sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Sinodalidade: sejamos verdadeiros e verdadeiras!

 


“A verdade vos libertará” (Jo 8,32)



Como Comunidade de Irmãos e Irmãs, todos e todas -  na diversidade dos carismas (dons) e ministérios (serviços) - somos corresponsáveis pela vida e missão da Igreja no mundo de hoje.

Com o apoio e o incentivo do nosso irmão, o Papa Francisco - começamos em outubro de 2021 o caminho sinodal da 16ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos com o tema “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. É um processo descentralizado de escuta e discernimento no âmbito de cada diocese, seguido de encontros regionais e continentais, que começou em outubro de 2021 com a previsão de terminar em outubro de 2023.

Posteriormente, por determinação do Papa Francisco - para dispor de um tempo maior dedicado à escuta e ao discernimento - o caminho sinodal foi prolongado por mais um ano, com a realização de duas sessões do Sínodo: a primeira de 4 a 29 de outubro de 2023 e a segunda em outubro de 2024.

Ora, para sermos verdadeiros e verdadeiras, precisamos reconhecer que essa experiência eclesial de sinodalidade, de “caminhar juntos”, é ainda parcial: diz respeito somente à apresentação e discussão de sugestões e propostas a serem enviadas à Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos.

Na Igreja que Jesus de Nazaré sonhou e quis, a sinodalidade deve ser vivida e praticada de maneira plena, participando também - com todos os direitos de membros da Igreja - da votação e aprovação das decisões finais a serem tomadas. A Igreja não é o Povo de Deus?

(Pedir que sejam dadas sugestões e apresentadas propostas sem poder participar - através da eleição de representantes do Povo de Deus - da votação e aprovação das decisões finais a serem tomadas, não deixa de ser - como se diz em italiano - uma “presa in giro” ou uma provocação).

Ora, para que a sinodalidade seja vivida de maneira plena em todos os níveis, precisamos: 

1. Voltar às fontes e acabar com a Igreja de classes

No Novo Testamento e nas primeiras Comunidades Cristãs, todos os discípulos e discípulas, seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré eram chamados de “santos e santas”, “eleitos e eleitas”, “irmãos e irmãs”. Não existia “leigo/a” e “clero”, não existia “laicato” e “hierarquia”, não existia “vida religiosa consagrada“.

(Aliás, o nome “vida religiosa consagrada” é impróprio. Todos e todas que praticam uma religião tem “vida religiosa”, e todos e todas que são batizados e batizadas têm - para nós cristãos e cristãs - “vida religiosa consagrada” (o Batismo é a maior consagração).

O nome da chamada “vida religiosa consagrada” deveria ser “vida cristã de particular consagração”, em resposta a um chamado pessoal de Deus para - na diversidade dos carismas - viver um “projeto de vida cristã radical”.

2. Repensar a Estrutura Social da Igreja e reelaborar a Teologia dos Ministérios a partir do binômio: Comunidade x Carismas e Ministérios

O Documento da CNBB “Missão e Ministérios dos Cristãos Leigos e Leigas” - 62/1999), afirma:  "Embora o Concílio Vaticano II tenha lançado as bases para uma compreensão da Estrutura Social da Igreja como Comunhão, essa estrutura continua ainda sendo pensada dentro do binômio clássico Hierarquia x Laicato”.

É, pois, a partir do binômio ‘Comunidade x Carismas e Ministérios’ que precisamos repensar toda a Estrutura Social da Igreja e reelaborar toda a Teologia dos Ministérios. É essa a perspectiva do Novo Testamento.

(Lamentavelmente, 17 anos depois, o Documento da CNBB “Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade” - 105/2016, simplesmente “desconhece” e “desconsidera”, ao invés de retomá-la e aprofundá-la, essa parte do Documento anterior, que abre caminhos novos.  Reafirma e reforça o binômio “Hierarquia x Laicato” - uma Igreja de duas classes (na realidade, três: Hierarquia, Vida Religiosa Consagrada e Laicato) - que não tem nenhum fundamento bíblico.

3. Criar o Sínodo do Povo de Deus

A Assembleia Geral do Sínodo do Povo de Deus (e não do Sínodo dos Bispos) seria a última instância para a discussão, votação e aprovação das decisões finais. Mesmo que o Sínodo não seja um Parlamento, a democracia é uma mediação histórica necessária. Sem democracia não há verdadeira sinodalidade.

Ora, se a democracia é um valor humano e se ser cristão ou cristã é ser radicalmente ser humano, a Igreja também deveria ser uma Instituição radicalmente democrática e plenamente sinodal. Um dia, chegaremos lá! 

(Leia também: A questão da sinodalidade na Igreja, em:

http://freimarcos.blogspot.com/2022/02/a-questao-da-sinodalidade-na-igreja-1.html - 1ª parte
http://freimarcos.blogspot.com/2022/04/a-questao-da-sinodalidade-na-igreja-2.html - 2ª parte

ou também nos sites do IHU, Portal das CEBs, Caminheiro do Reino e outros)




Agora: Sínodo 2021 – 2024


Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

                                                                                                                                                                            Goiânia, 23 de fevereiro de 2023


sábado, 18 de fevereiro de 2023

Violações de Direitos Humanos em Goiás 2022

 


O Comitê Goiano Dom Tomás Balduino (do qual sou membro) realizou - de 11 a 16 deste mês de fevereiro - a 6ª Jornada de Direitos Humanos no Estado de Goiás (atividade integrante do centenário de nascimento de Dom Tomás: semeador de esperança). Tema: Terra, Causa Indígena e Direitos Humanos.

Foram realizadas as seguintes atividades:

  • Encontro de Formação do Movimento de Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos (MTD/GO): Educação Popular e Direito à Cidade (na sede do Sindicato dos Trabalhadores/as dos Correios: SINTECT/GO);
  • Encontro de Defensores Populares: fortalecimento, segurança e proteção (em uma chácara no município de Hidrolândia/GO);
  • Visita a acampamentos ciganos para escuta e apoio (na cidade de Itumbiara/GO);
  • Solenidade de entrega do 4º Prêmio Dom Tomás Balduino de Direitos Humanos em Jornalismo com homenagem a defensores/as de Direitos Humanos (no auditório da ADUFG: Sindicato da UFG);
  • Análise de conjuntura brasileira e goiana: Democracia e Direitos Humanos - como ‘desbolsonarizar’ o Brasil (adiada para o dia 1º de março, por causa do falecimento do nosso companheiro e irmão Prof. Sílvio Costa);
  • Apresentação do Relatório de Violações de Direitos Humanos em 2022 no Estado de Goiás (na Assembleia Legislativa de Goiás);
  • Roda de conversa com lideranças indígenas do Estado de Goiás (no Núcleo Takinahaky de Formação Superior Indígena/NTFSI da UFG).

As violações dos Direitos Humanos que compõem o Relatório dizem respeito aos Povos Ciganos de Goiás, Povos Indígenas de Goiás, Conflitos de Terra, Violência policial, População em situação de rua, Despejos forçados, LGBTQIA+, Liberdade de imprensa e Sistema prisional.

Por exemplo:

A respeito dos Povos Ciganos (1.435 famílias ou cerca de 5.740 pessoas das etnias Rom e Calon, em 35 municípios), o Relatório afirma: “A história oficial de Goiás registra o apagamento dos Povos Ciganos e não reconhece sua história e composição cultural, excluindo-os das estruturas destinadas a quem é cidadão e pode ter acesso a Direitos. Essa perspectiva gera nessas Comunidades uma visão que as situa em uma condição de exclusão permanente, sem nenhuma possibilidade de mobilidade, à margem da estrutura social”.

A respeito dos Povos Indígenas (8.533, sendo 8.019 na zona urbana e 514 na área rural), o Relatório constata: “O ano de 2022 foi marcado pelo contínuo processo de invisibilidade e violação dos Direitos dos Povos Indígenas em Goiás” (como, aliás, no Brasil inteiro). “A destruição dos biomas, a invasão de terras indígenas, a contaminação do solo e de rios são implementadas ou permitidas como um projeto de eliminação dos Povos Indígenas. Trata-se de uma visão excludente e homogênea sobre quem deve ser considerado ‘povo brasileiro’. Essa lógica perversa reproduz-se também no Estado de Goiás, onde predominantemente três Povos Indígenas - Iny Carajá, Avá Canoeiro e Tapuia - lutam para sobreviver e defender aquilo que lhes é mais sagrado: seus territórios e sua cultura”.

A respeito dos Conflitos de Terra, o Relatório declara que (entre outros) “em 2022, foram intensificados os ataques ao Acampamento Dom Tomás Balduino (MST), que possui 280 famílias vivendo em três áreas há seis anos nas fazendas Cangalha, Maltizaria e Porteirinha, no município de Formosa/GO”.

“As famílias produzem uma grande diversidade de alimentos orgânicos (...). Boa parte da produção é doada para populações urbanas em situação de pobreza, mas também é consumida pelas próprias famílias e comercializada no entorno do Acampamento”. Que testemunho bonito de solidariedade de irmãos e irmãs!

Em breve, o Relatório de Violações de Direitos Humanos em Goiás 2022 será disponibilizado nas redes sociais. Leia-o! É uma meditação!

Unidos e unidas na luta pelo Direitos Humanos, que é a luta por um Brasil Novo e um Mundo Novo! A vitória é e será nossa!







Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 17 de fevereiro de 2023





sábado, 11 de fevereiro de 2023

“Verba indenizatória”: estratégia hipócrita e imoral

 


Na primeira página de “O Popular”, do dia 7 deste mês de fevereiro, deparamos com a manchete: “Tribunais pegam carona em lei que extrapola teto salarial”. O Jornal, comentando a manchete, afirma: “Proposta enviada à Assembleia permite que membros e servidores do TJ, TCE e TCM superem limite de R$ 39,2 mil, já que a lei transforma em “verba indenizatória” o que ultrapassar o teto. A estratégia foi utilizada pelo Executivo e é replicada em outros órgãos”.


Na página 4 - na reportagem de Marcos Carneiro - deparamos com outra manchete: “Brecha ‘fura teto’ deve ser ampliada a Tribunais”. Comentando, pois, a manchete, o Jornal declara: “Tribunal de Justiça e Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios apresentam projetos para pegar carona em lei aprovada pelo Executivo a fim de permitir salários acima do teto”.


No “O Popular” do dia seguinte (dia 8), na página 6 - numa nova reportagem do mesmo jornalista - deparamos com uma terceira manchete: “Órgãos extrapolam teto do funcionalismo em R$ 27,2 mi”. Comentando a manchete, o Jornal diz: “Vencimentos: Folhas de pagamento dos Tribunais de Justiça e de Contas, e do Ministério Público, mostram valores acima de R$ 100 mil em janeiro”.


Vejam só o “descaramento” do Tribunal de Justiça e Tribunais de Contas do Estado de Goiás e dos Municípios: “O Poder Judiciário goiano sempre cumpre com a legislação vigente em relação à remuneração de magistrados e servidores” (TJ-GO).


“Quanto aos pagamentos questionados, referem-se a um reduzido número de servidores e estão rigorosamente dentro da legalidade, referindo-se a parcelas de caráter indenizatório” (TCE-GO).


“Nenhum servidor ou membro recebe remuneração acima do teto constitucional”. “As verbas de natureza indenizatória não integram a remuneração” (TCM-GO).


Que verbas “de natureza indenizatória” são essas? Será que os Tribunais estão sendo indenizados por favorecer sorrateiramente a “legalização” e “institucionalização” do roubo que os poderosos praticam permanentemente na relação com os trabalhadores e trabalhadoras?


Que vergonha! Que cinismo! Que farisaísmo! Esses Tribunais estão dando um pontapé - perverso e cruel - no rosto dos trabalhadores e trabalhadoras que ganham o salário mínimo (e muitas vezes, nem isso) ou estão desempregados e desempregadas, passando fome.


O Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, em outubro de 2022, apontou - somente no Brasil -  33,1 milhões de pessoas em situação de fome.


Pouco importa saber se há alguma brecha que possa justificar legalmente o crime desses Tribunais e Ministério Público. Independentemente de sua “legalidade” ou não, trata-se de uma imoralidade pública hipócrita e repugnante.


Como podemos acreditar na justiça de juízes e desembargadores, que fazem de tudo para legalizar e institucionalizar tamanha imoralidade? Com certeza, eles não estão preocupados com a questão dos Direitos Humanos e do Cuidado para com a Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum.

 

Deixo uma advertência: com a chamada “verba indenizatória” - legalizada e institucionalizada - juízes, desembargadores e promotores poderão ludibriar da justiça humana, mas não conseguirão ludibriar da justiça divina.


Termino com uma pergunta para a nossa reflexão: no mundo de hoje e, de modo particular, no Brasil - onde existem tantos trabalhadores e trabalhadoras, irmãos e irmãs nossos, passando fome - é justo, é ético (ou, moral), é humano, é cristão ganhar um salário mensal de mais de 100 mil reais?


S. Tomás de Aquino - no seu tempo - já dizia que “ninguém tem direito ao supérfluo, enquanto o outro (ou a outra) não tem o necessário”.


Graças a Deus, a Esperança nunca morre e o Amor nunca poderá se apagado. “As águas da torrente jamais poderão apagar o Amor, nem os rios afogá-lo. Quisesse alguém dar tudo o que tem para comprar o Amor... seria tratado com desprezo” (Ct 8,7).


“Amemo-nos uns aos outros, pois o Amor vem de Deus. E todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus. Quem não ama, não conhece a Deus, porque Deus é Amor” (1Jo 4,7-8).



O Popular, 08/02/23, p. 6




Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

                                                                                                                                                                  Goiânia, 10 de fevereiro de 2023


sábado, 28 de janeiro de 2023

Situação calamitosa dos Yanomamis

 


Um crime que clama por justiça


Dia 14 deste mês de janeiro, na audiência da Comissão externa da Câmara dos Deputados, Entidades indigenistas e socioambientais denunciaram uma “tragédia humanitária” em curso na Terra Indígena Yanomami. A área - que ocupa partes dos Estados de Roraima e Amazonas - é marcada por garimpo ilegal de ouro e cassiterita, violência sexual de mulheres e crianças, ameaças de morte e desestruturação dos postos de saúde.

“Lideranças indígenas fizeram relatos dramáticos da situação da Terra Yanomami, homologada desde 1992 e com cerca de 30 mil pessoas vivendo hoje em 363 aldeias em 9,6 milhões de hectares da Floresta Amazônica. A região é palco de desmatamento, destruição do leito dos rios, contaminação por mercúrio, aumento dos casos de malária, acirramento de conflitos e violência, perda da soberania alimentar e desnutrição infantil”.

Dário Kopenawa, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), citou o caso da Comunidade Homoxi para mostrar o avanço do garimpo ilegal sobre área que deveria estar protegida. “A Comunidade e o garimpo ficam muito próximos e, por isso, as nossas crianças estão tomando água contaminada por mercúrio, 615 yanomamis foram ameaçados de morte, os garimpeiros tomaram conta do Posto de Saúde Yanomami. A Terra Yanomami e (as margens do rio) Uraricoera estão virando quase cidades, com cantinas e prostituição entre os garimpeiros ilegais”.

Júlio Rodrigues, presidente da Associação Wanasseduume Ye’kwana, ressaltou o impacto da violência na desestruturação comunitária dos Yanomami.

“Os jovens estão ficando mais agressivos por conta de ingerir bebidas alcoólicas e drogas. Não querem mais ficar nas Comunidades. As mulheres estão ficando cada vez mais com medo e não conseguem mais ir para a roça depois que aconteceram muitos abusos sexuais pelos garimpeiros. É difícil viver”.

A audiência contou também com a presença de representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que reclamaram da ausência de soluções mesmo diante de cobranças internacionais às autoridades brasileiras.

Dia 23 deste mesmo mês, a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) destacaram o cenário desumano verificado no território Yanomami e alertaram que a ausência de ações concretas para frear a tragédia humanitária em curso poderia resultar na futura responsabilização internacional do Estado brasileiro pelo genocídio da população indígena.

Segundo Estevão Senra, geógrafo e analista do Instituto Socioambiental (ISA), até abril de 2022, havia 4 mil hectares impactados pelo garimpo ilegal dentro da terra indígena e mais de 40 pistas clandestinas a serviço de garimpeiros e narcotraficantes.

Em 2021 - continua ele - a região registrou quase 50% dos casos de malária do País e atualmente existem cerca de 3 mil crianças com déficit nutricional. "Hoje, a Terra Indígena Yanomami é palco de uma das maiores tragédias humanitárias que estão ocorrendo no Brasil. Os dois vetores principais dessa crise são o avanço do garimpo ilegal e a má gestão do distrito sanitário, que se entrelaçam e vão se realimentando".

Infelizmente, o genocida Bolsonaro e seu Governo - de uma insensibilidade humana cruel e diabólica - não deram a mínima atenção. Ao contrário, debocharam da situação e - em manifestações sociais de apoiadores - esbanjaram ostensivamente dinheiro público, que é do povo trabalhador.

Fizeram, ainda, declarações preconceituosas e mentirosas sobre os indígenas, facilitando a entrada de garimpeiros na região. Os Yanomamis são alvos de violentos e frequentes conflitos com os garimpeiros.

Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, “570 crianças yanomamis morreram por contaminação de mercúrio, desnutrição e fome, devido ao impacto das atividades de garimpo ilegal na região".

Em 2022, o Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) elaborou um documento para denunciar o incentivo de ações ilegais por parte de garimpeiros e para examinar o impacto do garimpo e a contaminação de mercúrio pela gestão Bolsonaro, que - maldosamente - omitiu dados sobre as mortes de indígenas, cujo número aumentou assustadoramente a partir de 2019, quando começou o governo do ex-presidente.

(Fonte: https://www.camara.leg.br -14/07/22 e https://noticias.uol.com.br - 23/01/23)

Por fim, faço, encarecidamente, dois pedidos ao presidente Lula e ao seu Governo, que espero seja realmente “popular”: do lado dos Pobres, Excluídos e Descartados do Sistema Capitalista Neoliberal, um “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida, 385), estruturalmente perverso, desumano e antiético.

1º Pedido: que a situação calamitosa dos Yanomamis seja enfrentada e resolvida em caráter de “urgência urgentíssima”.

2º Pedido: que o genocida ex-presidente Bolsonaro e os membros de seu governo (melhor: desgoverno), responsáveis diretos por essa situação calamitosa, sejam - o quanto antes - processados e julgados.

Providências já! Justiça já!


                                                                         Dário Kopenawa e a deputada Joenia Wapichana


Indígena yanomami acompanha agentes do Ibama
durante operação contra garimpo ilegal na floresta amazônica



Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 27 de janeiro de 2023



sábado, 14 de janeiro de 2023

Invasão criminosa dos Três Poderes

 

A solidariedade nacional e internacional
fortaleceu o novo Governo


Como foi amplamente divulgado na imprensa e nas redes sociais, manifestantes criminosos - golpistas, terroristas, nazistas, fascistas e apoiadores do genocida ex-presidente Jair Bolsonaro, vindos do Brasil inteiro - invadiram neste domingo (8) o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional. Prédios públicos foram vandalizados e obras de arte, de valor inestimável, depredadas.

A situação foi controlada no início da noite com cerca de 300 pessoas presas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretou intervenção federal na segurança do DF e, posteriormente, se encontrou com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Após os atos de vandalismo, as pessoas presas eram cerca de 1.500.

O ministro do STF Alexandre de Moraes afastou - pelo prazo de 90 dias - o governador do DF, Ibaneis Rocha por “conduta dolosamente omissiva”, dizendo que o governador “não só deu declarações públicas defendendo uma falsa ‘livre manifestação política em Brasília’ - mesmo sabedor por todas as redes que ataques às Instituições e seus membros seriam realizados - como também  ignorou todos os apelos das autoridades para a realização de um plano de segurança semelhante aos realizados nos últimos dois anos em 7 de setembro, em especial, com a proibição de ingresso na esplanada dos Ministérios pelos criminosos terroristas” (https://www.cnnbrasil.com.br). O Senado e a Câmara aprovaram a intervenção.

Segunda-feira (9), os governadores foram à Brasília em solidariedade ao novo Governo Federal do presidente Lula e em defesa da democracia; nas capitais e em muitas outras cidades do Brasil aconteceram grandes manifestações com o mesmo objetivo.

Os criminosos - executores e mandantes (que sempre se apresentam como “pessoas de bem”) -  responsáveis por esses atos terroristas devem ser julgados e condenados sem nenhuma anistia, e obrigados a arcar com os gastos da recuperação dos danos provocados aos prédios públicos e da restauração das obras de arte.

Diante desses fatos, faço duas reflexões: 

  • A primeira, a respeito dos próprios fatos, que são de uma perversidade inconcebível. Como podem existir - em pleno século XXI - lideranças nazistas e fascistas que - com suas organizações -  defendem a ditadura e são declaradamente contra a democracia? Não dá para entender! É muito atraso!
E ainda: Como conseguem essas lideranças enganar e ludibriar muitos trabalhadores e trabalhadoras, pobres, oprimidos e explorados? Só podem ser pessoas de uma maldade que não tem limite, pessoas diabólicas (os demônios de hoje).

  •  A segunda, a respeito do ensinamento que podemos tirar dessa invasão terrorista. Ela nos mostra claramente a necessidade de retomar e fortalecer o trabalho de base nos Movimentos Sociais Populares, nos Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras e nas Comunidades.

A nossa democracia é ainda muito frágil. Precisamos defendê-la e fortalecê-la para que se torne na prática (e não só na teoria) “o Governo do Povo, pelo Povo, para o Povo” (Abraham Lincoln).

Na posse, Lula subiu a rampa do Palácio do Planalto acompanhado de 8 pessoas, representantes do Povo: Aline - catadora de materiais recicláveis (que entregou a faixa presidencial ao presidente), Raoni - líder indígena, Francisco Carlos - criança atleta, Ivan - pessoa com deficiência, Murilo Jesus - professor, Jucimara - cozinheira, Flávio - artesão e Weslley - metalúrgico.

Com esse gesto - de extraordinário simbolismo - o presidente Lula assumiu o compromisso de governar com o Povo em contato direto e permanente com o trabalho de base dos Movimentos Sociais Populares, dos Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras e das Comunidades.

Espero que o Governo Lula seja realmente um Governo Popular (socialista no verdadeiro sentido da palavra): um Governo que sabe dialogar com todos e com todas, mas que mostra de maneira clara que tem lado, o lado dos trabalhadores e trabalhadoras, o lado dos Pobres (empobrecidos, marginalizados, oprimidos, explorados e descartados).

Para os cristãos e cristãs esse é o lado de Jesus de Nazaré, esse é o caminho que Ele escolheu. Todos e todas somos convidados e convidadas a entrar nesse caminho.

Um outro Brasil é possível e necessário: um Brasil estruturalmente novo, justo e igualitário; um Brasil de irmãos e irmãs, onde todos e todas tenham condições de vida digna e sejam felizes. À luz da fé, é o Reino de Deus acontecendo no Brasil e no mundo. A luta continua! A esperança nunca morre!


Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto Fotos: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto
Fotos: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 11 de janeiro de 2023

https://www.ihu.unisinos.br/625504-invasao-criminosa-dos-tres-poderes



 

 


quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Natal 2022: que o lado de Jesus seja o nosso lado!

 

Lendo e meditando o Evangelho, percebemos claramente que no Natal - e em toda a sua vida - Jesus tem lado, o dos Pobres: marginalizados, oprimidos, excluídos e descartados da sociedade. Do nascimento até a morte na cruz, Jesus se identifica e solidariza com os Pobres.

(Leia o meu artigo de dezembro de 2021: No Natal, Jesus tem lado, em:

https://www.ihu.unisinos.br/615556-no-natal-jesus-tem-lado;


Neste Natal 2022 coloco - para a nossa reflexão - três questões:
  • Primeira: Por que no Natal falamos tanto a respeito de Jesus, o Filho de Deus, o Salvador do mundo, o Emanuel (o Deus conosco) que se encarna e se torna um Ser humano como nós (uma parte da verdade) e não falamos quase nada a respeito do “como” Jesus faz isso (a outra parte da verdade)?

Apresentar uma parte da verdade como se fosse toda a verdade, falsifica a verdade! Para se encarnar, Jesus não precisava nascer numa manjedoura, mas - sobretudo por ser Filho de Deus - podia nascer num palácio.

  • Segunda: Nascendo na manjedoura de um estábulo como “sem-teto”, o que Jesus quis nos dizer? 

Jesus nos mostra que, se encarnando, assume o lado dos Pobres. É este o caminho que Jesus escolhe e que define sua identidade: estar do lado e ao lado dos Pobres. Ele não exclui ninguém. Todos e todas - inclusive, os ricos -  são convidados a entrar nesse caminho. Por exemplo, o homem rico Zaqueu - encontrando-se com Jesus - se converte e entra nesse caminho; ao contrário, o jovem rico - mesmo encontrando-se com Jesus - não tem coragem de segui-lo, não entra nesse caminho e - diz o Evangelho - vai embora triste.        

  • Terceira: Sabendo que Jesus tem lado - no Brasil, na América Latina e no mundo - onde vai ser o Natal de Jesus em 2022?

Com certeza, ele não vai ser nas mansões dos ricos, dos opressores do Povo e nem vai ser nas Igrejas luxuosas e cheias de ouro.

O Natal do “sem-teto” Jesus vai ser, antes de tudo:

o   nas Ocupações urbanas e rurais ao lado dos Pobres, que lutam pelo direito à moradia digna (terra de moradia) e pelo direito a uma agricultura familiar e comunitária ecológica (terra de trabalho). Jesus - junto com os Pobres e na pessoa dos Pobres - corre o risco de ser despejado por uma liminar injusta de um juiz.

O Natal do “sem-teto” Jesus vai ser também:

o   nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), uma Igreja de irmãos e irmãs em comunhão, na igualdade e na diversidade dos dons e serviços: o “jeito de ser Igreja” que Jesus quer;


o   nos Movimentos Sociais Populares, nos Sindicatos e Partidos Políticos de Trabalhadores que - com garra, coragem e muita fé - lutam pela Vida. “Eu vim para que todos e todas tenham Vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).

O Natal do “sem-teto” Jesus vai ser ainda:

o   nos Fóruns ou Comitês de Direitos Humanos e da Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum, nas Comissões de Justiça e Paz e


o   em todas as Organizações ou pessoas que estão do e ao lado dos Pobres e caminham com eles e elas na luta por um Mundo Novo.

Como ser humano e como cristão (ser humano radical), reafirmo: todo despejo - mesmo com liminar judicial - é injusto, desumano e antiético. As pessoas humanas não se despejam e não se tratam com brutalidade e crueldade. Elas devem ser respeitadas em sua dignidade. A própria palavra “despejo” é ofensiva.

Mais uma vez: uma advertência aos Juízes e juízas. Cuidado! Não deem liminares de reintegração de posse, que na realidade são liminares de despejo. Com essas liminares, vocês mandam despejar seus irmãos e irmãs Pobres e o próprio Jesus na pessoa deles e delas: os “pequeninos” do Evangelho. Lembrem-se: Deus é justo!

Fazer a memória e celebrar o Natal de Jesus significa, pois, torna-lo presente hoje.

Que - no Natal 2022 e no Ano Novo 2023 - o lado de Jesus seja o nosso lado! São estes os meus votos de Feliz Natal e Feliz 2023.

Crianças diante do presépio

Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG

Goiânia, 20 de dezembro de 2022



 


A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos