sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Mensalão: um espetáculo circense

Sem querer generalizar, a vida pública transforma-se, na maioria das vezes, numa farra atrás da outra, ou - dito de outra forma - numa sucessão de espetáculos circenses, que, nos intervalos, oferecem sessões de piadas de mau gosto.
Um destes espetáculos é o chamado mensalão. Não dá para entender! Que justiça é essa? A questão não é meramente jurídica ou técnica, como muitos querem fazer crer, mas é, sobretudo, ética. Pergunto: houve ou não desvio de dinheiro público para compra de votos? E, se houve (até as pedras sabem disso), por que os responsáveis, depois de processados, julgados e condenados, não são obrigados a devolver o dinheiro roubado - que é dinheiro dos trabalhadores - aos cofres púbicos, sem tanta demora ou enrolação? Fatos são fatos, não são opiniões subjetivas. O dinheiro não é uma bolha de sabão, que desaparece ao menor sopro. Protelar demasiadamente o julgamento -mesmo com todos os artifícios legais possíveis - não é uma forma indireta de defender a impunidade e de ser coniventes com a prática política da corrupção pública?
Vir, como faz o ministro Gilberto Carvalho e o próprio ex-presidente Lula, com essa história de que se trata somente de caixa dois, significa subestimar a inteligência do povo e tratá-lo como otário.
Continuo perguntando: se os acusados fossem pobres, será que haveria a mesma preocupação e o mesmo interesse em salvaguardar o direito dos réus à análise dos “embargos infringentes”, a um “novo julgamento” e, por conseguinte, a ter um “processo justo”? O primeiro processo não foi justo? Será que foi baseado em fantasias e não em fatos? Onde está a moral dos juízes?
Vale o ditado: quem rouba pouco (uma galinha ou uma bugiganga no supermercado) é chamado de “ladrão”, quem rouba muito, é chamado de “barão”. As cadeias - que em geral são depósitos de lixo humano (violando todos os direitos humanos) - estão cheias de “ladrões”, mas os “barões” estão todos soltos e considerados “pessoas de bem”. Que sociedade hipócrita é a nossa!
O argumento de que houve outros mensalões - como de fato houve - não justifica. Todos os mensalões (e outras falcatruas da vida pública) devem ser denunciados e julgados. Mas o mensalão, que é hoje motivo de tanta celeuma, revela uma dose maior de hipocrisia e farisaísmo do que os outros. Infelizmente, todos sabemos que os outros mensalões são parte integrante da própria política capitalista neoliberal, que é uma política estruturalmente desumana e antiética. Ora, os acusados (ou seja, os mensaleiros) do mensalão, que está em julgamento, sempre denunciaram energicamente semelhante prática e, chegando ao poder, fizeram a mesma coisa. Aí está o motivo principal da indignação das pessoas, que têm um mínimo de senso ético e lutam por um mundo estruturalmente novo.
Não se trata, como dizem alguns, de sentimento de vingança ou de revanchismo, que é desumano e anticristão, mas de uma questão de transparência e justiça.
Jesus foi sempre de ternura e bondade infinitas para com os pecadores, que reconheciam seus erros (errar é humano), mas foi de uma dureza e severidade incrível com os fariseus, que eram pessoas “legalmente perfeitas”, mas oportunistas, falsas, hipócritas e injustas.
“Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus, hipócritas! Vocês são como sepulcros caiados: por fora parecem bonitos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e podridão. Assim também vocês: por fora, parecem justos diante dos outros, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e injustiça. Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas!” (Mt 23, 27-29).
Dizer também que mesmo alguns dos que se declaram cristãos da esquerda podem cair na armadilha do mecanismo “bode expiatório”, é um equívoco. Os cristãos - conscientes do que seja ser cristãos hoje - são “profetas da vida” e querem uma prática política diferente, como aliás o Partido dos Trabalhadores prometeu, mas - chegando ao poder - não cumpriu e continua não cumprindo!
Dizer ainda (estou cansado de ouvir essa ladainha) que certas forças políticas não se conformam com a chegada da esquerda ao governo, é outro grande equívoco. Que esquerda é essa, que faz aliança com Maluf, Sarney, Renan Calheiros e outros representantes históricos da ultradireita e da ditadura? Biblicamente falando, “aliança” não é um mero acordo estratégico ocasional, mas é comunhão permanente de ideais e de projetos. Que esquerda é essa, que pratica uma política na qual os banqueiros têm os maiores lucros de sua história, sugando criminosamente o sangue dos trabalhadores? Que esquerda é essa do Partido dos Trabalhadores, que, num passado recente, foi motivo de tanta esperança para o povo e que hoje - com argumentos oportunistas, que não convencem ninguém - renega toda sua história?
É verdade que os programas sociais dos últimos governos federais melhoraram a vida de muitas pessoas, mas não deixam de ser programas ambíguos. De um lado, aliviam o sofrimento do povo (o que é positivo), de outro, servem para cooptar o povo, mantê-lo submisso e fortalecer assim - sem perigo de contestações e revoltas - o sistema capitalista neoliberal, com sua política macroeconômica excludente e opressora.  
Os Movimentos Sociais Populares precisam, em primeiro lugar, recuperar sua autonomia e liberdade de organização, frente ao Poder Público e, em segundo lugar, lançar-se no desafio da construção do Projeto Popular para o Brasil, em contraposição ao projeto capitalista neoliberal.
Os membros dos Movimentos Sociais Populares e seus aliados, que - depois de muita luta - conseguiram ocupar alguns espaços na vida pública (no Executivo, Legislativo e Judiciário) não traiam seus companheiros (como, muitas vezes, costuma acontecer), dialoguem com todas as forças políticas, que - embora diferentes - têm o mesmo ideal (a mesma utopia) e exijam mudanças estruturais (sistêmicas), abrindo, assim, caminhos concretos para a construção do Projeto Popular. É este o tipo de atuação política que os representantes dos Movimentos Sociais Populares e seus aliados devem ter na institucionalidade.
A esperança se renova a cada dia e nunca acaba. Sejamos sujeitos conscientes e protagonistas de um Mundo Novo.


 Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 25 de setembro de 2013

sábado, 21 de setembro de 2013

A força dos Movimentos Sociais Populares

Os Movimentos Sociais Populares, que - depois de um tempo de hibernação - ressurgem com toda força, estão se unindo e organizando para exigir e construir mudanças estruturais. No dia 5 de agosto deste ano, aconteceu em São Paulo a Plenária Nacional de Movimentos Sociais Populares do campo e da cidade de todo o Brasil
Estiveram presentes na Plenária representantes de 15 Estados e mais de 45 Movimentos Sociais Populares.

A parte da manhã foi dedicada à construção de uma análise coletiva da conjuntura política com a intervenção de mais de vinte companheiros/as. Depois dessa análise, ficou claro, para todos e todas, que os Movimentos Sociais Populares devem se comprometer, cada vez mais, com as lutas sociais por mudanças estruturais.
Para dialogar com as mobilizações das ruas e as manifestações da sociedade os Movimentos apontam três caminhos. Primeiro: “seguir fazendo a luta concreta pelas conquistas imediatas da classe trabalhadora”. Segundo: “estimular e participar de todas as mobilizações de massas nas ruas”. Terceiro: dialogar na institucionalidade.
“Na institucionalidade, a única forma de dialogarmos agora é pela via da luta por uma Constituinte Exclusiva sobre o sistema político brasileiro, que coloque em debate na sociedade a necessidade das reformas estruturais. Para que se crie uma correlação de forças na qual tenhamos a capacidade de avançar nesta luta é preciso que o povo brasileiro exija essa Constituinte. Por isso, a realização de um Plebiscito Popular que leve o povo a participar de todo este processo de debates e lutas é a melhor forma tática e pedagógica de fazer o debate das mudanças políticas necessária no nosso país”.
Os militantes de Movimentos Sociais Populares de todo o Brasil afirmam: “precisamos construir um entendimento no campo popular, sobre quais as mudanças políticas que queremos, sobre que tipo de reformas estruturais e que tipo de reforma política. Também precisamos aprofundar sobre quais são as características da eleição de uma Constituinte para que ela seja popular e exclusiva apenas para fazer as leis das reformas. Isso será debatido e aprofundado entre os Movimentos Sociais Populares ao longo deste processo de construção”.
Dizem ainda os militantes dos Movimentos: aprofundaremos o debate sobre as características do Método e Organização do Trabalho a ser realizado no Plebiscito Popular, já que pensamos realizá-lo ao longo de um período que vá até o próximo ano”.
Nos encaminhamentos organizativos, foi pedido que na Jornada da Semana da Pátria (7 de setembro) - como forma de fazer o anúncio público - fosse divulgado que os Movimentos Sociais Populares realizarão um Plebiscito Popular para convocar uma Constituinte  Exclusiva.
Na Plenária Nacional foram discutidos também outros assuntos como: a defesa da soberania nacional contra os leilões do petróleo e da energia elétrica; o combate ao superávit primário e ao PL 4330; a democratização da mídia, e os 10% do PIB para a educação.
 Foi pedido, ainda, que os militantes realizem Plenárias Estaduais e Municipais (locais) com o maior numero possível de Movimentos Sociais Populares, para que se somem a esse debate e aprofundem suas idéias.
Por fim, permito-me fazer um alerta sobre dois perigos que, sobretudo hoje, rondam os Movimentos Sociais Populares: o perigo do neopeleguismo e o perigo do mero reformismo.
O neopeleguismo leva os Movimentos Sociais Populares a se deixar cooptar pelo Poder Público, atrelando-se a seus interesses e perdendo, por conseguinte, sua autonomia. Às vezes, leva também a se omitir diante da criminalização dos Movimentos por parte do Poder Público.
O mero reformismo leva os Movimentos Sociais Populares a acreditarem que o sistema capitalista neoliberal pode ser melhorado e humanizado somente com reformas. Não podemos esquecer que a injustiça e a iniquidade (desumanidade) do sistema capitalista neoliberal está no próprio sistema e é estrutural.  Portanto, precisamos lutar por mudanças que sejam sistêmicas e estruturais. O sistema capitalista neoliberal pede historicamente uma superação. Em determinadas situações, ele pode ser “amenizado”, mas nunca “humanizado”. Não existe - como afirmam alguns - capitalismo neoliberal de face humana ou com sensibilidade social. As reformas são ambíguas. Elas podem fortalecer e/ou enfraquecer o sistema vigente. Precisamos nos comprometer com reformas que, mesmo em sua ambiguidade, enfraqueçam o sistema e abram caminhos para mudanças estruturais, ou seja, mudanças  revolucionárias.
Termino fazendo meu o Convite: Participe conosco do “Momento de Diálogo e Reflexão” sobre o tema “O Brasil das Ruas. Provocações e Propostas para Goiás”: dia 26 deste mês, às 14 horas, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFG - Praça Universitária.
Colaboram: João Pedro Stedile - MST Nacional e Prof. José Paulo Pietrafesa - PUC Goiás/UFG.
Assinam o Convite: MST, PUC Goiás, UFG, UEG, Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil, CUT Goiás, Comitê Goiano da Verdade, Memória e Justiça, MCP, CRB, Grito dos Excluídos, Via Campesina, ANIGO, Comissão Verdade, Memória e Justiça do Sindicato dos Jornalistas de Goiás, Cajueiro, Centro Cultural Cara Vídeo, IBRACE.

