Vimos (na Parte
1) que na história - no tempo e no espaço - todo posicionamento prático e/ou teórico
do ser humano é ideológico. O que realmente importa é que seja um
posicionamento ideológico que liberte e promova a vida.
Como nos
lembra Leonardo Boff, ”todo ponto de vista é a vista de um ponto”. Ora, o ponto
de vista da Igreja e de todo cristão ou cristã deve ser - ou deveria ser - a vista
do ponto de Jesus de Nazaré, que é o ponto dos Pobres.
Portanto, para
a Igreja e todos os que somos cristãos ou cristãs, ver do ponto de vista de Jesus de Nazaré - seguindo o seu caminho desde
a manjedoura até sua morte na cruz e sua Ressurreição - é fazer a Opção pelos Pobres. Lamentavelmente, à expressão
“Opção pelos Pobres”, a Igreja acrescentou (com maior frequência nos Documentos
mais recentes) a palavra “preferencial” para contentar aqueles (sobretudo
padres e bispos) que não entenderam o que essa Opção significa.
Conheço padres
e bispos que - quando convidados para participar de Encontros de Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs) ou de Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), falam
de Comunidades Eclesiais (destacando - sobretudo hoje - a palavra
“Missionárias”) ou de Pastoral da Juventude, mas nunca pronunciam (parece que
há um bloqueio psicológico) as palavras “de
Base” ou “do Meio Popular”:
palavras perigosas por serem “ideológicas”
(leiam: do lado dos Pobres).
Lembro a essa Igreja (para a qual só é
“ideológico” o que está do lado dos Pobres) que uma Comunidade Eclesial é Missionária (Comunidade “em saída”) somente se
for “de Base”, ou seja, encarnada na vida do Povo, na vida dos Pobres como
fez Jesus de Nazaré, que nasceu na manjedoura de um estábulo e - a partir da
manjedoura - anunciou a Boa Notícia do Reino de Deus a todos e todas.
Por outro lado (reparem!), essa mesma Igreja usa - de boca cheia e sem
nenhum receio de ser “ideológica” - as palavras “Pastoral do empreendedor”
(“empreendedor” não é pobre, portanto, não é ideológico), “Grupo de empresários
católicos” (“empresários católicos” não são pobres, portanto, não são
ideológicos), “Grupo de advogados católicos” (“advogados católicos” - sobretudo
se forem “juízes” ou “desembargadores” - não são pobres, portanto, não são
ideológicos), e assim por diante. Para essa Igreja, o “perigo” de conotação ideológica só existe em relação aos Pobres, ou seja, para quem fica do lado
dos Pobres.
Por fim,
pergunto: qual foi o posicionamento
“ideológico” de Jesus de Nazaré? Ele ficou do lado dos poderosos ou do lado dos
pobres? A resposta encontra-se no motivo que foi apresentado para
justificar a sua “criminalização”
pelos “desembargadores” da época, com as “bênçãos” do Sinédrio. “Achamos este homem (Jesus) fazendo
subversão entre o nosso povo” (Lc
23,2).
Hoje -
lamento isso - no prédio do Tribunal de Justiça de Goiás tem até Capela
Católica com Sacrário e capelão: uma prática clara e indiscutivelmente
inconstitucional. A razão da Capela deve ser para que os “desembargadores católicos”
possam rezar diante do Santíssimo Sacramento e (quem sabe!) “assistir” à Missa
do capelão recebendo a comunhão, antes de “criminalizar”
trabalhadores e trabalhadoras “sem terra” e “sem teto” - ou seja, o próprio
Jesus na pessoa dos pobres que lutam pelos direitos sagrados à terra de
trabalho e à terra de moradia - assinando “ordens de despejo” (legais, mas
injustas, desumanas, antiéticas e anticristãs) de suas Ocupações. Que
descaramento! Quanta hipocrisia!
Os cristãos e
cristãs perguntemo-nos: que Igreja queremos ser? A dos fariseus hipócritas ou a
de Jesus de Nazaré? Que o Espírito Santo nos ilumine e nos transforme em verdadeiros profetas e profetisas da Boa
Notícia do Reino de Deus no mundo de hoje. Assim seja!
Águas e Profecias: Luzes do Meio Popular gerando Vidas
CEB ao redor da Palavra, em: https://pjmp.org/teologia-das-cebs
Marcos
Sassatelli, Frade dominicanoDoutor em Filosofia
(USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP)Professor aposentado
de Filosofia da UFGE-mail: mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 26 de junho de 2022
O artigo foi
publicado originalmente em:
https://portaldascebs.org.br/a-questao-da-ideologia-na-igreja-parte-2/
https://portaldascebs.org.br/a-questao-da-ideologia-na-igreja-parte-2/
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