sábado, 26 de março de 2011

O descaso na educação pública estadual

“Escolas estaduais pedem socorro”. “Levantamento da Secretaria de Educação mostra que 448 colégios precisam de reformas urgentes”. “O número corresponde a 40% das 1.095 escolas da rede, que precisam de reforma geral, ampliação ou construção de novos prédios. Apenas em Goiânia e no entorno, são mais de 60 escolas que precisam passar por reparos emergenciais” (O Popular, 14/03/11, p. 3). Que descaso!
            A reportagem cita, como exemplos, a situação extremamente precária do Colégio Estadual Tancredo Neves do Parque Industrial João Braz; cita também três outros colégios da Região Noroeste de Goiânia, que se encontram na mesma situação: o Colégio Estadual Jayme Câmara do bairro Floresta; a Escola Estadual João Bennio do Jardim Curitiba 3 e  a  Escola Estadual Edmundo Rocha da Vila Mutirão.
            Estas escolas e muitas outras foram construídas há mais de 20 anos, com placas de cimento pré-moldadas e deviam funcionar, em caráter provisório, somente até a construção das escolas definitivas. Infelizmente, pela falta de interesse do Poder Público Estadual, a “provisoriedade” continua até hoje e as escolas se encontram atualmente em estado de calamidade pública.
            Quando, por falta de segurança para os alunos, funcionários administrativos e professores, as escolas são interditadas, realizam-se “reparos emergenciais” para que possam continuar funcionando por mais algum tempo. Sai governo, entra governo e a situação das escolas, quando não piora, continua a mesma.
            A Secretaria Estadual de Educação diz que não tem verbas suficientes para atender todas as escolas e tenta rastrear dinheiro (quase R$ 80 milhões da educação, que voltaram para a conta do tesouro estadual) que deveria ter sido investido em obras e, não se sabe por que razões, não foi investido. Que desleixo! Que irresponsabilidade! De fato, na prática - embora na teoria se diga o contrário - a educação pública de qualidade não é prioridade para os nossos governantes.
            A estrutura física das escolas (como a qualificação dos professores e a questão dos salários) influencia na qualidade do ensino e do aprendizado. Por exemplo, Fernando, que tem nove anos de idade e é aluno do quarto ano no Colégio Estadual Tancredo Neves, divide uma sala apertada com mais de 40 alunos e diz: “Não consigo prestar atenção. É muito quente” (Cf. Ib., p. 4).
            A Constituição Federal afirma que os Estados e os Municípios devem aplicar anualmente “vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino” (Art. 212). Reparem: a Constituição Federal reza: “no mínimo”. Isso quer dizer que, se houver necessidade, o Estado pode e deve aplicar mais.
            A Constituição Federal afirma também que o direito à educação, entre outros direitos, deve ser assegurado à criança e ao adolescente, “com absoluta prioridade” (Art. 227. Ora, se o direito à educação deve ser assegurado “com absoluta prioridade”, mesmo que faltem verbas para outras obras, nunca deveriam faltar para a educação.  Em caso contrário, não se trataria de “absoluta prioridade”. É uma questão de lógica. Quem sabe se um pouco de estudo de lógica não levaria os nossos governantes a cumprir a Constituição Federal?
            Falando da educação, a Constituição Federal diz ainda: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (Art. 205).
            O Estado precisa urgentemente investir na qualificação dos professores e na sua formação permanente; precisa promover uma política salarial que valorize os trabalhadores em educação (professores e funcionários administrativos); e precisa construir escolas que ofereçam as condições físicas necessárias para o ensino e o aprendizado.

            O grande educador (e filósofo da educação) brasileiro Paulo Freire, apreciado no mundo inteiro e que, infelizmente, no Brasil foi muito pouco valorizado, poderia nos oferecer “novas luzes” para um trabalho educativo nas escolas e fora delas, que seja realmente um trabalho libertador e humanizador. A educação pública de qualidade é uma construção coletiva. Todos e todas somos sujeitos do processo educativo. Como nos lembra Paulo Freire: “Ninguém educa ninguém; ninguém se educa sozinho; os seres humanos se educam entre si (em comunhão)”. Os trabalhadores em educação (professores e funcionários administrativos) têm um papel de fundamental importância na construção de uma nova sociedade.
                  Diário da Manhã, Opinião Pública, Goiânia, 25/03/11, p. 3


Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano 
    Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof. na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra

Nenhum comentário:

Postar um comentário

A palavra do Frei Marcos: uma palavra crítica que - a partir de fatos concretos e na escuta dos sinais dos tempos aponta caminhos novos