Em tempo: recebi hoje, de noite, o Relato “Plebiscito Popular pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político” da Plenária Nacional dos Movimentos Sociais Populares, realizada em São Paulo, nos dias 14 e 15 deste mês. Voltarei sobre o assunto e demais encaminhamentos da Plenária.

Leia também:



 Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 19 de setembro de 2013

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Do pecado de omissão libertai-nos, Senhor!

“Eu quero que a Igreja vá para as ruas” (Francisco)

O maior pecado da Igreja hoje - e a Igreja somos todos nós, cristãos e cristãs - é o pecado de omissão: conivência silenciosa com as estruturas sociais de injustiça e de violação dos direitos humanos, justificada, muitas vezes, em nome da prudência, do diálogo e da verdade. Mas, que verdade é essa! Não é mera hipocrisia! Falo isso com dor no coração, porque amo a Igreja. Ela é a minha mãe. Eu também sou a Igreja.
Parafraseando João XXIII e Francisco, como gostaria de uma Igreja pobre, para os pobres, com os pobres e dos pobres!
Um exemplo recente de pecado de omissão - entre os muitos que poderiam ser citados - foi o comportamento da Igreja, que está em Goiânia, em relação ao Grito dos/as Excluídos/as 2013.
No dia 22 de julho passado, a Comissão Episcopal Pasto­ral para o Serviço da Cari­dade, da Justiça e da Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) enviou a todas as dioceses, paróquias e comunidades a Carta “Em apoio ao Grito dos/as Excluídos/as”.
A Carta inicia dizendo: “estamos celebrando o 19º Grito dos Excluídos/as com o lema: Juventude que ousa lutar constrói o Projeto Popular. O Grito acontece também em sintonia com a 5ª Semana Social Brasileira que traz a reflexão sobre o Estado: Estado para que e para quem?” (Diga-se de passagem, a Igreja, que está em Goiânia, não enviou nenhum representante na 5ª SSB).
“Com mais este Grito - continua a Carta - queremos contri­buir na superação da contradição funda­mental existente na sociedade brasileira, que continua sendo obrigada a conviver com a aberrante contradição de ser a 6ª potência econômica mundial e a 184ª em desigualdade social”. Que absurdo! Que pecado estrutural!
A Carta faz, pois, um caloroso convite: “convidamos as juventudes e a sociedade brasileira para participar des­te momento especial. Queremos também contribuir, com a força da fé, para que os raios de luz que irradiam das juventudes sejam alimentados e jamais se apaguem. E que o Estado brasileiro se coloque a serviço da sociedade e não do poder econômico”.
Continua ainda a Carta: “apoiamos a juventude brasileira que emerge como novos sujeitos sociais e exige novas estruturas de participação democrática, reforçando a democracia participativa e direta como forma legiti­ma de governo da sociedade brasileira. Acreditamos que as mani­festações populares poderão encontrar no 19º Grito uma rica oportunidade de expressão dos legítimos anseios da juventude brasileira que exige um novo Estado, uma nova política e uma nova nação”.
A Carta termina com um veemente apelo: “participe do 19º Grito dos Excluídos/as em sua comunidade e ouse lutar por um Projeto Popular fundamentado na garantia e proteção à saúde, segurança, transporte, emprego, salário e educação!” (Guilherme Werlang, bispo de Ipa­meri - GO e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz da CNBB).
Pergunto agora: Por que a Igreja, que está em Goiânia, na sua grande maioria, não atendeu a este apelo insistente da CNBB? Por que a participação dos cristãos e cristãs - embora expressiva - foi numérica e proporcionalmente tão pequena? Onde estavam, no dia 7 de setembro, de manhã, os representantes de muitas das nossas comunidades e paróquias? E os padres, que, como pastores, devem guiar (e guiar - diz Francisco - “não é o mesmo que comandar”) as nossas Comunidades e Paróquias? Mesmo tendo consciência que alguns faltaram por razões válidas, dói muito saber que só dois padres participaram da manifestação. Felizmente, tivemos a presença de muitas religiosas, inseridas nas comunidades. Foi um testemunho muito bonito e de profundo espírito evangélico.
