sindicalista e ex-presidente Lula! Parece o mais valioso mascote dos detentores do poder econômico mundial! É inacreditável que ainda existam pessoas dispostas a ouvir as baboseiras do Lula, falando de si mesmo (se autoelogiando), dos feitos de seu governo e do aumento da presença (que tipo de presença?) do Brasil no cenário dos “donos” do mundo.
Sempre segundo noticiou a imprensa, o Lula aceitou também o convite da multinacional LG para fazer palestra na Coréia do Sul, com cachê de US$ 500 mil (cerca de R$ 790 mil). Se confirmado o evento na Coréia do Sul, em três ou quatro meses, a receita do Lula em moeda estrangeira chegará a US$ 1,2 milhão. Trata-se realmente de uma afronta aos trabalhadores (ex-companheiros de Lula) e de um pontapé na cara dos pobres. Trata-se de um dinheiro que é fruto da exploração dos trabalhadores pelas multinacionais e, portanto, de um roubo legalizado. O pior é que Lula sabe disso.
A assessoria de Lula não confirma o valor do cachê das palestras do ex-presidente e Paulo Okamoto - sócio do novo empresário petista Lula na empresa LILS - diz cinicamente que “é segredo de Estado” (Cf. Folha de S. Paulo, 04/05/11, p. A9). Que desrespeito para com o povo! Que vergonha!
Esses fatos são mais que suficientes para provar que Lula - como diz o sociólogo Leo Lince - é “a metamorfose que ambula”. Pessoalmente acho que, desde a campanha para o 1º mandato de presidente da República quando quis ganhar as eleições a qualquer custo e com qualquer meio, Lula traiu os trabalhadores, seus ex-companheiros, aliou-se aos detentores do poder econômico mundial e usou sua popularidade (melhor seria dizer: seu populismo) a serviço dos interesses deles.
Permito-me sonhar! Como seria diferente se Lula, em suas palestras, fosse aliado e porta-voz dos trabalhadores, denunciando a exploração das multinacionais e dos banqueiros (que, diga-se de passagem, no governo Lula tiveram o maior lucro já conseguido até o presente), as estruturas de injustiça e a iniqüidade do atual sistema econômico mundial. Nesse caso, seriam os movimentos populares e os sindicatos autênticos dos trabalhadores a convidar Lula para proferir palestras, e não os banqueiros e as multinacionais. Lula não ganharia cachês milionários, mas ganharia um cachê muito mais valioso que seria a felicidade de servir gratuitamente. Nada vale mais que a felicidade e a alegria da missão cumprida.
Em todo esse contexto, é mais do que oportuna a advertência do apóstolo Tiago,  também para os novos ricos como Lula: “E agora vocês, ricos: comecem a chorar e gritar por causa das desgraças que estão para cair sobre vocês. Suas riquezas estão podres, suas roupas estão roídas pela traça; o ouro e a prata de vocês estão enferrujados; e a ferrugem deles será testemunha contra vocês, e como fogo lhes devorará a carne. Vocês amontoaram tesouros para o fim dos tempos. Vejam o salário dos trabalhadores que fizeram a colheita nos campos de vocês: retido por vocês, esse salário clama, e os protestos dos cortadores chegaram aos ouvidos do Senhor dos exércitos” (Tg 5, 1-4).

Lembremos: não são os milhões de dólares que fazem o ser humano feliz e realizado!
Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 13/05/11, p. 5


Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
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Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos