Neste segundo artigo sobre o momento político atual, faço
algumas reflexões a respeito do projeto político
do Governo Federal do PT e seus aliados (ou seja, da nova e velha burguesia),
que - embora alguns afirmem o contrário - é fundamentalmente um projeto
capitalista neoliberal, atenuado por políticas públicas compensatórias. E,
devido a essas políticas, é chamado também projeto neodesenvolvimentista.
“No
Brasil, o neoliberalismo surge como política de governo sob a presidência de
Collor (1990-1992); atinge o seu clímax no PROER (Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) e no auge das privatizações durante os governos FHC (1995-2002); e tem
seguimento, atenuado por políticas compensatórias, nos governos de Lula
(2003-2010) e Dilma (2011-2014). Em 2015, a crise bate à porta dos brasileiros
e as políticas de ‘ajuste’ do governo Dilma apontam para o aprofundamento das
políticas neoliberais, com novas perdas de direitos sociais e desidratação das
políticas compensatórias” (http://laurocampos.org.br/2015/01/neoliberalismo-estado-de-mal-estar-social/).
O
PT, até 2002, só fazia alianças com forças políticas situadas no campo
democrático popular (de centro-esquerda). Para o partido, essa prática era um princípio
sagrado e fazia parte de sua identidade. A respeito dsse princípio, o PT não
transigia em hipótese alguma. Quando, em nível estadual ou municipal, o principio
era desrespeitado, o Diretório nacional do PT intervinha imediatamente nos
Diretórios regionais e locais.
Na campanha presidencial de Lula em 2002, houve
uma reviravolta total. Lula foi obrigado a assinar um texto - a Carta aos Brasileiros - no qual
prometia que, caso ganhasse a disputa, não tomaria nenhuma medida que
representasse grandes mudanças na política econômica brasileira. Foi uma decepção
para setores da esquerda, que sonhavam com um outro governo.
O PT
- querendo ganhar o poder a qualquer custo e com qualquer meio - abandonou o
princípio sagrado pelo qual tanto lutou: fazer alianças somente com forças
políticas situadas no campo democrático popular. Renegou toda a sua história e fez
alianças com partidos políticos de direita e extrema direita, como o PP
(inclusive com Maluf e seu grupo político), o PMDB (inclusive com Sarney e seu
grupo político), e outros. Não esqueçamos que Maluf e Sarney foram grandes
esteios do golpe civil militar de 1964.
Na
realidade, o PT (como partido e não necessariamente todos os petistas) se
vendeu, traiu os trabalhadores e passou para o outro lado, apoiando e
fortalecendo o projeto capitalista neoliberal, embora com algumas políticas públicas
compensatórias, para tornar o projeto mais palatável ao gosto do povo. De fato,
fazer aliança significa estar unidos na realização de um projeto, mesmo com
algumas divergências secundárias. É diferente de um acordo pontual (sobre algum
assunto específico) entre dois projetos, que pode ser feito por razões diferentes
ou até opostas e que não compromete a substância dos projetos.
Os governos
do PT de Lula e de Dilma, para garantir a governabilidade capitalista neoliberal,
deram - e continuam dando - total apoio aos que detêm o poder econômico. Não
taxaram - e continuam não taxando - as grandes fortunas, não tiraram - e
continuam não tirando - um centavo sequer dos ricos, a fim de promover uma maior
distribuição de renda. Nesses governos, os banqueiros, por exemplo, conseguiram
os maiores lucros de toda sua história.
Os
governos do PT não tiveram - e continuam não tendo - nenhuma preocupação de abrir
caminhos novos que levem à mudança de estruturas, à superação, mesmo que a
longo prazo, do sistema capitalista neoliberal e à construção de um projeto
político popular.
As
forças políticas que - como o PT e outros - estavam do lado dos trabalhadores e
eram comprometidas com o projeto político popular, na prática (mesmo que digam
o contrário) se venderam, mudaram de lado e passaram a defender os interesses
dos poderosos. Essas forças políticas formam a nova burguesia (a burguesia dos
traidores, pior do que a velha burguesia, que sempre foi burguesia).
Dizer
que existe uma velha burguesia “raivosa” que não se conforma em ter perdido o
poder, é uma afirmação equivocada. A velha burguesia não perdeu o poder. Está
presente em postos-chave no Governo Federal atual, aliada à nova burguesia, que
é refém dela. Basta citar o comportamento político recente da presidenta Dilma
em relação ao PMDB. É simplesmente vergonhoso e repugnante! No caso, por
exemplo, do Acampamento Dom Tomás Balduino, em Corumbá de Goiás, o Governo
Federal foi covarde e totalmente submisso ao poder político do senador Eunício
Oliveira. E a nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e Kátia
Abreu para o Ministério da Agricultura? Não são eles legítimos representantes e
fiéis defensores da velha burguesia?
É
verdade que na velha burguesia, como na nova, existem pessoas e facções
políticas (partidos) que - embora unidas no mesmo projeto político - têm interesses
pessoais e grupais diferentes e até divergentes. A sede de poder é insaciável. Uma
facção política ou um partido - como no caso do PSDB em relação às últimas
eleições presidenciais - pode lamentar profundamente ter perdido as eleições.
Enfim,
os Governos do PT foram - e continuam sendo - uma grande decepção para todos
aqueles e aquelas (pessoas, movimentos populares, sindicatos autênticos e
outras entidades) que ainda acreditam num outro Brasil possível e lutam por
ele.
Lembrando
as palavras de Tobias - “pratica a justiça todos os dias de tua vida e não
sigas os caminhos da iniquidade” (Tb 4,5) - e manifestando sua preocupação
diante do delicado momento pelo qual passa o País - o escândalo da corrupção na
Petrobras, as recentes medidas de ajuste fiscal adotadas pelo Governo, a crise
na relação entre os três Poderes da República e manifestações de insatisfação
da população - a CNBB declara: “esta situação clama por medidas urgentes.
Qualquer resposta, no entanto, que atenda antes ao mercado e aos interesses
políticos que às necessidades do povo, especialmente dos mais pobres, nega a
ética e desvia-se do caminho da justiça. Cobrar essa resposta é direito da
população, desde que se preserve a ordem democrática e se respeitem as
instituições da comunidade política”.
A
CNBB continua dizendo: “diante das suspeitas de corrupção na gestão do
patrimônio público, manifestamos nossa firme convicção de que a justiça e a
ética requerem uma cuidadosa apuração dos fatos e a responsabilização, perante
a lei, de eventuais corruptos e corruptores. Enquanto a moralidade pública for
olhada com desprezo ou considerada um empecilho à busca do poder e do dinheiro,
estaremos longe de uma solução para a crise vivida no Brasil. A solução passa
também pelo fim do fisiologismo político que alimenta a cobiça insaciável de
agentes públicos, comprometidos com a manutenção de interesses privados. Urge,
ainda, uma profunda reforma política que renove em suas entranhas o sistema
político em vigor” (Nota da CNBB sobre a realidade atual do Brasil. Brasília,
12 de março de 2015).
A
reflexão do próximo artigo será sobre a reforma política
por meio de uma Constituinte exclusiva e soberana (a mudança estrutural do
sistema político).
Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral
(Assunção - SP),
Professor aposentado de Filosofia da UFG
Goiânia, 25
de março de 2015
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