sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Grito dos Excluídos e Excluídas: 30 anos de resistência

 


“30 anos tecendo o Brasil que a gente quer!”

O tema geral do Grito dos Excluídos e Excluídas é - desde o início - “Vida em primeiro lugar!”. O tema específico de 2024 é “Todas as formas de Vida importam. Mas quem se importa?”.

Antes de tudo, o Grito dos Excluídos e Excluídas deste ano faz a memória de uma tragédia que abala o mundo inteiro e, portanto, o Brasil também. “Segue o genocídio do Povo Palestino, mulheres e crianças como alvo, porque Israel e seus aliados acham que vidas palestinas não importam”.

Em seguida, lembra “os impactos das catástrofes climáticas, cada vez maiores, sobre os territórios periféricos - que não são só climáticas, mas provocadas pelo Sistema Capitalista para o qual a vida da Natureza não vale e a vida dos Povos Tradicionais não importa”.

O Grito continua apresentando alguns dados da realidade: “A riqueza dos cinco homens mais ricos mais que dobrou, entre 2020 e 2023, saindo de 405 bilhões de dólares para 869 bilhões de dólares. Enquanto 5 bilhões de pessoas ficaram mais pobres no mesmo período. A desigualdade e a fome aumentam dia após dia. E as políticas sociais continuam sendo cortadas dos orçamentos públicos, porque a vida das pessoas que acessam os serviços públicos pouco importa”.

E ainda: “A dívida pública consome quase metade do orçamento público federal (em 2023 foram R$ 1,879 trilhão, sendo 43,3% para pagar juros e serviços da dívida), estrangulando os gastos sociais em favor dos financeiros. Porque a vida dos que são credores de uma dívida social e ambiental pouco importa”.

“Na transação energética presente na intensa agenda internacional em que se encontra o Brasil, em 2024 e 2025 precisamos mostrar que as energias eólica e solar em grande escala não respondem a nossa soberania energética. São povos do campo e do mar enganados por falsos mercadores e a construção de torres de grande porte, impedindo que as pessoas durmam e crianças brinquem. A vida dessas pessoas importa?”.

O Grito lembra, pois, outros crimes: o aumento das pessoas em situação de rua; o aumento dos casos de estupro e feminicídio, em sua maioria dentro de casa; o aumento da carga diária de trabalho, diminuindo os rendimentos dos trabalhadores e trabalhadoras; a precarização no setor de aplicativos; a violência contra a população LGBTQIAPN+. A vida das mulheres e das crianças, dos trabalhadores e trabalhadoras não importa.

O desmatamento, as queimadas e a destruição dos biomas (Amazônia, Cerrado e outros) aumenta a cada dia que passa. A vida da Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum não importa.

Por fim, o Sistema Capitalista Neoliberal (ou Ultraneoliberal) é um Sistema injusto, desumano, antiético e anticristão. Sua iniquidade e perversidade é estrutural, legalizada e institucionalizada. Em outras palavras, é o pecado social ou estrutural do qual fala a Teologia da Libertação.

“Esse Sistema é insuportável, exclui, degrada e mata”

(Papa Francisco)

“Nesses 30 anos do Grito, ‘a Vida em primeiro lugar’ nos acompanhou! No mutirão pela vida, por terra, teto e trabalho! Porque a vida das mulheres, das crianças, do povo periférico, do povo negro, dos indígenas, dos quilombolas, das marisqueiras, das pessoas no campo, na floresta e na cidade IMPORTA”.

Se todos e todas somos irmãos e irmãs - unidos/as e organizados/as - precisamos derrotar, vencer e superar o Sistema Capitalista Neoliberal, rompendo com o ultra individualismo classista, racista, patriarcal e machista.

O Grito dos Excluídos e Excluídas - que comemora seus 30 anos de resistência - é um tempo forte de unidade na diversidade das Forças Socioambientais Populares: CEBs, Pastorais Sociais, Movimentos Populares, Partidos Políticos Populares, Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras, Coletivos de Mulheres, Entidades de Jovens estudantes, Fóruns de Direitos Humanos e de Cuidado com a Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum e muitas outras Organizações que lutam por um Projeto Popular Comunitário de Brasil e de Mundo. É a sinergia dos Excluídos e Excluídas fazendo acontecer um Brasil Novo, um Mundo Novo.

(Fonte: Jornal “Grito dos Excluídos e Excluidas”, ano 30 - número 81 - março/abril - 2024)


  Caminhando até a Ocupação Nova Canaã, onde acontecerá o GRITO


Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br

Goiânia, 30 de agosto de 2024



O Ser humano histórico-individual (4)



(Continua a série de artigos sobre o Ser humano)

Para o Ser humano histórico individual, “ser-no-mundo" corpórea, bio-psíquica e espiritualmente ou pessoalmente, significa ainda “ser-no-mundo" sexuadamente.

Como totalmente "corpo", totalmente "vida" (“bio-psique”) e totalmente "espírito" ou “pessoa” - o Ser humano individual é também totalmente "sexo" (sexuado). A "sexualidade" - que não se reduz à "genitalidade", mas a inclui - é constitutiva da individualidade (corporeidade, bio-psíquicidade e espiritualidade ou pessoalidade) do Ser humano.

A orientação sexual do Ser humano individual se desenvolve na adolescência, entre os 12 e os 16 anos aproximadamente. A maioria dos Seres humanos individuais sente atração (ligação afetiva) pelo sexo oposto (heterossexuais ou heteroafetivos); alguns (uma proporção bem menor), pelo mesmo sexo (homossexuais ou homoafetivos); e outros, por um sexo ou outro (bissexuais ou biafetivos).

Desde os anos 1990, para indicar as orientações sexuais minoritárias, usa-se a sigla LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis - transexuais - transgêneros). Posteriormente, a sigla passou por várias mudanças. Ultimamente, a mais usada é LGBTQIAPN+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, intersexo, assexuais, pansexuais, não-binários e outras).

Toda orientação sexual do Ser humano individual - mesmo que seja minoritária - deve ser sempre tratada com respeito, igualdade e inclusão.

O mesmo diga-se da identidade de gênero, que é a forma pela qual o Ser humano individual expressa o gênero com o qual se identifica.

Na orientação sexual majoritária, o Ser humano individual (homo) existe como homem (vir, macho) e mulher (mulier, fêmea).

As Antropologias "tradicionais" e algumas Antropologias "pós-tradicionais" (modernas) descuidaram deste dado de fato, considerando-o secundário para a compreensão da existência humana. É muito significativo o fato que algumas línguas dispõem de uma só palavra para indicar o homem - macho e fêmea - e somente o macho. Isso demostra o papel secundário da mulher e a não relevância da distinção homem-mulher (Cf. GEVAERT, J. Il Problema dell'Uomo. Introduzione all'Antropologia filosofica. Elle Di Ci, 19814, p. 80-81).

Para o Ser humano, o significado "humano" de ser homem e mulher está essencialmente na relação entre indivíduos corpóreos, bio-psíquicos e espirituais ou pessoais. O Ser humano individual torna-se homem e mulher na reciprocidade do encontro, isto é, no face a face corpóreo, bio-psíquico e espiritual ou pessoal do homem e da mulher. Um homem é verdadeiramente homem (vir) - em sentido humano - diante da mulher (mulier) e uma mulher é verdadeiramente mulher (mulier) - em sentido humano - diante do homem (vir).

A sexualidade é o fato de o Ser humano individual (homo) ser dois (vir e mulier) e se manifestar na reciprocidade (na relação, no encontro inter-subjetivo). Não é o homem (vir) e a mulher (mulier) que criam uma relação inter-individual (corpórea, bio-psíquica e espiritual ou pessoal), mas quando o Ser humano individual (homo) se torna relação (ser-para-um-outro), ele revela a mim a mim mesmo como homem (vir) ou mulher (mulier) no face a face. É neste face a face que me reconheço como homem (vir ou mulier) e sou reconhecido como tal.

Não é, portanto, a sexualidade que nos faz inventar o amor, mas é o amor que nos revela a natureza da sexualidade. Neste contexto do encontro inter-individual (corpóreo, bio-psíquico, espiritual ou pessoal) manifestam-se todas as possibilidades de linguagem e de reconhecimento do outro/a como outro/a, isto é, todas as possibilidades "humanas" das componentes do homem e da mulher, como as diferenças fisiológicas, o erotismo, as caracterizações psicológicas, as elaborações culturais, etc.

À sexualidade pertence a fecundidade. Ela é predisposta pela estrutura biológica e fisiológica do homem e da mulher, e se reveste de uma dimensão inter-individual (corpórea, bio-psíquica espiritual ou pessoal) na vivência do reconhecimento mútuo como homem e como mulher, e na instauração de um novo diálogo com um novo ser.

A estrutura homem-mulher é, podemos dizer, a estrutura que mais profundamente manifesta (exprime), no Ser humano, sua natureza inter-individual (corpórea, bio-psíquica, espiritual ou pessoal) e é o caminho comum para realizá-la (Cf. GEVAERT, J., o. c., p. 88-89).

Tudo isso - embora de forma diferente - é válido também nas orientações sexuais minoritárias. Um Ser humano individual é verdadeiramente ele mesmo - em sentido humano - diante de outro Ser humano individual. Ora, reciprocidade se dá unicamente onde há alteridade, ou seja, onde dois Seres humanos individuais existem plenamente.

(No próximo artigo continuaremos as nossas reflexões sobre a “relação” que existe entre as dimensões do Ser humano individual e sobre o próprio Ser humano individual como “presença”, “ausência” e “expressão”)

Compartilhando:

Para uma visão mais aprofundada e abrangente dos temas tratados, veja o meu livro: Ética da Libertação: uma abordagem filosófico-teológica. Lutas Anticapital, Marília - SP, 2023 (pág. 384).

Por estarmos nos últimos meses do Sínodo sobre Sinodalidade, veja também o meu livro (pequeno): Rumo ao Sínodo do Povo de Deus. Lutas Anticapital, Marília - SP, 2024 (pág.67).

 

           Ética da libertação:                                                         Rumo ao Sínodo do povo de Deu
                                                   uma abordagem filosófico-teológica



(A fonte da Capa encontra-se na pág. 4 dos livros)


www.lutasanticapital.com.br/ - editora@lutasanticapital.com.br

 

Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br


Goiânia, 28 de agosto de 2024



O artigo foi publicado originalmente em: 
https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano-historico-individual-4/  (23 de agosto de 2024)

segunda-feira, 19 de agosto de 2024

Ato Publico denuncia a expulsão de Moradores em Situação de Rua

 


No dia 15 deste mês de agosto/24, a partir das 17h, no Centro de Goiânia (Avenida Independência com Avenida Goiás), “onde há a maior concentração de pessoas em situação de vulnerabilidade” (Giovanna Campos. Jornal Opção, 15 de agosto/24, 19:40h), foi realizado um Ato Público:

  • Contra as ações higienistas - como a de 06 de agosto, no período noturno (reparem o requinte da perversidade: no período noturno) - da Prefeitura de Goiânia, com o apóio da Policia Militar do Estado de Goiás, verdadeiras “práticas de ‘limpeza social’ que têm agravado a vulnerabilidade de pessoas que já enfrentam condições extremas” (Ib.).

E, ao mesmo tempo:

  • Pelo Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua (19 de agosto).

“Um grupo de aproximadamente 20 Pessoas em Situação de Rua, que estava presente na intervenção, disse à reportagem que todos/as tiveram seus pertences jogados no lixo pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social (SEDHS) na última terça-feira, dia 6. Um deles, inclusive, não conseguia se levantar porque diz ter sido atingido com spray de pimenta e bala de borracha” (Ib.).

Mesmo não podendo estar fisicamente presente, devido a um compromisso – assumido anteriormente na Paróquia Nossa Senhora da Terra (Jardim Curitiba III) - o Ato teve e tem o meu total apoio. Reafirmo:

  • Toda “expulsão” de Moradores em Situação de Rua é injusta, desumana, antiética, anticristã e de uma iniquidade diabólica. Se for realizada com a liminar de juiz - o é mais ainda, porque se torna uma “expulsão legalizada e institucionalizada”.
  • O mesmo - como já disse outras vezes - vale para todo “despejo” de Moradores/as de Ocupações urbanas e rurais.

Pessoa humana não se “expulsa” e não se “despeja” como se fosse lixo, degradável ou reciclável, que deve ser removido. Aliás - diga-se de passagem - ao menos o lixo reciclável é mais bem tratado que os Moradores em Situação de Rua ou os Moradores das Ocupações.

Eduardo Matos, da Coordenação do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) de Goiás e um dos organizadores do evento, afirmou: “Estamos nos posicionando contra uma Política que trata Seres humanos como problemas a serem eliminados, e não como cidadãos que precisam de apoio e inclusão”. E ainda: “Essa intervenção é um grito por justiça, por dignidade e por políticas públicas que verdadeiramente acolham e respeitem quem mais precisa” (Ib.).

“A intervenção contou com a presença de Pessoas em Situação de Rua, Ativistas, Movimentos Sociais Populares e Cidadãos/ãs que defendem os Direitos Humanos e a Dignidade de todos os Moradores da cidade. Estiveram presentes o Vereador Fabrício Rosa (PT) e a Presidente estadual do PSOL, Cíntia Dias. Além da cavalaria da Polícia Militar (PM), havia cerca de 7 viaturas e 3 carros da Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM)” (Ib.).

Goiânia - calcula-se hoje - ultrapassa 4 mil Pessoas em Situação de Rua.

O Vereador Fabrício Rosa (PT) denunciou: “Os pertences, as roupas, os documentos das Pessoas em Situação de Rua foram roubados pelo Prefeito Rogério Cruz e pela Prefeitura de Goiânia, que é incapaz de criar uma casa de acolhida. Cada roupa, cada mala, cada documento, investimento de trabalho, foi desrespeitado. Precisamos tratar a dor das pessoas como se fosse nossa” (Ib.).

Tem razão o Papa Francisco quando afirma que hoje os Pobres não são excluídos (somente), mas descartados. O Sistema Capitalista Neoliberal (ou Ultraneoliberal), adorador do “deus dinheiro” é de uma iniquidade estrutural diabólica.

Por fim, a manifestação foi “um apelo à sociedade goianiense para que se una em defesa dos Direitos de Todos/as, exigindo que a Prefeitura de Goiânia cesse as ações repressivas e adote medidas inclusivas e humanitárias” (Ib.).

(Veja: https://www.jornalopcao.com.br/saude/populacao-em-situacao-de-rua-faz-manifestacao-contra-acao-higienista-da-prefeitura-de-goiania-629680/)

Esperançar é preciso! Um “Mundo Novo” é possível! A luta continua!


 


Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia (sobretudo de Ética) da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br

Goiânia, 18 de agosto de 2024

quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Um Poder Público diabólico

 


O Poder Público do Municipio de Goiânia e do Estado de Goiás expulsa as pessoas em Situação de Rua do Centro de Capital. Trata-se de uma iniquidade e crueldade inconcebíveis: uma verdadeira operação de guerra de uma perversidade diabólica.

Despejar moradores de Ocupações e expulsar moradores em Situação de Rua é sempre desumano, injusto, antiético e anticristão. Quando essas Operações de despejo e de expulsão são realizadas com “liminares” de juìzes, são ainda mais desumanas, mais injustas, mais antiéticas e mais anticristãs, porque são Operações legalizadas e institucionalizadas.

Faço minhas todas as Notas de Denúncia e de Repúdio dos Movimentos Socioambientais Populares, Comissões de Direitos Humanos e outras Organizações Populares a estas Operações diabólicas.

Como exemplo, cito a Nota (07/08/24), assinada pelo Coletivo Liberdade, Coletivo Intercambiantes Núcleo Goiás e Movimento Nacional da População em Situação de Rua. Diz a Nota:

“Vimos por intermédio desta, solicitar ao Supremo Tribunal Federal que tome providências em relação aos atos de violação de Direitos mencionados nos próximos parágrafos, tendo em vista que a Prefeitura Municipal de Goiânia, junto com a Polícia Militar do Estado de Goiás infrigiram a ADPF nº 976, ordenada pelo ministro relator Alexandre de Moraes, deste Tribunal, que proíbe  as remoções forçadas de pessoas em situação de rua e, inclusive, de seus bens e pertences pessoais, conforme Política Nacional para a População em Situação de Rua, instituída pelo Decreto Federal Nº 7.053/2009”.

Continua relatando: “A Prefeitura de Goiânia convocou todas as Secretarias para realizar uma ação na Avenida Goiás com a Independência e Paranaíba juntamente com a Guarda Civil Metropolitana e Polícia Militar, no dia 06 de agosto de 2024, período noturno (reparem o requinte da crueldade: período noturno), com o objetivo de tirar as pessoas em situação de rua do Centro da cidade. Denunciamos o caráter higienista da ação, que por ser pontual não apresenta uma real oportunidade de saída das ruas e não considera as necessidades da população em situação de rua, mas perpetua opressões e o controle dos “descartáveis”, “indesejáveis urbanos”, “desprezíveis” e “irrecuperáveis”. Mais uma vez, em período eleitoral, como resposta imediata e protocolar à sociedade, a Prefeitura de Goiânia criminaliza e culpabiliza a população que foi impelida a viver nas ruas hostis e inóspitas da cidade, fortalecendo e mantendo preconceitos contra esse grupo populacional”.

E ainda: “A ação violenta e higienista foi realizada na Avenida Goiás com a Independência. Montaram um arsenal de guerra, muitas viaturas da Polícia Militar, da Guarda Civil Metropolitana e da Polícia Civil, caminhões de lixo, trabalhadoras e trabalhadores da limpeza urbana, trabalhadoras e trabalhadores das Secretaria de Assistência Social e da Secretaria de Saúde, escancarando as contradições do Estado,  retirando os pertences das pessoas em situação de rua, expulsando do local de permanência nas ruas, violando o direito de ir, vir e permanecer, reprimindo, intimidando, afastando e amedrontando a população em situação de rua”.

“Ao usarem unidades de assistência-repressão, convocando serviços de saúde e assistência social para ações higienistas, demonstra o total descaso da Prefeitura de Goiânia com a População em situação de rua e com as trabalhadoras e trabalhadores da linha de frente, pois compromete o vínculo de confiança das pessoas em situação de rua com essas equipes impactando negativamente nos atendimentos”.

Não tenho dúvidas, os responsáveis dessas Operações - de uma iniquidade e perversidade inimagináveis - são os verdadeiros “demônios” de hoje.

Movimento Nacional da População de Rua unido, jamais sera vencido!  Pastoral do Povo da Rua unida, jamais será vencida! Movimentos Socioambientais Populares unidos, jamais serão vencidos! Estamos com vocês! Contem conosco!

Jesus de Nazaré está com vocês! Com Ele, a vitória é e será de vocês; é e será nossa! A luta continua! Esperaçar é preciso!

(Veja os vídeos de Estefânia Cheruli, do Comitê Dom Tomás Balduino e outro):

https://www.instagram.com/reel/C-XcmSyuSbR/?igsh=MWRnYmllY2xxNWVybw==  

https://www.instagram.com/p/C-X4twSuGGV/?igsh=MXd4enU1YXluOGk3OQ==

https://www.instagram.com/reel/C-WYCooR1P3/?igsh=MTNvM3lnOGRwY2Q2bw==

 

Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia (sobretudo de Ética) da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br


Goiânia, 07 de agosto de 2024

 


O Ser humano histórico-individual (3)

 


(Continua a série de artigos sobre o Ser humano)

Para o Ser humano histórico, “ser-no-mundo" individualmente, significa ainda “ser-no-mundo" espiritualmente ou pessoalmente (como Ser humano espiritual ou pessoal).

A dimensão da "espiritualidade" ou "pessoalidade" é constitutiva da individualidade humana. O Ser humano individual “é-no-espírito", “é-espírito" (“é-pessoa"). É espírito (pessoa) individual ou indivíduo espiritual (pessoal).

A terceira (sempre no sentido lógico e não cronológico) experiência existencial (concreta) que o Ser humano individual (o indivíduo) faz de si mesmo é a percepção de sua espiritualidade ou pessoalidade.

A palavra "espírito" (ruah, pneuma) significa o Ser humano individual todo enquanto ser espiritual ou pessoal (consciente, racional, pensante, relacional). Quando se diz que o Ser humano individual é espírito ou pessoa, o sujeito é sempre o Ser humano individual todo, mas a ênfase (o destaque) é colocada na sua espiritualidade ou pessoalidade (consciência, racionalidade, pensamento, relacionalidade).

De fato, aprofundando ainda mais nossa reflexão sobre um Ser humano individual concreto, constata-se que o indivíduo todo (e não uma parte dele) - além de corpo e vida (bio-psique) - é espírito ou pessoa (subjetividade consciente, razão pensante, relação). O Ser humano individual "é integralmente espírito" (MOUNIER, E. O Personalismo. Livraria Morais, Lisboa, 19642, p. 39).

"O universo da pessoa é o universo do Ser humano individual" (Ib., p. l6).

 A espiritualidade ou pessoalidade - como a corporeidade e a bio-psiquicidade - diz respeito ao Ser humano individual todo (integral), mas não é a totalidade do Ser humano individual.

O Ser humano individual, como espírito ou pessoa, “não é um objeto. Antes, é exatamente aquilo que em cada Ser humano individual não é passível de ser tratado como objeto. (...) A pessoa não é o mais maravilhoso objeto do mundo, objeto que conhecêssemos de fora, como todos os outros. É a única realidade que conhecemos e que, simultaneamente, construímos de dentro. Sempre presente, nunca se nos oferece. (...) A pessoa não é um objeto que se separe e se observe, mas um centro de reorientação do universo objetivo" (Ib., p. 18, 19, 35).  

Dizer que o Ser humano individual é espírito ou pessoa significa dizer que o Ser humano individual existe (é) como sujeito, único, irrepetível e inconfundível; como "alguém", como um "eu" frente (face) a um "tu": o outro (semelhante) e/ou o Outro absoluto (Deus). Destaca-se a intersubjetividade das pessoas, o encontro (a relação, a comunicação, a comunhão) interpessoal.

"O sujeito é, desde a sua gênese primeira, uma comunhão e a palavra um diálogo" (VAZ, H. C. de Lima. Ontologia e História. Duas Cidades, 1968, p. 275).

"Sem interlocutor, o Ser humano individual é impensável como 'sujeito' - como Ser humano individual" (Ib., p. 277, nota 7).

A ideia de espírito indica em primeiro lugar a unicidade e a alteridade dos sujeitos ou das pessoas.

O Ser humano individual (ou o indivíduo singular) existe (é) como pessoa concreta, que pensa, quer, fala, age, etc. Pensar, querer, falar, agir, etc. são modos de ser do sujeito pessoal (veremos isso falando do Ser humano como Práxis). O outro aparece como outro, como sujeito (único, irrepetível, inconfundível), como pessoa, como alguém exterior a mim, que está diante de mim e não se identifica comigo.

"A experiência do outro (e - eu digo também - do Outro absoluto ou Deus) é uma experiência originária, que revela, portanto, uma dimensão do Ser humano individual absolutamente irredutível à relação com o mundo material e vivente. Porquanto eu possa multiplicar os meus conhecimentos objetivos, aplicando-os ao outro Ser humano individual, nunca poderei captar sua alteridade: o outro como tu diante de mim se subtrai a toda conceituação e objetivação" (GEVAERT, J. Il Problema dell'Uomo. Introduzione all'Antropologia filosofica. Elle Di Ci, 19814, p. 113).

O outro é presente numa experiência imediata. "O imediato é o frente a frente" (LEVINAS, E. Totalidade e Infinito. Edições 70, Lisboa, 1988, p. 39).

"Se experiência significa precisamente relação com o absolutamente (totalmente) outro - isto é, com aquilo que extravasa sempre o pensamento - a relação com o Infinito (o Outro absoluto) completa a experiência por excelência" (Ib., p. 13). 

(No próximo artigo continuaremos as nossas reflexões, mostrando que - o Ser humano histórico-individual - corpóreo, bio-psíquico e espiritual ou pessoal - “é-no-mundo” sexuadamente).

Compartilhando:

·          Para uma visão mais aprofundada e abrangente dos temas tratados, veja o meu livro: Ética da Libertação: uma abordagem filosófico-teológica. Lutas Anticapital, Marília - SP, 2023 (pág. 384).

·          Por estarmos nos últimos meses do Sínodo sobre Sinodalidade, veja também o meu livro (pequeno): Rumo ao Sínodo do Povo de Deus. Lutas Anticapital, Marília - SP, 2024 (pág.67 - publicação recente).

www.lutasanticapital.com.br/ - editora@lutasanticapital.com.br


                  


Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br


Goiânia, 06 de agosto de 2024





O artigo foi publicado originalmente em:

https://portaldascebs.org.br/o-ser-humano-historico-individual-3/  (25/07/24)



terça-feira, 16 de julho de 2024

36º Congresso Internacional da SOTER - Algumas reflexões

 


 De 9 a 12 deste mês de julho/24 aconteceu na PUC Minas, em Belo Horizonte -na modalidade presencial e online - o 36º Congresso Internacional da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER), cujo tema foi: Economia e Inteligência Artificial: Desafios à Sociedade e à Religião.

Os subtemas do Congresso foram:

  • Inteligência Artificial: das técnicas às implicações sociais;
  • Política Econômica e Democracia participativa em tempos digitais;
  • Pós e Transumanismo: questões teológicas;
  • Desenvolvimento tecnológico e qualidade de vida: realces;
  • A Comunicação entre interesses econômicos e serviços à construção social;
  • A utopia religiosa da Casa Comum e desafios da economia global;
  • Considerações sobre o 36º Congresso Internacional da SOTER.

O tema e os subtemas, muito atuais, foram tratados e aprofundados por Professores/as Universitários/as - Doutores/as em diferentes áreas do Conhecimento - com a contribuição, nos debates, de membros do Congresso. O conteúdo das Conferências e Palestras foi abrangente e muito valioso.

Como sócio da SOTER e participante online do Congresso, parabenizo - na pessoa da presidente da Sociedade, Dra. Clélia Peretti - a Equipe de Coordenação e todas as Equipes de Serviços. Foi muito bom! Valeu a pena!

No intuito de colaborar, permito-me fazer agora - no espaço de um artigo - algumas reflexões críticas construtivas. 

Por ser o Ser humano histórico - situado (no espaço) e datado (no tempo) - toda Práxis humana (Prática e Teoria dialeticamente unidas) não é neutra, mas tem lado.

A questão da “não-neutralidade” ou da “não possibilidade da indiferença social” (socioeconômica, sociopolítica, socioecológica, sociocultural e sociorreligiosa) refere-se a todos os momentos do processo do Conhecimento: comum (a maioria dos nossos Conhecimentos, mesmo dos Cientistas, são do Conhecimento comum), científico, filosófico e teológico.

Devido, porém, ao extraordinário desenvolvimento das Ciências, a questão da não-neutralidade é particularmente sentida e debatida quando se trata do Conhecimento científico em sentido estrito (em sentido lato, todo conhecimento metódico e sistemático é conhecimento científico).

Ora, a “não-neutralidade” do Conhecimento refere-se não somente ao uso que se faz do Conhecimento (crítica externalista), mas também ao contexto específico do Conhecimento, ao próprio ato de conhecer (crítica internalista). Elimina-se, assim, a separação entre conhecer e valorar ou entre saber e agir. Mostra-se que o Conhecimento é Fato social (socioeconômico, sociopolítico, socioecológico, sociocultural e sociorreligioso).

O Conhecimento filosófico e teológico é - podemos dizer - o horizonte no qual o Conhecimento científico ganha profundidade de sentido (Filosofia e Teologia das Ciências). 

A Filosofia e a Teologia da Libertação partem sempre do Ser humano histórico, mesmo sabendo que o Ser humano é também um Ser meta-histórico: “já-e-ainda-não” neste mundo (passando de uma situação de vida menos humana para uma situação de vida mais humana) e “além-da-morte” na Eternidade (Plenitude da Vida, Páscoa definitiva).

As palavras “da Libertação” são um lembrete: elas nos recordam que a Filosofia, a Teologia e as Ciências da Religião - para serem humanas e, portanto, éticas - devem ter lado: o dos Pobres (empobrecidos, marginalizados, explorados, oprimidos, excluídos e descartados).

Portanto, a Opção pelos Pobres não é “preferencial” (uma Opção entre duas ou mais possiblidades), mas é o Caminho que leva à Vida. Jesus de Nazaré entrou nesse Caminho desde o seu nascimento como “sem teto” na manjedoura até a morte na Cruz. Todos e todas - inclusive os ricos - são convidados/as a entrar no Caminho que leva à Vida. Um exemplo: no Evangelho - convidados por Jesus - Zaqueu, homem rico, partilhou seus bens e entrou nesse Caminho; o jovem rico não teve a coragem - ao menos naquele momento - de fazer o mesmo e foi embora triste.

“Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). “Eu vim para que todos e todas tenham Vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).

Como Cientistas da Religião, Filósofos e Teólogos da Libertação, devemos testemunhar com a vida - prática e teórica - que a nossa Opção é a Opção pelos Pobres, que o nosso lado é o lado dos Pobres. Por isso, o ponto de partida e o eixo central (a espinha dorsal) de todo Encontro e Congresso de Ciências da Religião, Filosofia e Teologia deve ser a Opção pelos Pobres. Meditemos!





Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br


Goiânia, 15 de julho de 2024


quarta-feira, 26 de junho de 2024

Missão profética da CPT

 


A Comissão Pastoral da Terra (CPT), Pastoral socioambiental vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), é organizada em 21 Regionais distribuídas em todo o Brasil.

“Criada em 1975 em nível nacional e em 1976 no Estado de Goiás, tendo o seu CNPJ registrado em 1980, ela nasce em um contexto extremamente delicado da história brasileira, marcado pela violação de direitos e pela privação de liberdade que buscava calar a voz do povo que ousava gritar por democracia e se opor ao regime autoritário militar que se instalou no país após o golpe de Estado ocorrido em 1964”.

Agentes pastorais de todo o Brasil da Comissão Pastoral da Terra (CPT) estiveram reunidos e reunidas em Goiânia, entre os dias 19 e 21 deste mês de junho, num Encontro de formação e preparação das comemorações do Ano jubilar da CPT, cuja abertura aconteceu sábado, dia 22.  

Nesse dia - com Ato público, caminhada e Celebração eucarística - a CPT deu início “às atividades de memória e festejo de 50 anos de atuação em defesa dos direitos das populações do campo, das águas e das florestas em todo o Brasil e de presença profética junto a estes povos”.

As atividades iniciaram na Praça Universitária, “com um momento de memória da caminhada pastoral e homenagem aos mártires que tombaram em defesa da terra e de seus povos, personagens históricos que infelizmente foram vitimados na luta pelos direitos dos mais empobrecidos, a exemplo da Ir. Dorothy Stang, Pe. Josimo e tantos/as outros/as religiosos/as e lideranças populares”.

Ao som do batuque do Grupo Coró de Pau, os e as participantes do Ato público saíram em caminhada - uma verdadeira Romaria - até a Catedral Metropolitana. Dom João Justino, arcebispo de Goiânia, presidiu a Celebração eucarística de lançamento do Ano Jubilar da CPT, concelebrada por Dom Ionilton Lisboa, presidente da CPT e bispo da Prelazia de Marajó (PA), outros bispos e padres presentes.

Desde sua fundação, a CPT Nacional e - de modo especial - a CPT Goiás sempre tiveram - mesmo nos tempos difíceis da ditadura civil militar - o apoio destemido e profético de Dom Fernado Gomes dos Santos, 1º arcebispo de Goiânia.

Pessoalmente tive a graça de ser seu colaborador e amigo na prestação do serviço de Coordenador da Pastoral arquidiocesana e, nos últimos tempos de sua vida, também de Vigário Geral. E ainda: estivemos juntos no apoio à luta dos trabalhadores e das trabalhadoras por terra de moradia nos bairros da periferia da Goiânia, denunciando e combatendo a especulação imobiliária capitalista injusta, desumana, antiética e anticristã.

A CPT Goiás e a CPT Nacional tiveram o mesmo apoio de Dom Tomás Balduíno, bispo da diocese de Goiás, de Dom Pedro Casaldáliga, bispo de S. Felix do Araguaia, de outros bispos, padres, religiosos/as e agentes pastorais.

“A CPT Goiás - unida à CPT Nacional - atuou com firmeza denunciando a violência contra as famílias camponesas, padres, religiosos/as, agentes pastorais e lideranças populares em geral, que foram perseguidas e assassinadas por defender Comunidades que se organizavam para exigir o cumprimento da lei brasileira e para que elas pudessem ter o acesso à terra ou permanecer na terra para nela trabalhar, produzir e prover o seu sustento”.

A CPT Goiás e a CPT Nacional sempre buscaram valorizar a vida e a dignidade das pessoas que vivem no campo e sempre foram uma referência: na defesa dos direitos da pessoa humana; na luta contra o trabalho escravo; no cuidado da Nossa Casa Comum (a Mãe Terra); no incentivo de práticas agroecológicas voltadas para a diversificação da produção e da autonomia produtiva, visando garantir a segurança alimentar nutricional, além do acesso a água, com a recuperação de nascentes e as articulações de defesa do cerrado; no apoio à luta dos Povos Indígenas pela demarcação de suas terras e por seus direitos. “Nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra e nenhum trabalhador sem direitos” (Papa Francisco).

A CPT Nacional publicou, em abril deste ano, o Caderno “Conflitos no Campo Brasil” (38ª edição). Em 2023 os conflitos foram 2.303, contra 2.050 do ano anterior. A partir dessa publicação, a CPT Goiás publicou o Caderno “Conflitos no Campo 2023. Análise dos dados registrados em Goiás”. No Estado, em 2023, os conflitos foram 167 contra 80 do ano anterior. Esses dados mostram o quanto é ainda necessária no Brasil a missão profética da CPT.

(As fontes dos textos com aspas e de todo o artigo são: https://cptnacional.org.br/ e https://cptgoias.org.br/)

 Esperançar é preciso! O primeiro mártir Jesus de Nazaré, foi preso e morto na cruz com a acusação: “achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo” (Lc 23,2). Os e as mártires da América Latina, do Brasil e de Goiás - seus seguidores e seguidoras - estão presentes e caminham conosco! A missão profética continua! Um “Mundo Novo” é possível!





CPT Goiás






Marcos Sassatelli, Frade dominicano

Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)

Professor aposentado de Filosofia da UFG

E-mail: mpsassatelli@uol.com.br


Goiânia, 25 de junho de 2024


A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos