Com
a palavra o novo Secretário de Segurança Pública do Estado de Goiás, Sérgio
Augusto Inácio de Oliveira, que - por ter integrado a Comissão de Defesa dos
Direitos Humanos da OAB-GO - espero seja sensível à causa dos Direitos Humanos
e, sobretudo, à causa do primeiro de todos os Direitos Humanos, que é o Direito
à vida.
A
sociedade, senhor Secretário, exige o quanto antes uma resposta clara e
objetiva à pergunta: quem executou os moradores de rua Walter e Jeferson? Espero que o senhor faça uma investigação
séria e honesta a respeito do caso e que os responsáveis desta covarde e
criminosa execução - civis ou policiais - sejam processados, julgados e
punidos.
Relembremos
o caso: Por volta das 3,30h do dia 20 de maio deste ano "o morador de rua
Walter de Santana Alves Feitosa, de 32 anos, foi morto com dois tiros no tórax,
quando dormia em um corredor de acesso a barracões de um imóvel na Avenida
Goiás Norte, no Setor Norte Ferroviário, onde estava acostumado a dormir".
Walter passava o dia na Praça do Trabalhador e era "usuário de drogas, com
passagens na Polícia por pequenos furtos". Infelizmente, na nossa
sociedade hipócrita, quem pratica grandes furtos (desvio de verbas públicas,
superfaturamentos, etc.), normalmente não tem passagem na Polícia…
"A
mesma rotina (de Walter) era seguida pelo adolescente Jeferson Ferreira
Barbosa, de 16 anos, executado com dois tiros (…), na Avenida Leste-Oeste,
esquina com a Avenida República do Líbano, no Setor Marechal Rondon",
pouco depois da 3,30h do mesmo dia.
Os
dois assassinatos "ocorreram em locais próximos e as vítimas possuíam
perfis parecidos, o que leva a Polícia Civil a acreditar que o executor foi o
mesmo" (O Popular, Cidades, 21 de maio de 2010, p. 4).
Que
maldosa covardia! Quanta violência por causa do envolvimento com o mundo das
drogas e - o que é pior - quanta violência policial! A vida humana - parece -
não tem nenhum valor. Em que sociedade nós estamos! Em pleno século XXI, a
nossa sociedade é ainda uma sociedade estruturalmente injusta e assassina.
Chega de tanta barbárie! Chega de tantas mortes! Vamos defender a vida. Não
importa se a pessoa humana é culpada ou inocente.
Uma
Agente de Pastoral, que - com sensibilidade humana e com muito respeito - trabalha com os moradores de rua, conhecia
há tempo Walter e Jeferson, e tinha com eles um diálogo fraterno. Um dia,
prevendo sua própria morte, com um olhar sofrido e triste, Walter e Jeferson
falaram para à Agente de Pastoral: "Tia, a senhora não vai nos ver mais, porque
vamos morrer". Que drama! A Agente de Pastoral ficou em estado de choque e
profundamente indignada com a notícia da bárbara execução dos dois moradores de
rua, que se tornaram seus irmãos e amigos.
E
por falar em violência policial, há poucos dias um jovem Pré-Noviço dos Frades
Dominicanos (que mora, com outros oito jovens, na nossa Comunidade religiosa do
Convento São Judas Tadeu, no Setor Coimbra), quando voltava do curso de
espanhol e se encontrava no ponto de ônibus com outras pessoas, foi abordado
pela Polícia Militar de maneira arrogante, desrespeitosa e humilhante. Com que
direito a Polícia Militar faz isso? Será que não está na hora de mudar
totalmente o tipo de formação que os policiais recebem? Será que não precisamos acabar, de uma vez
por todas, com esta mentalidade cultural retrógrada e nazista? Quantos casos de
violência policial - muitas vezes com mortes - que todos nós conhecemos e que
poderíamos contar!
Lembrem-se,
os responsáveis de tanta violência e maldade, das palavras de Jesus:
"Todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores dos meus irmãos,
foi a mim que o fizeram!" (Mt 25, 40).
Lembrem-se,
também, da parábola do homem rico e do pobre Lázaro (Cf. Lc 16, 19-31). O pobre
Lázaro - no nosso caso - se chama Walter, se chama Jeferson. Tenho certeza na
fé que - apesar de tanta covardia e maldade - os nossos irmãos, os moradores de
rua Walter e Jeferson, completaram sua Páscoa e, libertos de todo sofrimento,
se encontram agora na plenitude do Reino de Deus, na plenitude da vida, na plenitude
da felicidade. Deus é justo.
E
nós, "o homem rico", somos também de alguma forma - direta ou
indiretamente, por ação ou por omissão - responsáveis por tamanha barbárie. Só
nos resta um caminho: a conversão e a mudança de vida. Nada, porém, nos levará
a essa conversão e mudança de vida, se não formos capazes de abrir o coração
para a Palavra de Deus, o que nos leva a voltar-nos para os pobres (Cf. Bíblia
Sagrada. Edição Pastoral. Nota de rodapé). "A parábola (do homem rico e do
pobre Lázaro) é exigência de profunda transformação social, para criar uma
sociedade onde haja partilha de bens entre todos" (Ib.). É esta a nossa
missão de cristãos(ãs), é a mesma missão de Jesus de Nazaré.
Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia
Moral (Assunção - SP)
Prof. de Filosofia da UFG (aposentado)
Prof.
na Pós-Graduação em Direitos Humanos
(Comissão
Dominicana Justiça e Paz do Brasil / PUC-GO)
Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arquidiocese de
Goiânia
Administrador Paroquial da Paróquia Nossa Senhora da Terra
Goiânia, 27 de maio de 2010
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