É verdade que o Grito dos/as Excluídos/as é um espaço de participação livre e popular e não só eclesial, mas a Igreja não deve ser fermento na massa, sal da terra e luz do mundo? Como pode ser fermento, sal e luz ficando por fora? Jesus não estava sempre no meio do povo, anunciando - com sua vida e palavra - a Boa Notícia do Reino de Deus? Por que tanto medo da diversidade e do pluralismo? Não é essa uma atitude farisaica? Falando, por exemplo, dos nossos irmãos gays, Francisco diz: "se uma pessoa é gay e busca Deus, quem sou eu para julgá-la?" E Jesus não foi acusado pelos fariseus - os legalmente “perfeitos” - de comer na casa dos pecadores? Ele não foi condenado porque subvertia a ordem? O que significa realmente seguir Jesus hoje, no mundo em que vivemos? Ser cristãos e cristãs - como nos lembra o Documento de Aparecida (471 e 220) - não é ser “profetas da vida”? E ser religiosos e religiosas não é ser “radicalmente profetas da vida”?
Apesar dessas limitações, a manifestação do Grito dos/as Excluídos/as em Goiânia (como, aliás, em todo o Brasil) foi muito boa e muito significativa. Participaram cerca de 800 pessoas, que - depois de uma caminhada pela Rua 10, da Praça Universitária até a Praça Cívica, com uma parada ao lado da Catedral - se uniram a outros grupos de manifestantes, cerca de 1000 pessoas, todos e todas gritando e lutando - embora no respeito à diversidade - por um outro mundo possível, mais justo, mais humano e mais fraterno. Num dos cartazes lia-se: “O Povo acordou! O Povo decidiu! Ou para a roubalheira ou paramos o Brasil! Agora chega!”. Ver tanta coragem e tanta vontade de lutar - sobretudo no meio dos jovens - nos anima a todos e a todas.
“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos/as de Cristo. Não se encontra nada verdadeiramente humano que não lhes ressoe no coração” (A Igreja no mundo de hoje - GS, 1). 
Escutemos o apelo do nosso irmão Francisco: a Igreja deve “sair das torres de marfim e ir ao encontro do povo.” "Eu quero agito nas dioceses, que vocês saiam às ruas. Eu quero que a Igreja vá para as ruas, eu quero que nós nos defendamos de toda acomodação, imobilidade, clericalismo. Se a Igreja não sai às ruas, se converte em uma ONG. A igreja não pode ser uma ONG". "Eu peço desculpas aos bispos e aos padres se isso pode gerar uma confusãozinha para vocês também" (JMJ, Encontro com os jovens argentinos, 25 de julho). Quanta sensibilidade humana! Quanta sinceridade! Quanto ardor missionário!  O testemunho de Francisco renova a nossa esperança.
A Primeira Leitura de domingo passado pergunta: “qual é o ser humano que pode conhecer os desígnios de Deus? Ou quem pode imaginar o desígnio do Senhor? (...) Acaso alguém teria conhecido o teu desígnio, sem que lhe desses Sabedoria e do alto lhe enviasses teu Santo Espírito? (Sb. 9, 13.17).  Que Deus  nos dê essa Sabedoria!

"Para desempenhar sua missão, a Igreja, a todo momento, tem o dever de perscrutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho”.
“Por conseguinte, é necessário conhecer e entender o mundo no qual vivemos,
suas esperanças, suas aspirações e sua índole frequentemente dramática"
 (A Igreja no mundo de hoje - GS, 4).



Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 11 de setembro de 2013

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Grito dos/as Excluídos/as 2013

“Juventude que ousa lutar
constrói o Projeto Popular!”

O Grito dos/as Excluídos/as “é uma manifestação popular carregada de simbolismo, é um espaço de animação e profecia, sempre aberto e plural de pessoas, grupos, entidades, igrejas e movimentos sociais comprometidos com as causas dos/as excluídos/as”. Ele “constitui-se numa mobilização com três sentidos: denunciar o modelo político e econômico que, ao mesmo tempo, concentra riqueza e renda e condena milhões de pessoas à exclusão social; tornar público, nas ruas e praças, o rosto desfigurado dos grupos excluídos, vítimas do desemprego, da miséria e da fome; propor caminhos alternativos ao modelo econômico neoliberal, de forma a desenvolver uma política de inclusão social, com a participação ampla de todos os cidadãos”.
O Grito “não é um movimento nem uma campanha, mas um espaço de participação livre e popular, em que os próprios excluídos/as, junto com os movimentos e entidades que os defendem, trazem à luz o protesto oculto nos esconderijos da sociedade e, ao mesmo tempo, o anseio por mudanças” (http://www.gritodosexcluidos.org/historia/).
O Grito dos/as Excluídos/as deste ano - em sua 19ª edição - tem como tema “A exclusão dos/as jovens” e como lema “Juventude que ousa lutar constrói o Projeto Popular!”. Pretende refletir sobre a situação da juventude - vítima de um sistema gerador de exclusão, discriminação, violência e extermínio - e convocar os/as jovens ao protagonismo social.
“Precisamos ter claro que o Estado, como temos hoje no Brasil, é a forma de organização da classe dominante. Sua função é tornar essa classe sempre mais dominante, visando sua hegemonia; assegurar o funcionamento e a reprodução do capital; impedir qualquer tentativa de mobilização popular”. 
A estratégia dos/as excluídos/as passa necessariamente pela mudança profunda da estrutura do Estado. “Nosso desafio é saber atuar nesta conjuntura tão adversa. É fundamental que os trabalhadores e trabalhadoras tenham um projeto que coloque no centro os interesses do Projeto Popular para o Brasil, articulado e assumido pelo conjunto das forças sociais do campo e da cidade. O momento é de fortalecermos lutas unificadas para derrotar as estruturas injustas desta sociedade”.
O Grito dos/as Excluídos/as 2013 “incentiva e convoca as organizações de articulação da juventude e da sociedade em geral a se juntarem, lutar e ajudar na construção deste Projeto Popular. A luta e a unidade da juventude são muito importantes nesta conjuntura. Os jovens podem contribuir com a criatividade, com a energia, com a força e com espírito questionador, próprios da juventude, para enfrentar o capital. E, como protagonistas, construírem sua história, comprometidos com a luta pela transformação social e a continuidade da vida”.
Este ano, o Grito dos/as Excluídos/as tem dez eixos: Mundo do Trabalho, Juventude e Exclusão, Comunicação, Políticas Públicas, Extermínio da Juventude, Juventude e Projeto Popular para o Brasil, Mística, Povos Indígenas/tradicionais, Violência contra a Mulher, Estado e Juventude”.
A respeito do Mundo do Trabalho, queremos “denunciar a exploração sofrida pelos jovens trabalhadores/as do campo e da cidade; levar a discussão sobre a ligação entre precariedade, exploração, desemprego e a relação com os Governos; gritar pelos direitos trabalhistas e educação formal da juventude; construir e divulgar caminhos concretos para a juventude trabalhadora enfrentar essa realidade”.
A respeito da Juventude e Exclusão, queremos “lutar pela desconstrução da realidade de exclusão social, sobretudo dos jovens, que cada vez mais se torna invisível aos olhos do sistema, do Estado, dos políticos e da sociedade como um todo”.
A respeito da Comunicação, queremos “denunciar os meios de comunicação de massa que vêm, ao longo da história, utilizando as mídias como instrumento de poder, alienação e manipulação da juventude e da sociedade. As mídias alternativas apresentam-se como uma forma de democratizar as informações, articular, mobilizar e impulsionar a organização coletiva em prol de objetivos comuns”. Queremos “anunciar que outra forma de comunicação é possível”. Precisamos “nos apropriar dos mecanismos de mídia em favor das lutas sociais” e gritar pela democratização da comunicação.
A respeito das Políticas Públicas, queremos que “as políticas públicas, em favor da juventude, sejam implementadas e monitoradas, visando uma sociedade mais justa e igualitária”.
A respeito do Extermínio da Juventude, queremos clamar “por paz e justiça, contra qualquer tipo de extermínio, seja físico ou mental, que atinja nossa juventude” e convidar “a todos/as a somar-se às lutas que já vêm acontecendo”.
A respeito da Juventude e Projeto Popular para o Brasil, queremos que - em contraposição ao projeto capitalista - os jovens se lancem “no desafio da construção do Projeto Popular. O que será possível com a luta pela construção de uma democracia plena e real”, que socialize o acesso a todos os direitos, inclusive à soberania.
A respeito da Mística, queremos - diante da mudança de época e dos novos desafios que esta mudança nos apresenta - “refletir sobre o protagonismo social dos jovens, homens, mulheres, negros, urbanos e rurais para superarem as crises, as adversidades e as situações traumáticas. É aí que entra a nossa espiritualidade, fonte e base de sustentação a uma prática transformadora com olhar distinto e microscópico das situações/realidades, que conduza à cidadania. É através da Mística que buscamos essa prática transformadora, ‘tudo junto e misturado’, dialogando e buscando novas experiências que ajudem na superação de problemas e dos grandes riscos que afetam o crescimento humano e espiritual”.
A respeito dos Povos Indígenas/tradicionais, queremos mudanças profundas, como “a demarcação de terra, autonomia e reconhecimento desses povos historicamente vítimas de exclusão, extermínio e escravidão. Para isso destacamos o protagonismo assumido pelos povos indígenas, que lutam pelo reconhecimento de seus territórios e denunciam as agressões e mortes que vêm sofrendo”.
A respeito da Violência contra a Mulher, queremos nos apropriar da Lei Maria da Penha e impulsionar “a discussão do papel do homem e da mulher, para que possamos combater o mal da violência contra a mulher pela raiz”.
A respeito do Estado e Juventude, queremos reivindicar “que o Estado cumpra com a sua responsabilidade de garantir direitos e políticas públicas a toda a população com qualidade e prioridade, principalmente aos nossos jovens e adolescentes”. (http://www.gritodosexcluidos.org/pdf/jornal_grito_56.pdf).

Em Goiânia, o Grito dos/as Excluídos/as 2013 acontecerá no dia 7 deste mês. A concentração será na Praça Universitária às 8 horas, com oficina de cartazes e apresentações teatrais de jovens. Caminharemos até a Catedral. Teremos uma parada e continuaremos a caminhada até a Praça Cívica. O encerramento está previsto por volta das 12 horas na mesma Praça. Participe! Sua presença é muito importante! Um outro mundo é possível e necessário!

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Farra parlamentar

Em um ano, 16 deputados estaduais fizeram 30 viagens internacionais para 13 países diferentes. O total gasto foi de R$ 774,135,42. A Assembleia Legislativa de Goiás pagou em média R$ 25.8 mil por viagem.
Gravem o nome dos deputados que viajaram com toda mordomia, gastando o dinheiro do povo: Ademir Menezes - PSD (Estados Unidos: R$ 19.972,90), Álvaro Guimarães - PR (Argentina: R$ 13.010,00), Bruno Peixoto -PMDB (Estados Unidos: R$ 23.077,88), Carlos Antônio - PSC (País não informado - duas vezes - e Suécia: R$ 73.037,54), Claudio Meirelles - PR (Estados Unidos - três vezes -: R$ 63.062,50), Daniel Messac - PSDB (Espanha: R$ 29.784,80), Francisco Junior - PSD (Portugal: R$ 31,093,05), Frederico Nascimento - PSD (Portugal: R$ 29.331,15), Helder Valin - PSDB (Austrália, Nova Zelândia e China: R$ 53.264,10), Iso Moreira - PSDB (País não informado e Itália: R$ 49.090,50), Lincoln Tejota - PSD (Estados Unidos, México e Suécia: R$ 54.724,80), José de Lima - PDT (País não informado e Portugal: R$ 53.340,15), José Vitti - DEM (África do Sul, Canadá e Estados Unidos: R$ 46.413,30), Paulo Cezar Martins - PMDB (Espanha e Estados Unidos - duas vezes -: R$ 71..745,30), Talles Barreto - PTB (Inglaterra, País não informado e Portugal: R$ 90.630,15), Túlio Isac - PSDB (País não informado - duas vezes - e Estados Unidos: R$ 72.555,30).
Eleitores e eleitoras, será que esses parlamentares merecem o seu voto? Reparem: eles sequer se lembram do destino das viagens e do valor total gasto. Que deboche! Quanta falta de responsabilidade! Onde está a transparência no uso do dinheiro público? Por que a Assembleia Legislativa não presta conta à sociedade?  
Por que - apesar de a Lei N. 12.527 de 18 de novembro de 2011 (Lei de Informação) dispor “sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações” (Art. 1o) - nem todas as informações estão disponíveis para consulta? (Cf. O Popular, 26/08/13, p. 10).
Como a mídia divulgou a falcatrua dos parlamentares e a sociedade ficou indignada, o mesmo Jornal, no dia seguinte, publicou a notícia: “a Assembleia Legislativa editou um novo decreto para regulamentar a concessão de diárias e ajuda de custo na Casa, diminuindo os valores pagos e definindo melhor as regras para prestação de contas e entrega de relatórios. O documento vale para diárias - tanto internacionais como nacionais - concedidas a partir do início deste mês” (Ib. 27/08/13, p. 11).

Reparem: os nossos parlamentares estão mais preocupados em parecer éticos do que em ser éticos. Lembro à Assembleia Legislativa que não basta editar um novo decreto, entrando em vigor no início deste mês, mas é preciso investigar o mau uso do dinheiro público, que é dinheiro do povo. Os responsáveis devem ser processados, julgados e obrigados a devolver aos cofres públicos o dinheiro roubado. Onde está o Ministério Público? Por que tanta omissão? A denúncia é divulgada na mídia e tudo fica por isso mesmo? Não dá para entender tanta conivência. Está na hora de tomar as providências legais cabíveis. È uma questão de justiça.
O nosso irmão Francisco, bispo da Igreja de Roma, lembra aos cristãos que “envolver-se na política é uma obrigação”. Os cristãos não podem “fazer de Pilatos, lavar as mãos”. “Devemos - afirma Francisco - implicar-nos na política, porque a política é uma das formas mais elevadas da caridade, visto que procura o bem comum”.
“Os leigos cristãos devem trabalhar na política. Dir-me-ão: não é fácil. (...) A política é demasiado suja, mas é suja porque os cristãos não se implicaram com o espírito evangélico. É fácil atirar culpas... mas eu, que faço? Trabalhar para o bem comum é dever de cristão” (Francisco, Encontro com crianças e jovens de escolas e movimentos Jesuítas. Vaticano, 07/06/13).
Meditemos essas palavras do nosso irmão Francisco. Vamos à luta. Sejamos “profetas da Vida” (Documento de Aparecida, 471).


Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 29 de agosto de 2013

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Uma prática política oportunista

“Pelo menos 61 servidores lotados em órgãos da administração direta e indireta da Prefeitura de Goiânia, como a Comurg (Companhia de Urbanização de Goiânia), receberam salários que, em alguns casos, superaram R$ 80 mil, bem acima dos R$ 19,2 mil pagos a Paulo Garcia (prefeito), que foi definido por decreto como teto no Município.” (O Popular, 15/08/13, p. 13)



Trata-se de um verdadeiro assalto aos cofres públicos.



Uma denúncia como essa deveria levar a Câmara Municipal a tomar providências imediatas, para averiguar sua veracidade ou não. “A verdade vos libertará” (Jo 8, 32).



Infelizmente, não foi isso o que aconteceu nestes dias. Entre os vereadores prevaleceu uma prática política demagógica, oportunista, calculista e interesseira, que é repugnante e totalmente antiética.



Reparem: “Após manobra da base do prefeito Paulo Garcia (PT), a Câmara de Goiânia arquivou ontem (dia 14) requerimento apresentado pelo vereador Elias Vaz (sem partido) para instalação da Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar casos de salários acima do teto na Prefeitura de Goiânia. A pedido da líder do prefeito, Célia Valadão (PMDB), a sessão plenária foi interrompida para reunião a portas fechadas e quando retornaram ao plenário, 8 dos 17 vereadores que tinham assinado o requerimento retiraram suas assinaturas” (Ib.).



Vejam os nomes dos vereadores que, por covardia ou interesse pessoal (que não é certamente o amor à verdade) retiraram suas assinaturas do requerimento: Zander Fábio (PSL), Antônio Uchôa (PSL), Paulo da Farmácia (PSDC), Divino Rodrigues (PSDC), Bernardo do Cais (PSC), Tatiana Lemos (PC do B), Paulo Magalhães (PV), Rogério Cruz (PRB). Eleitores e eleitoras, será que esses vereadores merecem o voto de vocês?



Por que tanta falcatrua? Não deveria ser interesse de todo mundo saber se a denúncia dos supersalários é verdadeira ou não? E, se a denúncia for verdadeira, os vereadores – como representantes e servidores do povo – não deveriam ser os primeiros a exigir que os responsáveis sejam processados, julgados, condenados e obrigados a devolver aos cofres públicos o dinheiro roubado?



O fato que o prefeito “assinou decreto solicitando a adequação dos salários” (Ib.) não justifica o comportamento irresponsável dos vereadores. Investigar a denúncia e tomar as medidas legais cabíveis é uma questão de justiça. Tamanha imoralidade não pode ser empurrada debaixo do tapete.



Ora, se a investigação vai ser feita por meio de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) ou por uma Comissão Permanente, é secundário. O importante é que a investigação seja realizada em caráter de urgência, que o povo não seja enganado ou feito de palhaço e que seja dada uma satisfação pública à sociedade. Chega de enrolação! Não dá mais para aguentar! 



Aliás, é necessário que a investigação da denúncia dos supersalários se estenda a todos os níveis do Poder Público: do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Trata-se de uma verdadeira formação de quadrilha e de uma farra escandalosa, que clama por justiça. 



Ah! Se os vereadores de Goiânia e todos os políticos lembrassem as palavras do nosso irmão Francisco, bispo da Igreja de Roma!



“O futuro exige hoje a tarefa de reabilitar a política, que é uma das formas mais sublime da caridade. O futuro exige de nós também uma visão humanista da economia e uma política que obtenha cada vez mais e melhor a participação das pessoas, evite o elitismo e erradique a pobreza. Que a ninguém falte o necessário e que se garanta a todos dignidade, fraternidade e solidariedade: este é o caminho proposto” (Teatro Municipal do Rio de Janeiro, 27/07/13). 



Vale destacar que a líder do prefeito, acima citada, escreveu um lindo testemunho de sua presença, como cristã e política, na JMJ. Dá para entender? Quanta incoerência! 



Irmão Francisco, se Deus quiser, chegaremos lá!

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A pena de morte para os moradores de rua

Fabíola ou Neguinha, de aproximadamente 30 anos, foi assassinada com dois tiros (tórax e abdômen) numa calçada da Avenida Bruxelas, no Jardim Novo Mundo, em Goiânia, na madrugada do dia 3 deste mês. Ela é a 33ª vítima da violência contra os moradores de rua na Capital desde agosto do ano passado e foi encontrada sem vida ao lado de um cachimbo de crack e uma garrafa de bebida alcoólica.



Fabíola “foi a segunda moradora de rua assassinada só na semana passada. Ela era acostumada a passar o dia com um grupo de andarilhos que perambulavam na região leste da Capital, entre a Praça da Bíblia, no setor leste Vila Nova e a linha de trem, no Jardim Novo Mundo”. O assassinato de Fabíola “está dentro de um contexto em que moradores de rua na Capital têm sofrido ataques constantemente, a tiros, a pedradas e a pauladas”. Tem-se a impressão que, na prática, foi decretada a pena de morte para os moradores de rua. Uma verdadeira barbárie!



José Eduardo da Silva, assistente social e assessor de direitos humanos do município de Goiânia e da Coordenação do Comitê Intersetorial de Políticas Municipais para a População de Rua, anunciou que “em meio a mais uma onda de assassinatos na Grande Goiânia, a Prefeitura vai lançar, em 90 dias, um sistema de proteção à pessoas em situação de rua”. Reparem: em 90 dias. O município não percebe que se trata de urgência urgentíssima? Por que tanta demora? Será, mais uma vez, uma conversa fiada?



Maria Madalena Patrício de Almeida, da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia, afirma que “o número de vítimas pode ser bem maior, já que ela perdeu o contato com muitos moradores de rua, após o início das execuções em série”. Ela “cobra ações pontuais para a elucidação dos crimes”. Tudo indica que se trata realmente de um grupo de extermínio.



Diante da omissão do Poder Público (municipal e estadual) e de sua incapacidade (ou, falta de vontade política) de resolver o problema, a Pastoral dos Povos de Rua – como afirma Maria Madalena – defende que “a investigação desses crimes deve ser federalizada.”



A respeito disso, apareceu uma luz no final do túnel. “Uma proposta de federalização das investigações de aproximadamente 40 homicídios cometidos no Estado está em análise pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). O pedido é de autoria da Procuradoria-Geral da República” (O Popular, 04/08/13, p. 03). A esperança sempre se renova e nunca morre!



Domingo (11), deste mês, fiquei tomado de indignação, lendo a seguinte notícia: “Será realizado na manhã do dia 10 de setembro o primeiro júri popular do acusado de matar um morador de rua em Goiânia, que está na lista dos 33 executados desde agosto do ano passado. O também morador de rua Alessandro Marques Teresa vai responder pela morte de Jorge Coelho dos Santos, assassinado, a facadas, em 8 de dezembro do ano passado, em um depósito de reciclagens, na Vila Boa Sorte.”



Não quero defender ninguém que mata outra pessoa. Nesse caso, porém, algumas perguntas, se fazem necessárias. Faço-as não só em nome pessoal, mas também da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia.



Será que deve ser justamente um morador de rua (Alessandro) – acusado de matar outro morador de rua (Jorge) – o primeiro a ir a júri popular? Será que com isso a Justiça não quer desviar a atenção da sociedade do verdadeiro problema e fazer crer que quem mata os moradores de rua são outros moradores de rua? Será que o morador de rua que matou outro morador de rua – se é que é verdade – não foi “comprado” por alguém para fazer o serviço? Será que não existe um grupo de extermínio que, a mando dos poderosos (considerados pessoas de bem), quer “limpar” a cidade? Enfim, será que a Justiça acha que a população é idiota?



A notícia continua dizendo: “Outros 11 foram executados antes de Jorge, mas ainda não foram julgados. O PM Rogério Moreira da Silva, o Zinca, é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população, mas também não há previsão para o julgamento dele” (Ib., 11/08/13, p. 08).



Pergunto: “Por que esses 11 homicídios, que foram cometidos “antes”, não foram julgados e os assassinos não foram a júri popular?”



O próprio PM Rogério – sempre segundo a mesma notícia – é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população. Por que ele não foi ainda julgado e não foi a júri popular? Queremos justiça e não maracutaia!




Termino, lembrando que para começar a buscar uma solução à situação desumana em que vivem os moradores de rua, nossos irmãos e irmãs, é preciso implementar – com respeito e amor – uma política baseada na pedagogia libertadora, que leve esses mesmos moradores de rua a serem sujeitos (protagonistas) de sua própria história e não meros objetos da ação assistencial e/ou caritativa do Poder Público, das igrejas e das chamadas “pessoas de bem” de nossa sociedade excludente e hipócrita. A responsabilidade para que isso aconteça é de todos e todas nós.
A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos