Lembro
que - além do auxílio-alimentação (R$ 418 mensais) - os magistrados recebem também
o auxílio-moradia (10% do salário, mensalmente) e o auxílio-livro (12%
do salário, uma vez ao ano). O salário de juiz em início de carreira é cerca de
R$ 22 mil e o salário do presidente do TJ-GO é cerca de R$ 30 mil. Coitados, os
nossos juízes e desembargadores, estão passando necessidade! Poderiam ser
inscritos no programa “Bolsa-Família”! Ironias a parte, é realmente um
descaramento total.
Concordo plenamente, em gênero, número e grau, com Humberto
Milhomem, quando afirma: “mais uma vez percebe-se que o Brasil é o país dos
oportunistas, dos aproveitadores, das castas privilegiadas, dos marajás...”. E
ainda: “a extensão do vale-refeição aos juízes e desembargadores - privilégio
que outras categorias do Judiciário já possuem - é, antes de tudo, uma acinte à
população”.
Para mostrar o absurdo e a imoralidade
do benefício, ele lembra, como exemplo, “que os professores dos Estados e dos Municípios
de todo o Brasil não têm direito sequer ao lanche servido aos alunos, muito menos
ao vale-refeição. E por que essa categoria não é merecedora deste direito?”.
Humberto continua dizendo: “muitos
professores, para dar conta das contas em casa, trabalham em dois turnos, tendo
menos de uma hora para almoçar, uma vez que as aulas terminam às 12:15 e
começam às 13 horas. Vão, então, para o segundo turno com fome, sem se
alimentar. E quanto ganham os professores? O salário é de R$ 1.567,00. Isto
mesmo! Com este mísero salário não têm direito ao vale-refeição”.
A
partir dessa realidade de gritante desigualdade, ele pergunta: “quanto ganha um
desembargador?”. Responde: “mais de R$ 20 mil. Estes absurdos - afirma Humberto
- nos fazem entender por que o Brasil é um dos países mais injustos do mundo,
um país de contrastes que só crescem”
Termina,
pois, o seu desabafo, dizendo: “agora, com todos esses privilégios, por que
nossa Justiça é a pior do mundo, ninguém consegue entender. Talvez esteja na
hora do Governo Federal, a exemplo dos médicos, importar juristas cubanos mais
eficientes e menos caninos na hora de atacar o erário” (Humberto Milhomem. Ib,
18/12/13. Carta dos leitores, p. 6).
Humberto,
todos e todas, que temos um mínimo de sensibilidade humana e de senso ético,
somos solidários e solidárias com a sua justa indignação.
Em
contraste com a denúncia de Humberto, vejam agora o despudor do juiz de direito
e presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO), Gilmar
Luiz Coelho. Para justificar o injustificável, a ASMEGO - através de seu
presidente - “reitera que não defende nenhum tipo de privilégio para qualquer
categoria. Defende, ao contrário, respeito, dignidade e igualdade no tratamento
de qualquer trabalhador. Ao requerer o pagamento do direito, o fez fundamentada
na Constituição Federal (artigo 129, parágrafo 4º) e na Resolução 133 do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), que prevê equiparação entre as carreiras da Magistratura
e do Ministério Público”.
A ASMEGO ressalta “que o direito não é
vedado pelo CNJ, sendo pago nos Tribunais Superiores e na imensa maioria dos Tribunais
de Justiça brasileiros. Destaca que o valor aprovado pela Corte Especial do
TJ-GO é bem inferior ao que é pago, por exemplo, ao MP: R$ 418,00 para
magistrados, enquanto o MP paga a promotores e procuradores R$ 710,00. E também
que não haverá pagamento retroativo a cinco anos, como no caso do Ministério
Público” (Ib.).
Vejam, também, o despudor do promotor
Alencar José Vital, presidente da Associação Goiana do Ministério Público
(AGMP). Ele afirma, com todas as letras, que “não vê imoralidade no pagamento
do auxílio-alimentação”. Para o promotor, “a concessão é legal e há outros
benefícios que o MP-GO ainda não recebe”. E adianta: “vou atrás para
recebermos”
Apresentando as razões, Alencar José
diz: “o pedido do pagamento do auxílio-alimentação retroativo a 2008 e do reajuste
do valor partiu da AGMP. Qual a justificativa para esse pedido? Esse benefício
está previsto para o Ministério Público Federal (MPF) desde 1993. Com a criação
do CNJ, passou-se a dar um caráter de similaridade nacional para os magistrados
e membros do MPF. Com isso, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)
reconheceu a simetria entre MPF e MPs estaduais. E é importante ressaltar que
isso já vale para outros órgãos da Justiça, como STF, STJ, que já recebiam o
auxílio. Nós fomos um dos últimos Estados a pagar esse benefício”.
Sobre o assunto em questão, o promotor
demonstra ter uma visão meramente legalista, corporativista e egocêntrica. Nas
suas palavras não transparece a mínima preocupação com a sociedade, que é estrutural
e legalmente injusta, que exclui e descarta as pessoas com a maior frieza e
crueldade, e que é baseada na lei do mais forte, que é a lei da barbárie.
A respeito da conquista do benefício
(que, diante de Deus - tenho certeza - é um malefício), Alencar José declara: “comemoramos
entre nós. A nossa obrigação, da Associação, é lutar pelos nossos direitos. Na
medida em que a PGJ aquieceu a um pedido nosso, que foi feito dentro da lei, da
fundamentação que se aplica a todo território nacional, não vejo problemas”.
Perguntado se, na concessão do
benefício do auxílio-moradia, não há imoralidade, o promotor diz: “o norte da
sociedade moral é a lei. Porque o julgamento moral dessa ou aquela ação é
subjetivo. Agimos em cima da legalidade”.
Não dá para acreditar que um promotor possa,
honestamente, fazer uma afirmação como essa. Até uma criança do Ensino Fundamental
sabe que nem tudo o que é legal, é ético. Na sociedade, a imoralidade é, na
maioria das vezes, legalizada e institucionalizada. Ora, quando a lei é
injusta, toda pessoa ética tem a obrigação de não aceitar os benefícios
concedidos por ela e, se for necessário - em nome do direito à “objeção de
consciència” - tem também a obrigação (mesmo com risco de vida) de praticar a
“desobediência civil” e de lutar para que a lei seja mudada. O comportamento
ético é o comportamento mais humano possível numa determinada situação
concreta.
Defender o “auxílio-alimentação e outros
auxílios em causa própria, é muita cara-de-pau dos magistrados. Esses juízes e
desembargadores não têm moral e, portanto, não têm condição de fazer justiça. Como
podemos confiar numa Justiça “injusta”, que é um verdadeiro assalto aos cofres
públicos? É lamentável que, em pleno século XXI, exista ainda tanto atraso
cultural e ético.
Que - depois de recebermos, com alegria
e esperança, a Boa Notícia do Natal de Jesus - 2014 seja, para todos e todas
nós, um ano de muito compromisso com a construção de uma nova sociedade, justa,
igualitária, de verdadeiros irmãos e irmãs. Feliz Ano Novo!
Em tempo: voltarei a escrever no início do
mês de fevereiro/14.
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