“As CEBs continuam sendo um ‘sinal da vitalidade da Igreja’ (Redemptoris Missio - RM 51). Os discípulos e as discípulas de Cristo nelas se reúnem na escuta e na partilha da Palavra de Deus. Buscam relações mais fraternas, igualitárias e inclusivas. Superam a cultura machista e o clericalismo. Celebram os mistérios cristãos e assumem o compromisso de transformação da sociedade e a defesa da criação, a nossa casa comum” (Carta do 14º Intereclesial das CEBs)
Do dia 23 a 27 de janeiro do corrente ano, participei do 14º Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), em Londrina (PR). Do Estado de Goiás e Distrito Federal (Regional Centro-Oeste da CNBB) éramos cerca de 150 delegados e delegadas, dos quais 35 da Arquidiocese de Goiânia. No total - vindos de todos os cantos do Brasil - éramos 3.300 delegados e delegadas. Havia também uma boa representação dos povos indígenas e quilombolas. Participaram ainda do Encontro 60 bispos, diversos padres e diáconos, religiosos e religiosas, representantes de outras Igrejas cristãs e de outras Religiões, convidados de países da América Latina e da Europa (Argentina, Paraguai, México, Alemanha, França e Itália) e membros de Movimentos Populares.
O tema do 14º Intereclesial foi: “CEBs e os desafios do mundo urbano” e o lema: “Eu vi e ouvi os clamores do meu povo e desci para libertá-lo” (Ex 3, 7).
O Encontro foi um verdadeiro Pentecostes. Todos e todas que o vivenciamos, ouvimos - como um apelo muito forte - as palavras de Jesus, atualizadas para nós hoje: Fiquem em Londrina. O Espírito Santo descerá sobre vocês e dele receberão força para serem minhas testemunhas em Londrina, no Paraná, no Brasil e até os extremos da terra (cf. At 1, 4 e 8).
Os dias do Intereclesial foram de muita partilha, reflexão e celebração. Partilhamos, refletimos e celebramos a vida à luz do mistério pascal e o mistério pascal à luz da vida. Um destaque especial merece a Celebração dos Mártires do Brasil e da América Latina, que foi realmente emocionante. Todos e todas, fortalecidos e fortalecidas com a experiência vivida, na “alegria do Evangelho” fomos enviados e enviadas - como discípulos missionários e discípulas missionarias - para continuar a missão de Jesus de Nazaré, fazendo acontecer - com a nossa palavra e, sobretudo, com o nosso testemunho - a sociedade do bem-viver e do bem-conviver, que - à luz da fé - é a Boa Notícia do Reino de Deus na história do ser humano e do mundo.
Escutamos os sinais dos tempos e - discernindo-os à luz da Palavra - ouvimos os apelos de Deus para nós hoje. .
“As mudanças culturais, os desafios e clamores da sociedade globalizada e da cultura urbana, o desmonte das estruturas democráticas em nosso País, a perda dos direitos civis e sociais e a degradação da dignidade humana e da criação levam as CEBs a assumirem os seguintes compromissos:
- transmitir às novas gerações as experiências e os valores das gerações anteriores;
- promover a cultura da vida;
- tornar-se uma Igreja de Comunidades em rede, com novos ministérios, que inclua a mulher em sua plena dignidade eclesial;
- incentivar o protagonismo das juventudes e combater o seu extermínio;
- apoiar as lutas dos povos indígenas, da população negra e quilombola, dos pescadores artesanais, da população em situação de rua, dos migrantes e refugiados, da população encarcerada, das crianças e dos idosos por cidadania plena;
- cobrar políticas públicas de inclusão social, participar dos conselhos de cidadania, promover a democracia direta e participativa e a autodeterminação dos povos;
- promover práticas de economia popular, solidária e sustentável;
- reafirmar a vocação política dos cristãos e cristãs;
- fortalecer a campanha pela auditoria da dívida pública, da reforma política e do controle sobre o poder judiciário.
Nunca podemos nos esquecer de que as comunidades cristãs nasceram no meio dos pobres como um grito de esperança e lugar de relações igualitárias e inclusivas” (Carta do 14º Intereclesial das CEBs).
Atualmente - apesar da falta de apoio, da indiferença, do desinteresse, de muitas Igrejas, apesar de serem, às vezes, simplesmente toleradas ou até descartadas por essas mesmas Igrejas e obrigadas a viverem nas catacumbas - as CEBs são uma Igreja mais viva do que nunca. Como acontecia com as primeiras comunidades cristãs, quando perseguidas, elas tornam-se mais fortes. Na diversidade de ministérios (serviços) e de carismas (dons), na variedade de suas expressões (mas com elementos eclesiológicos característicos comuns), as CEBs são “Igreja que nasce do Povo pela força do Espírito Santo”, são “Igreja pobre, para os pobres, dos pobres e com os pobres”, são “Igreja em permanente saída”.
Na organização da Igreja, as CEBs não são um grupo ou movimento entre muitos outros. Elas são “o primeiro e fundamental núcleo eclesial” ou “a célula inicial da estrutura eclesial” (Medellín XV, 10), e a Paróquia - renovada e libertadora - é “um conjunto pastoral unificador das Comunidades de Base” (ib. XV, 13). Lutemos para que esse ideal seja vivido e se torne, cada vez mais, realidade!
O Encontro foi uma experiência de intereclesialidade e de irmandade inesquecível. Para melhorar ainda mais os próximos Intereclesiais das CEBs, permito-me dar duas sugestões. Primeira: que - na programação dos Intereclesiais - haja mais espaço e mais tempo para a escuta do povo, aprendendo com sua sabedoria de vida e com sua vivência da fé.
“Em todos os batizados/as, desde o primeiro ao último, atua a força santificadora do Espírito que impele a evangelizar. O povo de Deus é santo em virtude desta unção, que o torna infalível ao crer (‘in credendo’), não pode enganar-se, ainda que não encontre palavras para explicar a sua fé. O Espírito o guia na verdade e o conduz à salvação. Como parte do seu mistério de amor pela humanidade, Deus concede a todos os fiéis o instinto da fé (o ‘sensus fidei’) que os ajuda a discernir o que vem realmente de Deus. A presença do Espírito confere aos cristãos/ãs uma certa conaturalidade com as realidades divinas e uma sabedoria que lhes permite captá-las intuitivamente, embora não possuam os meios adequados para expressá-las com precisão. Em virtude do Batismo recebido, cada membro do Povo de Deus tornou-se discípulo missionário (cf. Mt 28, 19). Cada um dos batizados, independentemente da própria função na Igreja e do grau de instrução da sua fé, é sujeito ativo de evangelização” (Papa Francisco. A Alegria do Evangelho - EG, 119-120).
Segunda sugestão: que, à luz do que Francisco nos ensina, os assessores e assessoras sejam sempre pessoas que participam integralmente do Intereclesial, que partilham sua vida com o povo, que aprendem com ele e que - a partir dessa experiência vivencial - contribuem com seus conhecimentos na busca comunitária de novos caminhos.
Por fim, comunicamos que a cidade de Rondonópolis, no Estado de Mato Grosso (Regional Oeste II da CNBB), assumiu o compromisso de sediar, em 2022, o 15º Intereclesial das CEBs. “Vem pra cá, vem pra cá, 15º Mato Grosso acolherá”.
“Lá vem, lá vem o trem das CEBs. Fazendo nossa história sempre a evangelizar. O trem traz nossas lutas, nosso canto e nossa força. E a próxima parada desse trem é o Mato Grosso”.
Somos Igreja de Jesus de Nazaré! Somos Povo de Deus! Somos CEBs!
(Leiam, em www.cebsdobrasil.com.br, a íntegra da “Mensagem do Papa Francisco ao 14º Intereclesial das CEBs”, a “Carta dos bispos presentes no 14º Intereclesial das CEBs”, a “Carta do 14º Intereclesial das CEBs” e outros escritos muito interessantes sobre as CEBs).
Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 01 de fevereiro de 2018
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